Coluna quinzenal do jornalista e escritor Sérgio Augusto sobre literatura

Opinião|Por acreditar no apocalipse, retorno à questão: como e quando se deu a aurora do mundo?


Um big-bang? Um coruscante raio de luz, acompanhado da voz de Deus? Um tremendo son & lumière, infelizmente sem plateia? Cientistas ainda fazem cálculos.

Por Sérgio Augusto

Como escrevo esta lereia na quinta-feira, sem saber se a candidatura de Joe Biden já kaput ou ainda não kaput, só me resta bocejar diante de outras questões relevantes, igualmente irrespondidas e com mais tempo de assombração em nossos pesadelos, opção que reputo criteriosa, para dizer o mínimo – e, quem sabe, até o máximo.

Muitos dos que têm Trump como o Anticristo e certa a sua reeleição talvez estejam agora a se perguntar se conseguiremos sobreviver a um segundo trumpanato ou seremos mesmo aniquilados por um acúmulo de cataclismos climáticos. Por acreditar que o apocalipse, climático ou trumpista, não é para o meu tempo e me desagradar a hipótese de chegar ao fim sem conhecer direito o nosso começo, retorno à questão primordial: como e quando, exatamente, se deu a aurora do mundo?

Um big-bang? Um coruscante raio de luz, acompanhado da voz de Deus? Um tremendo son & lumière, infelizmente sem plateia? Cientistas ainda fazem cálculos. Lutero, que não era cientista, fez as suas contas – e errou. No século 17, o arcebispo irlandês James Usher teve o desplante de apresentar uma data precisa para o nascimento disso que aí ainda está: 23 de outubro de 4.004 a.C., às 18h. Só muito depois alguém o contestou. Após investigações, dr. John Lightfoot, vice-reitor da Universidade de Cambridge, concluiu que o mundo não nasceu às 6 da tarde – e sim às 4 da manhã, a mesma hora em que saía de casa pro batente o Zé Marmita daquela marchinha consagrada por Marlene no carnaval de 1953.

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Se não sabemos com exatidão quando e de que forma o mundo surgiu, como não duvidar do que por aí contam a respeito da origem do ser humano sem conjunção carnal? Se Adão veio do barro e Eva, da costela de Adão, o casal com umbigo que você andou vendo em pinturas e naquele épico bíblico filmado por John Huston era falso.

Quanto à história da maçã, foi a primeira metáfora que a humanidade conheceu. Ou o primeiro episódio da Bíblia com cena de sexo implícito. Em cima de outra marchinha carnavalesca, esta lançada por Jorge Veiga, no carnaval de 1954, a molecada da época fez uma paródia do que parece ter ocorrido no Paraíso depois de Adão descobrir o que se ocultava atrás da folha de parreira de Eva: “A história da maçã / é pura safadeza. Adão comeu a Eva / e a maçã de sobremesa”.

Como não podia deixar de ser, Adão também foi o primeiro homem a ter uma ereção. Eis outra questão transcendental. Hoje qualquer um sabe que mistérios há por trás de uma ereção. Mas, se embarcássemos numa máquina do tempo e fôssemos bater na Grécia do século 4.º a.C., ficaríamos chocados com o que então se falava sobre a intumescência peniana. Para Aristóteles, a ereção era fruto da ação de uma série de verduras, legumes e frutos do mar no organismo humano. Se o grande filósofo da Grécia explicava a ereção nesses termos, imagine que explicações o populacho local dava à menstruação.

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Céu estrelado na cidade de Tartarugalzinho, no Amapá, durante apagão elétrico em 2020 Foto: Dida Sampaio/Estadão

Como escrevo esta lereia na quinta-feira, sem saber se a candidatura de Joe Biden já kaput ou ainda não kaput, só me resta bocejar diante de outras questões relevantes, igualmente irrespondidas e com mais tempo de assombração em nossos pesadelos, opção que reputo criteriosa, para dizer o mínimo – e, quem sabe, até o máximo.

Muitos dos que têm Trump como o Anticristo e certa a sua reeleição talvez estejam agora a se perguntar se conseguiremos sobreviver a um segundo trumpanato ou seremos mesmo aniquilados por um acúmulo de cataclismos climáticos. Por acreditar que o apocalipse, climático ou trumpista, não é para o meu tempo e me desagradar a hipótese de chegar ao fim sem conhecer direito o nosso começo, retorno à questão primordial: como e quando, exatamente, se deu a aurora do mundo?

Um big-bang? Um coruscante raio de luz, acompanhado da voz de Deus? Um tremendo son & lumière, infelizmente sem plateia? Cientistas ainda fazem cálculos. Lutero, que não era cientista, fez as suas contas – e errou. No século 17, o arcebispo irlandês James Usher teve o desplante de apresentar uma data precisa para o nascimento disso que aí ainda está: 23 de outubro de 4.004 a.C., às 18h. Só muito depois alguém o contestou. Após investigações, dr. John Lightfoot, vice-reitor da Universidade de Cambridge, concluiu que o mundo não nasceu às 6 da tarde – e sim às 4 da manhã, a mesma hora em que saía de casa pro batente o Zé Marmita daquela marchinha consagrada por Marlene no carnaval de 1953.

Se não sabemos com exatidão quando e de que forma o mundo surgiu, como não duvidar do que por aí contam a respeito da origem do ser humano sem conjunção carnal? Se Adão veio do barro e Eva, da costela de Adão, o casal com umbigo que você andou vendo em pinturas e naquele épico bíblico filmado por John Huston era falso.

Quanto à história da maçã, foi a primeira metáfora que a humanidade conheceu. Ou o primeiro episódio da Bíblia com cena de sexo implícito. Em cima de outra marchinha carnavalesca, esta lançada por Jorge Veiga, no carnaval de 1954, a molecada da época fez uma paródia do que parece ter ocorrido no Paraíso depois de Adão descobrir o que se ocultava atrás da folha de parreira de Eva: “A história da maçã / é pura safadeza. Adão comeu a Eva / e a maçã de sobremesa”.

Como não podia deixar de ser, Adão também foi o primeiro homem a ter uma ereção. Eis outra questão transcendental. Hoje qualquer um sabe que mistérios há por trás de uma ereção. Mas, se embarcássemos numa máquina do tempo e fôssemos bater na Grécia do século 4.º a.C., ficaríamos chocados com o que então se falava sobre a intumescência peniana. Para Aristóteles, a ereção era fruto da ação de uma série de verduras, legumes e frutos do mar no organismo humano. Se o grande filósofo da Grécia explicava a ereção nesses termos, imagine que explicações o populacho local dava à menstruação.

Céu estrelado na cidade de Tartarugalzinho, no Amapá, durante apagão elétrico em 2020 Foto: Dida Sampaio/Estadão

Como escrevo esta lereia na quinta-feira, sem saber se a candidatura de Joe Biden já kaput ou ainda não kaput, só me resta bocejar diante de outras questões relevantes, igualmente irrespondidas e com mais tempo de assombração em nossos pesadelos, opção que reputo criteriosa, para dizer o mínimo – e, quem sabe, até o máximo.

Muitos dos que têm Trump como o Anticristo e certa a sua reeleição talvez estejam agora a se perguntar se conseguiremos sobreviver a um segundo trumpanato ou seremos mesmo aniquilados por um acúmulo de cataclismos climáticos. Por acreditar que o apocalipse, climático ou trumpista, não é para o meu tempo e me desagradar a hipótese de chegar ao fim sem conhecer direito o nosso começo, retorno à questão primordial: como e quando, exatamente, se deu a aurora do mundo?

Um big-bang? Um coruscante raio de luz, acompanhado da voz de Deus? Um tremendo son & lumière, infelizmente sem plateia? Cientistas ainda fazem cálculos. Lutero, que não era cientista, fez as suas contas – e errou. No século 17, o arcebispo irlandês James Usher teve o desplante de apresentar uma data precisa para o nascimento disso que aí ainda está: 23 de outubro de 4.004 a.C., às 18h. Só muito depois alguém o contestou. Após investigações, dr. John Lightfoot, vice-reitor da Universidade de Cambridge, concluiu que o mundo não nasceu às 6 da tarde – e sim às 4 da manhã, a mesma hora em que saía de casa pro batente o Zé Marmita daquela marchinha consagrada por Marlene no carnaval de 1953.

Se não sabemos com exatidão quando e de que forma o mundo surgiu, como não duvidar do que por aí contam a respeito da origem do ser humano sem conjunção carnal? Se Adão veio do barro e Eva, da costela de Adão, o casal com umbigo que você andou vendo em pinturas e naquele épico bíblico filmado por John Huston era falso.

Quanto à história da maçã, foi a primeira metáfora que a humanidade conheceu. Ou o primeiro episódio da Bíblia com cena de sexo implícito. Em cima de outra marchinha carnavalesca, esta lançada por Jorge Veiga, no carnaval de 1954, a molecada da época fez uma paródia do que parece ter ocorrido no Paraíso depois de Adão descobrir o que se ocultava atrás da folha de parreira de Eva: “A história da maçã / é pura safadeza. Adão comeu a Eva / e a maçã de sobremesa”.

Como não podia deixar de ser, Adão também foi o primeiro homem a ter uma ereção. Eis outra questão transcendental. Hoje qualquer um sabe que mistérios há por trás de uma ereção. Mas, se embarcássemos numa máquina do tempo e fôssemos bater na Grécia do século 4.º a.C., ficaríamos chocados com o que então se falava sobre a intumescência peniana. Para Aristóteles, a ereção era fruto da ação de uma série de verduras, legumes e frutos do mar no organismo humano. Se o grande filósofo da Grécia explicava a ereção nesses termos, imagine que explicações o populacho local dava à menstruação.

Céu estrelado na cidade de Tartarugalzinho, no Amapá, durante apagão elétrico em 2020 Foto: Dida Sampaio/Estadão
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É jornalista, escritor e autor de 'Esse Mundo é um Pandeiro', entre outros

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