Coluna semanal do antropólogo Roberto DaMatta com reflexões sobre o Brasil

Opinião|O horror ao universal: o geral nivelador nos irrita porque todos somos ‘especiais’


Todos os governos tocam nos mesmos problemas, sobretudo a corrupção. Roubos tanto à direita quanto à esquerda, porque, conforme se sabe, ‘ninguém é de ferro’. Em suma, tudo muda para não mudar

Por Roberto DaMatta

O horror ao universal: esse é, sem sombra de dúvida, o traço mais visível e retinente de nossa governabilidade. E, é claro, de nossa vida. Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas – que estudei com Alberto Junqueira em Fila e Democracia, de 2017 –, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores. O geral nivelador nos irrita porque todos somos “especiais”.

A lista das singularidades que diferenciam é inesgotável porque o sistema gira em torno de si mesmo e não em torno de um eixo de projetos e avanços capaz de ancorá-lo. Todos os governos tocam nos mesmos problemas – previdência, inflação, filhotismo político, ajuste de contas públicas, pobreza, crime organizado, saúde e, sobretudo, a chaga perpétua das mais diversas governanças: a corrupção. Roubos tanto à direita quanto à esquerda, porque, conforme se sabe, “ninguém é de ferro”.

Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores.  Foto: Zoe/Adobe Stock
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Em suma, tudo muda para não mudar. Inaugurar novos estilos de administrar implica necessariamente em regras gerais e no respeito de todos pelas mesmas leis. Coisa difícil em um País das prerrogativas que aristocratizam os eleitos pelo povo. Pessoas que se elegem como Zé Ninguém moram em palácios e tem a vassalagem de uma Versalhes. É claro que odeiam o capitalismo, que a todo momento inventa um troço que desbanca outro troço, esmagando empresas concorrentes. A raiva não é do sistema, mas do dinamismo do mercado, esse espaço universal da oferta e procura no qual se garante a liberdade de escolha.

Odiando a competição, muitos temem o diabólico capitalismo e abraçam – que o diga Raymundo Faoro – o velho e bom patrimonialismo. Nele, tudo é exceção. Em todo lugar há o caso especial que legitima e engendra protegidos. Visto como um todo, o sistema jamais cogita abandonar o eixo hierárquico. O que ele mais teme é a universalidade e a igualdade que um estilo de vida moderno e globalizado por intensa comunicabilidade de todos com (e contra) todos produziu.

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Curioso e patético ver uma multidão de privilegiados transformando o republicanismo na velha aristocracia luso-nacional das cidadanias reguladas, como disse um saudoso Wanderley Guilherme. Tudo regulado, tudo hierarquizado. Tudo legislado e, portanto, “legal”!

Papai só toma café sem açúcar, o presidente elegantemente anuncia não ser idoso porque tem “tesão de vinte”. Eu, com meus oitenta e tantos, invejo. Ademais, ele é o supremo magistrado da nação e eu um cronista marginal...

Na terra dos papagaios, o universal, o princípio irredutível, é a exceção. Odeia-se a universidade e a igualdade das regras que controlam a isenção de leis e condutas. Nesse contexto, o Plano Real é um milagre. Recuperou o universalismo, sem o qual o velho sistema de escravaria, casta e anistia permaneceria.

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PS: a tentativa de assassinar Trump produz o inesperado que faz bandido virar vítima. Seria a tal “brasilianização”?

O horror ao universal: esse é, sem sombra de dúvida, o traço mais visível e retinente de nossa governabilidade. E, é claro, de nossa vida. Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas – que estudei com Alberto Junqueira em Fila e Democracia, de 2017 –, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores. O geral nivelador nos irrita porque todos somos “especiais”.

A lista das singularidades que diferenciam é inesgotável porque o sistema gira em torno de si mesmo e não em torno de um eixo de projetos e avanços capaz de ancorá-lo. Todos os governos tocam nos mesmos problemas – previdência, inflação, filhotismo político, ajuste de contas públicas, pobreza, crime organizado, saúde e, sobretudo, a chaga perpétua das mais diversas governanças: a corrupção. Roubos tanto à direita quanto à esquerda, porque, conforme se sabe, “ninguém é de ferro”.

Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores.  Foto: Zoe/Adobe Stock

Em suma, tudo muda para não mudar. Inaugurar novos estilos de administrar implica necessariamente em regras gerais e no respeito de todos pelas mesmas leis. Coisa difícil em um País das prerrogativas que aristocratizam os eleitos pelo povo. Pessoas que se elegem como Zé Ninguém moram em palácios e tem a vassalagem de uma Versalhes. É claro que odeiam o capitalismo, que a todo momento inventa um troço que desbanca outro troço, esmagando empresas concorrentes. A raiva não é do sistema, mas do dinamismo do mercado, esse espaço universal da oferta e procura no qual se garante a liberdade de escolha.

Odiando a competição, muitos temem o diabólico capitalismo e abraçam – que o diga Raymundo Faoro – o velho e bom patrimonialismo. Nele, tudo é exceção. Em todo lugar há o caso especial que legitima e engendra protegidos. Visto como um todo, o sistema jamais cogita abandonar o eixo hierárquico. O que ele mais teme é a universalidade e a igualdade que um estilo de vida moderno e globalizado por intensa comunicabilidade de todos com (e contra) todos produziu.

Curioso e patético ver uma multidão de privilegiados transformando o republicanismo na velha aristocracia luso-nacional das cidadanias reguladas, como disse um saudoso Wanderley Guilherme. Tudo regulado, tudo hierarquizado. Tudo legislado e, portanto, “legal”!

Papai só toma café sem açúcar, o presidente elegantemente anuncia não ser idoso porque tem “tesão de vinte”. Eu, com meus oitenta e tantos, invejo. Ademais, ele é o supremo magistrado da nação e eu um cronista marginal...

Na terra dos papagaios, o universal, o princípio irredutível, é a exceção. Odeia-se a universidade e a igualdade das regras que controlam a isenção de leis e condutas. Nesse contexto, o Plano Real é um milagre. Recuperou o universalismo, sem o qual o velho sistema de escravaria, casta e anistia permaneceria.

PS: a tentativa de assassinar Trump produz o inesperado que faz bandido virar vítima. Seria a tal “brasilianização”?

O horror ao universal: esse é, sem sombra de dúvida, o traço mais visível e retinente de nossa governabilidade. E, é claro, de nossa vida. Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas – que estudei com Alberto Junqueira em Fila e Democracia, de 2017 –, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores. O geral nivelador nos irrita porque todos somos “especiais”.

A lista das singularidades que diferenciam é inesgotável porque o sistema gira em torno de si mesmo e não em torno de um eixo de projetos e avanços capaz de ancorá-lo. Todos os governos tocam nos mesmos problemas – previdência, inflação, filhotismo político, ajuste de contas públicas, pobreza, crime organizado, saúde e, sobretudo, a chaga perpétua das mais diversas governanças: a corrupção. Roubos tanto à direita quanto à esquerda, porque, conforme se sabe, “ninguém é de ferro”.

Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores.  Foto: Zoe/Adobe Stock

Em suma, tudo muda para não mudar. Inaugurar novos estilos de administrar implica necessariamente em regras gerais e no respeito de todos pelas mesmas leis. Coisa difícil em um País das prerrogativas que aristocratizam os eleitos pelo povo. Pessoas que se elegem como Zé Ninguém moram em palácios e tem a vassalagem de uma Versalhes. É claro que odeiam o capitalismo, que a todo momento inventa um troço que desbanca outro troço, esmagando empresas concorrentes. A raiva não é do sistema, mas do dinamismo do mercado, esse espaço universal da oferta e procura no qual se garante a liberdade de escolha.

Odiando a competição, muitos temem o diabólico capitalismo e abraçam – que o diga Raymundo Faoro – o velho e bom patrimonialismo. Nele, tudo é exceção. Em todo lugar há o caso especial que legitima e engendra protegidos. Visto como um todo, o sistema jamais cogita abandonar o eixo hierárquico. O que ele mais teme é a universalidade e a igualdade que um estilo de vida moderno e globalizado por intensa comunicabilidade de todos com (e contra) todos produziu.

Curioso e patético ver uma multidão de privilegiados transformando o republicanismo na velha aristocracia luso-nacional das cidadanias reguladas, como disse um saudoso Wanderley Guilherme. Tudo regulado, tudo hierarquizado. Tudo legislado e, portanto, “legal”!

Papai só toma café sem açúcar, o presidente elegantemente anuncia não ser idoso porque tem “tesão de vinte”. Eu, com meus oitenta e tantos, invejo. Ademais, ele é o supremo magistrado da nação e eu um cronista marginal...

Na terra dos papagaios, o universal, o princípio irredutível, é a exceção. Odeia-se a universidade e a igualdade das regras que controlam a isenção de leis e condutas. Nesse contexto, o Plano Real é um milagre. Recuperou o universalismo, sem o qual o velho sistema de escravaria, casta e anistia permaneceria.

PS: a tentativa de assassinar Trump produz o inesperado que faz bandido virar vítima. Seria a tal “brasilianização”?

O horror ao universal: esse é, sem sombra de dúvida, o traço mais visível e retinente de nossa governabilidade. E, é claro, de nossa vida. Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas – que estudei com Alberto Junqueira em Fila e Democracia, de 2017 –, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores. O geral nivelador nos irrita porque todos somos “especiais”.

A lista das singularidades que diferenciam é inesgotável porque o sistema gira em torno de si mesmo e não em torno de um eixo de projetos e avanços capaz de ancorá-lo. Todos os governos tocam nos mesmos problemas – previdência, inflação, filhotismo político, ajuste de contas públicas, pobreza, crime organizado, saúde e, sobretudo, a chaga perpétua das mais diversas governanças: a corrupção. Roubos tanto à direita quanto à esquerda, porque, conforme se sabe, “ninguém é de ferro”.

Seja em casa ou na rua, na escola ou no shopping, na estrada ou na calçada, e, muito especialmente, nas filas, buscamos a exceção que nos refaz como nobres e superiores.  Foto: Zoe/Adobe Stock

Em suma, tudo muda para não mudar. Inaugurar novos estilos de administrar implica necessariamente em regras gerais e no respeito de todos pelas mesmas leis. Coisa difícil em um País das prerrogativas que aristocratizam os eleitos pelo povo. Pessoas que se elegem como Zé Ninguém moram em palácios e tem a vassalagem de uma Versalhes. É claro que odeiam o capitalismo, que a todo momento inventa um troço que desbanca outro troço, esmagando empresas concorrentes. A raiva não é do sistema, mas do dinamismo do mercado, esse espaço universal da oferta e procura no qual se garante a liberdade de escolha.

Odiando a competição, muitos temem o diabólico capitalismo e abraçam – que o diga Raymundo Faoro – o velho e bom patrimonialismo. Nele, tudo é exceção. Em todo lugar há o caso especial que legitima e engendra protegidos. Visto como um todo, o sistema jamais cogita abandonar o eixo hierárquico. O que ele mais teme é a universalidade e a igualdade que um estilo de vida moderno e globalizado por intensa comunicabilidade de todos com (e contra) todos produziu.

Curioso e patético ver uma multidão de privilegiados transformando o republicanismo na velha aristocracia luso-nacional das cidadanias reguladas, como disse um saudoso Wanderley Guilherme. Tudo regulado, tudo hierarquizado. Tudo legislado e, portanto, “legal”!

Papai só toma café sem açúcar, o presidente elegantemente anuncia não ser idoso porque tem “tesão de vinte”. Eu, com meus oitenta e tantos, invejo. Ademais, ele é o supremo magistrado da nação e eu um cronista marginal...

Na terra dos papagaios, o universal, o princípio irredutível, é a exceção. Odeia-se a universidade e a igualdade das regras que controlam a isenção de leis e condutas. Nesse contexto, o Plano Real é um milagre. Recuperou o universalismo, sem o qual o velho sistema de escravaria, casta e anistia permaneceria.

PS: a tentativa de assassinar Trump produz o inesperado que faz bandido virar vítima. Seria a tal “brasilianização”?

Opinião por Roberto DaMatta

É antropólogo social, escritor e autor de 'Fila e Democracia'

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