Coluna semanal do antropólogo Roberto DaMatta com reflexões sobre o Brasil

Opinião|Misto de ancestral e fantasma, reencontro, emocionado, minha juventude na aldeia Botica


Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua

Por Roberto DaMatta
Atualização:

Não foi por efeito literário que Claude Lévi-Strauss, o mais inspirado e admirável antropólogo de nossa época, abriu o livro Tristes Trópicos, em 1955, sentenciando: “Odeio as viagens e os exploradores”.

Frase paradoxal, uma vez que os “trópicos”, tristes ou alegres, exigem o deslocamento de um Velho Mundo inquestionavelmente civilizado para um novo mundo a ser domesticado nos moldes de uma visão europeia.

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Os exploradores mencionados neste texto são separados dos 'etnógrafos' - dos antropólogos sociais. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas, note bem: os exploradores mencionados nesta primeira página são separados dos “etnógrafos” - dos antropólogos sociais. Ambos viajam e experimentam conviver com os nativos, mas os exploradores ficam com o exótico como uma forma curiosa de inferioridade, ao passo que os etnógrafos tomam os locais não como um exemplo de atraso ou curiosidade, mas como alternativos.

Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua, o que contraria a perspectiva habitual acostumada a confirmar que nada se pode aprender com os “primitivos” - os que ainda “estão na Idade da Pedra”.

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No exercício do ofício de antropólogo, eu soneguei a aventura e concedi primazia à fortuna de procurar conhecer a organização social de uma humanidade diferente, mas absolutamente equivalente e, em certos pontos, mais bem ajustada do que a minha.

Um modo de existência que admite e usa a polaridade não para isolar, discriminar ou suprimir o outro, mas para concebê-lo como complementar, na complicada tarefa de dar sentido à vida e ao mundo. Assim, o dualismo que divide o grupo em “metades” serve para unificá-lo, do mesmo modo que o dia não deseja dominar a noite; ou o Sol apagar a Lua. A explicitação das oposições inibe o seu poder destrutivo, trazendo à tona sua evidente complementaridade.

*

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Essas um tanto pomposas abstrações estão sendo escritas da casa do chefe Zé da Doca - Tepkryt -, um líder dos nativos Apinajés, na aldeia Botica, ao lado da cidade de Tocantinópolis. No fundo da morada corre, com suas águas transparentes, o ribeirão do mesmo nome que me aguarda para o banho coletivo e alegre com os moradores da aldeia.

Fiz muitas viagens, mas nenhuma se compara com as do ano passado e de hoje. Jornadas nas quais o espaço traz de volta minha juventude, pois aqui estive pela primeira vez em 1963. Como a ordem social desses nativos foi alvo de meus estudos, eu aqui voltei pelo menos quatro vezes. Mas o meio século de ausência transformou-me num misto de ancestral e fantasma. Muitos me imaginavam morto. Hoje, ao lado do meu filho Renato e de minha mulher Christina, recebo honrarias entremeadas de profundas emoções. São as benesses dessas viagens que são a minha própria vida.

Não foi por efeito literário que Claude Lévi-Strauss, o mais inspirado e admirável antropólogo de nossa época, abriu o livro Tristes Trópicos, em 1955, sentenciando: “Odeio as viagens e os exploradores”.

Frase paradoxal, uma vez que os “trópicos”, tristes ou alegres, exigem o deslocamento de um Velho Mundo inquestionavelmente civilizado para um novo mundo a ser domesticado nos moldes de uma visão europeia.

Os exploradores mencionados neste texto são separados dos 'etnógrafos' - dos antropólogos sociais. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas, note bem: os exploradores mencionados nesta primeira página são separados dos “etnógrafos” - dos antropólogos sociais. Ambos viajam e experimentam conviver com os nativos, mas os exploradores ficam com o exótico como uma forma curiosa de inferioridade, ao passo que os etnógrafos tomam os locais não como um exemplo de atraso ou curiosidade, mas como alternativos.

Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua, o que contraria a perspectiva habitual acostumada a confirmar que nada se pode aprender com os “primitivos” - os que ainda “estão na Idade da Pedra”.

No exercício do ofício de antropólogo, eu soneguei a aventura e concedi primazia à fortuna de procurar conhecer a organização social de uma humanidade diferente, mas absolutamente equivalente e, em certos pontos, mais bem ajustada do que a minha.

Um modo de existência que admite e usa a polaridade não para isolar, discriminar ou suprimir o outro, mas para concebê-lo como complementar, na complicada tarefa de dar sentido à vida e ao mundo. Assim, o dualismo que divide o grupo em “metades” serve para unificá-lo, do mesmo modo que o dia não deseja dominar a noite; ou o Sol apagar a Lua. A explicitação das oposições inibe o seu poder destrutivo, trazendo à tona sua evidente complementaridade.

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Essas um tanto pomposas abstrações estão sendo escritas da casa do chefe Zé da Doca - Tepkryt -, um líder dos nativos Apinajés, na aldeia Botica, ao lado da cidade de Tocantinópolis. No fundo da morada corre, com suas águas transparentes, o ribeirão do mesmo nome que me aguarda para o banho coletivo e alegre com os moradores da aldeia.

Fiz muitas viagens, mas nenhuma se compara com as do ano passado e de hoje. Jornadas nas quais o espaço traz de volta minha juventude, pois aqui estive pela primeira vez em 1963. Como a ordem social desses nativos foi alvo de meus estudos, eu aqui voltei pelo menos quatro vezes. Mas o meio século de ausência transformou-me num misto de ancestral e fantasma. Muitos me imaginavam morto. Hoje, ao lado do meu filho Renato e de minha mulher Christina, recebo honrarias entremeadas de profundas emoções. São as benesses dessas viagens que são a minha própria vida.

Não foi por efeito literário que Claude Lévi-Strauss, o mais inspirado e admirável antropólogo de nossa época, abriu o livro Tristes Trópicos, em 1955, sentenciando: “Odeio as viagens e os exploradores”.

Frase paradoxal, uma vez que os “trópicos”, tristes ou alegres, exigem o deslocamento de um Velho Mundo inquestionavelmente civilizado para um novo mundo a ser domesticado nos moldes de uma visão europeia.

Os exploradores mencionados neste texto são separados dos 'etnógrafos' - dos antropólogos sociais. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas, note bem: os exploradores mencionados nesta primeira página são separados dos “etnógrafos” - dos antropólogos sociais. Ambos viajam e experimentam conviver com os nativos, mas os exploradores ficam com o exótico como uma forma curiosa de inferioridade, ao passo que os etnógrafos tomam os locais não como um exemplo de atraso ou curiosidade, mas como alternativos.

Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua, o que contraria a perspectiva habitual acostumada a confirmar que nada se pode aprender com os “primitivos” - os que ainda “estão na Idade da Pedra”.

No exercício do ofício de antropólogo, eu soneguei a aventura e concedi primazia à fortuna de procurar conhecer a organização social de uma humanidade diferente, mas absolutamente equivalente e, em certos pontos, mais bem ajustada do que a minha.

Um modo de existência que admite e usa a polaridade não para isolar, discriminar ou suprimir o outro, mas para concebê-lo como complementar, na complicada tarefa de dar sentido à vida e ao mundo. Assim, o dualismo que divide o grupo em “metades” serve para unificá-lo, do mesmo modo que o dia não deseja dominar a noite; ou o Sol apagar a Lua. A explicitação das oposições inibe o seu poder destrutivo, trazendo à tona sua evidente complementaridade.

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Essas um tanto pomposas abstrações estão sendo escritas da casa do chefe Zé da Doca - Tepkryt -, um líder dos nativos Apinajés, na aldeia Botica, ao lado da cidade de Tocantinópolis. No fundo da morada corre, com suas águas transparentes, o ribeirão do mesmo nome que me aguarda para o banho coletivo e alegre com os moradores da aldeia.

Fiz muitas viagens, mas nenhuma se compara com as do ano passado e de hoje. Jornadas nas quais o espaço traz de volta minha juventude, pois aqui estive pela primeira vez em 1963. Como a ordem social desses nativos foi alvo de meus estudos, eu aqui voltei pelo menos quatro vezes. Mas o meio século de ausência transformou-me num misto de ancestral e fantasma. Muitos me imaginavam morto. Hoje, ao lado do meu filho Renato e de minha mulher Christina, recebo honrarias entremeadas de profundas emoções. São as benesses dessas viagens que são a minha própria vida.

Não foi por efeito literário que Claude Lévi-Strauss, o mais inspirado e admirável antropólogo de nossa época, abriu o livro Tristes Trópicos, em 1955, sentenciando: “Odeio as viagens e os exploradores”.

Frase paradoxal, uma vez que os “trópicos”, tristes ou alegres, exigem o deslocamento de um Velho Mundo inquestionavelmente civilizado para um novo mundo a ser domesticado nos moldes de uma visão europeia.

Os exploradores mencionados neste texto são separados dos 'etnógrafos' - dos antropólogos sociais. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas, note bem: os exploradores mencionados nesta primeira página são separados dos “etnógrafos” - dos antropólogos sociais. Ambos viajam e experimentam conviver com os nativos, mas os exploradores ficam com o exótico como uma forma curiosa de inferioridade, ao passo que os etnógrafos tomam os locais não como um exemplo de atraso ou curiosidade, mas como alternativos.

Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua, o que contraria a perspectiva habitual acostumada a confirmar que nada se pode aprender com os “primitivos” - os que ainda “estão na Idade da Pedra”.

No exercício do ofício de antropólogo, eu soneguei a aventura e concedi primazia à fortuna de procurar conhecer a organização social de uma humanidade diferente, mas absolutamente equivalente e, em certos pontos, mais bem ajustada do que a minha.

Um modo de existência que admite e usa a polaridade não para isolar, discriminar ou suprimir o outro, mas para concebê-lo como complementar, na complicada tarefa de dar sentido à vida e ao mundo. Assim, o dualismo que divide o grupo em “metades” serve para unificá-lo, do mesmo modo que o dia não deseja dominar a noite; ou o Sol apagar a Lua. A explicitação das oposições inibe o seu poder destrutivo, trazendo à tona sua evidente complementaridade.

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Essas um tanto pomposas abstrações estão sendo escritas da casa do chefe Zé da Doca - Tepkryt -, um líder dos nativos Apinajés, na aldeia Botica, ao lado da cidade de Tocantinópolis. No fundo da morada corre, com suas águas transparentes, o ribeirão do mesmo nome que me aguarda para o banho coletivo e alegre com os moradores da aldeia.

Fiz muitas viagens, mas nenhuma se compara com as do ano passado e de hoje. Jornadas nas quais o espaço traz de volta minha juventude, pois aqui estive pela primeira vez em 1963. Como a ordem social desses nativos foi alvo de meus estudos, eu aqui voltei pelo menos quatro vezes. Mas o meio século de ausência transformou-me num misto de ancestral e fantasma. Muitos me imaginavam morto. Hoje, ao lado do meu filho Renato e de minha mulher Christina, recebo honrarias entremeadas de profundas emoções. São as benesses dessas viagens que são a minha própria vida.

Não foi por efeito literário que Claude Lévi-Strauss, o mais inspirado e admirável antropólogo de nossa época, abriu o livro Tristes Trópicos, em 1955, sentenciando: “Odeio as viagens e os exploradores”.

Frase paradoxal, uma vez que os “trópicos”, tristes ou alegres, exigem o deslocamento de um Velho Mundo inquestionavelmente civilizado para um novo mundo a ser domesticado nos moldes de uma visão europeia.

Os exploradores mencionados neste texto são separados dos 'etnógrafos' - dos antropólogos sociais. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Mas, note bem: os exploradores mencionados nesta primeira página são separados dos “etnógrafos” - dos antropólogos sociais. Ambos viajam e experimentam conviver com os nativos, mas os exploradores ficam com o exótico como uma forma curiosa de inferioridade, ao passo que os etnógrafos tomam os locais não como um exemplo de atraso ou curiosidade, mas como alternativos.

Se o explorador tem como base a aventura, Lévi-Strauss adverte que o antropólogo evita essa dimensão, pois o seu alvo é exorcizar um estilo de vida exótico numa ordem paralela à sua, o que contraria a perspectiva habitual acostumada a confirmar que nada se pode aprender com os “primitivos” - os que ainda “estão na Idade da Pedra”.

No exercício do ofício de antropólogo, eu soneguei a aventura e concedi primazia à fortuna de procurar conhecer a organização social de uma humanidade diferente, mas absolutamente equivalente e, em certos pontos, mais bem ajustada do que a minha.

Um modo de existência que admite e usa a polaridade não para isolar, discriminar ou suprimir o outro, mas para concebê-lo como complementar, na complicada tarefa de dar sentido à vida e ao mundo. Assim, o dualismo que divide o grupo em “metades” serve para unificá-lo, do mesmo modo que o dia não deseja dominar a noite; ou o Sol apagar a Lua. A explicitação das oposições inibe o seu poder destrutivo, trazendo à tona sua evidente complementaridade.

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Essas um tanto pomposas abstrações estão sendo escritas da casa do chefe Zé da Doca - Tepkryt -, um líder dos nativos Apinajés, na aldeia Botica, ao lado da cidade de Tocantinópolis. No fundo da morada corre, com suas águas transparentes, o ribeirão do mesmo nome que me aguarda para o banho coletivo e alegre com os moradores da aldeia.

Fiz muitas viagens, mas nenhuma se compara com as do ano passado e de hoje. Jornadas nas quais o espaço traz de volta minha juventude, pois aqui estive pela primeira vez em 1963. Como a ordem social desses nativos foi alvo de meus estudos, eu aqui voltei pelo menos quatro vezes. Mas o meio século de ausência transformou-me num misto de ancestral e fantasma. Muitos me imaginavam morto. Hoje, ao lado do meu filho Renato e de minha mulher Christina, recebo honrarias entremeadas de profundas emoções. São as benesses dessas viagens que são a minha própria vida.

Opinião por Roberto DaMatta

É antropólogo social, escritor e autor de 'Fila e Democracia'

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