‘Sexismo barato e cantores anasalados’: Nasi, do Ira!, critica sucesso do funk e sertanejo no Brasil


Em entrevista ao ‘Estadão’, o polêmico vocalista se disse decepcionado com o cenário atual da música brasileira, afirmou estar preocupado com as eleições americanas e falou sobre seu novo álbum, ‘Rocksoulblues’

Por Gabriel Zorzetto
Atualização:

Menos irado e mais sereno, mas sem jamais perder o espírito desafiador, Nasi acaba de celebrar 62 anos de uma vida recheada de sabores e dissabores. Com cigarro na mão, o vocalista do Ira! conversou com o Estadão, entre uma tragada e outra, sobre o momento político do Brasil, o cenário da música atual, o revival do rock nacional, além de seu novo álbum Rocksoulblues, já disponível nas plataformas de streaming.

O líder da icônica banda formada em 1981 tentou explicar os motivos para uma espécie de redescoberta do gênero que bombou no Brasil durante a década de 1980, evidenciada não apenas no sucesso das turnês do conjunto responsável por clássicos como Envelheço na Cidade e Eu Quero Sempre Mais, mas também na estrondosa reunião dos Titãs, que lotou estádios pelo País no ano passado.

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“Não quero ser saudosista ou pessimista. É óbvio que existem jovens talentos, mas aquela era uma época de grandes letristas, como Renato Russo, que tocavam muito nas rádios. Hoje em dia o negócio é cantar com autotune [recurso que corrige erros e imperfeições vocais] e as vozes são todas iguais”, opina.

Apesar do rock ter ganhado força no mercado ao vivo, o estilo mais ouvido no Brasil em 2023 foi o sertanejo, seguido de perto pelo funk. Nasi acredita que essa falta de diversidade seja prejudicial para a indústria.

Todo movimento musical hegemônico faz mal para o próprio gênero. Quer falar de sertanejo? É Chitãozinho & Xororó pra trás. Isso daí não é música sertaneja. Todos com o mesmo timbre, anasalados. Fiquei chocado ao descobrir que existe um sujeito que compõe as músicas pros caras. Ele rima ‘beija’ com ‘cerveja’ e faz a fórmula. E no funk carioca, ao contrário do rap – que tem conteúdo e reflete a realidade das periferias –, os MCs só falam de ostentação, um sexismo barato.

Nasi

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A cidade que envelhece

Como cantor de um grupo que transmite como nenhum outro o DNA da capital paulista, Marcos Valadão (seu nome de batismo) não esconde suas decepções com a situação atual da cidade. “São Paulo cresce de uma forma monstruosa e maligna. A questão da rede elétrica, da manutenção, a Cracolândia, o lixo. Nada muda, só piora. O paulistano é um herói – no sentido de ter que fugir de bandidos, viciados e policiais violentos.”

Crítico da extrema-direita, Nasi já está acostumado a responder sobre os colegas roqueiros, em especial Lobão e Roger Moreira, que se associaram a um posicionamento político que ele condena. “Ouvi coisas abomináveis, mas cada um é dono da sua própria biografia. Eles são minoria. Os roqueiros da minha geração são caras de centro-esquerda, no mínimo, e de uma visão humanista”, afirma. No momento, porém, o artista anda mais preocupado com as eleições americanas do que com a política nacional. “O fenômeno Trump me preocupa muito, porque este homem representa o que existe de pior na América misógina e racista.”

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Ao 'Estadão', Nasi critica o sucesso do funk e do sertanejo no Brasil. Foto: Ana Karina Zaratin/Divulgação

‘O blues é a raiz, o resto são os frutos’

O disco Rocksoulblues traz oito faixas que passeiam pelos gêneros sugeridos no título. Com exceção da inédita Blues do Gato Preto, o álbum oferece releituras surpreendentes de interpretações de nomes como Zé Rodrix, Tim Maia, Erasmo Carlos, Jerry Lee Lewis, Martinho da Vila e Robert Johnson, além de uma versão blues de Dias de Luta, hit do Ira!.

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“Esse disco eu fiz pra mim, primeiramente. E se eu me agrado, é óbvio que muitos fãs também vão gostar. Eu quis fazer um mergulho em cada gênero que estava visitando e pude me desprender das amarras de estar à frente de uma banda fixa. O Caveira, por exemplo, é um samba que gosto desde moleque, mas eu não ia gravar um samba, seria um acinte! Foi então que optamos por fazer algo meio country-western, meio deserto, Tarantino”, explica.

E mesmo um standard tão conhecido do blues como Rollin’ and Tumblin’, regravado por Jeff Beck, B.B. King, Eric Clapton, Muddy Waters, entre outros, ganhou uma roupagem moderna, com toques de hip-hop e música eletrônica, sob a tradução criativa de Não Vá Me Machucar.

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“Foi até difícil descobrir para quem dar o crédito, pois é uma música de domínio público. A primeira gravação foi em 1927 e dois anos depois o Robert Johnson a popularizou. É difícil fazer uma tradução poética, mas procurei adaptar a letra com o espírito do blues. É das faixas que eu tenho mais orgulho no disco. O blues está na raiz de tudo. Tem a máxima do Willie Dixon: ‘The blues are the roots, the rest are the fruits!’ – o blues é a raiz, o resto são os frutos”, afirma Nasi.

Menos irado e mais sereno, mas sem jamais perder o espírito desafiador, Nasi acaba de celebrar 62 anos de uma vida recheada de sabores e dissabores. Com cigarro na mão, o vocalista do Ira! conversou com o Estadão, entre uma tragada e outra, sobre o momento político do Brasil, o cenário da música atual, o revival do rock nacional, além de seu novo álbum Rocksoulblues, já disponível nas plataformas de streaming.

O líder da icônica banda formada em 1981 tentou explicar os motivos para uma espécie de redescoberta do gênero que bombou no Brasil durante a década de 1980, evidenciada não apenas no sucesso das turnês do conjunto responsável por clássicos como Envelheço na Cidade e Eu Quero Sempre Mais, mas também na estrondosa reunião dos Titãs, que lotou estádios pelo País no ano passado.

“Não quero ser saudosista ou pessimista. É óbvio que existem jovens talentos, mas aquela era uma época de grandes letristas, como Renato Russo, que tocavam muito nas rádios. Hoje em dia o negócio é cantar com autotune [recurso que corrige erros e imperfeições vocais] e as vozes são todas iguais”, opina.

Apesar do rock ter ganhado força no mercado ao vivo, o estilo mais ouvido no Brasil em 2023 foi o sertanejo, seguido de perto pelo funk. Nasi acredita que essa falta de diversidade seja prejudicial para a indústria.

Todo movimento musical hegemônico faz mal para o próprio gênero. Quer falar de sertanejo? É Chitãozinho & Xororó pra trás. Isso daí não é música sertaneja. Todos com o mesmo timbre, anasalados. Fiquei chocado ao descobrir que existe um sujeito que compõe as músicas pros caras. Ele rima ‘beija’ com ‘cerveja’ e faz a fórmula. E no funk carioca, ao contrário do rap – que tem conteúdo e reflete a realidade das periferias –, os MCs só falam de ostentação, um sexismo barato.

Nasi

A cidade que envelhece

Como cantor de um grupo que transmite como nenhum outro o DNA da capital paulista, Marcos Valadão (seu nome de batismo) não esconde suas decepções com a situação atual da cidade. “São Paulo cresce de uma forma monstruosa e maligna. A questão da rede elétrica, da manutenção, a Cracolândia, o lixo. Nada muda, só piora. O paulistano é um herói – no sentido de ter que fugir de bandidos, viciados e policiais violentos.”

Crítico da extrema-direita, Nasi já está acostumado a responder sobre os colegas roqueiros, em especial Lobão e Roger Moreira, que se associaram a um posicionamento político que ele condena. “Ouvi coisas abomináveis, mas cada um é dono da sua própria biografia. Eles são minoria. Os roqueiros da minha geração são caras de centro-esquerda, no mínimo, e de uma visão humanista”, afirma. No momento, porém, o artista anda mais preocupado com as eleições americanas do que com a política nacional. “O fenômeno Trump me preocupa muito, porque este homem representa o que existe de pior na América misógina e racista.”

Ao 'Estadão', Nasi critica o sucesso do funk e do sertanejo no Brasil. Foto: Ana Karina Zaratin/Divulgação

‘O blues é a raiz, o resto são os frutos’

O disco Rocksoulblues traz oito faixas que passeiam pelos gêneros sugeridos no título. Com exceção da inédita Blues do Gato Preto, o álbum oferece releituras surpreendentes de interpretações de nomes como Zé Rodrix, Tim Maia, Erasmo Carlos, Jerry Lee Lewis, Martinho da Vila e Robert Johnson, além de uma versão blues de Dias de Luta, hit do Ira!.

“Esse disco eu fiz pra mim, primeiramente. E se eu me agrado, é óbvio que muitos fãs também vão gostar. Eu quis fazer um mergulho em cada gênero que estava visitando e pude me desprender das amarras de estar à frente de uma banda fixa. O Caveira, por exemplo, é um samba que gosto desde moleque, mas eu não ia gravar um samba, seria um acinte! Foi então que optamos por fazer algo meio country-western, meio deserto, Tarantino”, explica.

E mesmo um standard tão conhecido do blues como Rollin’ and Tumblin’, regravado por Jeff Beck, B.B. King, Eric Clapton, Muddy Waters, entre outros, ganhou uma roupagem moderna, com toques de hip-hop e música eletrônica, sob a tradução criativa de Não Vá Me Machucar.

“Foi até difícil descobrir para quem dar o crédito, pois é uma música de domínio público. A primeira gravação foi em 1927 e dois anos depois o Robert Johnson a popularizou. É difícil fazer uma tradução poética, mas procurei adaptar a letra com o espírito do blues. É das faixas que eu tenho mais orgulho no disco. O blues está na raiz de tudo. Tem a máxima do Willie Dixon: ‘The blues are the roots, the rest are the fruits!’ – o blues é a raiz, o resto são os frutos”, afirma Nasi.

Menos irado e mais sereno, mas sem jamais perder o espírito desafiador, Nasi acaba de celebrar 62 anos de uma vida recheada de sabores e dissabores. Com cigarro na mão, o vocalista do Ira! conversou com o Estadão, entre uma tragada e outra, sobre o momento político do Brasil, o cenário da música atual, o revival do rock nacional, além de seu novo álbum Rocksoulblues, já disponível nas plataformas de streaming.

O líder da icônica banda formada em 1981 tentou explicar os motivos para uma espécie de redescoberta do gênero que bombou no Brasil durante a década de 1980, evidenciada não apenas no sucesso das turnês do conjunto responsável por clássicos como Envelheço na Cidade e Eu Quero Sempre Mais, mas também na estrondosa reunião dos Titãs, que lotou estádios pelo País no ano passado.

“Não quero ser saudosista ou pessimista. É óbvio que existem jovens talentos, mas aquela era uma época de grandes letristas, como Renato Russo, que tocavam muito nas rádios. Hoje em dia o negócio é cantar com autotune [recurso que corrige erros e imperfeições vocais] e as vozes são todas iguais”, opina.

Apesar do rock ter ganhado força no mercado ao vivo, o estilo mais ouvido no Brasil em 2023 foi o sertanejo, seguido de perto pelo funk. Nasi acredita que essa falta de diversidade seja prejudicial para a indústria.

Todo movimento musical hegemônico faz mal para o próprio gênero. Quer falar de sertanejo? É Chitãozinho & Xororó pra trás. Isso daí não é música sertaneja. Todos com o mesmo timbre, anasalados. Fiquei chocado ao descobrir que existe um sujeito que compõe as músicas pros caras. Ele rima ‘beija’ com ‘cerveja’ e faz a fórmula. E no funk carioca, ao contrário do rap – que tem conteúdo e reflete a realidade das periferias –, os MCs só falam de ostentação, um sexismo barato.

Nasi

A cidade que envelhece

Como cantor de um grupo que transmite como nenhum outro o DNA da capital paulista, Marcos Valadão (seu nome de batismo) não esconde suas decepções com a situação atual da cidade. “São Paulo cresce de uma forma monstruosa e maligna. A questão da rede elétrica, da manutenção, a Cracolândia, o lixo. Nada muda, só piora. O paulistano é um herói – no sentido de ter que fugir de bandidos, viciados e policiais violentos.”

Crítico da extrema-direita, Nasi já está acostumado a responder sobre os colegas roqueiros, em especial Lobão e Roger Moreira, que se associaram a um posicionamento político que ele condena. “Ouvi coisas abomináveis, mas cada um é dono da sua própria biografia. Eles são minoria. Os roqueiros da minha geração são caras de centro-esquerda, no mínimo, e de uma visão humanista”, afirma. No momento, porém, o artista anda mais preocupado com as eleições americanas do que com a política nacional. “O fenômeno Trump me preocupa muito, porque este homem representa o que existe de pior na América misógina e racista.”

Ao 'Estadão', Nasi critica o sucesso do funk e do sertanejo no Brasil. Foto: Ana Karina Zaratin/Divulgação

‘O blues é a raiz, o resto são os frutos’

O disco Rocksoulblues traz oito faixas que passeiam pelos gêneros sugeridos no título. Com exceção da inédita Blues do Gato Preto, o álbum oferece releituras surpreendentes de interpretações de nomes como Zé Rodrix, Tim Maia, Erasmo Carlos, Jerry Lee Lewis, Martinho da Vila e Robert Johnson, além de uma versão blues de Dias de Luta, hit do Ira!.

“Esse disco eu fiz pra mim, primeiramente. E se eu me agrado, é óbvio que muitos fãs também vão gostar. Eu quis fazer um mergulho em cada gênero que estava visitando e pude me desprender das amarras de estar à frente de uma banda fixa. O Caveira, por exemplo, é um samba que gosto desde moleque, mas eu não ia gravar um samba, seria um acinte! Foi então que optamos por fazer algo meio country-western, meio deserto, Tarantino”, explica.

E mesmo um standard tão conhecido do blues como Rollin’ and Tumblin’, regravado por Jeff Beck, B.B. King, Eric Clapton, Muddy Waters, entre outros, ganhou uma roupagem moderna, com toques de hip-hop e música eletrônica, sob a tradução criativa de Não Vá Me Machucar.

“Foi até difícil descobrir para quem dar o crédito, pois é uma música de domínio público. A primeira gravação foi em 1927 e dois anos depois o Robert Johnson a popularizou. É difícil fazer uma tradução poética, mas procurei adaptar a letra com o espírito do blues. É das faixas que eu tenho mais orgulho no disco. O blues está na raiz de tudo. Tem a máxima do Willie Dixon: ‘The blues are the roots, the rest are the fruits!’ – o blues é a raiz, o resto são os frutos”, afirma Nasi.

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