Os Ramones estão quase todos mortos, os Sex Pistols ficaram gagás, o New York Dolls se arrasta por aí. Mas, ironicamente, apesar do nome, os Dead Kennedys estão bem vivos.De todos os grupos punks históricos, poucos se mantém na ativa, mas a banda formada em 1978 em São Francisco pelo baixista Klaus Flouride e pelo vocalista e agitador social Jello Biafra continua mandando bala. Jello Biafra largou o grupo, mas Flouride segura a onda. Eles estiveram no Brasil em 2001, e voltam agora com a turnê California Uber Alles, no dia 21, no Via Marques.O guitarrista East Bay Ray, o outro veterano da banda, é um ativista cibernético (os outros integrantes são D.H. Peligro e Skip McSkipster). Flouride (cujo nome real é Geoffrey Lyall) fará 64 anos no dia 30 de maio. O baixista e líder do Dead Kennedys falou ao Estado por telefone, essa semana. Segue vigorosamente esquerdista. Costuma citar uma frase de um grafite para expressar como vê o mundo: "Se você não está com raiva, não está prestando atenção".Em sua opinião, o que mudou no mundo desde que vocês começaram, em finais dos anos 1970, para hoje?Tudo está pior. A pobreza vai aumentar, as corporações multinacionais, especialmente a indústria de armamentos, estão indo para onde está o dinheiro. Estão colocando armas automáticas na mão de gente que não poderia ter acesso a armas automáticas. Essas armas estão indo para os lugares errados. Estão indo para os morros do Rio de Janeiro, onde aqueles caras violentaram a mulher na semana passada. Coisas como essas vão sempre acontecer eternamente. E tudo que eles querem é pegar os 99% de todo o dinheiro e ficar com ele. As lideranças continuam megalomaníacas e as corporações continuam no topo das decisões. Os países estão destroçando as conquistas sociais, os direitos sociais. A religião segue enlouquecendo as pessoas. Temos um novo papa que está sendo retratado como um cara legal, mas cujas posições o desmentem. Ele não tem mostrado nenhuma visão diferente dos anteriores, não vai reconhecer que as pessoas têm o direito de decidirem sobre o que fazem com seus próprios corpos. Então, vai ser um retrocesso, a Igreja Católica não tem intenção de mudar e as pessoas vão mergulhando em mais ignorância. Esse papa simplesmente ganhou um belo de um apartamento para si. O Vaticano é um belo palácio, quantos de nós poderiam viver num lugar assim? Nada mudou.O novo papa chegou a ser acusado de ter colaborado com a ditadura argentina.Não tinha ouvido falar sobre isso, mas não posso dizer que seja uma surpresa para mim. A Igreja Católica sempre vendou seus olhos nos lugares onde aconteciam atrocidades. E a igreja argentina, naquele período, ganhou a reputação de não ser um bom lugar para se procurar um homem santo. Eu tendo a ficar longe de teorias conspiratórias, mas sempre que há uma fumaça há fogo.Jello Biafra disse uma vez que "o punk rock não está morto, mas merece morrer".Biafra sempre usou de muito sarcasmo. Acho que ele estava falando... Eu não falo muito sobre Biafra hoje em dia, não sei o que exatamente ele pensa. Mas acho que as coisas se mantém em movimento, que uma música agressiva não é necessariamente punk rock, e certamente a moda, um casaco preto, um cabelo moicano, nada disso tem nada a ver com punk. Muita gente vive desse sentimento nostálgico, que não carrega o espírito da coisa. Tem muita gente por aí vivendo como se fosse um hippie dos anos 1960. E ficam dizendo besteiras: "Ah, 1966, aquele ano era meu favorito!". Ou: "Uh, 1977 foi o melhor ano da vida!".Há alguma possibilidade de o Dead Kennedys gravar um novo disco com essa formação atual?Há sempre uma possibilidade. O único problema é que não é mais tão orgânico como costumava ser. O cantor vive em Nova York, o baterista vive em Los Angeles, e eu vivo aqui em São Francisco. Então, ficar juntos para ensaiar e desenvolver canções é muito difícil de acontecer. Mas temos colaborado, mandando arquivos musicais um para o outro. Há algum material novo já produzido.DEAD KENNEDYSVia Marques. Av. Marquês de São Vicente, 1.589, 3611-2696. Dom. (21), 18h. R$ 80/ R$ 150