O que esperar do show de Roger Waters em São Paulo? Apresentação no Rio teve comoção e surpresas


‘Estadão’ viu o show no Estádio Nilton Santos antes da passagem do cantor por São Paulo, que teve clássicos, declaração de amor ao Brasil, homenagens e música nunca tocada ao vivo pelo Pink Floyd; veja fotos e destaques da setlist de Roger Waters

Por Pedro Só

Parafraseando a famosa frase do americano James Carville, estrategista da equipe de Bill Clinton na campanha presidencial americana de 1992: “É a política, estúpido!”. O espetáculo This Is Not A Drill, apresentado no Rio pelo inglês Roger Waters, 80 anos, ex-Pink Floyd, em sua turnê global de despedida, é provavelmente o mais panfletário de sua carreira. Os vídeos do telão disparam mensagens o tempo todo, com mão pesada e quase sem refresco. Até o porco voador gigante traz palavras de ordem.

Waters define o espetáculo como “uma extravaganza cinematógráfica rock’n’roll” que junta “uma acusação impressionante da distopia corporativa na qual todos nós lutamos para sobreviver e uma ação para amar, proteger e compartilhar nosso precioso e precário lar planetário”. Mas, para além do discurso inflamado e do brilhante lado musical de sua antiga banda, o show revela a humanidade de seu protagonista. Isso se viu nitidamente neste sábado, 28, no Estádio Nílton Santos, no Rio de Janeiro.

“Eu poderia ficar aqui afogado no amor de vocês até o fim dos meus dias. (...) Não é provável que eu volte (...) Mas, por Deus, estou adorando!”, exclamou Waters, bastante comovido, perto do fim da apresentação que durou cerca de 2h10, fora os 20 minutos de intervalo.

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Roger Waters está no Brasil com a turnê This is not a Drill; músico se apresentou no Rio neste sábado, 28 Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Fãs anônimos e ilustres como Milton Nascimento puderam ver Roger Waters ensaiar passinhos descontraídos de disco music (no megahit Another Brick in The Wall part two), mostrando vitalidade, e se rasgar em manifestações de afeto de maneira aparentemente sincera. Ao fim de Brain Damage, ele ouviu gritos de “eu te amo” e agradeceu: “Eu me sinto em casa aqui no Brasil”.

Músicas tocadas por Roger Waters

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Houve quem sentisse falta de Time e reclamasse da versão tocada de Shine On You Crazy Diamond, mas não faltaram clássicos impactantes desde o princípio.

Waters entrou de jaleco, carregando um “paciente” na cadeira de rodas, e mandou de cara Comfortably Numb 2022, versão atualizada e mais soturna (um tom abaixo da original) da música que tinha a voz e a guitarra de David Gilmour (desafeto de Waters) como assinaturas.

No início do show, Roger Waters usou um jaleco branco e entrou com um "paciente" Foto: Pedro Kirilos
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Na sequência, em The Happiest Days of Our Lives, ele mostrou que ainda consegue se esgoelar afinadamente nos trechos mais dementes do rock. Em Money, pegou o contrabaixo palhetando com vigor, os braços ainda musculosos como nos anos 1970. E deixou muito celular no Engenhão embebido em lágrimas com uma emocionante versão de Wish You Were, tributo ao amigo e cofundador da banda Syd Barrett, mártir do rock psicodélico.

Outros shows de Roger Waters no Brasil em 2023

A quinta passagem de Waters pelo Brasil prevê cerca de vinte dias no país, com uma sequência de sete shows, iniciada no dia 24 de outubro, na Arena Mané Garrincha, em Brasília, e com encerramento previsto após duas datas no Allianz Parque, em São Paulo, nos dias 11 e 12 de novembro (antes passa também por Porto Alegre, na próxima quarta-feira, dia 1º de novembro; Curitiba, dia 4, e Belo Horizonte, no dia 8).

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Antes do show, o aviso de Waters sobre o teor politizado do show recebeu uma tradução mais carioca, menos polida do que a exibida em Brasília, porém ainda longe do “fuck off” original: “Se você é um daqueles que diz: Eu amo o Pink Floyd, mas não suporto a política do Roger’, vaza pro bar!”

Fato é que a maioria do público vibrou quando o artista revelou um pouco de sua agenda política na estadia. Na véspera, recebeu uma medalha na Câmara de Vereadores do Rio, numa homenagem a Marielle Franco (citada em um dos vídeos do telão do show, em meio a outros ativistas assassinados) “Estive com o seu presidente Lula. Que cara adorável”, disse Waters, antes de repetir a segunda frase, mais enfaticamente, puxando uma resposta mais vibrante.

No show do Rio, Roger Waters tocou uma música que o Pink Floyd nunca tocou ao vivo Foto: Pedro Kirilos/Estadão
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O Engenhão também o brindou com um coro de “olê, olê, olê, olê, Ró-gêr, Ró-gêr”, em inusitada adaptação tônica do público. Sem medo de resvalar na pieguice, na parte final do show, Waters anunciou a presença de Kamilah Chavis, com quem se casou em 2021. Ela é citada antes de apresentar o segundo trecho de sua recente composição, The Bar, uma das novidades do repertório da turnê, ela é a “senhora de olhos tristes” - expressão que Roger confessa ter “roubado” da famosa canção de Bob Dylan, Sad Eyed Lady From The Lowlands. “Seus olhos ficam tristes porque ela tem um coração muito grande, muita empatia”, explicou.

Em seguida, lembrou o irmão mais velho, John D Waters. “Ele morreu no ano passado. Esta canção é sobre o tempo em que nós éramos desse tamanho - ele, assim; eu, assim”, contou, gesticulando.

No Rio, Roger Waters disse que se sentia em casa Foto: Pedro Kirilos
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Depois, ao piano, com a voz grave, com um quê de Leonard Cohen (mais declamada do que cantada em alguns trechos), entoou a letra que fala sobre uma reminiscência familiar: o pai, com John no colo, fumando e soprando círculos de fumaça em sua direção. “Mais fogo, papai/ Eu fui misericordiosamente poupado/ das memórias que eles dividiram/ porque eu tinha apenas cinco meses quando meu velho pai morreu”.

O pai do músico, Eric Fletcher Waters, foi segundo-tenente do exército inglês e morreu na Itália, em 1944, na Segunda Guerra. Ter perdido o pai na Segunda Guerra, combatendo o nazi fascismo, é fator crucial na obra de Roger Waters e também no seu ideário. The Final Cut, álbum de 1982 (o derradeiro de Roger com a banda) é dedicado a ele.

E veio do repertório deste álbum a melhor surpresa musical do roteiro de This Is Not a Drill, Two Suns in The Sunset, faixa que o Pink Floyd nunca chegou a tocar ao vivo. A letra, que narra o começo de uma Terceira Guerra Mundial, traz uma lição humanista com o melhor de Waters: “Somos todos iguais no final”.

Parafraseando a famosa frase do americano James Carville, estrategista da equipe de Bill Clinton na campanha presidencial americana de 1992: “É a política, estúpido!”. O espetáculo This Is Not A Drill, apresentado no Rio pelo inglês Roger Waters, 80 anos, ex-Pink Floyd, em sua turnê global de despedida, é provavelmente o mais panfletário de sua carreira. Os vídeos do telão disparam mensagens o tempo todo, com mão pesada e quase sem refresco. Até o porco voador gigante traz palavras de ordem.

Waters define o espetáculo como “uma extravaganza cinematógráfica rock’n’roll” que junta “uma acusação impressionante da distopia corporativa na qual todos nós lutamos para sobreviver e uma ação para amar, proteger e compartilhar nosso precioso e precário lar planetário”. Mas, para além do discurso inflamado e do brilhante lado musical de sua antiga banda, o show revela a humanidade de seu protagonista. Isso se viu nitidamente neste sábado, 28, no Estádio Nílton Santos, no Rio de Janeiro.

“Eu poderia ficar aqui afogado no amor de vocês até o fim dos meus dias. (...) Não é provável que eu volte (...) Mas, por Deus, estou adorando!”, exclamou Waters, bastante comovido, perto do fim da apresentação que durou cerca de 2h10, fora os 20 minutos de intervalo.

Roger Waters está no Brasil com a turnê This is not a Drill; músico se apresentou no Rio neste sábado, 28 Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Fãs anônimos e ilustres como Milton Nascimento puderam ver Roger Waters ensaiar passinhos descontraídos de disco music (no megahit Another Brick in The Wall part two), mostrando vitalidade, e se rasgar em manifestações de afeto de maneira aparentemente sincera. Ao fim de Brain Damage, ele ouviu gritos de “eu te amo” e agradeceu: “Eu me sinto em casa aqui no Brasil”.

Músicas tocadas por Roger Waters

Houve quem sentisse falta de Time e reclamasse da versão tocada de Shine On You Crazy Diamond, mas não faltaram clássicos impactantes desde o princípio.

Waters entrou de jaleco, carregando um “paciente” na cadeira de rodas, e mandou de cara Comfortably Numb 2022, versão atualizada e mais soturna (um tom abaixo da original) da música que tinha a voz e a guitarra de David Gilmour (desafeto de Waters) como assinaturas.

No início do show, Roger Waters usou um jaleco branco e entrou com um "paciente" Foto: Pedro Kirilos

Na sequência, em The Happiest Days of Our Lives, ele mostrou que ainda consegue se esgoelar afinadamente nos trechos mais dementes do rock. Em Money, pegou o contrabaixo palhetando com vigor, os braços ainda musculosos como nos anos 1970. E deixou muito celular no Engenhão embebido em lágrimas com uma emocionante versão de Wish You Were, tributo ao amigo e cofundador da banda Syd Barrett, mártir do rock psicodélico.

Outros shows de Roger Waters no Brasil em 2023

A quinta passagem de Waters pelo Brasil prevê cerca de vinte dias no país, com uma sequência de sete shows, iniciada no dia 24 de outubro, na Arena Mané Garrincha, em Brasília, e com encerramento previsto após duas datas no Allianz Parque, em São Paulo, nos dias 11 e 12 de novembro (antes passa também por Porto Alegre, na próxima quarta-feira, dia 1º de novembro; Curitiba, dia 4, e Belo Horizonte, no dia 8).

Antes do show, o aviso de Waters sobre o teor politizado do show recebeu uma tradução mais carioca, menos polida do que a exibida em Brasília, porém ainda longe do “fuck off” original: “Se você é um daqueles que diz: Eu amo o Pink Floyd, mas não suporto a política do Roger’, vaza pro bar!”

Fato é que a maioria do público vibrou quando o artista revelou um pouco de sua agenda política na estadia. Na véspera, recebeu uma medalha na Câmara de Vereadores do Rio, numa homenagem a Marielle Franco (citada em um dos vídeos do telão do show, em meio a outros ativistas assassinados) “Estive com o seu presidente Lula. Que cara adorável”, disse Waters, antes de repetir a segunda frase, mais enfaticamente, puxando uma resposta mais vibrante.

No show do Rio, Roger Waters tocou uma música que o Pink Floyd nunca tocou ao vivo Foto: Pedro Kirilos/Estadão

O Engenhão também o brindou com um coro de “olê, olê, olê, olê, Ró-gêr, Ró-gêr”, em inusitada adaptação tônica do público. Sem medo de resvalar na pieguice, na parte final do show, Waters anunciou a presença de Kamilah Chavis, com quem se casou em 2021. Ela é citada antes de apresentar o segundo trecho de sua recente composição, The Bar, uma das novidades do repertório da turnê, ela é a “senhora de olhos tristes” - expressão que Roger confessa ter “roubado” da famosa canção de Bob Dylan, Sad Eyed Lady From The Lowlands. “Seus olhos ficam tristes porque ela tem um coração muito grande, muita empatia”, explicou.

Em seguida, lembrou o irmão mais velho, John D Waters. “Ele morreu no ano passado. Esta canção é sobre o tempo em que nós éramos desse tamanho - ele, assim; eu, assim”, contou, gesticulando.

No Rio, Roger Waters disse que se sentia em casa Foto: Pedro Kirilos

Depois, ao piano, com a voz grave, com um quê de Leonard Cohen (mais declamada do que cantada em alguns trechos), entoou a letra que fala sobre uma reminiscência familiar: o pai, com John no colo, fumando e soprando círculos de fumaça em sua direção. “Mais fogo, papai/ Eu fui misericordiosamente poupado/ das memórias que eles dividiram/ porque eu tinha apenas cinco meses quando meu velho pai morreu”.

O pai do músico, Eric Fletcher Waters, foi segundo-tenente do exército inglês e morreu na Itália, em 1944, na Segunda Guerra. Ter perdido o pai na Segunda Guerra, combatendo o nazi fascismo, é fator crucial na obra de Roger Waters e também no seu ideário. The Final Cut, álbum de 1982 (o derradeiro de Roger com a banda) é dedicado a ele.

E veio do repertório deste álbum a melhor surpresa musical do roteiro de This Is Not a Drill, Two Suns in The Sunset, faixa que o Pink Floyd nunca chegou a tocar ao vivo. A letra, que narra o começo de uma Terceira Guerra Mundial, traz uma lição humanista com o melhor de Waters: “Somos todos iguais no final”.

Parafraseando a famosa frase do americano James Carville, estrategista da equipe de Bill Clinton na campanha presidencial americana de 1992: “É a política, estúpido!”. O espetáculo This Is Not A Drill, apresentado no Rio pelo inglês Roger Waters, 80 anos, ex-Pink Floyd, em sua turnê global de despedida, é provavelmente o mais panfletário de sua carreira. Os vídeos do telão disparam mensagens o tempo todo, com mão pesada e quase sem refresco. Até o porco voador gigante traz palavras de ordem.

Waters define o espetáculo como “uma extravaganza cinematógráfica rock’n’roll” que junta “uma acusação impressionante da distopia corporativa na qual todos nós lutamos para sobreviver e uma ação para amar, proteger e compartilhar nosso precioso e precário lar planetário”. Mas, para além do discurso inflamado e do brilhante lado musical de sua antiga banda, o show revela a humanidade de seu protagonista. Isso se viu nitidamente neste sábado, 28, no Estádio Nílton Santos, no Rio de Janeiro.

“Eu poderia ficar aqui afogado no amor de vocês até o fim dos meus dias. (...) Não é provável que eu volte (...) Mas, por Deus, estou adorando!”, exclamou Waters, bastante comovido, perto do fim da apresentação que durou cerca de 2h10, fora os 20 minutos de intervalo.

Roger Waters está no Brasil com a turnê This is not a Drill; músico se apresentou no Rio neste sábado, 28 Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Fãs anônimos e ilustres como Milton Nascimento puderam ver Roger Waters ensaiar passinhos descontraídos de disco music (no megahit Another Brick in The Wall part two), mostrando vitalidade, e se rasgar em manifestações de afeto de maneira aparentemente sincera. Ao fim de Brain Damage, ele ouviu gritos de “eu te amo” e agradeceu: “Eu me sinto em casa aqui no Brasil”.

Músicas tocadas por Roger Waters

Houve quem sentisse falta de Time e reclamasse da versão tocada de Shine On You Crazy Diamond, mas não faltaram clássicos impactantes desde o princípio.

Waters entrou de jaleco, carregando um “paciente” na cadeira de rodas, e mandou de cara Comfortably Numb 2022, versão atualizada e mais soturna (um tom abaixo da original) da música que tinha a voz e a guitarra de David Gilmour (desafeto de Waters) como assinaturas.

No início do show, Roger Waters usou um jaleco branco e entrou com um "paciente" Foto: Pedro Kirilos

Na sequência, em The Happiest Days of Our Lives, ele mostrou que ainda consegue se esgoelar afinadamente nos trechos mais dementes do rock. Em Money, pegou o contrabaixo palhetando com vigor, os braços ainda musculosos como nos anos 1970. E deixou muito celular no Engenhão embebido em lágrimas com uma emocionante versão de Wish You Were, tributo ao amigo e cofundador da banda Syd Barrett, mártir do rock psicodélico.

Outros shows de Roger Waters no Brasil em 2023

A quinta passagem de Waters pelo Brasil prevê cerca de vinte dias no país, com uma sequência de sete shows, iniciada no dia 24 de outubro, na Arena Mané Garrincha, em Brasília, e com encerramento previsto após duas datas no Allianz Parque, em São Paulo, nos dias 11 e 12 de novembro (antes passa também por Porto Alegre, na próxima quarta-feira, dia 1º de novembro; Curitiba, dia 4, e Belo Horizonte, no dia 8).

Antes do show, o aviso de Waters sobre o teor politizado do show recebeu uma tradução mais carioca, menos polida do que a exibida em Brasília, porém ainda longe do “fuck off” original: “Se você é um daqueles que diz: Eu amo o Pink Floyd, mas não suporto a política do Roger’, vaza pro bar!”

Fato é que a maioria do público vibrou quando o artista revelou um pouco de sua agenda política na estadia. Na véspera, recebeu uma medalha na Câmara de Vereadores do Rio, numa homenagem a Marielle Franco (citada em um dos vídeos do telão do show, em meio a outros ativistas assassinados) “Estive com o seu presidente Lula. Que cara adorável”, disse Waters, antes de repetir a segunda frase, mais enfaticamente, puxando uma resposta mais vibrante.

No show do Rio, Roger Waters tocou uma música que o Pink Floyd nunca tocou ao vivo Foto: Pedro Kirilos/Estadão

O Engenhão também o brindou com um coro de “olê, olê, olê, olê, Ró-gêr, Ró-gêr”, em inusitada adaptação tônica do público. Sem medo de resvalar na pieguice, na parte final do show, Waters anunciou a presença de Kamilah Chavis, com quem se casou em 2021. Ela é citada antes de apresentar o segundo trecho de sua recente composição, The Bar, uma das novidades do repertório da turnê, ela é a “senhora de olhos tristes” - expressão que Roger confessa ter “roubado” da famosa canção de Bob Dylan, Sad Eyed Lady From The Lowlands. “Seus olhos ficam tristes porque ela tem um coração muito grande, muita empatia”, explicou.

Em seguida, lembrou o irmão mais velho, John D Waters. “Ele morreu no ano passado. Esta canção é sobre o tempo em que nós éramos desse tamanho - ele, assim; eu, assim”, contou, gesticulando.

No Rio, Roger Waters disse que se sentia em casa Foto: Pedro Kirilos

Depois, ao piano, com a voz grave, com um quê de Leonard Cohen (mais declamada do que cantada em alguns trechos), entoou a letra que fala sobre uma reminiscência familiar: o pai, com John no colo, fumando e soprando círculos de fumaça em sua direção. “Mais fogo, papai/ Eu fui misericordiosamente poupado/ das memórias que eles dividiram/ porque eu tinha apenas cinco meses quando meu velho pai morreu”.

O pai do músico, Eric Fletcher Waters, foi segundo-tenente do exército inglês e morreu na Itália, em 1944, na Segunda Guerra. Ter perdido o pai na Segunda Guerra, combatendo o nazi fascismo, é fator crucial na obra de Roger Waters e também no seu ideário. The Final Cut, álbum de 1982 (o derradeiro de Roger com a banda) é dedicado a ele.

E veio do repertório deste álbum a melhor surpresa musical do roteiro de This Is Not a Drill, Two Suns in The Sunset, faixa que o Pink Floyd nunca chegou a tocar ao vivo. A letra, que narra o começo de uma Terceira Guerra Mundial, traz uma lição humanista com o melhor de Waters: “Somos todos iguais no final”.

Parafraseando a famosa frase do americano James Carville, estrategista da equipe de Bill Clinton na campanha presidencial americana de 1992: “É a política, estúpido!”. O espetáculo This Is Not A Drill, apresentado no Rio pelo inglês Roger Waters, 80 anos, ex-Pink Floyd, em sua turnê global de despedida, é provavelmente o mais panfletário de sua carreira. Os vídeos do telão disparam mensagens o tempo todo, com mão pesada e quase sem refresco. Até o porco voador gigante traz palavras de ordem.

Waters define o espetáculo como “uma extravaganza cinematógráfica rock’n’roll” que junta “uma acusação impressionante da distopia corporativa na qual todos nós lutamos para sobreviver e uma ação para amar, proteger e compartilhar nosso precioso e precário lar planetário”. Mas, para além do discurso inflamado e do brilhante lado musical de sua antiga banda, o show revela a humanidade de seu protagonista. Isso se viu nitidamente neste sábado, 28, no Estádio Nílton Santos, no Rio de Janeiro.

“Eu poderia ficar aqui afogado no amor de vocês até o fim dos meus dias. (...) Não é provável que eu volte (...) Mas, por Deus, estou adorando!”, exclamou Waters, bastante comovido, perto do fim da apresentação que durou cerca de 2h10, fora os 20 minutos de intervalo.

Roger Waters está no Brasil com a turnê This is not a Drill; músico se apresentou no Rio neste sábado, 28 Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Fãs anônimos e ilustres como Milton Nascimento puderam ver Roger Waters ensaiar passinhos descontraídos de disco music (no megahit Another Brick in The Wall part two), mostrando vitalidade, e se rasgar em manifestações de afeto de maneira aparentemente sincera. Ao fim de Brain Damage, ele ouviu gritos de “eu te amo” e agradeceu: “Eu me sinto em casa aqui no Brasil”.

Músicas tocadas por Roger Waters

Houve quem sentisse falta de Time e reclamasse da versão tocada de Shine On You Crazy Diamond, mas não faltaram clássicos impactantes desde o princípio.

Waters entrou de jaleco, carregando um “paciente” na cadeira de rodas, e mandou de cara Comfortably Numb 2022, versão atualizada e mais soturna (um tom abaixo da original) da música que tinha a voz e a guitarra de David Gilmour (desafeto de Waters) como assinaturas.

No início do show, Roger Waters usou um jaleco branco e entrou com um "paciente" Foto: Pedro Kirilos

Na sequência, em The Happiest Days of Our Lives, ele mostrou que ainda consegue se esgoelar afinadamente nos trechos mais dementes do rock. Em Money, pegou o contrabaixo palhetando com vigor, os braços ainda musculosos como nos anos 1970. E deixou muito celular no Engenhão embebido em lágrimas com uma emocionante versão de Wish You Were, tributo ao amigo e cofundador da banda Syd Barrett, mártir do rock psicodélico.

Outros shows de Roger Waters no Brasil em 2023

A quinta passagem de Waters pelo Brasil prevê cerca de vinte dias no país, com uma sequência de sete shows, iniciada no dia 24 de outubro, na Arena Mané Garrincha, em Brasília, e com encerramento previsto após duas datas no Allianz Parque, em São Paulo, nos dias 11 e 12 de novembro (antes passa também por Porto Alegre, na próxima quarta-feira, dia 1º de novembro; Curitiba, dia 4, e Belo Horizonte, no dia 8).

Antes do show, o aviso de Waters sobre o teor politizado do show recebeu uma tradução mais carioca, menos polida do que a exibida em Brasília, porém ainda longe do “fuck off” original: “Se você é um daqueles que diz: Eu amo o Pink Floyd, mas não suporto a política do Roger’, vaza pro bar!”

Fato é que a maioria do público vibrou quando o artista revelou um pouco de sua agenda política na estadia. Na véspera, recebeu uma medalha na Câmara de Vereadores do Rio, numa homenagem a Marielle Franco (citada em um dos vídeos do telão do show, em meio a outros ativistas assassinados) “Estive com o seu presidente Lula. Que cara adorável”, disse Waters, antes de repetir a segunda frase, mais enfaticamente, puxando uma resposta mais vibrante.

No show do Rio, Roger Waters tocou uma música que o Pink Floyd nunca tocou ao vivo Foto: Pedro Kirilos/Estadão

O Engenhão também o brindou com um coro de “olê, olê, olê, olê, Ró-gêr, Ró-gêr”, em inusitada adaptação tônica do público. Sem medo de resvalar na pieguice, na parte final do show, Waters anunciou a presença de Kamilah Chavis, com quem se casou em 2021. Ela é citada antes de apresentar o segundo trecho de sua recente composição, The Bar, uma das novidades do repertório da turnê, ela é a “senhora de olhos tristes” - expressão que Roger confessa ter “roubado” da famosa canção de Bob Dylan, Sad Eyed Lady From The Lowlands. “Seus olhos ficam tristes porque ela tem um coração muito grande, muita empatia”, explicou.

Em seguida, lembrou o irmão mais velho, John D Waters. “Ele morreu no ano passado. Esta canção é sobre o tempo em que nós éramos desse tamanho - ele, assim; eu, assim”, contou, gesticulando.

No Rio, Roger Waters disse que se sentia em casa Foto: Pedro Kirilos

Depois, ao piano, com a voz grave, com um quê de Leonard Cohen (mais declamada do que cantada em alguns trechos), entoou a letra que fala sobre uma reminiscência familiar: o pai, com John no colo, fumando e soprando círculos de fumaça em sua direção. “Mais fogo, papai/ Eu fui misericordiosamente poupado/ das memórias que eles dividiram/ porque eu tinha apenas cinco meses quando meu velho pai morreu”.

O pai do músico, Eric Fletcher Waters, foi segundo-tenente do exército inglês e morreu na Itália, em 1944, na Segunda Guerra. Ter perdido o pai na Segunda Guerra, combatendo o nazi fascismo, é fator crucial na obra de Roger Waters e também no seu ideário. The Final Cut, álbum de 1982 (o derradeiro de Roger com a banda) é dedicado a ele.

E veio do repertório deste álbum a melhor surpresa musical do roteiro de This Is Not a Drill, Two Suns in The Sunset, faixa que o Pink Floyd nunca chegou a tocar ao vivo. A letra, que narra o começo de uma Terceira Guerra Mundial, traz uma lição humanista com o melhor de Waters: “Somos todos iguais no final”.

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