O legado de Karl Lagerfeld


Morto aos 85 anos, o estilista alemão reinventou o prêt-à-porter à frente da Chanel e ajudou a traçar os movimentos do mercado de luxo global

Por Maria Rita Alonso
Atualização:

Karl Lagerfeld era o alemão mais francês da face da Terra. Espirituoso e mordaz, escorria fel nas entrevistas que costumava dar –para o desespero dos assessores de comunicação que nunca sabiam os focos de incêndio que teriam de apagar. No universo dissimulado e obcecado pelas aparências da moda, Karl Lagerfeld, que morreu na terça-feira, 19, aos 85 anos, costumava dizer o que pensava. Na segunda, 18, ele foi internado às pressas em um hospital de Paris. A causa da morte ainda não foi divulgada. 

Graças à autoconfiança e à coerência estética que manteve em sua trajetória, venceu bravamente a efemeridade e competitividade dessa indústria, que considera velha uma modelo de 25 anos e ultrapassado um estilista de 40. No comando da maison mais chique do mundo, reinventada com primor por ele mesmo, Karl Lagerfeld virou o kaiser da moda.

Cresceu sob as bases incríveis e revolucionárias de Gabrielle Chanel, famosa já no início dos anos 20 por abolir os espartilhos, encurtar as saias femininas e adotar peças práticas do vestuário masculino, como a calça comprida. Ela transgrediu as regras de etiqueta e criou um guarda-roupa para a mulher do século 20. E ele evoluiu sob os ombros dessa gigante, criando a imagem da mulher rica e chique, inteligente e dinâmica, ajudando a construir um império de moda bilionário e global.

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O estilista alemão Karl Lagerfeld, em foto de desfile de 2013, em Paris Foto: Charles Platiau/ Reuters

Em termos de roupas e acessórios, não há uma marca mais cara do que a Chanel hoje. Por outro lado, em 2004, Lagerfeld foi pioneiro na parceria com a rede de fast fashion H&M, numa movimentação de popularizar a moda. “Ele antecipou isso, assim como se jogava no prêt-à-porter quando os outros ainda estavam na alta-costura”, diz o jornalista Mario Mendes.

Excêntrico e vaidoso, Karl fez de sua imagem de estilista famoso um personagem fashion e vendedor. Óculos escuros e rabo de cavalo eram marcas registradas desde os anos 70. “Eles são a minha burca”, dizia. Poliglota e pluricultural, tinha a disciplina germânica, vivia como um puritano, não bebia nem fumava. Passou as últimas décadas trabalhando feito louco. Desenvolvia seis coleções por ano para a Chanel, além de atuar como diretor criativo da marca italiana Fendi, há mais de 50 anos, e assinar coleções para a sua marca homônima. “Esse papel do velho solitário não cola em mim. Faço mil coisas, trabalho o tempo todo cercado por dezenas de pessoas. Quando chego em casa, simplesmente amo ficar sozinho, e preciso ficar sozinho para ler e me restaurar.”

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O mundo sem ostentação não era para Karl. Ele tinha carta branca na Chanel e um budget aparentemente infinito para realizar o sonho de moda que quisesse. A cada temporada do prêt-à-porter, alugava nada menos do que o Grand Palais, em Paris, para montar desfiles espetaculares. Ali, fez um foguete decolar, montou um transatlântico em tamanho real, criou uma praia fictícia com toneladas de areia e colocou gôndolas de um supermercado superchique. Isso só para ficar nos eventos mais recentes. “Ele não era um criador de formas nem um costureiro genial. Foi sobretudo um ícone pop da moda e um image maker que aliava profundo conhecimento do tempo em que vivia com uma capacidade de gerar imagens impactantes. Os desfiles apoteóticos da Chanel são exemplo disso”, avalia Daniela Falcão, diretora das Edições Globo Condé Nast, que publica a Vogue.

Na era da imagem multiplicada pelas redes sociais, ele não media esforços para imprimir a riqueza do universo da alta moda em seus desfiles instagramáveis. E foram muitas, especialmente os promovidas em viagens faraônicas para destinos estratégicos do mercado de luxo. Explorou o Oriente com megadesfiles em Dubai, Seul, Cingapura e na Muralha da China. A última tacada foi tomar um templo egípcio instalado dentro do museu Metropolitan, em Nova York.

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A Maison Chanel anunciou nesta terça-feira a morte de seu estilista e um dos maiores nomes da moda, Karl Lagerfeld. O alemão tinha 85 anos e sua saúde havia se deteriorado nas últimas semanas.

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Odiou São Paulo. Disse várias vezes que tinha medo de vir ao Brasil. Em 2015, finalmente se rendeu devido a inauguração de uma exposição de fotografia da Chanel montada na Oca, no Parque do Ibirapuera. Foi embora jurando que não voltava mais. Ainda no Brasil assinou coleção para a Riachuelo e desenhou calçados para a Nascido em uma família burguesa de Hamburgo, Lagerfeld representou como poucos a essência da moda francesa, elegante, burguesa, provocante na medida. A idade deixou sua língua mais solta. “No ano passado, perdi dois dos meus melhores inimigos: Pierre Bergé e o outro. Azzedine (Alaïa), me execrava. No funeral de Pierre, minha florista perguntou: ‘Quer que mandemos um cacto?’” Ainda atacava ativistas do Peta, reclamava de movimentos como #MeToo e desdenhava da inclusão de corpos diversos na passarela. “Ele dizia que o politicamente correto era uma prisão. Era um homem culto, cáustico, crítico e amava os livros”, lembra Costanza Pascolato.

Sua morte agora deixa uma pergunta. Quem ficará no comando da Chanel? Por enquanto, sua ex-assistente, braço direito e esquerdo, a francesa Virginie Viard, com quem trabalhou por três décadas. / Colaborou Sergio Amaral

Karl Lagerfeld era o alemão mais francês da face da Terra. Espirituoso e mordaz, escorria fel nas entrevistas que costumava dar –para o desespero dos assessores de comunicação que nunca sabiam os focos de incêndio que teriam de apagar. No universo dissimulado e obcecado pelas aparências da moda, Karl Lagerfeld, que morreu na terça-feira, 19, aos 85 anos, costumava dizer o que pensava. Na segunda, 18, ele foi internado às pressas em um hospital de Paris. A causa da morte ainda não foi divulgada. 

Graças à autoconfiança e à coerência estética que manteve em sua trajetória, venceu bravamente a efemeridade e competitividade dessa indústria, que considera velha uma modelo de 25 anos e ultrapassado um estilista de 40. No comando da maison mais chique do mundo, reinventada com primor por ele mesmo, Karl Lagerfeld virou o kaiser da moda.

Cresceu sob as bases incríveis e revolucionárias de Gabrielle Chanel, famosa já no início dos anos 20 por abolir os espartilhos, encurtar as saias femininas e adotar peças práticas do vestuário masculino, como a calça comprida. Ela transgrediu as regras de etiqueta e criou um guarda-roupa para a mulher do século 20. E ele evoluiu sob os ombros dessa gigante, criando a imagem da mulher rica e chique, inteligente e dinâmica, ajudando a construir um império de moda bilionário e global.

O estilista alemão Karl Lagerfeld, em foto de desfile de 2013, em Paris Foto: Charles Platiau/ Reuters

Em termos de roupas e acessórios, não há uma marca mais cara do que a Chanel hoje. Por outro lado, em 2004, Lagerfeld foi pioneiro na parceria com a rede de fast fashion H&M, numa movimentação de popularizar a moda. “Ele antecipou isso, assim como se jogava no prêt-à-porter quando os outros ainda estavam na alta-costura”, diz o jornalista Mario Mendes.

Excêntrico e vaidoso, Karl fez de sua imagem de estilista famoso um personagem fashion e vendedor. Óculos escuros e rabo de cavalo eram marcas registradas desde os anos 70. “Eles são a minha burca”, dizia. Poliglota e pluricultural, tinha a disciplina germânica, vivia como um puritano, não bebia nem fumava. Passou as últimas décadas trabalhando feito louco. Desenvolvia seis coleções por ano para a Chanel, além de atuar como diretor criativo da marca italiana Fendi, há mais de 50 anos, e assinar coleções para a sua marca homônima. “Esse papel do velho solitário não cola em mim. Faço mil coisas, trabalho o tempo todo cercado por dezenas de pessoas. Quando chego em casa, simplesmente amo ficar sozinho, e preciso ficar sozinho para ler e me restaurar.”

O mundo sem ostentação não era para Karl. Ele tinha carta branca na Chanel e um budget aparentemente infinito para realizar o sonho de moda que quisesse. A cada temporada do prêt-à-porter, alugava nada menos do que o Grand Palais, em Paris, para montar desfiles espetaculares. Ali, fez um foguete decolar, montou um transatlântico em tamanho real, criou uma praia fictícia com toneladas de areia e colocou gôndolas de um supermercado superchique. Isso só para ficar nos eventos mais recentes. “Ele não era um criador de formas nem um costureiro genial. Foi sobretudo um ícone pop da moda e um image maker que aliava profundo conhecimento do tempo em que vivia com uma capacidade de gerar imagens impactantes. Os desfiles apoteóticos da Chanel são exemplo disso”, avalia Daniela Falcão, diretora das Edições Globo Condé Nast, que publica a Vogue.

Na era da imagem multiplicada pelas redes sociais, ele não media esforços para imprimir a riqueza do universo da alta moda em seus desfiles instagramáveis. E foram muitas, especialmente os promovidas em viagens faraônicas para destinos estratégicos do mercado de luxo. Explorou o Oriente com megadesfiles em Dubai, Seul, Cingapura e na Muralha da China. A última tacada foi tomar um templo egípcio instalado dentro do museu Metropolitan, em Nova York.

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A Maison Chanel anunciou nesta terça-feira a morte de seu estilista e um dos maiores nomes da moda, Karl Lagerfeld. O alemão tinha 85 anos e sua saúde havia se deteriorado nas últimas semanas.

Odiou São Paulo. Disse várias vezes que tinha medo de vir ao Brasil. Em 2015, finalmente se rendeu devido a inauguração de uma exposição de fotografia da Chanel montada na Oca, no Parque do Ibirapuera. Foi embora jurando que não voltava mais. Ainda no Brasil assinou coleção para a Riachuelo e desenhou calçados para a Nascido em uma família burguesa de Hamburgo, Lagerfeld representou como poucos a essência da moda francesa, elegante, burguesa, provocante na medida. A idade deixou sua língua mais solta. “No ano passado, perdi dois dos meus melhores inimigos: Pierre Bergé e o outro. Azzedine (Alaïa), me execrava. No funeral de Pierre, minha florista perguntou: ‘Quer que mandemos um cacto?’” Ainda atacava ativistas do Peta, reclamava de movimentos como #MeToo e desdenhava da inclusão de corpos diversos na passarela. “Ele dizia que o politicamente correto era uma prisão. Era um homem culto, cáustico, crítico e amava os livros”, lembra Costanza Pascolato.

Sua morte agora deixa uma pergunta. Quem ficará no comando da Chanel? Por enquanto, sua ex-assistente, braço direito e esquerdo, a francesa Virginie Viard, com quem trabalhou por três décadas. / Colaborou Sergio Amaral

Karl Lagerfeld era o alemão mais francês da face da Terra. Espirituoso e mordaz, escorria fel nas entrevistas que costumava dar –para o desespero dos assessores de comunicação que nunca sabiam os focos de incêndio que teriam de apagar. No universo dissimulado e obcecado pelas aparências da moda, Karl Lagerfeld, que morreu na terça-feira, 19, aos 85 anos, costumava dizer o que pensava. Na segunda, 18, ele foi internado às pressas em um hospital de Paris. A causa da morte ainda não foi divulgada. 

Graças à autoconfiança e à coerência estética que manteve em sua trajetória, venceu bravamente a efemeridade e competitividade dessa indústria, que considera velha uma modelo de 25 anos e ultrapassado um estilista de 40. No comando da maison mais chique do mundo, reinventada com primor por ele mesmo, Karl Lagerfeld virou o kaiser da moda.

Cresceu sob as bases incríveis e revolucionárias de Gabrielle Chanel, famosa já no início dos anos 20 por abolir os espartilhos, encurtar as saias femininas e adotar peças práticas do vestuário masculino, como a calça comprida. Ela transgrediu as regras de etiqueta e criou um guarda-roupa para a mulher do século 20. E ele evoluiu sob os ombros dessa gigante, criando a imagem da mulher rica e chique, inteligente e dinâmica, ajudando a construir um império de moda bilionário e global.

O estilista alemão Karl Lagerfeld, em foto de desfile de 2013, em Paris Foto: Charles Platiau/ Reuters

Em termos de roupas e acessórios, não há uma marca mais cara do que a Chanel hoje. Por outro lado, em 2004, Lagerfeld foi pioneiro na parceria com a rede de fast fashion H&M, numa movimentação de popularizar a moda. “Ele antecipou isso, assim como se jogava no prêt-à-porter quando os outros ainda estavam na alta-costura”, diz o jornalista Mario Mendes.

Excêntrico e vaidoso, Karl fez de sua imagem de estilista famoso um personagem fashion e vendedor. Óculos escuros e rabo de cavalo eram marcas registradas desde os anos 70. “Eles são a minha burca”, dizia. Poliglota e pluricultural, tinha a disciplina germânica, vivia como um puritano, não bebia nem fumava. Passou as últimas décadas trabalhando feito louco. Desenvolvia seis coleções por ano para a Chanel, além de atuar como diretor criativo da marca italiana Fendi, há mais de 50 anos, e assinar coleções para a sua marca homônima. “Esse papel do velho solitário não cola em mim. Faço mil coisas, trabalho o tempo todo cercado por dezenas de pessoas. Quando chego em casa, simplesmente amo ficar sozinho, e preciso ficar sozinho para ler e me restaurar.”

O mundo sem ostentação não era para Karl. Ele tinha carta branca na Chanel e um budget aparentemente infinito para realizar o sonho de moda que quisesse. A cada temporada do prêt-à-porter, alugava nada menos do que o Grand Palais, em Paris, para montar desfiles espetaculares. Ali, fez um foguete decolar, montou um transatlântico em tamanho real, criou uma praia fictícia com toneladas de areia e colocou gôndolas de um supermercado superchique. Isso só para ficar nos eventos mais recentes. “Ele não era um criador de formas nem um costureiro genial. Foi sobretudo um ícone pop da moda e um image maker que aliava profundo conhecimento do tempo em que vivia com uma capacidade de gerar imagens impactantes. Os desfiles apoteóticos da Chanel são exemplo disso”, avalia Daniela Falcão, diretora das Edições Globo Condé Nast, que publica a Vogue.

Na era da imagem multiplicada pelas redes sociais, ele não media esforços para imprimir a riqueza do universo da alta moda em seus desfiles instagramáveis. E foram muitas, especialmente os promovidas em viagens faraônicas para destinos estratégicos do mercado de luxo. Explorou o Oriente com megadesfiles em Dubai, Seul, Cingapura e na Muralha da China. A última tacada foi tomar um templo egípcio instalado dentro do museu Metropolitan, em Nova York.

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A Maison Chanel anunciou nesta terça-feira a morte de seu estilista e um dos maiores nomes da moda, Karl Lagerfeld. O alemão tinha 85 anos e sua saúde havia se deteriorado nas últimas semanas.

Odiou São Paulo. Disse várias vezes que tinha medo de vir ao Brasil. Em 2015, finalmente se rendeu devido a inauguração de uma exposição de fotografia da Chanel montada na Oca, no Parque do Ibirapuera. Foi embora jurando que não voltava mais. Ainda no Brasil assinou coleção para a Riachuelo e desenhou calçados para a Nascido em uma família burguesa de Hamburgo, Lagerfeld representou como poucos a essência da moda francesa, elegante, burguesa, provocante na medida. A idade deixou sua língua mais solta. “No ano passado, perdi dois dos meus melhores inimigos: Pierre Bergé e o outro. Azzedine (Alaïa), me execrava. No funeral de Pierre, minha florista perguntou: ‘Quer que mandemos um cacto?’” Ainda atacava ativistas do Peta, reclamava de movimentos como #MeToo e desdenhava da inclusão de corpos diversos na passarela. “Ele dizia que o politicamente correto era uma prisão. Era um homem culto, cáustico, crítico e amava os livros”, lembra Costanza Pascolato.

Sua morte agora deixa uma pergunta. Quem ficará no comando da Chanel? Por enquanto, sua ex-assistente, braço direito e esquerdo, a francesa Virginie Viard, com quem trabalhou por três décadas. / Colaborou Sergio Amaral

Karl Lagerfeld era o alemão mais francês da face da Terra. Espirituoso e mordaz, escorria fel nas entrevistas que costumava dar –para o desespero dos assessores de comunicação que nunca sabiam os focos de incêndio que teriam de apagar. No universo dissimulado e obcecado pelas aparências da moda, Karl Lagerfeld, que morreu na terça-feira, 19, aos 85 anos, costumava dizer o que pensava. Na segunda, 18, ele foi internado às pressas em um hospital de Paris. A causa da morte ainda não foi divulgada. 

Graças à autoconfiança e à coerência estética que manteve em sua trajetória, venceu bravamente a efemeridade e competitividade dessa indústria, que considera velha uma modelo de 25 anos e ultrapassado um estilista de 40. No comando da maison mais chique do mundo, reinventada com primor por ele mesmo, Karl Lagerfeld virou o kaiser da moda.

Cresceu sob as bases incríveis e revolucionárias de Gabrielle Chanel, famosa já no início dos anos 20 por abolir os espartilhos, encurtar as saias femininas e adotar peças práticas do vestuário masculino, como a calça comprida. Ela transgrediu as regras de etiqueta e criou um guarda-roupa para a mulher do século 20. E ele evoluiu sob os ombros dessa gigante, criando a imagem da mulher rica e chique, inteligente e dinâmica, ajudando a construir um império de moda bilionário e global.

O estilista alemão Karl Lagerfeld, em foto de desfile de 2013, em Paris Foto: Charles Platiau/ Reuters

Em termos de roupas e acessórios, não há uma marca mais cara do que a Chanel hoje. Por outro lado, em 2004, Lagerfeld foi pioneiro na parceria com a rede de fast fashion H&M, numa movimentação de popularizar a moda. “Ele antecipou isso, assim como se jogava no prêt-à-porter quando os outros ainda estavam na alta-costura”, diz o jornalista Mario Mendes.

Excêntrico e vaidoso, Karl fez de sua imagem de estilista famoso um personagem fashion e vendedor. Óculos escuros e rabo de cavalo eram marcas registradas desde os anos 70. “Eles são a minha burca”, dizia. Poliglota e pluricultural, tinha a disciplina germânica, vivia como um puritano, não bebia nem fumava. Passou as últimas décadas trabalhando feito louco. Desenvolvia seis coleções por ano para a Chanel, além de atuar como diretor criativo da marca italiana Fendi, há mais de 50 anos, e assinar coleções para a sua marca homônima. “Esse papel do velho solitário não cola em mim. Faço mil coisas, trabalho o tempo todo cercado por dezenas de pessoas. Quando chego em casa, simplesmente amo ficar sozinho, e preciso ficar sozinho para ler e me restaurar.”

O mundo sem ostentação não era para Karl. Ele tinha carta branca na Chanel e um budget aparentemente infinito para realizar o sonho de moda que quisesse. A cada temporada do prêt-à-porter, alugava nada menos do que o Grand Palais, em Paris, para montar desfiles espetaculares. Ali, fez um foguete decolar, montou um transatlântico em tamanho real, criou uma praia fictícia com toneladas de areia e colocou gôndolas de um supermercado superchique. Isso só para ficar nos eventos mais recentes. “Ele não era um criador de formas nem um costureiro genial. Foi sobretudo um ícone pop da moda e um image maker que aliava profundo conhecimento do tempo em que vivia com uma capacidade de gerar imagens impactantes. Os desfiles apoteóticos da Chanel são exemplo disso”, avalia Daniela Falcão, diretora das Edições Globo Condé Nast, que publica a Vogue.

Na era da imagem multiplicada pelas redes sociais, ele não media esforços para imprimir a riqueza do universo da alta moda em seus desfiles instagramáveis. E foram muitas, especialmente os promovidas em viagens faraônicas para destinos estratégicos do mercado de luxo. Explorou o Oriente com megadesfiles em Dubai, Seul, Cingapura e na Muralha da China. A última tacada foi tomar um templo egípcio instalado dentro do museu Metropolitan, em Nova York.

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A Maison Chanel anunciou nesta terça-feira a morte de seu estilista e um dos maiores nomes da moda, Karl Lagerfeld. O alemão tinha 85 anos e sua saúde havia se deteriorado nas últimas semanas.

Odiou São Paulo. Disse várias vezes que tinha medo de vir ao Brasil. Em 2015, finalmente se rendeu devido a inauguração de uma exposição de fotografia da Chanel montada na Oca, no Parque do Ibirapuera. Foi embora jurando que não voltava mais. Ainda no Brasil assinou coleção para a Riachuelo e desenhou calçados para a Nascido em uma família burguesa de Hamburgo, Lagerfeld representou como poucos a essência da moda francesa, elegante, burguesa, provocante na medida. A idade deixou sua língua mais solta. “No ano passado, perdi dois dos meus melhores inimigos: Pierre Bergé e o outro. Azzedine (Alaïa), me execrava. No funeral de Pierre, minha florista perguntou: ‘Quer que mandemos um cacto?’” Ainda atacava ativistas do Peta, reclamava de movimentos como #MeToo e desdenhava da inclusão de corpos diversos na passarela. “Ele dizia que o politicamente correto era uma prisão. Era um homem culto, cáustico, crítico e amava os livros”, lembra Costanza Pascolato.

Sua morte agora deixa uma pergunta. Quem ficará no comando da Chanel? Por enquanto, sua ex-assistente, braço direito e esquerdo, a francesa Virginie Viard, com quem trabalhou por três décadas. / Colaborou Sergio Amaral

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