Morte de Rubinho Barsotti leva o último baterista da era de ouro


Um dos mais espetaculares instrumentistas da primeira geração, ao lado de Milton Banana e Edison Machado, Rubinho morreu aos 87 anos, depois de complicações de uma cirurgia no fêmur

Por Julio Maria
Atualização:

Vestido de terno para receber o jornalista, com uma caixa de bateria estrategicamente colocada em um canto da sala, Rubinho Barsotti abria a porta sozinho, fazia as honras da casa e sentava-se ao sofá. Sua fala era contida, parecia querer limitar-se às passagens mais importantes, e seus dedos longos iam e vinham no ar quando falava como se regessem uma orquestra. Os grandes bateristas tocam exatamente aquilo que são. Os pedintes de atenção serão exagerados na caixa e nos pratos, os coadjuvantes na vida farão levadas precisas mas discretas, os destemperados nunca entenderão que fazem parte de algo maior do que eles mesmos. Dez minutos falando com Rubinho em sua presença valiam para entender porque sua bateria, equilibrada entre a sensatez e o espetáculo, fizeram uma revolução na música brasileira a partir do começo dos anos 1960.

O baterista Rubinho Barsotti Foto: Arquivo P

Sua morte na madrugada desta quarta-feira (15), aos 87 anos, vítima das complicações de uma cirurgia no fêmur feita depois de sofrer uma queda na casa de repouso em que vivia, leva as últimas baquetas de ouro, o último representante da primeira geração dos bateristas brasileiros. Antes deles, não havia bateria ou, ao menos, ninguém que desse a esse instrumento o status de instrumento, vivo, inteligente e, mais que rítmico, melódico também. E, por eles, entenda-se uma constelação de três: Milton Banana, Edison Machado e Rubinho Barsotti, todos casca grossa que se recusaram a domesticar suas levadas mesmo durante a domesticação em massa de baterias, guitarras, baixos e vozes promovida pela bossa nova a partir de 1959.

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Foi justamente contra essa sutileza dos bossa novistas que Rubinho se juntou, em 1964, ao pianista Amilton Godoy e ao baixista Luís Chaves para formar o Zimbo Trio. O samba jazz que nascia ao mesmo tempo nas casas da Praça Roosevelt, de São Paulo, e no Beco das Garrafas, no Rio, tinha poderes para se impor com uma força descomunal, sobretudo graças ao vigor dos improvisos, por mais que nunca viessem a fazer frente à popularidade da bossa nova. Elis, que já tinha visto Edison Machado no Beco das Garrafas fazendo ‘air drums’ com as mãos, enlouqueceu ao saber que poderia apresentar um programa de TV ao lado do Zimbo. Ao chegar ao estúdio da TV Record pela primeira vez, Elis foi de certa forma testada por Amilton e o surpreendeu mostrando que não era mais um ‘canário’. Depois, se comportou ao lado de Rubinho com uma destreza instrumental, não vocal. “Ela era uma bateria”, lembrou Amilton. E Rubinho Barsotti era seu parceiro.

Em foto de 1998, o baixista LuizChaves, o pianista Amilton Godoye o baterista Rubinho Barsotti no CLAM Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O ídolo maior de Rubinho, citado em todas as suas entrevistas e, musicalmente, em cada solo de bateria, era Buddy Rich, um dos maiores músicos norte-americanos, criador de uma escola da Era do Swing que o jazz viveu entre 1936 e 1946, um momento de explosão instrumental em plena Segunda Guerra Mundial. “Ele foi o primeiro que me assustou”, dizia. Buddy, à frente de sua big band, atrás de Frank Sinatra, Tommy Dorsey e Harry James ou ao lado de Charlie Parker, Lester Young e Art Tatum, era a estrela que guiava Rubinho desde os primeiros anos. Algo do ídolo, como as viradas nos graves, os solos monumentais e a alternância precisa é ágil das mãos nos ataques da caixa, seria aglutinado à sua brasilidade, mas dentro de um outro pensamento rítmico. Buddy Rich era um filho do jazz, Rubinho era um rebento do samba. “Está vendo aquela caixa ali?”, ele pergunta ao repórter no final da entrevista, concedida em 2014. “Foi o Buddy Rich quem me deu.”

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Mas Rubinho poderia ter dado sua caixa também a Buddy Rich, Gene Krupa, Max Roach ou Art Blakey que todos teriam motivos de orgulho. Ao longo dos anos, a história foi sendo construída na porção Sul das Américas por musicalidades como a sua, ao lado do Zimbo Trio ou de Elis, Jair Rodrigues, Elizeth Cardoso, Wilson Simonal e vários outros. A partir dos anos 70, os amigos do Zimbo, já sem Elis, montaram um projeto de educação musical que faria tanta história quanto o grupo, o CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), uma espécie de batismo de grandes instrumentistas do jazz brasileiro. Em 2011, Rubinho rompeu com Amilton Godoy ao reclamar para si a marca Zimbo e informando, por advogados, que Amilton precisaria de autorização caso viesse a se apresentar ou a gravar discos com essa nomenclatura. Foi um susto que derrubou Amilton. Os dois já não tocavam juntos desde que Rubinho havia se retirado de cena por motivos de saúde, mas era amigos até então, tinham gravado 51 discos juntos. O baixista Luiz Chaves havia morrido em 2007. Perguntado sobre o que fica de Rubinho depois de tantas quebradeiras, Amilton Godoy diz: “O que mais importa são as lembranças que temos durante uma amizade de quase 50 anos.” E escreve em sua página de Facebook: “Para mim, Rubinho sempre foi o melhor baterista de sua geração. Descanse em paz, meu amigo!”

Vestido de terno para receber o jornalista, com uma caixa de bateria estrategicamente colocada em um canto da sala, Rubinho Barsotti abria a porta sozinho, fazia as honras da casa e sentava-se ao sofá. Sua fala era contida, parecia querer limitar-se às passagens mais importantes, e seus dedos longos iam e vinham no ar quando falava como se regessem uma orquestra. Os grandes bateristas tocam exatamente aquilo que são. Os pedintes de atenção serão exagerados na caixa e nos pratos, os coadjuvantes na vida farão levadas precisas mas discretas, os destemperados nunca entenderão que fazem parte de algo maior do que eles mesmos. Dez minutos falando com Rubinho em sua presença valiam para entender porque sua bateria, equilibrada entre a sensatez e o espetáculo, fizeram uma revolução na música brasileira a partir do começo dos anos 1960.

O baterista Rubinho Barsotti Foto: Arquivo P

Sua morte na madrugada desta quarta-feira (15), aos 87 anos, vítima das complicações de uma cirurgia no fêmur feita depois de sofrer uma queda na casa de repouso em que vivia, leva as últimas baquetas de ouro, o último representante da primeira geração dos bateristas brasileiros. Antes deles, não havia bateria ou, ao menos, ninguém que desse a esse instrumento o status de instrumento, vivo, inteligente e, mais que rítmico, melódico também. E, por eles, entenda-se uma constelação de três: Milton Banana, Edison Machado e Rubinho Barsotti, todos casca grossa que se recusaram a domesticar suas levadas mesmo durante a domesticação em massa de baterias, guitarras, baixos e vozes promovida pela bossa nova a partir de 1959.

Foi justamente contra essa sutileza dos bossa novistas que Rubinho se juntou, em 1964, ao pianista Amilton Godoy e ao baixista Luís Chaves para formar o Zimbo Trio. O samba jazz que nascia ao mesmo tempo nas casas da Praça Roosevelt, de São Paulo, e no Beco das Garrafas, no Rio, tinha poderes para se impor com uma força descomunal, sobretudo graças ao vigor dos improvisos, por mais que nunca viessem a fazer frente à popularidade da bossa nova. Elis, que já tinha visto Edison Machado no Beco das Garrafas fazendo ‘air drums’ com as mãos, enlouqueceu ao saber que poderia apresentar um programa de TV ao lado do Zimbo. Ao chegar ao estúdio da TV Record pela primeira vez, Elis foi de certa forma testada por Amilton e o surpreendeu mostrando que não era mais um ‘canário’. Depois, se comportou ao lado de Rubinho com uma destreza instrumental, não vocal. “Ela era uma bateria”, lembrou Amilton. E Rubinho Barsotti era seu parceiro.

Em foto de 1998, o baixista LuizChaves, o pianista Amilton Godoye o baterista Rubinho Barsotti no CLAM Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O ídolo maior de Rubinho, citado em todas as suas entrevistas e, musicalmente, em cada solo de bateria, era Buddy Rich, um dos maiores músicos norte-americanos, criador de uma escola da Era do Swing que o jazz viveu entre 1936 e 1946, um momento de explosão instrumental em plena Segunda Guerra Mundial. “Ele foi o primeiro que me assustou”, dizia. Buddy, à frente de sua big band, atrás de Frank Sinatra, Tommy Dorsey e Harry James ou ao lado de Charlie Parker, Lester Young e Art Tatum, era a estrela que guiava Rubinho desde os primeiros anos. Algo do ídolo, como as viradas nos graves, os solos monumentais e a alternância precisa é ágil das mãos nos ataques da caixa, seria aglutinado à sua brasilidade, mas dentro de um outro pensamento rítmico. Buddy Rich era um filho do jazz, Rubinho era um rebento do samba. “Está vendo aquela caixa ali?”, ele pergunta ao repórter no final da entrevista, concedida em 2014. “Foi o Buddy Rich quem me deu.”

Mas Rubinho poderia ter dado sua caixa também a Buddy Rich, Gene Krupa, Max Roach ou Art Blakey que todos teriam motivos de orgulho. Ao longo dos anos, a história foi sendo construída na porção Sul das Américas por musicalidades como a sua, ao lado do Zimbo Trio ou de Elis, Jair Rodrigues, Elizeth Cardoso, Wilson Simonal e vários outros. A partir dos anos 70, os amigos do Zimbo, já sem Elis, montaram um projeto de educação musical que faria tanta história quanto o grupo, o CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), uma espécie de batismo de grandes instrumentistas do jazz brasileiro. Em 2011, Rubinho rompeu com Amilton Godoy ao reclamar para si a marca Zimbo e informando, por advogados, que Amilton precisaria de autorização caso viesse a se apresentar ou a gravar discos com essa nomenclatura. Foi um susto que derrubou Amilton. Os dois já não tocavam juntos desde que Rubinho havia se retirado de cena por motivos de saúde, mas era amigos até então, tinham gravado 51 discos juntos. O baixista Luiz Chaves havia morrido em 2007. Perguntado sobre o que fica de Rubinho depois de tantas quebradeiras, Amilton Godoy diz: “O que mais importa são as lembranças que temos durante uma amizade de quase 50 anos.” E escreve em sua página de Facebook: “Para mim, Rubinho sempre foi o melhor baterista de sua geração. Descanse em paz, meu amigo!”

Vestido de terno para receber o jornalista, com uma caixa de bateria estrategicamente colocada em um canto da sala, Rubinho Barsotti abria a porta sozinho, fazia as honras da casa e sentava-se ao sofá. Sua fala era contida, parecia querer limitar-se às passagens mais importantes, e seus dedos longos iam e vinham no ar quando falava como se regessem uma orquestra. Os grandes bateristas tocam exatamente aquilo que são. Os pedintes de atenção serão exagerados na caixa e nos pratos, os coadjuvantes na vida farão levadas precisas mas discretas, os destemperados nunca entenderão que fazem parte de algo maior do que eles mesmos. Dez minutos falando com Rubinho em sua presença valiam para entender porque sua bateria, equilibrada entre a sensatez e o espetáculo, fizeram uma revolução na música brasileira a partir do começo dos anos 1960.

O baterista Rubinho Barsotti Foto: Arquivo P

Sua morte na madrugada desta quarta-feira (15), aos 87 anos, vítima das complicações de uma cirurgia no fêmur feita depois de sofrer uma queda na casa de repouso em que vivia, leva as últimas baquetas de ouro, o último representante da primeira geração dos bateristas brasileiros. Antes deles, não havia bateria ou, ao menos, ninguém que desse a esse instrumento o status de instrumento, vivo, inteligente e, mais que rítmico, melódico também. E, por eles, entenda-se uma constelação de três: Milton Banana, Edison Machado e Rubinho Barsotti, todos casca grossa que se recusaram a domesticar suas levadas mesmo durante a domesticação em massa de baterias, guitarras, baixos e vozes promovida pela bossa nova a partir de 1959.

Foi justamente contra essa sutileza dos bossa novistas que Rubinho se juntou, em 1964, ao pianista Amilton Godoy e ao baixista Luís Chaves para formar o Zimbo Trio. O samba jazz que nascia ao mesmo tempo nas casas da Praça Roosevelt, de São Paulo, e no Beco das Garrafas, no Rio, tinha poderes para se impor com uma força descomunal, sobretudo graças ao vigor dos improvisos, por mais que nunca viessem a fazer frente à popularidade da bossa nova. Elis, que já tinha visto Edison Machado no Beco das Garrafas fazendo ‘air drums’ com as mãos, enlouqueceu ao saber que poderia apresentar um programa de TV ao lado do Zimbo. Ao chegar ao estúdio da TV Record pela primeira vez, Elis foi de certa forma testada por Amilton e o surpreendeu mostrando que não era mais um ‘canário’. Depois, se comportou ao lado de Rubinho com uma destreza instrumental, não vocal. “Ela era uma bateria”, lembrou Amilton. E Rubinho Barsotti era seu parceiro.

Em foto de 1998, o baixista LuizChaves, o pianista Amilton Godoye o baterista Rubinho Barsotti no CLAM Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O ídolo maior de Rubinho, citado em todas as suas entrevistas e, musicalmente, em cada solo de bateria, era Buddy Rich, um dos maiores músicos norte-americanos, criador de uma escola da Era do Swing que o jazz viveu entre 1936 e 1946, um momento de explosão instrumental em plena Segunda Guerra Mundial. “Ele foi o primeiro que me assustou”, dizia. Buddy, à frente de sua big band, atrás de Frank Sinatra, Tommy Dorsey e Harry James ou ao lado de Charlie Parker, Lester Young e Art Tatum, era a estrela que guiava Rubinho desde os primeiros anos. Algo do ídolo, como as viradas nos graves, os solos monumentais e a alternância precisa é ágil das mãos nos ataques da caixa, seria aglutinado à sua brasilidade, mas dentro de um outro pensamento rítmico. Buddy Rich era um filho do jazz, Rubinho era um rebento do samba. “Está vendo aquela caixa ali?”, ele pergunta ao repórter no final da entrevista, concedida em 2014. “Foi o Buddy Rich quem me deu.”

Mas Rubinho poderia ter dado sua caixa também a Buddy Rich, Gene Krupa, Max Roach ou Art Blakey que todos teriam motivos de orgulho. Ao longo dos anos, a história foi sendo construída na porção Sul das Américas por musicalidades como a sua, ao lado do Zimbo Trio ou de Elis, Jair Rodrigues, Elizeth Cardoso, Wilson Simonal e vários outros. A partir dos anos 70, os amigos do Zimbo, já sem Elis, montaram um projeto de educação musical que faria tanta história quanto o grupo, o CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), uma espécie de batismo de grandes instrumentistas do jazz brasileiro. Em 2011, Rubinho rompeu com Amilton Godoy ao reclamar para si a marca Zimbo e informando, por advogados, que Amilton precisaria de autorização caso viesse a se apresentar ou a gravar discos com essa nomenclatura. Foi um susto que derrubou Amilton. Os dois já não tocavam juntos desde que Rubinho havia se retirado de cena por motivos de saúde, mas era amigos até então, tinham gravado 51 discos juntos. O baixista Luiz Chaves havia morrido em 2007. Perguntado sobre o que fica de Rubinho depois de tantas quebradeiras, Amilton Godoy diz: “O que mais importa são as lembranças que temos durante uma amizade de quase 50 anos.” E escreve em sua página de Facebook: “Para mim, Rubinho sempre foi o melhor baterista de sua geração. Descanse em paz, meu amigo!”

Vestido de terno para receber o jornalista, com uma caixa de bateria estrategicamente colocada em um canto da sala, Rubinho Barsotti abria a porta sozinho, fazia as honras da casa e sentava-se ao sofá. Sua fala era contida, parecia querer limitar-se às passagens mais importantes, e seus dedos longos iam e vinham no ar quando falava como se regessem uma orquestra. Os grandes bateristas tocam exatamente aquilo que são. Os pedintes de atenção serão exagerados na caixa e nos pratos, os coadjuvantes na vida farão levadas precisas mas discretas, os destemperados nunca entenderão que fazem parte de algo maior do que eles mesmos. Dez minutos falando com Rubinho em sua presença valiam para entender porque sua bateria, equilibrada entre a sensatez e o espetáculo, fizeram uma revolução na música brasileira a partir do começo dos anos 1960.

O baterista Rubinho Barsotti Foto: Arquivo P

Sua morte na madrugada desta quarta-feira (15), aos 87 anos, vítima das complicações de uma cirurgia no fêmur feita depois de sofrer uma queda na casa de repouso em que vivia, leva as últimas baquetas de ouro, o último representante da primeira geração dos bateristas brasileiros. Antes deles, não havia bateria ou, ao menos, ninguém que desse a esse instrumento o status de instrumento, vivo, inteligente e, mais que rítmico, melódico também. E, por eles, entenda-se uma constelação de três: Milton Banana, Edison Machado e Rubinho Barsotti, todos casca grossa que se recusaram a domesticar suas levadas mesmo durante a domesticação em massa de baterias, guitarras, baixos e vozes promovida pela bossa nova a partir de 1959.

Foi justamente contra essa sutileza dos bossa novistas que Rubinho se juntou, em 1964, ao pianista Amilton Godoy e ao baixista Luís Chaves para formar o Zimbo Trio. O samba jazz que nascia ao mesmo tempo nas casas da Praça Roosevelt, de São Paulo, e no Beco das Garrafas, no Rio, tinha poderes para se impor com uma força descomunal, sobretudo graças ao vigor dos improvisos, por mais que nunca viessem a fazer frente à popularidade da bossa nova. Elis, que já tinha visto Edison Machado no Beco das Garrafas fazendo ‘air drums’ com as mãos, enlouqueceu ao saber que poderia apresentar um programa de TV ao lado do Zimbo. Ao chegar ao estúdio da TV Record pela primeira vez, Elis foi de certa forma testada por Amilton e o surpreendeu mostrando que não era mais um ‘canário’. Depois, se comportou ao lado de Rubinho com uma destreza instrumental, não vocal. “Ela era uma bateria”, lembrou Amilton. E Rubinho Barsotti era seu parceiro.

Em foto de 1998, o baixista LuizChaves, o pianista Amilton Godoye o baterista Rubinho Barsotti no CLAM Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O ídolo maior de Rubinho, citado em todas as suas entrevistas e, musicalmente, em cada solo de bateria, era Buddy Rich, um dos maiores músicos norte-americanos, criador de uma escola da Era do Swing que o jazz viveu entre 1936 e 1946, um momento de explosão instrumental em plena Segunda Guerra Mundial. “Ele foi o primeiro que me assustou”, dizia. Buddy, à frente de sua big band, atrás de Frank Sinatra, Tommy Dorsey e Harry James ou ao lado de Charlie Parker, Lester Young e Art Tatum, era a estrela que guiava Rubinho desde os primeiros anos. Algo do ídolo, como as viradas nos graves, os solos monumentais e a alternância precisa é ágil das mãos nos ataques da caixa, seria aglutinado à sua brasilidade, mas dentro de um outro pensamento rítmico. Buddy Rich era um filho do jazz, Rubinho era um rebento do samba. “Está vendo aquela caixa ali?”, ele pergunta ao repórter no final da entrevista, concedida em 2014. “Foi o Buddy Rich quem me deu.”

Mas Rubinho poderia ter dado sua caixa também a Buddy Rich, Gene Krupa, Max Roach ou Art Blakey que todos teriam motivos de orgulho. Ao longo dos anos, a história foi sendo construída na porção Sul das Américas por musicalidades como a sua, ao lado do Zimbo Trio ou de Elis, Jair Rodrigues, Elizeth Cardoso, Wilson Simonal e vários outros. A partir dos anos 70, os amigos do Zimbo, já sem Elis, montaram um projeto de educação musical que faria tanta história quanto o grupo, o CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), uma espécie de batismo de grandes instrumentistas do jazz brasileiro. Em 2011, Rubinho rompeu com Amilton Godoy ao reclamar para si a marca Zimbo e informando, por advogados, que Amilton precisaria de autorização caso viesse a se apresentar ou a gravar discos com essa nomenclatura. Foi um susto que derrubou Amilton. Os dois já não tocavam juntos desde que Rubinho havia se retirado de cena por motivos de saúde, mas era amigos até então, tinham gravado 51 discos juntos. O baixista Luiz Chaves havia morrido em 2007. Perguntado sobre o que fica de Rubinho depois de tantas quebradeiras, Amilton Godoy diz: “O que mais importa são as lembranças que temos durante uma amizade de quase 50 anos.” E escreve em sua página de Facebook: “Para mim, Rubinho sempre foi o melhor baterista de sua geração. Descanse em paz, meu amigo!”

Vestido de terno para receber o jornalista, com uma caixa de bateria estrategicamente colocada em um canto da sala, Rubinho Barsotti abria a porta sozinho, fazia as honras da casa e sentava-se ao sofá. Sua fala era contida, parecia querer limitar-se às passagens mais importantes, e seus dedos longos iam e vinham no ar quando falava como se regessem uma orquestra. Os grandes bateristas tocam exatamente aquilo que são. Os pedintes de atenção serão exagerados na caixa e nos pratos, os coadjuvantes na vida farão levadas precisas mas discretas, os destemperados nunca entenderão que fazem parte de algo maior do que eles mesmos. Dez minutos falando com Rubinho em sua presença valiam para entender porque sua bateria, equilibrada entre a sensatez e o espetáculo, fizeram uma revolução na música brasileira a partir do começo dos anos 1960.

O baterista Rubinho Barsotti Foto: Arquivo P

Sua morte na madrugada desta quarta-feira (15), aos 87 anos, vítima das complicações de uma cirurgia no fêmur feita depois de sofrer uma queda na casa de repouso em que vivia, leva as últimas baquetas de ouro, o último representante da primeira geração dos bateristas brasileiros. Antes deles, não havia bateria ou, ao menos, ninguém que desse a esse instrumento o status de instrumento, vivo, inteligente e, mais que rítmico, melódico também. E, por eles, entenda-se uma constelação de três: Milton Banana, Edison Machado e Rubinho Barsotti, todos casca grossa que se recusaram a domesticar suas levadas mesmo durante a domesticação em massa de baterias, guitarras, baixos e vozes promovida pela bossa nova a partir de 1959.

Foi justamente contra essa sutileza dos bossa novistas que Rubinho se juntou, em 1964, ao pianista Amilton Godoy e ao baixista Luís Chaves para formar o Zimbo Trio. O samba jazz que nascia ao mesmo tempo nas casas da Praça Roosevelt, de São Paulo, e no Beco das Garrafas, no Rio, tinha poderes para se impor com uma força descomunal, sobretudo graças ao vigor dos improvisos, por mais que nunca viessem a fazer frente à popularidade da bossa nova. Elis, que já tinha visto Edison Machado no Beco das Garrafas fazendo ‘air drums’ com as mãos, enlouqueceu ao saber que poderia apresentar um programa de TV ao lado do Zimbo. Ao chegar ao estúdio da TV Record pela primeira vez, Elis foi de certa forma testada por Amilton e o surpreendeu mostrando que não era mais um ‘canário’. Depois, se comportou ao lado de Rubinho com uma destreza instrumental, não vocal. “Ela era uma bateria”, lembrou Amilton. E Rubinho Barsotti era seu parceiro.

Em foto de 1998, o baixista LuizChaves, o pianista Amilton Godoye o baterista Rubinho Barsotti no CLAM Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O ídolo maior de Rubinho, citado em todas as suas entrevistas e, musicalmente, em cada solo de bateria, era Buddy Rich, um dos maiores músicos norte-americanos, criador de uma escola da Era do Swing que o jazz viveu entre 1936 e 1946, um momento de explosão instrumental em plena Segunda Guerra Mundial. “Ele foi o primeiro que me assustou”, dizia. Buddy, à frente de sua big band, atrás de Frank Sinatra, Tommy Dorsey e Harry James ou ao lado de Charlie Parker, Lester Young e Art Tatum, era a estrela que guiava Rubinho desde os primeiros anos. Algo do ídolo, como as viradas nos graves, os solos monumentais e a alternância precisa é ágil das mãos nos ataques da caixa, seria aglutinado à sua brasilidade, mas dentro de um outro pensamento rítmico. Buddy Rich era um filho do jazz, Rubinho era um rebento do samba. “Está vendo aquela caixa ali?”, ele pergunta ao repórter no final da entrevista, concedida em 2014. “Foi o Buddy Rich quem me deu.”

Mas Rubinho poderia ter dado sua caixa também a Buddy Rich, Gene Krupa, Max Roach ou Art Blakey que todos teriam motivos de orgulho. Ao longo dos anos, a história foi sendo construída na porção Sul das Américas por musicalidades como a sua, ao lado do Zimbo Trio ou de Elis, Jair Rodrigues, Elizeth Cardoso, Wilson Simonal e vários outros. A partir dos anos 70, os amigos do Zimbo, já sem Elis, montaram um projeto de educação musical que faria tanta história quanto o grupo, o CLAM (Centro Livre de Aprendizagem Musical), uma espécie de batismo de grandes instrumentistas do jazz brasileiro. Em 2011, Rubinho rompeu com Amilton Godoy ao reclamar para si a marca Zimbo e informando, por advogados, que Amilton precisaria de autorização caso viesse a se apresentar ou a gravar discos com essa nomenclatura. Foi um susto que derrubou Amilton. Os dois já não tocavam juntos desde que Rubinho havia se retirado de cena por motivos de saúde, mas era amigos até então, tinham gravado 51 discos juntos. O baixista Luiz Chaves havia morrido em 2007. Perguntado sobre o que fica de Rubinho depois de tantas quebradeiras, Amilton Godoy diz: “O que mais importa são as lembranças que temos durante uma amizade de quase 50 anos.” E escreve em sua página de Facebook: “Para mim, Rubinho sempre foi o melhor baterista de sua geração. Descanse em paz, meu amigo!”

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