Agosto de 2000. Não se falava em outra coisa na Praça da Sé que não fosse o Show do Milhão, programa de perguntas e respostas comandado por Silvio Santos, que arrebatava o Brasil. Eu tinha começado a trabalhar na Agência Estado havia dois meses, quando tive, toda constrangida, de pedir à minha chefe à época, Rosa Riscala, uma folga para participar do programa.
Minha mãe, grande fã de programas do tipo quiz, me inscreveu e fomos sorteadas, eu e ela - os contemplados podiam levar um acompanhante. Rosa era também uma admiradora de Silvio e do Show do Milhão e impôs uma condição para me liberar a participar da gravação. “Se você ganhar um milhão, você me prometa que vai voltar a trabalhar.” Numa hora dessa, a gente topa qualquer coisa. Me comprometi e lá fomos nós, eu e minha mãe.
A participação no programa levaria o dia todo. O SBT nos levou num ônibus que saía da unidade que fica na Rua Jaceguai, ao lado do Teatro Oficina, até o Complexo Anhanguera. Chegando lá, era uma multidão de gente, tanto participantes quanto pessoas que ficariam na plateia, pois seriam gravados vários programas no mesmo dia. Gente do Brasil inteiro sendo recebida com carinho e café da manhã. O homem sabia como cativar.
Cada programa reunia um tanto de pessoas para ficarem no palco, como potenciais “respondentes” às perguntas. Os felizardos eram escolhidos na hora, via sorteio. Pouco antes de começar a gravação, eu e os demais integrantes esperávamos numa espécie de antessala. Sem qualquer aviso, eis que entra Silvio, em carne e osso, gente como a gente. Fiquei atônita, pois em fração de segundos apareceu na minha cabeça a minha avó e o filme de toda uma infância assistindo SBT aos domingos, das 9h às 22h. Era audiência garantida.
Ele estava no meio de nós. Disse que gostava de se reunir antes com os participantes para alinhar algumas estratégias. “Quando forem chamados a responder, não deem a resposta logo de cara. Pensem um pouco, mesmo que a pergunta seja ‘qual a cor do cavalo branco de Napoleão?’”.
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Segundo o mestre, pessoas que sabiam a resposta e acertavam logo de cara não conseguiam angariar a torcida, não conseguiam o carinho do público, seja na plateia seja em casa. “Eu tenho ‘um pouco’ de experiência disso e digo para vocês que muita gente que está assistindo não se identifica com quem sabe muito”, avisou. Foi um jeito elegante de dizer que o povão queria se ver ali, que a maioria não tinha acesso a cultura e informação. Um gênio.
Chegou a hora da gravação. Minha mãe estava na primeira fila. Eu não fui sorteada na hora para responder, mas participei como o pessoal “das placas”, que podia ser acionado para consulta pelo participante em caso de dúvida. Um dos sorteados foi um rapaz que sofria de epilepsia e teve uma crise em plena gravação. Travou e não conseguiu continuar respondendo.
Daí pensei, “Silvio vai ter um chilique!”. Nada. Ele chamou o intervalo e na volta explicou ao público que o rapaz teve um problema e, se conseguisse se restabelecer, voltaria ao final do programa. Esse era o Silvio, respeitoso e transparente com o seu maior ativo: o público.
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O rapaz acabou não conseguindo voltar para o programa e soube depois que a emissora o levou de helicóptero para um hospital em Guarulhos. Eu não fui sorteada, mas tive a experiência de conhecer o ícone da comunicação no Brasil e ter história pra contar. Agradeço à minha mãe e a Rosa Riscala. Voltei a trabalhar no dia seguinte, como tinha prometido. Mas sem R$ 1 milhão. Apenas com os R$ 300 pela participação no programa. E eternas lembranças.