Em 2017, o ator Rodrigo Simas participou de um curso na Rede Globo sobre a obra do dramaturgo William Shakespeare (1564-1616). O workshop, ministrado pela professora espanhola Yolanda Vazquez, da Shakespeare’s Globe, de Londres, reuniu 30 colegas da emissora, e Simas chegou a contracenar com a atriz Carol Castro em um exercício em torno de Romeu e Julieta. “Eu tinha Shakespeare em um pedestal e minha visão mudou radicalmente”, conta o artista carioca, de 32 anos. “Ele escrevia para o povo e suas peças são o que são porque buscam a comunicação com o grande público.”
Mal Simas imaginaria que o destino o aproximaria cada vez mais das ideias e das palavras do bardo inglês. Em uma provocação do diretor Ciro Barcelos (ex-Dzi Croquettes), ele estreou em 2022 o monólogo Prazer, Hamlet, adaptação da tragédia sobre o príncipe da Dinamarca que questiona, entre outros pontos, a orientação sexual do personagem.
O espetáculo, visto no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Fortaleza, mexeu com a cabeça do ator e lhe fez perceber o poder transformador da arte. “Eu olhei para dentro de mim, lidei com as minhas sombras e esse trabalho me tirou de uma caixinha que a televisão me colocou”, afirma o ator, que promete retomar o solo no ano que vem.
Sim, porque até lá Simas enfrenta um desafio tão grande ou maior que dar vida ao atormentado herdeiro do trono dinamarquês. No espetáculo Shakespeare Apaixonado, dirigido por Rafael Gomes, em cartaz no Teatro Santander, no 033 Rooftop do Complexo JK Iguatemi, ele interpreta o próprio dramaturgo em um elenco que conta ainda com 22 atores e atrizes.
A peça é uma adaptação do filme homônimo, protagonizado por Joseph Fiennes e Gwyneth Paltrow, que venceu a brasileira Fernanda Montenegro (Central do Brasil) no Oscar de melhor atriz de 1999. “Quando recebi o convite, estava em um intervalo da gravação de Renascer e, apesar do entusiasmo, segui o protocolo, respondendo que a ideia me interessava, mas gostaria de ler o texto”, conta ele, que já sabia que seu personagem da novela das nove, Zé Venâncio, morreria por volta do capítulo 60. “Só que, ao desligar o telefone, pulei de alegria dentro do estúdio porque tinha tudo para dar certo.”
Na trama, Shakespeare enfrenta um bloqueio criativo e não aguenta mais escrever as comédias leves e pouco ousadas que tanto agradam a Rainha Elizabeth I (papel de Ana Lucia Torre). É quando ele conhece a aristocrata Viola (vivida por Carla Salle), que sonha em ser atriz numa época que só os homens subiam ao palco, e, totalmente fascinado, cria a peça Romeu e Julieta, a trágica história dos amantes proibidos de Verona. “Prazer, Hamlet deu início a uma virada artística e pessoal e, agora, tenho a confirmação de que é nessa trilha que devo seguir”, diz. “Fazer sete sessões semanais de Shakespeare Apaixonado é como integrar uma orquestra em que me questiono, me encontro e me perco o tempo todo.”
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O ator pode ser visto ainda na série policial Vidas Bandidas, que estreia dia 21 na Disney+, em que contracena com Juliana Paes e Thomás Aquino. “O Serginho, meu personagem, é um cara que só quer existir, mas tem uma ambição que o leva para caminhos errados”, antecipa ele, que ainda rodou em Israel o filme Viva a Vida!, comédia romântica de Cris D’Amato, ao lado de Thati Lopes, Diego Martins e Jonas Bloch.
Terapia, autoconhecimento e novos caminhos
Há três anos, Simas sentiu pesar a barra e enxergou a hora de buscar o autoconhecimento na terapia. O jovem, popularizado nas novelas Fina Estampa (2011), Boogie Oogie (2014) e Órfãos da Terra (2019), olhava para trás e não valorizava a própria trajetória.
Filho do capoeirista Beto Simas e da produtora Ana Paula Sang, ele é irmão dos atores Bruno Gissoni e Felipe Simas e morou dos 6 aos 15 anos nos Estados Unidos. A carreira na televisão não o deslumbrou e sua cabeça começou a pegar fogo. “Cheguei perto dos 30 anos e vi que não tinha mais desculpas só para experimentar”, lembra. “Precisava tirar um tempo para me organizar e concretizar as coisas.”
É surpreendente ouvir Simas, um rapaz de 30 e poucos anos, afirmar que carrega a noção da brevidade da vida. “Eu penso todos os dias na morte, não no sentido dramático ou trágico, mas com a consciência de que tudo pode acabar a qualquer momento”, revela. Ele se mostra tranquilo com o chamado de processo de amadurecimento pessoal e acredita que esse turbilhão de reflexões já reverbera nas escolhas profissionais. “Estou mais seguro com as minhas verdades porque tenho me apropriado de mim mesmo e, quando isso acontece, é inevitável uma evolução.”
Em meio a esse jogo da verdade consigo mesmo, Simas tornou pública a sua bissexualidade e garante que isso não compromete em nada o relacionamento de quatro anos com a atriz Agatha Moreira. Ele, porém, reconhece que existe um preconceito dentro da própria comunidade LGBTQIA+ e diz que é importante tratar do assunto para que outras pessoas se identifiquem.
“Eu mesmo só consegui me enxergar neste lugar mais velho porque somos levados a crer que é como ficar em cima do muro e não é nada disso”, declara. “O ideal é que a questão se normalize e deixe de ser assunto, mas acho importante falar porque abre portas e faz com que outras pessoas possam existir.”
Shakespeare Apaixonado
- Onde: Teatro Santander - 033 Rooftop do Complexo do Shopping JK Iguatemi, Avenida Juscelino Kubitschek, 2041
- Quando: Quintas e sextas, às 19h30; sábados e domingos, às 15h e 19h30 - até 22 de setembro
- Preços: R$ 19,80 a R$ 400,00
- Ingressos: bileto.sympla.com.br