Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal


Diretor do teatro no início dos anos 2000, regente comanda 'Cavalleria Rusticana' e 'Pagliacci'

Por João Luiz Sampaio

Ira Levin abre a porta de seu camarim no Teatro Municipal com um sorriso no rosto e uma expressão relaxada que nada tem a ver com aquela de dez anos atrás. Foi quando o maestro americano esteve pela última vez naqueles corredores: no final de 2004, regeu uma produção de Lohengrin, de Wagner - e pouco depois, com a troca de gestão na Prefeitura, seria demitido do posto de diretor musical. "É uma sensação engraçada. Sou uma pessoa totalmente diferente, mas algumas coisas parecem as mesmas: estou hospedado em um hotel a um quarteirão de meu antigo apartamento", brinca.

Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão
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À frente do Municipal, Levin foi responsável pelo crescimento dos corpos estáveis da casa, assim como pela diversificação do repertório do teatro. Agora, está de volta para reger, a partir de amanhã, as óperas

Cavalleria Rusticana

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e

Pagliacci

. "Não gasto muito tempo pensando no que aconteceu, mas, sim, vivi alguns momentos desagradáveis aqui, por conta de questões políticas. Este, porém, tem sido um retorno feliz. Investi quatro anos de minha vida no Municipal. E é bom vê-lo funcionando, perceber que, com apoio, o maestro John Neschling tem realizado algumas reformas importantes."

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Alguns anos depois de deixar o Municipal, Levin assumiu a Sinfônica Nacional, de Brasília, onde ficou até 2010, quando se mudou de volta para a Alemanha. Em 2013, após duas temporadas como maestro convidado no Teatro Colón, de Buenos Aires, foi chamado a assumir o posto de regente convidado principal. "De certa forma, a experiência em São Paulo me ajudou na Argentina", ele diz ao

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Estado

. "Quando cheguei aqui, ninguém me explicou como as coisas funcionavam, quais eram os problemas. Apenas me diziam: resolva! Agora, em Buenos Aires, sei melhor como lidar com questões estruturais delicadas, com questões políticas. E o Colón é um teatro magnífico, pensar em todos os artistas que já passaram por lá é algo muito especial", completa. "Eu gosto muito de trabalhar na América Latina. Quando as coisas funcionam, funcionam mesmo, de verdade, e a resposta humana é incrível. Não tenho sangue latino, mas meu temperamento é um pouco esse."

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Talvez por isso, ele diz estar contente por fazer seu retorno a São Paulo justamente com

Cavalleria

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, de Mascagni, e

Pagliacci

, de Leoncavallo, "duas obras de alta voltagem emocional". Separadas por cerca de dois anos (estrearam em 1890 e 1892), elas fazem parte do movimento verista que, em linhas gerais, propôs levar ao palco histórias de corte mais realista. Ambas giram em torno de um caso de traição - e têm desfechos trágicos. Ainda assim, há algumas diferenças. "Pagliacci talvez tenha uma riqueza maior de coloridos na partitura, assim como um libreto com mais camadas, preocupado com uma caracterização mais complexa das personagens", diz Levin.

O maestro, no entanto, não descarta

Cavalleria

como uma ópera menor. "Eu sempre preferi

Pagliacci

, até agora, até trabalhar intensamente com a

Cavalleria

. Se você presta atenção e leva a sério a partitura de Mascagni, descobre que ela é mais do que apenas um veículo para emoções exacerbadas. Há muitas sutilezas na escrita. Aquilo que pode soar como lugar comum, na verdade, não é." Para Levin, é tudo uma questão de postura. "Este período é fascinante, mas ele carrega um risco, assim como algumas óperas de Puccini. Se você não toma cuidado, elas podem soar vulgares, baratas. É por isso que é importante prestar atenção nas cores da partitura, nas linhas de canto. Veja a abertura da

Cavalleria

, com o coro: ela se transforma se você se preocupa com a delicadeza do canto, se faz a orquestra ouvir os cantores. Se feita assim, essa música se transforma."

Nos últimos tempos, Levin, que também é pianista, tem se dedicado a outra de suas grandes paixões: o trabalho de transcrições de peças. Em 2007, lançou um disco no Brasil, com versões para piano de peças orquestrais, que venceu o Prêmio Bravo de melhor do ano na categoria erudita. E, agora, tem feito o caminho inverso. Na próxima semana, por exemplo, a Sinfônica de Helsinque faz, com o maestro Leif Segerstam, a estreia da sinfonia que ele construiu a partir do quinteto do compositor Cesar Franck. "É um trabalho que faço para mim, não porque alguém me pediu, mas porque essa é minha loucura", brinca. "Depois de mais de duas mil apresentações, posso dizer que sou essencialmente um intérprete, mas gosto de saber que estou deixando algo mais, algo meu, além da minha interpretação para a obra dos outros."

William Pereira dirige novo Pagliacci
Dirigida por Pier Francesco Maestrini, a montagem de Cavalleria Rusticana, que sobe ao palco do Municipal amanhã, foi apresentada no ano passado ao lado de Jupyra, de Francisco Braga. Desta vez, porém, vai se juntar a Pagliacci, ópera de Leoncavallo, que terá direção de William Pereira. 
São dois diretores muito diferentes. Maestrini, na Cavalleria, aposta em tons naturalistas. O trabalho de Pereira com ópera, no entanto, tem como tônica uma tentativa de atualização das tramas, rechaçando qualquer aproximação de tons realistas.
“Quando me convidaram para fazer Pagliacci, essa dualidade me veio logo à mente”, diz Pereira. “A produção da Cavalleria é linda, mas não tem nada a ver com o meu trabalho. Como, então, usando elementos cênicos já presentes na Cavalleria, eu poderia construir a minha interpretação? Entrou aí o trabalho do cenógrafo Juan Guillermo Nova, que poluiu, desconstruiu o cenário original, abrindo espaço para a minha visão.”
E que visão seria essa? Leoncavallo escreveu Pagliacci a partir de uma história real, acontecida 20 anos antes. “E eu fiz o mesmo, ambientando minha montagem no final do século 20. Para mim, o foco da história está na violência cotidiana.”
Nas duas óperas, além da Sinfônica Municipal e do Coral Lírico, reveza-se um elenco formado por cantores como Inva Mula, Marina Considera, Elena Lo Forte, Giancarlo Monsalve, Walter Fraccaro, Richard Bauer e Guilherme Rosa, entre outros. 
CAVALLERIA RUSTICANA 
E PAGLIACCI
Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, 3053-2090. Dias 18, 21, 23, 25, 28 e 29, às 20 h; dias 19 e 26, às 18 h. R$ 40/R$ 100.

Ira Levin abre a porta de seu camarim no Teatro Municipal com um sorriso no rosto e uma expressão relaxada que nada tem a ver com aquela de dez anos atrás. Foi quando o maestro americano esteve pela última vez naqueles corredores: no final de 2004, regeu uma produção de Lohengrin, de Wagner - e pouco depois, com a troca de gestão na Prefeitura, seria demitido do posto de diretor musical. "É uma sensação engraçada. Sou uma pessoa totalmente diferente, mas algumas coisas parecem as mesmas: estou hospedado em um hotel a um quarteirão de meu antigo apartamento", brinca.

Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão

À frente do Municipal, Levin foi responsável pelo crescimento dos corpos estáveis da casa, assim como pela diversificação do repertório do teatro. Agora, está de volta para reger, a partir de amanhã, as óperas

Cavalleria Rusticana

e

Pagliacci

. "Não gasto muito tempo pensando no que aconteceu, mas, sim, vivi alguns momentos desagradáveis aqui, por conta de questões políticas. Este, porém, tem sido um retorno feliz. Investi quatro anos de minha vida no Municipal. E é bom vê-lo funcionando, perceber que, com apoio, o maestro John Neschling tem realizado algumas reformas importantes."

Alguns anos depois de deixar o Municipal, Levin assumiu a Sinfônica Nacional, de Brasília, onde ficou até 2010, quando se mudou de volta para a Alemanha. Em 2013, após duas temporadas como maestro convidado no Teatro Colón, de Buenos Aires, foi chamado a assumir o posto de regente convidado principal. "De certa forma, a experiência em São Paulo me ajudou na Argentina", ele diz ao

Estado

. "Quando cheguei aqui, ninguém me explicou como as coisas funcionavam, quais eram os problemas. Apenas me diziam: resolva! Agora, em Buenos Aires, sei melhor como lidar com questões estruturais delicadas, com questões políticas. E o Colón é um teatro magnífico, pensar em todos os artistas que já passaram por lá é algo muito especial", completa. "Eu gosto muito de trabalhar na América Latina. Quando as coisas funcionam, funcionam mesmo, de verdade, e a resposta humana é incrível. Não tenho sangue latino, mas meu temperamento é um pouco esse."

Talvez por isso, ele diz estar contente por fazer seu retorno a São Paulo justamente com

Cavalleria

, de Mascagni, e

Pagliacci

, de Leoncavallo, "duas obras de alta voltagem emocional". Separadas por cerca de dois anos (estrearam em 1890 e 1892), elas fazem parte do movimento verista que, em linhas gerais, propôs levar ao palco histórias de corte mais realista. Ambas giram em torno de um caso de traição - e têm desfechos trágicos. Ainda assim, há algumas diferenças. "Pagliacci talvez tenha uma riqueza maior de coloridos na partitura, assim como um libreto com mais camadas, preocupado com uma caracterização mais complexa das personagens", diz Levin.

O maestro, no entanto, não descarta

Cavalleria

como uma ópera menor. "Eu sempre preferi

Pagliacci

, até agora, até trabalhar intensamente com a

Cavalleria

. Se você presta atenção e leva a sério a partitura de Mascagni, descobre que ela é mais do que apenas um veículo para emoções exacerbadas. Há muitas sutilezas na escrita. Aquilo que pode soar como lugar comum, na verdade, não é." Para Levin, é tudo uma questão de postura. "Este período é fascinante, mas ele carrega um risco, assim como algumas óperas de Puccini. Se você não toma cuidado, elas podem soar vulgares, baratas. É por isso que é importante prestar atenção nas cores da partitura, nas linhas de canto. Veja a abertura da

Cavalleria

, com o coro: ela se transforma se você se preocupa com a delicadeza do canto, se faz a orquestra ouvir os cantores. Se feita assim, essa música se transforma."

Nos últimos tempos, Levin, que também é pianista, tem se dedicado a outra de suas grandes paixões: o trabalho de transcrições de peças. Em 2007, lançou um disco no Brasil, com versões para piano de peças orquestrais, que venceu o Prêmio Bravo de melhor do ano na categoria erudita. E, agora, tem feito o caminho inverso. Na próxima semana, por exemplo, a Sinfônica de Helsinque faz, com o maestro Leif Segerstam, a estreia da sinfonia que ele construiu a partir do quinteto do compositor Cesar Franck. "É um trabalho que faço para mim, não porque alguém me pediu, mas porque essa é minha loucura", brinca. "Depois de mais de duas mil apresentações, posso dizer que sou essencialmente um intérprete, mas gosto de saber que estou deixando algo mais, algo meu, além da minha interpretação para a obra dos outros."

William Pereira dirige novo Pagliacci
Dirigida por Pier Francesco Maestrini, a montagem de Cavalleria Rusticana, que sobe ao palco do Municipal amanhã, foi apresentada no ano passado ao lado de Jupyra, de Francisco Braga. Desta vez, porém, vai se juntar a Pagliacci, ópera de Leoncavallo, que terá direção de William Pereira. 
São dois diretores muito diferentes. Maestrini, na Cavalleria, aposta em tons naturalistas. O trabalho de Pereira com ópera, no entanto, tem como tônica uma tentativa de atualização das tramas, rechaçando qualquer aproximação de tons realistas.
“Quando me convidaram para fazer Pagliacci, essa dualidade me veio logo à mente”, diz Pereira. “A produção da Cavalleria é linda, mas não tem nada a ver com o meu trabalho. Como, então, usando elementos cênicos já presentes na Cavalleria, eu poderia construir a minha interpretação? Entrou aí o trabalho do cenógrafo Juan Guillermo Nova, que poluiu, desconstruiu o cenário original, abrindo espaço para a minha visão.”
E que visão seria essa? Leoncavallo escreveu Pagliacci a partir de uma história real, acontecida 20 anos antes. “E eu fiz o mesmo, ambientando minha montagem no final do século 20. Para mim, o foco da história está na violência cotidiana.”
Nas duas óperas, além da Sinfônica Municipal e do Coral Lírico, reveza-se um elenco formado por cantores como Inva Mula, Marina Considera, Elena Lo Forte, Giancarlo Monsalve, Walter Fraccaro, Richard Bauer e Guilherme Rosa, entre outros. 
CAVALLERIA RUSTICANA 
E PAGLIACCI
Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, 3053-2090. Dias 18, 21, 23, 25, 28 e 29, às 20 h; dias 19 e 26, às 18 h. R$ 40/R$ 100.

Ira Levin abre a porta de seu camarim no Teatro Municipal com um sorriso no rosto e uma expressão relaxada que nada tem a ver com aquela de dez anos atrás. Foi quando o maestro americano esteve pela última vez naqueles corredores: no final de 2004, regeu uma produção de Lohengrin, de Wagner - e pouco depois, com a troca de gestão na Prefeitura, seria demitido do posto de diretor musical. "É uma sensação engraçada. Sou uma pessoa totalmente diferente, mas algumas coisas parecem as mesmas: estou hospedado em um hotel a um quarteirão de meu antigo apartamento", brinca.

Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão

À frente do Municipal, Levin foi responsável pelo crescimento dos corpos estáveis da casa, assim como pela diversificação do repertório do teatro. Agora, está de volta para reger, a partir de amanhã, as óperas

Cavalleria Rusticana

e

Pagliacci

. "Não gasto muito tempo pensando no que aconteceu, mas, sim, vivi alguns momentos desagradáveis aqui, por conta de questões políticas. Este, porém, tem sido um retorno feliz. Investi quatro anos de minha vida no Municipal. E é bom vê-lo funcionando, perceber que, com apoio, o maestro John Neschling tem realizado algumas reformas importantes."

Alguns anos depois de deixar o Municipal, Levin assumiu a Sinfônica Nacional, de Brasília, onde ficou até 2010, quando se mudou de volta para a Alemanha. Em 2013, após duas temporadas como maestro convidado no Teatro Colón, de Buenos Aires, foi chamado a assumir o posto de regente convidado principal. "De certa forma, a experiência em São Paulo me ajudou na Argentina", ele diz ao

Estado

. "Quando cheguei aqui, ninguém me explicou como as coisas funcionavam, quais eram os problemas. Apenas me diziam: resolva! Agora, em Buenos Aires, sei melhor como lidar com questões estruturais delicadas, com questões políticas. E o Colón é um teatro magnífico, pensar em todos os artistas que já passaram por lá é algo muito especial", completa. "Eu gosto muito de trabalhar na América Latina. Quando as coisas funcionam, funcionam mesmo, de verdade, e a resposta humana é incrível. Não tenho sangue latino, mas meu temperamento é um pouco esse."

Talvez por isso, ele diz estar contente por fazer seu retorno a São Paulo justamente com

Cavalleria

, de Mascagni, e

Pagliacci

, de Leoncavallo, "duas obras de alta voltagem emocional". Separadas por cerca de dois anos (estrearam em 1890 e 1892), elas fazem parte do movimento verista que, em linhas gerais, propôs levar ao palco histórias de corte mais realista. Ambas giram em torno de um caso de traição - e têm desfechos trágicos. Ainda assim, há algumas diferenças. "Pagliacci talvez tenha uma riqueza maior de coloridos na partitura, assim como um libreto com mais camadas, preocupado com uma caracterização mais complexa das personagens", diz Levin.

O maestro, no entanto, não descarta

Cavalleria

como uma ópera menor. "Eu sempre preferi

Pagliacci

, até agora, até trabalhar intensamente com a

Cavalleria

. Se você presta atenção e leva a sério a partitura de Mascagni, descobre que ela é mais do que apenas um veículo para emoções exacerbadas. Há muitas sutilezas na escrita. Aquilo que pode soar como lugar comum, na verdade, não é." Para Levin, é tudo uma questão de postura. "Este período é fascinante, mas ele carrega um risco, assim como algumas óperas de Puccini. Se você não toma cuidado, elas podem soar vulgares, baratas. É por isso que é importante prestar atenção nas cores da partitura, nas linhas de canto. Veja a abertura da

Cavalleria

, com o coro: ela se transforma se você se preocupa com a delicadeza do canto, se faz a orquestra ouvir os cantores. Se feita assim, essa música se transforma."

Nos últimos tempos, Levin, que também é pianista, tem se dedicado a outra de suas grandes paixões: o trabalho de transcrições de peças. Em 2007, lançou um disco no Brasil, com versões para piano de peças orquestrais, que venceu o Prêmio Bravo de melhor do ano na categoria erudita. E, agora, tem feito o caminho inverso. Na próxima semana, por exemplo, a Sinfônica de Helsinque faz, com o maestro Leif Segerstam, a estreia da sinfonia que ele construiu a partir do quinteto do compositor Cesar Franck. "É um trabalho que faço para mim, não porque alguém me pediu, mas porque essa é minha loucura", brinca. "Depois de mais de duas mil apresentações, posso dizer que sou essencialmente um intérprete, mas gosto de saber que estou deixando algo mais, algo meu, além da minha interpretação para a obra dos outros."

William Pereira dirige novo Pagliacci
Dirigida por Pier Francesco Maestrini, a montagem de Cavalleria Rusticana, que sobe ao palco do Municipal amanhã, foi apresentada no ano passado ao lado de Jupyra, de Francisco Braga. Desta vez, porém, vai se juntar a Pagliacci, ópera de Leoncavallo, que terá direção de William Pereira. 
São dois diretores muito diferentes. Maestrini, na Cavalleria, aposta em tons naturalistas. O trabalho de Pereira com ópera, no entanto, tem como tônica uma tentativa de atualização das tramas, rechaçando qualquer aproximação de tons realistas.
“Quando me convidaram para fazer Pagliacci, essa dualidade me veio logo à mente”, diz Pereira. “A produção da Cavalleria é linda, mas não tem nada a ver com o meu trabalho. Como, então, usando elementos cênicos já presentes na Cavalleria, eu poderia construir a minha interpretação? Entrou aí o trabalho do cenógrafo Juan Guillermo Nova, que poluiu, desconstruiu o cenário original, abrindo espaço para a minha visão.”
E que visão seria essa? Leoncavallo escreveu Pagliacci a partir de uma história real, acontecida 20 anos antes. “E eu fiz o mesmo, ambientando minha montagem no final do século 20. Para mim, o foco da história está na violência cotidiana.”
Nas duas óperas, além da Sinfônica Municipal e do Coral Lírico, reveza-se um elenco formado por cantores como Inva Mula, Marina Considera, Elena Lo Forte, Giancarlo Monsalve, Walter Fraccaro, Richard Bauer e Guilherme Rosa, entre outros. 
CAVALLERIA RUSTICANA 
E PAGLIACCI
Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, 3053-2090. Dias 18, 21, 23, 25, 28 e 29, às 20 h; dias 19 e 26, às 18 h. R$ 40/R$ 100.

Ira Levin abre a porta de seu camarim no Teatro Municipal com um sorriso no rosto e uma expressão relaxada que nada tem a ver com aquela de dez anos atrás. Foi quando o maestro americano esteve pela última vez naqueles corredores: no final de 2004, regeu uma produção de Lohengrin, de Wagner - e pouco depois, com a troca de gestão na Prefeitura, seria demitido do posto de diretor musical. "É uma sensação engraçada. Sou uma pessoa totalmente diferente, mas algumas coisas parecem as mesmas: estou hospedado em um hotel a um quarteirão de meu antigo apartamento", brinca.

Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão

À frente do Municipal, Levin foi responsável pelo crescimento dos corpos estáveis da casa, assim como pela diversificação do repertório do teatro. Agora, está de volta para reger, a partir de amanhã, as óperas

Cavalleria Rusticana

e

Pagliacci

. "Não gasto muito tempo pensando no que aconteceu, mas, sim, vivi alguns momentos desagradáveis aqui, por conta de questões políticas. Este, porém, tem sido um retorno feliz. Investi quatro anos de minha vida no Municipal. E é bom vê-lo funcionando, perceber que, com apoio, o maestro John Neschling tem realizado algumas reformas importantes."

Alguns anos depois de deixar o Municipal, Levin assumiu a Sinfônica Nacional, de Brasília, onde ficou até 2010, quando se mudou de volta para a Alemanha. Em 2013, após duas temporadas como maestro convidado no Teatro Colón, de Buenos Aires, foi chamado a assumir o posto de regente convidado principal. "De certa forma, a experiência em São Paulo me ajudou na Argentina", ele diz ao

Estado

. "Quando cheguei aqui, ninguém me explicou como as coisas funcionavam, quais eram os problemas. Apenas me diziam: resolva! Agora, em Buenos Aires, sei melhor como lidar com questões estruturais delicadas, com questões políticas. E o Colón é um teatro magnífico, pensar em todos os artistas que já passaram por lá é algo muito especial", completa. "Eu gosto muito de trabalhar na América Latina. Quando as coisas funcionam, funcionam mesmo, de verdade, e a resposta humana é incrível. Não tenho sangue latino, mas meu temperamento é um pouco esse."

Talvez por isso, ele diz estar contente por fazer seu retorno a São Paulo justamente com

Cavalleria

, de Mascagni, e

Pagliacci

, de Leoncavallo, "duas obras de alta voltagem emocional". Separadas por cerca de dois anos (estrearam em 1890 e 1892), elas fazem parte do movimento verista que, em linhas gerais, propôs levar ao palco histórias de corte mais realista. Ambas giram em torno de um caso de traição - e têm desfechos trágicos. Ainda assim, há algumas diferenças. "Pagliacci talvez tenha uma riqueza maior de coloridos na partitura, assim como um libreto com mais camadas, preocupado com uma caracterização mais complexa das personagens", diz Levin.

O maestro, no entanto, não descarta

Cavalleria

como uma ópera menor. "Eu sempre preferi

Pagliacci

, até agora, até trabalhar intensamente com a

Cavalleria

. Se você presta atenção e leva a sério a partitura de Mascagni, descobre que ela é mais do que apenas um veículo para emoções exacerbadas. Há muitas sutilezas na escrita. Aquilo que pode soar como lugar comum, na verdade, não é." Para Levin, é tudo uma questão de postura. "Este período é fascinante, mas ele carrega um risco, assim como algumas óperas de Puccini. Se você não toma cuidado, elas podem soar vulgares, baratas. É por isso que é importante prestar atenção nas cores da partitura, nas linhas de canto. Veja a abertura da

Cavalleria

, com o coro: ela se transforma se você se preocupa com a delicadeza do canto, se faz a orquestra ouvir os cantores. Se feita assim, essa música se transforma."

Nos últimos tempos, Levin, que também é pianista, tem se dedicado a outra de suas grandes paixões: o trabalho de transcrições de peças. Em 2007, lançou um disco no Brasil, com versões para piano de peças orquestrais, que venceu o Prêmio Bravo de melhor do ano na categoria erudita. E, agora, tem feito o caminho inverso. Na próxima semana, por exemplo, a Sinfônica de Helsinque faz, com o maestro Leif Segerstam, a estreia da sinfonia que ele construiu a partir do quinteto do compositor Cesar Franck. "É um trabalho que faço para mim, não porque alguém me pediu, mas porque essa é minha loucura", brinca. "Depois de mais de duas mil apresentações, posso dizer que sou essencialmente um intérprete, mas gosto de saber que estou deixando algo mais, algo meu, além da minha interpretação para a obra dos outros."

William Pereira dirige novo Pagliacci
Dirigida por Pier Francesco Maestrini, a montagem de Cavalleria Rusticana, que sobe ao palco do Municipal amanhã, foi apresentada no ano passado ao lado de Jupyra, de Francisco Braga. Desta vez, porém, vai se juntar a Pagliacci, ópera de Leoncavallo, que terá direção de William Pereira. 
São dois diretores muito diferentes. Maestrini, na Cavalleria, aposta em tons naturalistas. O trabalho de Pereira com ópera, no entanto, tem como tônica uma tentativa de atualização das tramas, rechaçando qualquer aproximação de tons realistas.
“Quando me convidaram para fazer Pagliacci, essa dualidade me veio logo à mente”, diz Pereira. “A produção da Cavalleria é linda, mas não tem nada a ver com o meu trabalho. Como, então, usando elementos cênicos já presentes na Cavalleria, eu poderia construir a minha interpretação? Entrou aí o trabalho do cenógrafo Juan Guillermo Nova, que poluiu, desconstruiu o cenário original, abrindo espaço para a minha visão.”
E que visão seria essa? Leoncavallo escreveu Pagliacci a partir de uma história real, acontecida 20 anos antes. “E eu fiz o mesmo, ambientando minha montagem no final do século 20. Para mim, o foco da história está na violência cotidiana.”
Nas duas óperas, além da Sinfônica Municipal e do Coral Lírico, reveza-se um elenco formado por cantores como Inva Mula, Marina Considera, Elena Lo Forte, Giancarlo Monsalve, Walter Fraccaro, Richard Bauer e Guilherme Rosa, entre outros. 
CAVALLERIA RUSTICANA 
E PAGLIACCI
Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, 3053-2090. Dias 18, 21, 23, 25, 28 e 29, às 20 h; dias 19 e 26, às 18 h. R$ 40/R$ 100.

Ira Levin abre a porta de seu camarim no Teatro Municipal com um sorriso no rosto e uma expressão relaxada que nada tem a ver com aquela de dez anos atrás. Foi quando o maestro americano esteve pela última vez naqueles corredores: no final de 2004, regeu uma produção de Lohengrin, de Wagner - e pouco depois, com a troca de gestão na Prefeitura, seria demitido do posto de diretor musical. "É uma sensação engraçada. Sou uma pessoa totalmente diferente, mas algumas coisas parecem as mesmas: estou hospedado em um hotel a um quarteirão de meu antigo apartamento", brinca.

Óperas levam o maestro Ira Levin de volta ao Teatro Municipal Foto: J.F.Diorio/ Estadão

À frente do Municipal, Levin foi responsável pelo crescimento dos corpos estáveis da casa, assim como pela diversificação do repertório do teatro. Agora, está de volta para reger, a partir de amanhã, as óperas

Cavalleria Rusticana

e

Pagliacci

. "Não gasto muito tempo pensando no que aconteceu, mas, sim, vivi alguns momentos desagradáveis aqui, por conta de questões políticas. Este, porém, tem sido um retorno feliz. Investi quatro anos de minha vida no Municipal. E é bom vê-lo funcionando, perceber que, com apoio, o maestro John Neschling tem realizado algumas reformas importantes."

Alguns anos depois de deixar o Municipal, Levin assumiu a Sinfônica Nacional, de Brasília, onde ficou até 2010, quando se mudou de volta para a Alemanha. Em 2013, após duas temporadas como maestro convidado no Teatro Colón, de Buenos Aires, foi chamado a assumir o posto de regente convidado principal. "De certa forma, a experiência em São Paulo me ajudou na Argentina", ele diz ao

Estado

. "Quando cheguei aqui, ninguém me explicou como as coisas funcionavam, quais eram os problemas. Apenas me diziam: resolva! Agora, em Buenos Aires, sei melhor como lidar com questões estruturais delicadas, com questões políticas. E o Colón é um teatro magnífico, pensar em todos os artistas que já passaram por lá é algo muito especial", completa. "Eu gosto muito de trabalhar na América Latina. Quando as coisas funcionam, funcionam mesmo, de verdade, e a resposta humana é incrível. Não tenho sangue latino, mas meu temperamento é um pouco esse."

Talvez por isso, ele diz estar contente por fazer seu retorno a São Paulo justamente com

Cavalleria

, de Mascagni, e

Pagliacci

, de Leoncavallo, "duas obras de alta voltagem emocional". Separadas por cerca de dois anos (estrearam em 1890 e 1892), elas fazem parte do movimento verista que, em linhas gerais, propôs levar ao palco histórias de corte mais realista. Ambas giram em torno de um caso de traição - e têm desfechos trágicos. Ainda assim, há algumas diferenças. "Pagliacci talvez tenha uma riqueza maior de coloridos na partitura, assim como um libreto com mais camadas, preocupado com uma caracterização mais complexa das personagens", diz Levin.

O maestro, no entanto, não descarta

Cavalleria

como uma ópera menor. "Eu sempre preferi

Pagliacci

, até agora, até trabalhar intensamente com a

Cavalleria

. Se você presta atenção e leva a sério a partitura de Mascagni, descobre que ela é mais do que apenas um veículo para emoções exacerbadas. Há muitas sutilezas na escrita. Aquilo que pode soar como lugar comum, na verdade, não é." Para Levin, é tudo uma questão de postura. "Este período é fascinante, mas ele carrega um risco, assim como algumas óperas de Puccini. Se você não toma cuidado, elas podem soar vulgares, baratas. É por isso que é importante prestar atenção nas cores da partitura, nas linhas de canto. Veja a abertura da

Cavalleria

, com o coro: ela se transforma se você se preocupa com a delicadeza do canto, se faz a orquestra ouvir os cantores. Se feita assim, essa música se transforma."

Nos últimos tempos, Levin, que também é pianista, tem se dedicado a outra de suas grandes paixões: o trabalho de transcrições de peças. Em 2007, lançou um disco no Brasil, com versões para piano de peças orquestrais, que venceu o Prêmio Bravo de melhor do ano na categoria erudita. E, agora, tem feito o caminho inverso. Na próxima semana, por exemplo, a Sinfônica de Helsinque faz, com o maestro Leif Segerstam, a estreia da sinfonia que ele construiu a partir do quinteto do compositor Cesar Franck. "É um trabalho que faço para mim, não porque alguém me pediu, mas porque essa é minha loucura", brinca. "Depois de mais de duas mil apresentações, posso dizer que sou essencialmente um intérprete, mas gosto de saber que estou deixando algo mais, algo meu, além da minha interpretação para a obra dos outros."

William Pereira dirige novo Pagliacci
Dirigida por Pier Francesco Maestrini, a montagem de Cavalleria Rusticana, que sobe ao palco do Municipal amanhã, foi apresentada no ano passado ao lado de Jupyra, de Francisco Braga. Desta vez, porém, vai se juntar a Pagliacci, ópera de Leoncavallo, que terá direção de William Pereira. 
São dois diretores muito diferentes. Maestrini, na Cavalleria, aposta em tons naturalistas. O trabalho de Pereira com ópera, no entanto, tem como tônica uma tentativa de atualização das tramas, rechaçando qualquer aproximação de tons realistas.
“Quando me convidaram para fazer Pagliacci, essa dualidade me veio logo à mente”, diz Pereira. “A produção da Cavalleria é linda, mas não tem nada a ver com o meu trabalho. Como, então, usando elementos cênicos já presentes na Cavalleria, eu poderia construir a minha interpretação? Entrou aí o trabalho do cenógrafo Juan Guillermo Nova, que poluiu, desconstruiu o cenário original, abrindo espaço para a minha visão.”
E que visão seria essa? Leoncavallo escreveu Pagliacci a partir de uma história real, acontecida 20 anos antes. “E eu fiz o mesmo, ambientando minha montagem no final do século 20. Para mim, o foco da história está na violência cotidiana.”
Nas duas óperas, além da Sinfônica Municipal e do Coral Lírico, reveza-se um elenco formado por cantores como Inva Mula, Marina Considera, Elena Lo Forte, Giancarlo Monsalve, Walter Fraccaro, Richard Bauer e Guilherme Rosa, entre outros. 
CAVALLERIA RUSTICANA 
E PAGLIACCI
Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, 3053-2090. Dias 18, 21, 23, 25, 28 e 29, às 20 h; dias 19 e 26, às 18 h. R$ 40/R$ 100.

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