Durante as três primeiras temporadas de Insecure, os sentimentos de Issa Rae, sua criadora, roteirista e protagonista, foram mudando. “Na primeira era: ‘incrível, vou ter uma série no ar, mas, se não funcionar, tudo bem, fiz o meu melhor’”, disse ela em entrevista por telefone ao Estado – em razão da pandemia de covid-19, os contatos pessoais entre jornalistas e artistas, claro, foram suspensos.
“Na segunda, era: ‘que legal, as pessoas amaram o show!’ Mas, na terceira, eu estava cansada, trabalhando três anos em Insecure, sem intervalo. Queria ver o que mais poderia fazer.” A parada de um ano e meio serviu para atuar em alguns filmes, estar mais presente em sua produtora e ficar novamente empolgada e grata de voltar a Issa, Molly e outros personagens da série, que estreou sua quarta temporada ontem, na HBO.
“Tirar essa folga foi fundamental. Muitas das histórias que usamos vêm das nossas vidas pessoais, e eu sentia que não estava vivendo”, disse Rae. Também foi uma boa época para colocar a cabeça no lugar em relação a críticas que vinha recebendo. “Eu sempre quis que Insecure mostrasse facetas diferentes da experiência de ser negro”, contou. “Eu esperava que, a essa altura, houvesse muito mais séries fazendo isso, mas não foram tantas. E, quanto mais você fica sob os holofotes, mais as pessoas esperam que a experiência seja uma determinada coisa.”
Rae disse acreditar que recebeu muitas críticas injustas sobre a maneira “como retratamos a experiência de ser negro”. “Por exemplo, teve a polêmica dos preservativos. Muitas séries têm cenas de sexo, e ninguém precisa ficar mostrando como usar camisinha. Por que a cobrança com a gente? Eu ouço e absorvo algumas coisas, mas, às vezes, há muita pressão.”
Na terceira temporada (atenção para os spoilers), Issa Dee (Issa Rae) finalmente pediu demissão do emprego que não a satisfazia, disse que não tinha gostado de uma atitude de sua melhor amiga Molly (Yvonne Orji) e recusou a desculpa de seu namorado Nathan (Kendrick Sampson) pelo sumiço de semanas, preferindo ficar sozinha. Sinais de que Issa, a personagem, está ficando menos insegura. “Ela percebeu que estava confiando em outras pessoas para definir quem era. Agora, finalmente vai poder descobrir quais são suas paixões, vai fazer algo que ama. Isso tudo é fundamental para ela descobrir quem é e por qual caminho deseja seguir.”
O relacionamento de Issa e Molly é um dos assuntos principais dos novos episódios. “Falamos muito sobre se pessoas estão na sua vida por uma razão ou uma estação”, disse. O público também vai ter a oportunidade de finalmente conhecer a mãe de Issa, interpretada por Wendy Raquel Robinson. “No passado, a personagem só falava da família. Nunca conhecemos ninguém a não ser seu irmão. Mas esta temporada tem muito a ver com seu mundo desmoronando, ela definindo quem é, achei que era a hora ideal para apresentar sua mãe.”
Curiosamente, enquanto sua personagem fica menos insegura, Issa Rae disse que está mais. “Eu sempre fui muito autoconfiante e faço o que amo. Mas, quanto mais embarco em projetos que sinto que posso fazer bem, mais insegura eu fico porque amo tanto que tenho medo de perder tudo.”
Além da série, ela tem uma produtora e um selo musical e está abrindo um café em Inglewood, um bairro tradicionalmente de grande população negra que está gentrificando rapidamente. “Eu tenho oportunidade de produzir o conteúdo que quero ver, ser uma artista e dar oportunidade a outros artistas. Isso me motiva demais. E voltei a Insecure super empolgada.”
A única coisa estranha é estrear bem no meio da pandemia. “Eu acho esquisito promover a série agora. Normalmente fazemos festas e reunimos os roteiristas para assistir aos episódios. Mas as pessoas estão aguardando com ansiedade a estreia, dizendo que vai ser um alívio nessa loucura. Que bom. Ainda assim, não é o ideal.”