Mundo da música quer reviver Sidney Miller


A compositora Cristina Saraiva pretende lançar CD duplo em homenagem ao compositor, com cinco músicas inéditas, reunindo grandes nomes da MPB

Por Agencia Estado

Sidney Miller planejava montar um show em que dividiria o palco com o violonista Maurício Tapajós. Tinha várias músicas novas e quis mostrar o repertório para o MPB-4, que havia feito enorme sucesso cantando uma de suas composições - a tristíssima, desalentada, desesperançada canção Pois É, pra Quê?. Gravou uma fita com cinco das músicas novas e entregou-a a Miltinho, o violonista do quarteto. Miltinho ouviu, adorou, guardou. Isso foi no começo de 1980. No dia 16 de julho, Sidney Miller morreu. Tinha 35 anos. Oficialmente, morreu de câncer. É o que consta das notícias de época, não contestadas. Um delicado silêncio encobriu o gesto de desespero - Sidney trabalhava na Funarte, onde esteve naquele dia mesmo, de onde saiu, ao fim do expediente, para nunca mais. Miltinho não voltou a ouvir a fita. Pano rápido. Há três anos, a compositora Cristina Saraiva, parceira mais constante de Simone Guimarães (e de Danilo Caymmi, Sueli Costa, Sérgio Santos, Jayme Álem, entre muitos) resolveu prestar uma homenagem a Sidney, um de seus ídolos maiores. Um disco, um tributo. Convidou, naturalmente, Chico Buarque, a quem Sidney Miller era comparado, e Elba Ramalho, Paulinho da Viola, Zé Renato, o Quarteto em Cy. Todos toparam, na hora. Chico chegou a escolher a música: Pede Passagem. É um samba de desencantos - "Chegou a hora da escola de samba sair/ Deixar morrendo no asfalto uma dor que não quis/ Quem não soube o que é ter alegria na vida/ Tem toda a avenida pra ser muito feliz." Claro, Cristina convidou o MPB-4. Foi quando Miltinho se lembrou da fita (leia as letras ao lado). Vasculhou os guardados e extraiu a preciosidade, as cinco músicas inéditas de Sidney Miller - ainda que Soneto sobre Valsa remeta a Paisagem sobre a Valsa, que Alaíde Costa gravou num disco póstumo (a voz de Sidney aparece em algumas faixas, com arranjos feitos a posteriori por Antônio Adolfo) e Hermínio Bello de Carvalho produziu para Funarte, ainda nos anos 80. O disco, de circulação restrita (as edições da Funarte vendiam-se exclusivamente na Funarte), nunca foi reeditado. Com a descoberta, o projeto de Cristina Saraiva cresceu - de CD simples para duplo. Cresceram também as adesões - o mundo da música quer reviver Sidney Miller. O projeto está sendo submetido à Lei Rouanet. Cristina está acompanhando o processo. Quer lançar o disco duplo no início do ano que vem. Ela ainda não tinha 15 anos quando Sidney Miller morreu. Cresceu ouvindo sua música. Depois de separada, a mãe teve um namorado que lhe deu de presente dois discos - os dois do Sidney Miller. Foi o que ela ouviu, enquanto crescia e começava a entender o mundo. Daí a paixão. Ela submeteu o projeto ao Museu da Imagem e do Som, que não mostrou interesse, à Funarte, que não topou. Cabe lembrar que a Funarte, Fundação Nacional de Arte, abriga a Sala Sidney Miller, no Rio. Cabe lembrar, ainda, que uma das primeiras medidas do governo Collor foi fechar a Funarte e, com ela, a Sala Sidney Miller. Alguém percebeu uma metáfora? Sidney Álvaro Miller Filho nasceu no Rio, em 1945. Começou a compor na adolescência, estudou Economia - não se formou -, estreou para o público com o samba Queixa, uma parceria a seis mãos com Zé Kéti e Paulo Thiago que Ciro Monteiro interpretou no primeiro festival da TV Excelsior. Em 1967, ele mesmo defendeu a épica A Estrada e o Violeiro, num dueto com Nara Leão. Ganhou o prêmio de melhor letra no terceiro festival da TV Record. Concorria, entre outras, com Roda Viva, de Chico Buarque, Ponteio, de Edu Lobo e Capinam, Domingo no Parque, de Gilberto Gil, Alegria, Alegria, de Caetano Veloso. A corajosa Nara foi sua grande incentivadora. Nelson Lins e Barros os apresentou. Ele levou uma penca de músicas para ela. Nara gravou cinco, em 1966, num mesmo disco - num tempo em que os discos tinham, no máximo, 12 faixas. Entre as escolhidas de Nara estavam Pede Passagem (que deu nome ao disco), O Circo ("Vai, vai, vai, começar a brincadeira/ Tem charanga tocando a noite inteira"). De repente, todo mundo cantava O Circo. Era a música que os pais cantavam para os filhos - e os filhos cantavam junto os versos desalentados: "De chicote e cara feia, o domador fica mais forte/ Meia volta, volta e meia, meia vida, meia morte/ Terminado o seu batente, de repente a fera some/ Domador que era valente em outras feras se consome/ Seu amor indiferente, sua vida, sua fome." O percurso artístico foi errático. Sidney era um tímido incurável que se recolheu aos bastidores. Gravou três discos, entre 1967 e 1974, que estão fora de mercado: Sidney Miller, Do Guarani ao Guaraná e Línguas de Fogo. Foi um grande produtor de espetáculos, musicou filmes e peças de teatro, escreveu um livro. Fez sambas (Pede Passagem, Alô Fevereiro), toadas (A Estrada e o Violeiro), retrabalhou cantigas de roda (De Marré de Ci, Passa, Passa, Gavião, A Menina e a Agulha), flertou com o tropicalismo (em Do Guarani ao Guaraná). Seu talento só encontrava comparação no de Chico Buarque e na carreira curta, a obra densa guarda alguns dos versos mais tristes da história da música brasileira, como os de Pois É, pra Quê?: "Que rapaz é esse, que estranho canto/ Seu rosto é santo, seu canto é tudo/ Saiu do nada, da dor fingida/ Caiu na estrada, fugiu na vida/ A menina aflita ele não quer ver/ A guitarra excita, pois é: pra quê?"

Sidney Miller planejava montar um show em que dividiria o palco com o violonista Maurício Tapajós. Tinha várias músicas novas e quis mostrar o repertório para o MPB-4, que havia feito enorme sucesso cantando uma de suas composições - a tristíssima, desalentada, desesperançada canção Pois É, pra Quê?. Gravou uma fita com cinco das músicas novas e entregou-a a Miltinho, o violonista do quarteto. Miltinho ouviu, adorou, guardou. Isso foi no começo de 1980. No dia 16 de julho, Sidney Miller morreu. Tinha 35 anos. Oficialmente, morreu de câncer. É o que consta das notícias de época, não contestadas. Um delicado silêncio encobriu o gesto de desespero - Sidney trabalhava na Funarte, onde esteve naquele dia mesmo, de onde saiu, ao fim do expediente, para nunca mais. Miltinho não voltou a ouvir a fita. Pano rápido. Há três anos, a compositora Cristina Saraiva, parceira mais constante de Simone Guimarães (e de Danilo Caymmi, Sueli Costa, Sérgio Santos, Jayme Álem, entre muitos) resolveu prestar uma homenagem a Sidney, um de seus ídolos maiores. Um disco, um tributo. Convidou, naturalmente, Chico Buarque, a quem Sidney Miller era comparado, e Elba Ramalho, Paulinho da Viola, Zé Renato, o Quarteto em Cy. Todos toparam, na hora. Chico chegou a escolher a música: Pede Passagem. É um samba de desencantos - "Chegou a hora da escola de samba sair/ Deixar morrendo no asfalto uma dor que não quis/ Quem não soube o que é ter alegria na vida/ Tem toda a avenida pra ser muito feliz." Claro, Cristina convidou o MPB-4. Foi quando Miltinho se lembrou da fita (leia as letras ao lado). Vasculhou os guardados e extraiu a preciosidade, as cinco músicas inéditas de Sidney Miller - ainda que Soneto sobre Valsa remeta a Paisagem sobre a Valsa, que Alaíde Costa gravou num disco póstumo (a voz de Sidney aparece em algumas faixas, com arranjos feitos a posteriori por Antônio Adolfo) e Hermínio Bello de Carvalho produziu para Funarte, ainda nos anos 80. O disco, de circulação restrita (as edições da Funarte vendiam-se exclusivamente na Funarte), nunca foi reeditado. Com a descoberta, o projeto de Cristina Saraiva cresceu - de CD simples para duplo. Cresceram também as adesões - o mundo da música quer reviver Sidney Miller. O projeto está sendo submetido à Lei Rouanet. Cristina está acompanhando o processo. Quer lançar o disco duplo no início do ano que vem. Ela ainda não tinha 15 anos quando Sidney Miller morreu. Cresceu ouvindo sua música. Depois de separada, a mãe teve um namorado que lhe deu de presente dois discos - os dois do Sidney Miller. Foi o que ela ouviu, enquanto crescia e começava a entender o mundo. Daí a paixão. Ela submeteu o projeto ao Museu da Imagem e do Som, que não mostrou interesse, à Funarte, que não topou. Cabe lembrar que a Funarte, Fundação Nacional de Arte, abriga a Sala Sidney Miller, no Rio. Cabe lembrar, ainda, que uma das primeiras medidas do governo Collor foi fechar a Funarte e, com ela, a Sala Sidney Miller. Alguém percebeu uma metáfora? Sidney Álvaro Miller Filho nasceu no Rio, em 1945. Começou a compor na adolescência, estudou Economia - não se formou -, estreou para o público com o samba Queixa, uma parceria a seis mãos com Zé Kéti e Paulo Thiago que Ciro Monteiro interpretou no primeiro festival da TV Excelsior. Em 1967, ele mesmo defendeu a épica A Estrada e o Violeiro, num dueto com Nara Leão. Ganhou o prêmio de melhor letra no terceiro festival da TV Record. Concorria, entre outras, com Roda Viva, de Chico Buarque, Ponteio, de Edu Lobo e Capinam, Domingo no Parque, de Gilberto Gil, Alegria, Alegria, de Caetano Veloso. A corajosa Nara foi sua grande incentivadora. Nelson Lins e Barros os apresentou. Ele levou uma penca de músicas para ela. Nara gravou cinco, em 1966, num mesmo disco - num tempo em que os discos tinham, no máximo, 12 faixas. Entre as escolhidas de Nara estavam Pede Passagem (que deu nome ao disco), O Circo ("Vai, vai, vai, começar a brincadeira/ Tem charanga tocando a noite inteira"). De repente, todo mundo cantava O Circo. Era a música que os pais cantavam para os filhos - e os filhos cantavam junto os versos desalentados: "De chicote e cara feia, o domador fica mais forte/ Meia volta, volta e meia, meia vida, meia morte/ Terminado o seu batente, de repente a fera some/ Domador que era valente em outras feras se consome/ Seu amor indiferente, sua vida, sua fome." O percurso artístico foi errático. Sidney era um tímido incurável que se recolheu aos bastidores. Gravou três discos, entre 1967 e 1974, que estão fora de mercado: Sidney Miller, Do Guarani ao Guaraná e Línguas de Fogo. Foi um grande produtor de espetáculos, musicou filmes e peças de teatro, escreveu um livro. Fez sambas (Pede Passagem, Alô Fevereiro), toadas (A Estrada e o Violeiro), retrabalhou cantigas de roda (De Marré de Ci, Passa, Passa, Gavião, A Menina e a Agulha), flertou com o tropicalismo (em Do Guarani ao Guaraná). Seu talento só encontrava comparação no de Chico Buarque e na carreira curta, a obra densa guarda alguns dos versos mais tristes da história da música brasileira, como os de Pois É, pra Quê?: "Que rapaz é esse, que estranho canto/ Seu rosto é santo, seu canto é tudo/ Saiu do nada, da dor fingida/ Caiu na estrada, fugiu na vida/ A menina aflita ele não quer ver/ A guitarra excita, pois é: pra quê?"

Sidney Miller planejava montar um show em que dividiria o palco com o violonista Maurício Tapajós. Tinha várias músicas novas e quis mostrar o repertório para o MPB-4, que havia feito enorme sucesso cantando uma de suas composições - a tristíssima, desalentada, desesperançada canção Pois É, pra Quê?. Gravou uma fita com cinco das músicas novas e entregou-a a Miltinho, o violonista do quarteto. Miltinho ouviu, adorou, guardou. Isso foi no começo de 1980. No dia 16 de julho, Sidney Miller morreu. Tinha 35 anos. Oficialmente, morreu de câncer. É o que consta das notícias de época, não contestadas. Um delicado silêncio encobriu o gesto de desespero - Sidney trabalhava na Funarte, onde esteve naquele dia mesmo, de onde saiu, ao fim do expediente, para nunca mais. Miltinho não voltou a ouvir a fita. Pano rápido. Há três anos, a compositora Cristina Saraiva, parceira mais constante de Simone Guimarães (e de Danilo Caymmi, Sueli Costa, Sérgio Santos, Jayme Álem, entre muitos) resolveu prestar uma homenagem a Sidney, um de seus ídolos maiores. Um disco, um tributo. Convidou, naturalmente, Chico Buarque, a quem Sidney Miller era comparado, e Elba Ramalho, Paulinho da Viola, Zé Renato, o Quarteto em Cy. Todos toparam, na hora. Chico chegou a escolher a música: Pede Passagem. É um samba de desencantos - "Chegou a hora da escola de samba sair/ Deixar morrendo no asfalto uma dor que não quis/ Quem não soube o que é ter alegria na vida/ Tem toda a avenida pra ser muito feliz." Claro, Cristina convidou o MPB-4. Foi quando Miltinho se lembrou da fita (leia as letras ao lado). Vasculhou os guardados e extraiu a preciosidade, as cinco músicas inéditas de Sidney Miller - ainda que Soneto sobre Valsa remeta a Paisagem sobre a Valsa, que Alaíde Costa gravou num disco póstumo (a voz de Sidney aparece em algumas faixas, com arranjos feitos a posteriori por Antônio Adolfo) e Hermínio Bello de Carvalho produziu para Funarte, ainda nos anos 80. O disco, de circulação restrita (as edições da Funarte vendiam-se exclusivamente na Funarte), nunca foi reeditado. Com a descoberta, o projeto de Cristina Saraiva cresceu - de CD simples para duplo. Cresceram também as adesões - o mundo da música quer reviver Sidney Miller. O projeto está sendo submetido à Lei Rouanet. Cristina está acompanhando o processo. Quer lançar o disco duplo no início do ano que vem. Ela ainda não tinha 15 anos quando Sidney Miller morreu. Cresceu ouvindo sua música. Depois de separada, a mãe teve um namorado que lhe deu de presente dois discos - os dois do Sidney Miller. Foi o que ela ouviu, enquanto crescia e começava a entender o mundo. Daí a paixão. Ela submeteu o projeto ao Museu da Imagem e do Som, que não mostrou interesse, à Funarte, que não topou. Cabe lembrar que a Funarte, Fundação Nacional de Arte, abriga a Sala Sidney Miller, no Rio. Cabe lembrar, ainda, que uma das primeiras medidas do governo Collor foi fechar a Funarte e, com ela, a Sala Sidney Miller. Alguém percebeu uma metáfora? Sidney Álvaro Miller Filho nasceu no Rio, em 1945. Começou a compor na adolescência, estudou Economia - não se formou -, estreou para o público com o samba Queixa, uma parceria a seis mãos com Zé Kéti e Paulo Thiago que Ciro Monteiro interpretou no primeiro festival da TV Excelsior. Em 1967, ele mesmo defendeu a épica A Estrada e o Violeiro, num dueto com Nara Leão. Ganhou o prêmio de melhor letra no terceiro festival da TV Record. Concorria, entre outras, com Roda Viva, de Chico Buarque, Ponteio, de Edu Lobo e Capinam, Domingo no Parque, de Gilberto Gil, Alegria, Alegria, de Caetano Veloso. A corajosa Nara foi sua grande incentivadora. Nelson Lins e Barros os apresentou. Ele levou uma penca de músicas para ela. Nara gravou cinco, em 1966, num mesmo disco - num tempo em que os discos tinham, no máximo, 12 faixas. Entre as escolhidas de Nara estavam Pede Passagem (que deu nome ao disco), O Circo ("Vai, vai, vai, começar a brincadeira/ Tem charanga tocando a noite inteira"). De repente, todo mundo cantava O Circo. Era a música que os pais cantavam para os filhos - e os filhos cantavam junto os versos desalentados: "De chicote e cara feia, o domador fica mais forte/ Meia volta, volta e meia, meia vida, meia morte/ Terminado o seu batente, de repente a fera some/ Domador que era valente em outras feras se consome/ Seu amor indiferente, sua vida, sua fome." O percurso artístico foi errático. Sidney era um tímido incurável que se recolheu aos bastidores. Gravou três discos, entre 1967 e 1974, que estão fora de mercado: Sidney Miller, Do Guarani ao Guaraná e Línguas de Fogo. Foi um grande produtor de espetáculos, musicou filmes e peças de teatro, escreveu um livro. Fez sambas (Pede Passagem, Alô Fevereiro), toadas (A Estrada e o Violeiro), retrabalhou cantigas de roda (De Marré de Ci, Passa, Passa, Gavião, A Menina e a Agulha), flertou com o tropicalismo (em Do Guarani ao Guaraná). Seu talento só encontrava comparação no de Chico Buarque e na carreira curta, a obra densa guarda alguns dos versos mais tristes da história da música brasileira, como os de Pois É, pra Quê?: "Que rapaz é esse, que estranho canto/ Seu rosto é santo, seu canto é tudo/ Saiu do nada, da dor fingida/ Caiu na estrada, fugiu na vida/ A menina aflita ele não quer ver/ A guitarra excita, pois é: pra quê?"

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