Uma pequena cidade é abalada por um crime brutal, dando início a uma investigação. Na superfície, Mare of Easttown não parece trazer nada de novo. Mas os detalhes fazem toda a diferença na minissérie criada por Brad Ingelsby (O Caminho de Volta) e dirigida por Craig Zobel (The Leftovers), que estreou no domingo, 18, e está na programação da HBO e HBO Go.
A Mare do título é uma personagem com muitas nuances, realçadas pela escalação de Kate Winslet para interpretá-la. Ela é uma detetive sem tempo para rodeios da pequena Easttown, no Estado da Pensilvânia. “Foi um dos maiores desafios da minha carreira, porque ela não tem nada a ver comigo”, disse Winslet, em entrevista a jornalistas durante evento da Associação de Críticos de Televisão, que foi realizado virtualmente por conta da pandemia. “Foi aterrorizante de um jeito bom, se você é uma atriz como eu que gosta de se sentir apavorada e exposta”, completou, entre risos. Winslet afirmou que seria péssima detetive. “Eu jamais poderia fazer o que Mare faz. Mas seria ótima no cafezinho e nas cervejas depois do expediente”, brincou. Ela passou alguns dias com policiais da cidade de Easttown e teve consultoria da detetive Christine Bleiler. “Ela sempre falava: ‘Hum, não, isso é o que eles fazem na TV’”, contou a divertida Winslet. “Christine sempre frisava que muitas situações são confusas, tem coisa que dá errado, que a algema cai no chão. Que não é perfeito mesmo.” A atriz, que concorreu sete vezes ao Oscar, ganhando por O Leitor, em 2009, e venceu o Emmy por Mildred Pierce, da mesma HBO, identificou-se, porém, com uma faceta de sua personagem: sua relação com a família e a capacidade de admitir seus erros. “Ela tenta manter a coesão familiar a todo custo e corrigir seus erros, mesmo sendo uma pessoa de difícil convivência.” Há uma tragédia no passado de Mare Sheehan, revelada aos poucos. Ela mora numa casa com a filha adolescente Siobhan (Angourie Rice), a mãe Helen (Jean Smart, indicada para o Emmy por Watchmen) e o neto pequeno. Mare é separada do marido, Frank (David Denman), que está se casando com outra mulher. O padre Dan Hastings (Neal Huff) sempre está por perto para provocar Mare daquele jeito que só os primos podem fazer. Helen também não deixa barato. O elenco tem outros nomes fortes, como Julianne Nicholson no papel de Lori, amiga de infância de Mare, e Guy Pearce, que interpreta um professor que acabou de se mudar para a cidade. Fora o trabalho como detetive, Kate Winslet, que é inglesa, precisou aprender o específico sotaque conhecido como Delco, daquela região da Pensilvânia. A atriz está acostumada com sotaques, mas quase desistiu. “Foi um dos três mais difíceis que fiz”, contou. “Quase enlouqueci, cheguei a jogar coisas na parede.” Mas era importante acertar. Mare of Easttown é tanto um retrato de uma personagem quanto a radiografia de uma comunidade, como indica o título. A minissérie coloca o espectador nas ruas de sobe e desce, com casinhas alinhadas em ambos os lados. Easttown é uma daquelas pequenas cidades da região com moradores da classe trabalhadora, que sofreram com as crises econômicas recentes. É um daqueles lugares onde todo mundo conhece todo mundo. Onde a senhorinha liga diretamente para Mare em vez de telefonar para a delegacia quando há um pequeno problema. Onde ela conhece o rapaz que, para comprar drogas, invade e rouba a casa da irmã, que já não aguenta mais. O criador e o diretor são muito hábeis em transferir para a tela a atmosfera local. “Eu cresci ali”, explicou Ingelsby. “E nós dissemos para a HBO logo no início que tínhamos de gravar lá, e eles apoiaram a decisão. Realmente, é como se fosse um personagem que adiciona profundidade e autenticidade à história.” Winslet mergulhou no lugarejo de 10 mil habitantes e ficou íntima da Wawa, uma rede de lojas de conveniência típica da região. Ela se rendeu ao sanduíche Gobbler, que é um peru do Dia de Ação de Graças em forma de sanduíche. “O Evan Peters (que faz o detetive Colin Zabel) ficou obcecado e me disse que era para entrar em coma alimentar. Então, tive a experiência completa do Delco”, disse a atriz, referindo-se ao apelido dado àquela parte dos Estados Unidos. Para ela, é assim que se faz. “Não importa há quanto tempo estou fazendo esse trabalho, não dá para me apoiar em glórias do passado”, disse. “O público nota se você foi preguiçosa e não se comprometeu com o negócio.” Na televisão, ela acha ainda mais sério. “Você entra na casa das pessoas. É uma honra, e é preciso corresponder. Então eu trabalho duro, enfrento o medo e vou adiante.”