THE NEW YORK TIMES - Muitos dos maiores mistérios não resolvidos de O Senhor dos Anéis, a extensa trilogia de J.R.R. Tolkien, resultaram dos menores pedaços de textos que ele deixou para trás: uma linha aqui, um comentário ali, uma pequena análise que levantou uma questão que ele nunca respondeu antes de morrer, em 1973.
Depois de seis episódios, a série da Amazon Os Anéis do Poder, ambientada antes da trilogia de Tolkien e extraída de detalhes em seus seis apêndices, parece disposta a resolver alguns deles, até mesmo questões antigas sobre a origem dos orcs, o destino dos Magos Azuis e o que Sauron fez durante os séculos após a derrota de Morgoth.
É muito provável que essas respostas terão relação com vários personagens misteriosos da série - personagens que, até agora, não são familiares nem mesmo para os maiores especialistas em Tolkien. Quem é Adar? Quem é Halbrand? Quem é o forasteiro que caiu do céu? E aquelas três sacerdotisas sinistras?
Todo mundo deve estar se perguntando o que despertou na escuridão; com apenas dois episódios restantes na primeira temporada, suas verdadeiras identidades ainda são desconhecidas. Aqui vão algumas teorias que podem iluminar as coisas.
O homem que caiu na Terra Média
Não faltam teorias sobre o confuso viajante celestial conhecido por muitos simplesmente como forasteiro (Daniel Weyman), ou mais carinhosamente como Homem do Meteoro. Alguns dizem que ele é Sauron, ou um Balrog, ou Tilion - ou mesmo Gandalf.
Esta última possibilidade tem apelo emocional. Além disso, ele viajou de meteoro: com certeza, deve ser um Maiar - que, como Gandalf explica mais tarde, se originam no reino espiritual antes de chegar à Terra Média em forma física. A forma corpórea muito recente poderia explicar sua dificuldade em controlar seus imensos poderes mágicos. (Uma de suas habilidades especiais é conjurar feitiços na língua élfica Quenya, como o encantamento de cura/renovação envinyanta).
Essa característica lembra magos, ou Istari, como Gandalf, o Cinzento, Saruman, o Branco e Radagast, o Marrom, mas a maioria só chega à saga de Tolkien na Terceira Era. Existem outros dois nesta mesma ordem, porém, e eles podem estar na Terra Média já na Segunda Era, época de Anéis de Poder. São os Magos Azuis: Pallando (também conhecido como Rómestámo, que significa “Ajudante do Leste”) e seu colega Alatar (também conhecido como Morinehtar, que significa “Matador das Trevas”). Tolkien escreveu versões contraditórias dessa história, mas parece provável que o forasteiro possa estar procurando por um amigo caído.
Místicas ameaçadoras
Aproximando-se ameaçadoramente do homem do meteoro estão três outras forasteiras, conhecidas como a Habitante (Bridie Sisson), a Nômade (Edith Poor, de elmo) e a Asceta (Kali Kopae, de capuz). Elas definitivamente parecem ter poderes sobrenaturais, então faria sentido se fossem integrantes de um culto de Sauron - mais especificamente o Culto de Melkor - com sua iconografia celestial e talismãs ritualísticos.
Mas os lacaios de Sauron não vestem branco; talvez essas intrusas sejam cultistas de uma ordem diferente. Um dos produtores da série revelou que as três viajaram das terras de Rhûn, bem ao leste, onde também se encontram os Magos Azuis.
Tolkien tinha dúvidas sobre seus Magos Azuis. Conforme capturado em cartas e esboços publicados em Contos Inacabados e Os povos da Terra Média, sua concepção mudou ao longo do tempo. A princípio, Tolkien especulou que eles haviam falhado em sua missão original e se tornaram líderes de cultos mágicos secretos; mais tarde, sugeriu que eles conseguiram ajudar a barrar Sauron.
Mas e se ambas as versões pudessem ser verdadeiras? E se os magos operassem independentemente, em lados opostos? As místicas talvez pertençam a um desses cultos e estejam tentando acolher - ou conter - qualquer membro recém-chegado da ordem.
Figura paterna
“Você é Sauron, não é?” Quando Waldreg (Geoff Morrell) faz essa pergunta, o elfo negro Adar (Joseph Mawle) explode de raiva. Por quê? Porque, na verdade, Sauron é um insulto, significa “o Abominado”. Porque foi Adar, chamado de “pai” por seus seguidores orcs, quem matou Sauron para proteger seu povo.
Mais tarde, quando a supostamente virtuosa Galadriel (Morfydd Clark) defende o genocídio sistemático dos orcs, Adar defende a ideia de juntar forças com o campo dos simpatizantes dos orcs. Galadriel e Adar articulam ambas as versões das teorias concorrentes sobre a origem dos orcs de Tolkien: que os orcs foram criados como arremedos dos elfos (versão do Livro dos contos perdidos), ou que na verdade eles eram elfos corrompidos (versão do Silmarillion). O próprio Tolkien ficou com esse dilema, se perguntando se os orcs eram completamente irredimíveis. Adar defende os direitos dos orcs. Se você nos cortar, pergunta ele, vamos sangrar preto, não vamos?
O próprio Adar ainda é mais elfo do que orc, ou uruk, como ele prefere ser chamado. Ele ainda é imortal (está vivo desde a Primeira Era). Pode ficar no sol. E segue a tradição de plantar sementes antes da batalha. Em vez de ameaçar matar seus “filhos”, Galadriel poderia ter perguntado quantos outros elfos como ele foram transformados pela escuridão.
Senhor perdido
No início da série, Galadriel diz: “Nada é mau no começo”. O que ela não diz - mas é dito no livro - é que “nem mesmo Sauron era mau assim”. Vale a pena notar que Sauron é um Maia, ser que pode se apartar de sua forma física e voltar em um novo corpo, ou sem corpo. Durante a Segunda Era, escreveu Tolkien, o Senhor das Trevas passou algum tempo disfarçado, e é por isso que agora existem tantos personagens suspeitos de serem Sauron.
Das várias possibilidades, a série se inclina mais para o obscuro companheiro de naufrágio de Galadriel (e entusiasta da ferraria), Halbrand (Charlie Vickers). Ela não parece disposta a acreditar que ele é um rei perdido? Será que isso é o fim de seu segredo? Todos os movimentos de câmera sugerem que não.
Nas cartas de Tolkien, ele escreve sobre o momento da Segunda Era em que Sauron tentou se arrepender; a natureza desse arrependimento foi mudando com o tempo. É possível que Halbrand não seja apenas um herói relutante, mas também um vilão relutante. Assim, as conversas de Halbrand e Galadriel seriam menos um romance e mais um sinal de luta para não recair em uma forma mais sombria. Como o próprio Halbrand diz: “As aparências enganam”. /TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU