De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Contagiante, O Exorcista do Papa é um terror sem medo de susto e com heroísmo


Por Rodrigo Fonseca
Dublado no Brasil por Guilherme Lopes, Russell Crowe (à direita, ao lado do ator Daniel Zovatto) tem uma atuação primorosa em "O Exorcista do Papa", ao reviver os feitos do Padre Amorth - Foto: @Screen Gems Courtesy

RODRIGO FONSECA Lá pelas 21h10 do último sábado, o Kinoplex Nova América, em Del Castilho, no Rio de Janeiro, inchou a sessão de "O Exorcista do Papa", da mesma maneira como aconteceu em outras salas do Rio - e, dizem bilheteiras e bilheteiros, de todo o país - à força de uma narrativa eletrizante de sangue, tripas e som nas alturas, sem a moderação bossanovista (padrão Nutella) do tal "novo terror europeu", aquela vertente do sobrenatural que não dá medo, só discute causas políticas, tipo "Speak No Evil" e "The Innocents". O novo filme de Julius Avery (de "Operação Overlord"), deitando e rolando no carisma de um Russell Crowe afinzão de brilhar, é horror raiz. A toda hora apela por jump scare (susto), utiliza a carpintaria gráfica de sua direção de arte, de sua maquiagem e de seus efeitos visuais para mostrar que o demônio encarnado no corpo de um menininho é Diabo com D maiúsculo. É filme pra gelar a espinha mesmo, com um (senhor) diferencial com o qual Hollywood parece ter desaprendido a lidar, por pressões sociológicas da correção política: tem um herói. É um terror com heroísmo explícito, luta do Bem contra o Mal sem mimimi. O herói, encarnado por um Crowe em estado de graça (dublado pelo brilhante Guilherme Lopes no Brasil), é o padre Gabriele Amorth (1925-2016), intelectual brilhante, que foi um esgrimista da gramática numa trajetória paralela como escritor e jornalista, embora seja lembrado por ter sido o Exorcista Chefe do Vaticano. Coube a ele combater manifestações até hoje contestadas pela ciência que vulnerabilizaram corpos em todo o mundo. Crendo ou não na liturgia católica (ou em qualquer credo), é impossível não se aplaudir seu empenho humanista de defender pessoas fragilidades de intempéries da alma, que uns chamam de surto e outros, de possessão. Avery - que dirigiu Sylvester Stallone no precioso "Samaritano", um dos maiores sucessos da Amazon Prime em 2022 - aposta na hipótese da incorporação de pessoas por forças das trevas ao assumir um caso, ambientado na Espanha, no fim dos anos 1980, no qual uma viúva vinda dos EUA, Julia (Alex Essoe), tem seu caçula, Henry (Peter DeSouza-Feighoney), tomado por um diabrete cujos poderes desafiam a perspicácia dos clérigos do Vaticano. Numa decisão sábia da produção de elenco, o diretor aceitou trazer Franco Nero, o eterno Django, para encarnar o Sumo-Pontífice de Roma, o Papa, numa atuação vicejante, de arrancar lágrimas de qualquer cinéfilo. A dobradinha entre Nero e Crowe em cena, driblando lugares comuns, tem uma eficácia digna de Pelé e Garrincha nos gramados. É emocionante ver a simbiose entre o caubói nº 1 do western spaghetti com o Gladiador de Ridley Scott.

A fotografia de Khalid Mohtaseb amplia a força da narrativa dirigida por Julius Avery  
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Além de criar uma narrativa espetaculosa, que gruda a plateia na poltrona, assustada, de olho arregalado, o filmaço de Avery ainda abre uma discussão necessária sobre o crimes da Igreja. A investigação comandada pelo sacerdote encarnado por Crowe aborda negligências (reais) do passado, fala sobre abusos sexuais de padres e analisa delitos oriundos da Santa Inquisição, o movimento repressor que é muito bem explicado no roteiro moldado por Michael Petroni e Evan Spiliotopoulos, a partir de um argumento de R. Dean McCreary, Chester Hastings e Jeff Katz, baseado nas memórias do próprio Amorth. Ainda inédito nos EUA, "The Pope's Exorcist" (seu título original) se candidata a blockbuster. É, desde já, uma das melhores surpresas do cinemão mais pipoca, com uma fotografia dionisíaca de Khalid Mohtaseb. Vale ressaltar que a dublagem brasileira é impecável.

Detalhe: David Gordon Green está preparando a retomada de "O Exorcista" (1973), com Linda Blair e Ellen Burstyn.

Dublado no Brasil por Guilherme Lopes, Russell Crowe (à direita, ao lado do ator Daniel Zovatto) tem uma atuação primorosa em "O Exorcista do Papa", ao reviver os feitos do Padre Amorth - Foto: @Screen Gems Courtesy

RODRIGO FONSECA Lá pelas 21h10 do último sábado, o Kinoplex Nova América, em Del Castilho, no Rio de Janeiro, inchou a sessão de "O Exorcista do Papa", da mesma maneira como aconteceu em outras salas do Rio - e, dizem bilheteiras e bilheteiros, de todo o país - à força de uma narrativa eletrizante de sangue, tripas e som nas alturas, sem a moderação bossanovista (padrão Nutella) do tal "novo terror europeu", aquela vertente do sobrenatural que não dá medo, só discute causas políticas, tipo "Speak No Evil" e "The Innocents". O novo filme de Julius Avery (de "Operação Overlord"), deitando e rolando no carisma de um Russell Crowe afinzão de brilhar, é horror raiz. A toda hora apela por jump scare (susto), utiliza a carpintaria gráfica de sua direção de arte, de sua maquiagem e de seus efeitos visuais para mostrar que o demônio encarnado no corpo de um menininho é Diabo com D maiúsculo. É filme pra gelar a espinha mesmo, com um (senhor) diferencial com o qual Hollywood parece ter desaprendido a lidar, por pressões sociológicas da correção política: tem um herói. É um terror com heroísmo explícito, luta do Bem contra o Mal sem mimimi. O herói, encarnado por um Crowe em estado de graça (dublado pelo brilhante Guilherme Lopes no Brasil), é o padre Gabriele Amorth (1925-2016), intelectual brilhante, que foi um esgrimista da gramática numa trajetória paralela como escritor e jornalista, embora seja lembrado por ter sido o Exorcista Chefe do Vaticano. Coube a ele combater manifestações até hoje contestadas pela ciência que vulnerabilizaram corpos em todo o mundo. Crendo ou não na liturgia católica (ou em qualquer credo), é impossível não se aplaudir seu empenho humanista de defender pessoas fragilidades de intempéries da alma, que uns chamam de surto e outros, de possessão. Avery - que dirigiu Sylvester Stallone no precioso "Samaritano", um dos maiores sucessos da Amazon Prime em 2022 - aposta na hipótese da incorporação de pessoas por forças das trevas ao assumir um caso, ambientado na Espanha, no fim dos anos 1980, no qual uma viúva vinda dos EUA, Julia (Alex Essoe), tem seu caçula, Henry (Peter DeSouza-Feighoney), tomado por um diabrete cujos poderes desafiam a perspicácia dos clérigos do Vaticano. Numa decisão sábia da produção de elenco, o diretor aceitou trazer Franco Nero, o eterno Django, para encarnar o Sumo-Pontífice de Roma, o Papa, numa atuação vicejante, de arrancar lágrimas de qualquer cinéfilo. A dobradinha entre Nero e Crowe em cena, driblando lugares comuns, tem uma eficácia digna de Pelé e Garrincha nos gramados. É emocionante ver a simbiose entre o caubói nº 1 do western spaghetti com o Gladiador de Ridley Scott.

A fotografia de Khalid Mohtaseb amplia a força da narrativa dirigida por Julius Avery  

Além de criar uma narrativa espetaculosa, que gruda a plateia na poltrona, assustada, de olho arregalado, o filmaço de Avery ainda abre uma discussão necessária sobre o crimes da Igreja. A investigação comandada pelo sacerdote encarnado por Crowe aborda negligências (reais) do passado, fala sobre abusos sexuais de padres e analisa delitos oriundos da Santa Inquisição, o movimento repressor que é muito bem explicado no roteiro moldado por Michael Petroni e Evan Spiliotopoulos, a partir de um argumento de R. Dean McCreary, Chester Hastings e Jeff Katz, baseado nas memórias do próprio Amorth. Ainda inédito nos EUA, "The Pope's Exorcist" (seu título original) se candidata a blockbuster. É, desde já, uma das melhores surpresas do cinemão mais pipoca, com uma fotografia dionisíaca de Khalid Mohtaseb. Vale ressaltar que a dublagem brasileira é impecável.

Detalhe: David Gordon Green está preparando a retomada de "O Exorcista" (1973), com Linda Blair e Ellen Burstyn.

Dublado no Brasil por Guilherme Lopes, Russell Crowe (à direita, ao lado do ator Daniel Zovatto) tem uma atuação primorosa em "O Exorcista do Papa", ao reviver os feitos do Padre Amorth - Foto: @Screen Gems Courtesy

RODRIGO FONSECA Lá pelas 21h10 do último sábado, o Kinoplex Nova América, em Del Castilho, no Rio de Janeiro, inchou a sessão de "O Exorcista do Papa", da mesma maneira como aconteceu em outras salas do Rio - e, dizem bilheteiras e bilheteiros, de todo o país - à força de uma narrativa eletrizante de sangue, tripas e som nas alturas, sem a moderação bossanovista (padrão Nutella) do tal "novo terror europeu", aquela vertente do sobrenatural que não dá medo, só discute causas políticas, tipo "Speak No Evil" e "The Innocents". O novo filme de Julius Avery (de "Operação Overlord"), deitando e rolando no carisma de um Russell Crowe afinzão de brilhar, é horror raiz. A toda hora apela por jump scare (susto), utiliza a carpintaria gráfica de sua direção de arte, de sua maquiagem e de seus efeitos visuais para mostrar que o demônio encarnado no corpo de um menininho é Diabo com D maiúsculo. É filme pra gelar a espinha mesmo, com um (senhor) diferencial com o qual Hollywood parece ter desaprendido a lidar, por pressões sociológicas da correção política: tem um herói. É um terror com heroísmo explícito, luta do Bem contra o Mal sem mimimi. O herói, encarnado por um Crowe em estado de graça (dublado pelo brilhante Guilherme Lopes no Brasil), é o padre Gabriele Amorth (1925-2016), intelectual brilhante, que foi um esgrimista da gramática numa trajetória paralela como escritor e jornalista, embora seja lembrado por ter sido o Exorcista Chefe do Vaticano. Coube a ele combater manifestações até hoje contestadas pela ciência que vulnerabilizaram corpos em todo o mundo. Crendo ou não na liturgia católica (ou em qualquer credo), é impossível não se aplaudir seu empenho humanista de defender pessoas fragilidades de intempéries da alma, que uns chamam de surto e outros, de possessão. Avery - que dirigiu Sylvester Stallone no precioso "Samaritano", um dos maiores sucessos da Amazon Prime em 2022 - aposta na hipótese da incorporação de pessoas por forças das trevas ao assumir um caso, ambientado na Espanha, no fim dos anos 1980, no qual uma viúva vinda dos EUA, Julia (Alex Essoe), tem seu caçula, Henry (Peter DeSouza-Feighoney), tomado por um diabrete cujos poderes desafiam a perspicácia dos clérigos do Vaticano. Numa decisão sábia da produção de elenco, o diretor aceitou trazer Franco Nero, o eterno Django, para encarnar o Sumo-Pontífice de Roma, o Papa, numa atuação vicejante, de arrancar lágrimas de qualquer cinéfilo. A dobradinha entre Nero e Crowe em cena, driblando lugares comuns, tem uma eficácia digna de Pelé e Garrincha nos gramados. É emocionante ver a simbiose entre o caubói nº 1 do western spaghetti com o Gladiador de Ridley Scott.

A fotografia de Khalid Mohtaseb amplia a força da narrativa dirigida por Julius Avery  

Além de criar uma narrativa espetaculosa, que gruda a plateia na poltrona, assustada, de olho arregalado, o filmaço de Avery ainda abre uma discussão necessária sobre o crimes da Igreja. A investigação comandada pelo sacerdote encarnado por Crowe aborda negligências (reais) do passado, fala sobre abusos sexuais de padres e analisa delitos oriundos da Santa Inquisição, o movimento repressor que é muito bem explicado no roteiro moldado por Michael Petroni e Evan Spiliotopoulos, a partir de um argumento de R. Dean McCreary, Chester Hastings e Jeff Katz, baseado nas memórias do próprio Amorth. Ainda inédito nos EUA, "The Pope's Exorcist" (seu título original) se candidata a blockbuster. É, desde já, uma das melhores surpresas do cinemão mais pipoca, com uma fotografia dionisíaca de Khalid Mohtaseb. Vale ressaltar que a dublagem brasileira é impecável.

Detalhe: David Gordon Green está preparando a retomada de "O Exorcista" (1973), com Linda Blair e Ellen Burstyn.

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