Coluna semanal do antropólogo Roberto DaMatta com reflexões sobre o Brasil

Opinião|Foi-se o tempo dos ‘países adiantados’. A globalização nos revela um planeta doente e finito


Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul e Hollywood esbanjava confiança no individualista estilo de vida americano. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias

Por Roberto DaMatta
Atualização:

“Países Adiantados”. Era como eu (e a torcida do Flamengo) me referia aos Estados Unidos e a algumas nações da Europa, em contraste com o persistente “atraso” do Brasil, visto como um utópico “país do futuro”.

Éramos ruins em tudo, menos em sermos retrógrados, em oposição a uma civilizada Argentina, que era a mais falada nação de nossa vizinhança. Quando, nos anos 1950, tio Marcelino voltou de excursão a Buenos Aires foi categórico: éramos um país de mestiços analfabetos! Buenos Aires só não foi Pasárgada porque meu tio estava com a mulher e o real não tem rima.

Esses eram tempos nos quais Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul. E Hollywood esbanjava confiança no dinâmico e individualista estilo de vida americano. Livros de viagem que garantiam o nosso atraso eram best-sellers. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias.

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O “mundo” era gigantesco e possuía a autossuficiência misteriosa e indecifrável das bolas, sinônimo de eternidade contida na inesgotável superfície das esferas. Quando se dizia que o nosso amor era “o maior do mundo”, éramos retribuídos com um sublime beijo na boca. Símbolo das promessas desse mundo majestoso e inesgotável.

Um contraparente nosso, o saudoso jornalista Roberto Gonzaga, foi aos Estados Unidos e nos visitou. Com inocência infantojuvenil, perguntamos se o que o cinema mostrava era verdade. Ah! O que os EUA representaram para esse Brasil que tinha “criadas”, não tinha banheiros públicos, importava trigo e manteiga, não fabricava automóveis e que os políticos assaltavam de pleno direito e com paradoxal e impecável compostura...

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O filho de um diplomata que morava na nossa rua trouxe de Nova York um assombroso revólver de faroeste e camisas coloridas que nossa inveja questionava se haviam sido compradas em lojas que vendiam artigo para homem.

A Times Square, famoso ponto turístico de Nova York, nos EUA. Foto: f11photo/adobe.stock

Haja ingenuidade. Uma lista de países impecáveis produzia inveja. Um amigo dizia ser francês em espírito. A nobre Inglaterra era invejada – seus reis não eram gordos – e uma duvidosa Alemanha era vista como feita de gênios, ao lado de uma Itália próxima demais. Tão familiar quanto seu Remo, nosso professor de canto orfeônico, Portugal era um piada de português.

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Hoje, a globalização nos esbofeteia, revelando um planeta doente e finito. Ela comprova a frase mais dura que jamais li quando eu, crente na perfeição de certos países e aprendiz de Antropologia Social – essa disciplina matriz das Ciências Ocultas e Letras Apagadas –, me confrontei abalado com a reflexão de Claude Lévi-Strauss, segundo a qual “não existe sociedade perfeita”.

Acho que todos concordamos que um mundo globalizado e ordinário revela sem rodeios a não existência de sistemas perfeitos, lâmpadas de Aladim e balas de prata. Estamos à mercê de nossas fantasias, intolerâncias, indecisões e hipocrisias...

“Países Adiantados”. Era como eu (e a torcida do Flamengo) me referia aos Estados Unidos e a algumas nações da Europa, em contraste com o persistente “atraso” do Brasil, visto como um utópico “país do futuro”.

Éramos ruins em tudo, menos em sermos retrógrados, em oposição a uma civilizada Argentina, que era a mais falada nação de nossa vizinhança. Quando, nos anos 1950, tio Marcelino voltou de excursão a Buenos Aires foi categórico: éramos um país de mestiços analfabetos! Buenos Aires só não foi Pasárgada porque meu tio estava com a mulher e o real não tem rima.

Esses eram tempos nos quais Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul. E Hollywood esbanjava confiança no dinâmico e individualista estilo de vida americano. Livros de viagem que garantiam o nosso atraso eram best-sellers. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias.

O “mundo” era gigantesco e possuía a autossuficiência misteriosa e indecifrável das bolas, sinônimo de eternidade contida na inesgotável superfície das esferas. Quando se dizia que o nosso amor era “o maior do mundo”, éramos retribuídos com um sublime beijo na boca. Símbolo das promessas desse mundo majestoso e inesgotável.

Um contraparente nosso, o saudoso jornalista Roberto Gonzaga, foi aos Estados Unidos e nos visitou. Com inocência infantojuvenil, perguntamos se o que o cinema mostrava era verdade. Ah! O que os EUA representaram para esse Brasil que tinha “criadas”, não tinha banheiros públicos, importava trigo e manteiga, não fabricava automóveis e que os políticos assaltavam de pleno direito e com paradoxal e impecável compostura...

O filho de um diplomata que morava na nossa rua trouxe de Nova York um assombroso revólver de faroeste e camisas coloridas que nossa inveja questionava se haviam sido compradas em lojas que vendiam artigo para homem.

A Times Square, famoso ponto turístico de Nova York, nos EUA. Foto: f11photo/adobe.stock

Haja ingenuidade. Uma lista de países impecáveis produzia inveja. Um amigo dizia ser francês em espírito. A nobre Inglaterra era invejada – seus reis não eram gordos – e uma duvidosa Alemanha era vista como feita de gênios, ao lado de uma Itália próxima demais. Tão familiar quanto seu Remo, nosso professor de canto orfeônico, Portugal era um piada de português.

Hoje, a globalização nos esbofeteia, revelando um planeta doente e finito. Ela comprova a frase mais dura que jamais li quando eu, crente na perfeição de certos países e aprendiz de Antropologia Social – essa disciplina matriz das Ciências Ocultas e Letras Apagadas –, me confrontei abalado com a reflexão de Claude Lévi-Strauss, segundo a qual “não existe sociedade perfeita”.

Acho que todos concordamos que um mundo globalizado e ordinário revela sem rodeios a não existência de sistemas perfeitos, lâmpadas de Aladim e balas de prata. Estamos à mercê de nossas fantasias, intolerâncias, indecisões e hipocrisias...

“Países Adiantados”. Era como eu (e a torcida do Flamengo) me referia aos Estados Unidos e a algumas nações da Europa, em contraste com o persistente “atraso” do Brasil, visto como um utópico “país do futuro”.

Éramos ruins em tudo, menos em sermos retrógrados, em oposição a uma civilizada Argentina, que era a mais falada nação de nossa vizinhança. Quando, nos anos 1950, tio Marcelino voltou de excursão a Buenos Aires foi categórico: éramos um país de mestiços analfabetos! Buenos Aires só não foi Pasárgada porque meu tio estava com a mulher e o real não tem rima.

Esses eram tempos nos quais Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul. E Hollywood esbanjava confiança no dinâmico e individualista estilo de vida americano. Livros de viagem que garantiam o nosso atraso eram best-sellers. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias.

O “mundo” era gigantesco e possuía a autossuficiência misteriosa e indecifrável das bolas, sinônimo de eternidade contida na inesgotável superfície das esferas. Quando se dizia que o nosso amor era “o maior do mundo”, éramos retribuídos com um sublime beijo na boca. Símbolo das promessas desse mundo majestoso e inesgotável.

Um contraparente nosso, o saudoso jornalista Roberto Gonzaga, foi aos Estados Unidos e nos visitou. Com inocência infantojuvenil, perguntamos se o que o cinema mostrava era verdade. Ah! O que os EUA representaram para esse Brasil que tinha “criadas”, não tinha banheiros públicos, importava trigo e manteiga, não fabricava automóveis e que os políticos assaltavam de pleno direito e com paradoxal e impecável compostura...

O filho de um diplomata que morava na nossa rua trouxe de Nova York um assombroso revólver de faroeste e camisas coloridas que nossa inveja questionava se haviam sido compradas em lojas que vendiam artigo para homem.

A Times Square, famoso ponto turístico de Nova York, nos EUA. Foto: f11photo/adobe.stock

Haja ingenuidade. Uma lista de países impecáveis produzia inveja. Um amigo dizia ser francês em espírito. A nobre Inglaterra era invejada – seus reis não eram gordos – e uma duvidosa Alemanha era vista como feita de gênios, ao lado de uma Itália próxima demais. Tão familiar quanto seu Remo, nosso professor de canto orfeônico, Portugal era um piada de português.

Hoje, a globalização nos esbofeteia, revelando um planeta doente e finito. Ela comprova a frase mais dura que jamais li quando eu, crente na perfeição de certos países e aprendiz de Antropologia Social – essa disciplina matriz das Ciências Ocultas e Letras Apagadas –, me confrontei abalado com a reflexão de Claude Lévi-Strauss, segundo a qual “não existe sociedade perfeita”.

Acho que todos concordamos que um mundo globalizado e ordinário revela sem rodeios a não existência de sistemas perfeitos, lâmpadas de Aladim e balas de prata. Estamos à mercê de nossas fantasias, intolerâncias, indecisões e hipocrisias...

“Países Adiantados”. Era como eu (e a torcida do Flamengo) me referia aos Estados Unidos e a algumas nações da Europa, em contraste com o persistente “atraso” do Brasil, visto como um utópico “país do futuro”.

Éramos ruins em tudo, menos em sermos retrógrados, em oposição a uma civilizada Argentina, que era a mais falada nação de nossa vizinhança. Quando, nos anos 1950, tio Marcelino voltou de excursão a Buenos Aires foi categórico: éramos um país de mestiços analfabetos! Buenos Aires só não foi Pasárgada porque meu tio estava com a mulher e o real não tem rima.

Esses eram tempos nos quais Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul. E Hollywood esbanjava confiança no dinâmico e individualista estilo de vida americano. Livros de viagem que garantiam o nosso atraso eram best-sellers. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias.

O “mundo” era gigantesco e possuía a autossuficiência misteriosa e indecifrável das bolas, sinônimo de eternidade contida na inesgotável superfície das esferas. Quando se dizia que o nosso amor era “o maior do mundo”, éramos retribuídos com um sublime beijo na boca. Símbolo das promessas desse mundo majestoso e inesgotável.

Um contraparente nosso, o saudoso jornalista Roberto Gonzaga, foi aos Estados Unidos e nos visitou. Com inocência infantojuvenil, perguntamos se o que o cinema mostrava era verdade. Ah! O que os EUA representaram para esse Brasil que tinha “criadas”, não tinha banheiros públicos, importava trigo e manteiga, não fabricava automóveis e que os políticos assaltavam de pleno direito e com paradoxal e impecável compostura...

O filho de um diplomata que morava na nossa rua trouxe de Nova York um assombroso revólver de faroeste e camisas coloridas que nossa inveja questionava se haviam sido compradas em lojas que vendiam artigo para homem.

A Times Square, famoso ponto turístico de Nova York, nos EUA. Foto: f11photo/adobe.stock

Haja ingenuidade. Uma lista de países impecáveis produzia inveja. Um amigo dizia ser francês em espírito. A nobre Inglaterra era invejada – seus reis não eram gordos – e uma duvidosa Alemanha era vista como feita de gênios, ao lado de uma Itália próxima demais. Tão familiar quanto seu Remo, nosso professor de canto orfeônico, Portugal era um piada de português.

Hoje, a globalização nos esbofeteia, revelando um planeta doente e finito. Ela comprova a frase mais dura que jamais li quando eu, crente na perfeição de certos países e aprendiz de Antropologia Social – essa disciplina matriz das Ciências Ocultas e Letras Apagadas –, me confrontei abalado com a reflexão de Claude Lévi-Strauss, segundo a qual “não existe sociedade perfeita”.

Acho que todos concordamos que um mundo globalizado e ordinário revela sem rodeios a não existência de sistemas perfeitos, lâmpadas de Aladim e balas de prata. Estamos à mercê de nossas fantasias, intolerâncias, indecisões e hipocrisias...

“Países Adiantados”. Era como eu (e a torcida do Flamengo) me referia aos Estados Unidos e a algumas nações da Europa, em contraste com o persistente “atraso” do Brasil, visto como um utópico “país do futuro”.

Éramos ruins em tudo, menos em sermos retrógrados, em oposição a uma civilizada Argentina, que era a mais falada nação de nossa vizinhança. Quando, nos anos 1950, tio Marcelino voltou de excursão a Buenos Aires foi categórico: éramos um país de mestiços analfabetos! Buenos Aires só não foi Pasárgada porque meu tio estava com a mulher e o real não tem rima.

Esses eram tempos nos quais Chicago tinha mais telefones que toda a América do Sul. E Hollywood esbanjava confiança no dinâmico e individualista estilo de vida americano. Livros de viagem que garantiam o nosso atraso eram best-sellers. Não havia essa comunicabilidade instantânea, reveladora das incertezas humanas, hoje tão óbvias.

O “mundo” era gigantesco e possuía a autossuficiência misteriosa e indecifrável das bolas, sinônimo de eternidade contida na inesgotável superfície das esferas. Quando se dizia que o nosso amor era “o maior do mundo”, éramos retribuídos com um sublime beijo na boca. Símbolo das promessas desse mundo majestoso e inesgotável.

Um contraparente nosso, o saudoso jornalista Roberto Gonzaga, foi aos Estados Unidos e nos visitou. Com inocência infantojuvenil, perguntamos se o que o cinema mostrava era verdade. Ah! O que os EUA representaram para esse Brasil que tinha “criadas”, não tinha banheiros públicos, importava trigo e manteiga, não fabricava automóveis e que os políticos assaltavam de pleno direito e com paradoxal e impecável compostura...

O filho de um diplomata que morava na nossa rua trouxe de Nova York um assombroso revólver de faroeste e camisas coloridas que nossa inveja questionava se haviam sido compradas em lojas que vendiam artigo para homem.

A Times Square, famoso ponto turístico de Nova York, nos EUA. Foto: f11photo/adobe.stock

Haja ingenuidade. Uma lista de países impecáveis produzia inveja. Um amigo dizia ser francês em espírito. A nobre Inglaterra era invejada – seus reis não eram gordos – e uma duvidosa Alemanha era vista como feita de gênios, ao lado de uma Itália próxima demais. Tão familiar quanto seu Remo, nosso professor de canto orfeônico, Portugal era um piada de português.

Hoje, a globalização nos esbofeteia, revelando um planeta doente e finito. Ela comprova a frase mais dura que jamais li quando eu, crente na perfeição de certos países e aprendiz de Antropologia Social – essa disciplina matriz das Ciências Ocultas e Letras Apagadas –, me confrontei abalado com a reflexão de Claude Lévi-Strauss, segundo a qual “não existe sociedade perfeita”.

Acho que todos concordamos que um mundo globalizado e ordinário revela sem rodeios a não existência de sistemas perfeitos, lâmpadas de Aladim e balas de prata. Estamos à mercê de nossas fantasias, intolerâncias, indecisões e hipocrisias...

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Opinião por Roberto DaMatta

É antropólogo social, escritor e autor de 'Fila e Democracia'

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