Com salões de dança fechados, idosos buscam alternativas online


Aulas online podem ajudar idosos que frequentavam bailes a manter em dia a saúde física e mental

Por Gilberto Amendola

“Eu me apaixonei pelos pés dele”, disse Denise Nocentini Silveira, 72 anos. Ela conheceu o amor de uma vida inteira em um baile – ao ser flagrada admirando os passos de um charmoso “valete” que flutuava pelo salão. “Lembro até hoje de quando ele olhou para mim pela primeira vez”, completou. 

Ademir Gomes da Silveira e Denise Nocentini Silveira, ambos de 72 anos, dançam no apartamento em que moram Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Há mais de 40 anos, Denise e Ademir Gomes da Silveira, 72 anos, tratam os bailes da terceira idade (também conhecidos como bailes da saudade) como o “elixir do casamento”. “Nós íamos duas ou três vezes dançar. A gente frequentava mesmo, a gente se entrosou com outras pessoas, fez amizades. Infelizmente, agora, a coisa esfriou, sabemos de gente que morreu de covid... Mas espero que um dia os bailes possam voltar em segurança, sem risco”, falou Ademir. No dia 28 de fevereiro, o noticiário mostrou o fechamento de um baile da terceira idade que funcionava clandestinamente na zona leste de São Paulo – desobedecendo assim às restrições impostas pelo governo estadual para combater o avanço da pandemia. Embora nada justifique a realização de um baile em um momento como este, é possível, ao menos, entender de onde vem tanta saudade e a importância desse tipo de evento para um público com mais de 60 anos.  Luiz da Silva Filho, diretor-presidente da União Fraterna, um dos principais salões de baile da cidade, contou que, só no período da manhã, recebe pelo menos cinco ligações de idosos perguntando sobre a volta dos eventos. “A falta que o baile faz é palpável. Além dos frequentadores, temos toda uma cadeia de fornecedores, bandas de música, cantores, garçons. Estamos todos na expectativa de, quem sabe, em um segundo semestre ou mais adiante voltar com as atividades”, disse Silva. Os bailes da saudade estão no centro da vida de Ivone Rodrigues Ciocci, 70 anos. Há 4 anos, ela ficou viúva. Em seu tempo de casada, nunca havia pisado em um salão de baile ou mesmo dançado em qualquer circunstância. Dona de casa e cada vez mais deprimida, ouviu de uma amiga que precisava sair para se divertir um pouco. Foi então que Ivone se permitiu.

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“Eu peguei gosto pelo baile, pela dança livre e de salão. Eu ia para dois, três bailes na mesma noite. Andava com minhas roupas de baile em uma mochila. Quando chegava em casa, tinha que ficar com as pernas para cima de tanto que tinha dançado”, brincou. Ela confessa a falta que os encontros dançantes estão fazendo. “A gente faz tantos amigos, coisa que eu não tinha antes. Sou uma dona de casa que não sabia que a vida poderia ser tão boa. Agora, com a covid, me sinto uma criança de castigo. O tempo está correndo para mim. Quero logo a vacina para que eu ainda tenha tempo para dançar”, disse.  Até quem não é muito de frequentar salões tem uma lembrança divertida. “Acho muito ‘mela-mela’ para o meu gosto. Mas teve um dia que eu, sem querer, arranquei a peruca de um velho durante uma dança. Saí com a peruca dele nas mãos”, lembrou Margarida Arouche, 69 anos. Irmã de Margarida, Martha Arouche, 73 anos, também costuma trocar a dança por atividades como capoeira e pilates. “A idade é o que você faz. Não é aquela que você tem. Muita saudade de sentar em um boteco com minha irmã e amigas”, falou. Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas, aponta os sinais de ansiedade e depressão em pacientes em uma faixa etária mais avançada. “O combate biológico da pandemia é importantíssimo, mas não podemos descuidar da saúde mental dos idosos”, disse. “Uma das soluções é abusar dos recursos tecnológicos, das chamadas de vídeo, dos telefonemas, das redes sociais. Conversar, trocar impressões subjetivas ajuda no equilíbrio pessoal, impacta na memória e na linguagem”, completou Gomes. A professora de dança Valda Souza, 63 anos, tenta aplacar a saudade de um bom baile ministrando aulas de dança online para o público da terceira idade. “Eu dou aulas que começam com as pessoas ainda sentadas, fazendo alongamentos. Depois, temos danças coreografadas, passo a passo. É um público que gosta muito de se movimentar. As aulas são muito divertidas. Na maioria das vezes, são mulheres. Os homens são mais tímidos online”, contou a professora.  Roberto Caroano, 65 anos, é uma exceção entre os homens – e grande frequentador das aulas de dança na internet. “Antes da pandemia, eu fazia muita atividade, frequentava muitos salões. Sempre faltam valetes (homens). Então, quando eu entrava no salão, dançava o tempo todinho”, disse.  Agora, precisando ficar em casa, ele se sente como uma criança que ficou sem o doce. “Era uma válvula de escape. Para não entrar em depressão e superar essa fase, faço aulas de dança online. Me ajuda a não desanimar”, afirmou Roberto. “Não é a mesma coisa. Não tem os trajes, os perfumes, mas ajuda muito.” A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo informou que, por conta do isolamento social, foram criados mecanismos para a manutenção de um vínculo com o público da terceira idade que, por exemplo, frequentava os polos culturais na cidade. Uma dessas iniciativas foi a criação do grupo WhatsApp Solidário, que inclui mais de 200 pessoas do Polo Cultural da Terceira Idade, do Grande Conselho Municipal do Idoso e do programa Espaço Longevidade. No WhatsApp Solidário, a população idosa tem acesso diário a orientações sobre prevenção à covid-19, dicas de bem-estar e qualidade de vida mediante vídeos temáticos, além de jogos online, filmes, aulas de ioga, teatro e de dança. Além disso, desenvolveu em parceria com a startup Isgame o aplicativo Cérebro Ativo, um programa de aulas online. A ferramenta incentiva raciocínio lógico, criatividade, planejamento, concentração e socialização de pessoas idosas. Cerca de 40% dos usuários do Polo participam das atividades.

“Eu me apaixonei pelos pés dele”, disse Denise Nocentini Silveira, 72 anos. Ela conheceu o amor de uma vida inteira em um baile – ao ser flagrada admirando os passos de um charmoso “valete” que flutuava pelo salão. “Lembro até hoje de quando ele olhou para mim pela primeira vez”, completou. 

Ademir Gomes da Silveira e Denise Nocentini Silveira, ambos de 72 anos, dançam no apartamento em que moram Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Há mais de 40 anos, Denise e Ademir Gomes da Silveira, 72 anos, tratam os bailes da terceira idade (também conhecidos como bailes da saudade) como o “elixir do casamento”. “Nós íamos duas ou três vezes dançar. A gente frequentava mesmo, a gente se entrosou com outras pessoas, fez amizades. Infelizmente, agora, a coisa esfriou, sabemos de gente que morreu de covid... Mas espero que um dia os bailes possam voltar em segurança, sem risco”, falou Ademir. No dia 28 de fevereiro, o noticiário mostrou o fechamento de um baile da terceira idade que funcionava clandestinamente na zona leste de São Paulo – desobedecendo assim às restrições impostas pelo governo estadual para combater o avanço da pandemia. Embora nada justifique a realização de um baile em um momento como este, é possível, ao menos, entender de onde vem tanta saudade e a importância desse tipo de evento para um público com mais de 60 anos.  Luiz da Silva Filho, diretor-presidente da União Fraterna, um dos principais salões de baile da cidade, contou que, só no período da manhã, recebe pelo menos cinco ligações de idosos perguntando sobre a volta dos eventos. “A falta que o baile faz é palpável. Além dos frequentadores, temos toda uma cadeia de fornecedores, bandas de música, cantores, garçons. Estamos todos na expectativa de, quem sabe, em um segundo semestre ou mais adiante voltar com as atividades”, disse Silva. Os bailes da saudade estão no centro da vida de Ivone Rodrigues Ciocci, 70 anos. Há 4 anos, ela ficou viúva. Em seu tempo de casada, nunca havia pisado em um salão de baile ou mesmo dançado em qualquer circunstância. Dona de casa e cada vez mais deprimida, ouviu de uma amiga que precisava sair para se divertir um pouco. Foi então que Ivone se permitiu.

“Eu peguei gosto pelo baile, pela dança livre e de salão. Eu ia para dois, três bailes na mesma noite. Andava com minhas roupas de baile em uma mochila. Quando chegava em casa, tinha que ficar com as pernas para cima de tanto que tinha dançado”, brincou. Ela confessa a falta que os encontros dançantes estão fazendo. “A gente faz tantos amigos, coisa que eu não tinha antes. Sou uma dona de casa que não sabia que a vida poderia ser tão boa. Agora, com a covid, me sinto uma criança de castigo. O tempo está correndo para mim. Quero logo a vacina para que eu ainda tenha tempo para dançar”, disse.  Até quem não é muito de frequentar salões tem uma lembrança divertida. “Acho muito ‘mela-mela’ para o meu gosto. Mas teve um dia que eu, sem querer, arranquei a peruca de um velho durante uma dança. Saí com a peruca dele nas mãos”, lembrou Margarida Arouche, 69 anos. Irmã de Margarida, Martha Arouche, 73 anos, também costuma trocar a dança por atividades como capoeira e pilates. “A idade é o que você faz. Não é aquela que você tem. Muita saudade de sentar em um boteco com minha irmã e amigas”, falou. Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas, aponta os sinais de ansiedade e depressão em pacientes em uma faixa etária mais avançada. “O combate biológico da pandemia é importantíssimo, mas não podemos descuidar da saúde mental dos idosos”, disse. “Uma das soluções é abusar dos recursos tecnológicos, das chamadas de vídeo, dos telefonemas, das redes sociais. Conversar, trocar impressões subjetivas ajuda no equilíbrio pessoal, impacta na memória e na linguagem”, completou Gomes. A professora de dança Valda Souza, 63 anos, tenta aplacar a saudade de um bom baile ministrando aulas de dança online para o público da terceira idade. “Eu dou aulas que começam com as pessoas ainda sentadas, fazendo alongamentos. Depois, temos danças coreografadas, passo a passo. É um público que gosta muito de se movimentar. As aulas são muito divertidas. Na maioria das vezes, são mulheres. Os homens são mais tímidos online”, contou a professora.  Roberto Caroano, 65 anos, é uma exceção entre os homens – e grande frequentador das aulas de dança na internet. “Antes da pandemia, eu fazia muita atividade, frequentava muitos salões. Sempre faltam valetes (homens). Então, quando eu entrava no salão, dançava o tempo todinho”, disse.  Agora, precisando ficar em casa, ele se sente como uma criança que ficou sem o doce. “Era uma válvula de escape. Para não entrar em depressão e superar essa fase, faço aulas de dança online. Me ajuda a não desanimar”, afirmou Roberto. “Não é a mesma coisa. Não tem os trajes, os perfumes, mas ajuda muito.” A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo informou que, por conta do isolamento social, foram criados mecanismos para a manutenção de um vínculo com o público da terceira idade que, por exemplo, frequentava os polos culturais na cidade. Uma dessas iniciativas foi a criação do grupo WhatsApp Solidário, que inclui mais de 200 pessoas do Polo Cultural da Terceira Idade, do Grande Conselho Municipal do Idoso e do programa Espaço Longevidade. No WhatsApp Solidário, a população idosa tem acesso diário a orientações sobre prevenção à covid-19, dicas de bem-estar e qualidade de vida mediante vídeos temáticos, além de jogos online, filmes, aulas de ioga, teatro e de dança. Além disso, desenvolveu em parceria com a startup Isgame o aplicativo Cérebro Ativo, um programa de aulas online. A ferramenta incentiva raciocínio lógico, criatividade, planejamento, concentração e socialização de pessoas idosas. Cerca de 40% dos usuários do Polo participam das atividades.

“Eu me apaixonei pelos pés dele”, disse Denise Nocentini Silveira, 72 anos. Ela conheceu o amor de uma vida inteira em um baile – ao ser flagrada admirando os passos de um charmoso “valete” que flutuava pelo salão. “Lembro até hoje de quando ele olhou para mim pela primeira vez”, completou. 

Ademir Gomes da Silveira e Denise Nocentini Silveira, ambos de 72 anos, dançam no apartamento em que moram Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Há mais de 40 anos, Denise e Ademir Gomes da Silveira, 72 anos, tratam os bailes da terceira idade (também conhecidos como bailes da saudade) como o “elixir do casamento”. “Nós íamos duas ou três vezes dançar. A gente frequentava mesmo, a gente se entrosou com outras pessoas, fez amizades. Infelizmente, agora, a coisa esfriou, sabemos de gente que morreu de covid... Mas espero que um dia os bailes possam voltar em segurança, sem risco”, falou Ademir. No dia 28 de fevereiro, o noticiário mostrou o fechamento de um baile da terceira idade que funcionava clandestinamente na zona leste de São Paulo – desobedecendo assim às restrições impostas pelo governo estadual para combater o avanço da pandemia. Embora nada justifique a realização de um baile em um momento como este, é possível, ao menos, entender de onde vem tanta saudade e a importância desse tipo de evento para um público com mais de 60 anos.  Luiz da Silva Filho, diretor-presidente da União Fraterna, um dos principais salões de baile da cidade, contou que, só no período da manhã, recebe pelo menos cinco ligações de idosos perguntando sobre a volta dos eventos. “A falta que o baile faz é palpável. Além dos frequentadores, temos toda uma cadeia de fornecedores, bandas de música, cantores, garçons. Estamos todos na expectativa de, quem sabe, em um segundo semestre ou mais adiante voltar com as atividades”, disse Silva. Os bailes da saudade estão no centro da vida de Ivone Rodrigues Ciocci, 70 anos. Há 4 anos, ela ficou viúva. Em seu tempo de casada, nunca havia pisado em um salão de baile ou mesmo dançado em qualquer circunstância. Dona de casa e cada vez mais deprimida, ouviu de uma amiga que precisava sair para se divertir um pouco. Foi então que Ivone se permitiu.

“Eu peguei gosto pelo baile, pela dança livre e de salão. Eu ia para dois, três bailes na mesma noite. Andava com minhas roupas de baile em uma mochila. Quando chegava em casa, tinha que ficar com as pernas para cima de tanto que tinha dançado”, brincou. Ela confessa a falta que os encontros dançantes estão fazendo. “A gente faz tantos amigos, coisa que eu não tinha antes. Sou uma dona de casa que não sabia que a vida poderia ser tão boa. Agora, com a covid, me sinto uma criança de castigo. O tempo está correndo para mim. Quero logo a vacina para que eu ainda tenha tempo para dançar”, disse.  Até quem não é muito de frequentar salões tem uma lembrança divertida. “Acho muito ‘mela-mela’ para o meu gosto. Mas teve um dia que eu, sem querer, arranquei a peruca de um velho durante uma dança. Saí com a peruca dele nas mãos”, lembrou Margarida Arouche, 69 anos. Irmã de Margarida, Martha Arouche, 73 anos, também costuma trocar a dança por atividades como capoeira e pilates. “A idade é o que você faz. Não é aquela que você tem. Muita saudade de sentar em um boteco com minha irmã e amigas”, falou. Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas, aponta os sinais de ansiedade e depressão em pacientes em uma faixa etária mais avançada. “O combate biológico da pandemia é importantíssimo, mas não podemos descuidar da saúde mental dos idosos”, disse. “Uma das soluções é abusar dos recursos tecnológicos, das chamadas de vídeo, dos telefonemas, das redes sociais. Conversar, trocar impressões subjetivas ajuda no equilíbrio pessoal, impacta na memória e na linguagem”, completou Gomes. A professora de dança Valda Souza, 63 anos, tenta aplacar a saudade de um bom baile ministrando aulas de dança online para o público da terceira idade. “Eu dou aulas que começam com as pessoas ainda sentadas, fazendo alongamentos. Depois, temos danças coreografadas, passo a passo. É um público que gosta muito de se movimentar. As aulas são muito divertidas. Na maioria das vezes, são mulheres. Os homens são mais tímidos online”, contou a professora.  Roberto Caroano, 65 anos, é uma exceção entre os homens – e grande frequentador das aulas de dança na internet. “Antes da pandemia, eu fazia muita atividade, frequentava muitos salões. Sempre faltam valetes (homens). Então, quando eu entrava no salão, dançava o tempo todinho”, disse.  Agora, precisando ficar em casa, ele se sente como uma criança que ficou sem o doce. “Era uma válvula de escape. Para não entrar em depressão e superar essa fase, faço aulas de dança online. Me ajuda a não desanimar”, afirmou Roberto. “Não é a mesma coisa. Não tem os trajes, os perfumes, mas ajuda muito.” A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo informou que, por conta do isolamento social, foram criados mecanismos para a manutenção de um vínculo com o público da terceira idade que, por exemplo, frequentava os polos culturais na cidade. Uma dessas iniciativas foi a criação do grupo WhatsApp Solidário, que inclui mais de 200 pessoas do Polo Cultural da Terceira Idade, do Grande Conselho Municipal do Idoso e do programa Espaço Longevidade. No WhatsApp Solidário, a população idosa tem acesso diário a orientações sobre prevenção à covid-19, dicas de bem-estar e qualidade de vida mediante vídeos temáticos, além de jogos online, filmes, aulas de ioga, teatro e de dança. Além disso, desenvolveu em parceria com a startup Isgame o aplicativo Cérebro Ativo, um programa de aulas online. A ferramenta incentiva raciocínio lógico, criatividade, planejamento, concentração e socialização de pessoas idosas. Cerca de 40% dos usuários do Polo participam das atividades.

“Eu me apaixonei pelos pés dele”, disse Denise Nocentini Silveira, 72 anos. Ela conheceu o amor de uma vida inteira em um baile – ao ser flagrada admirando os passos de um charmoso “valete” que flutuava pelo salão. “Lembro até hoje de quando ele olhou para mim pela primeira vez”, completou. 

Ademir Gomes da Silveira e Denise Nocentini Silveira, ambos de 72 anos, dançam no apartamento em que moram Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Há mais de 40 anos, Denise e Ademir Gomes da Silveira, 72 anos, tratam os bailes da terceira idade (também conhecidos como bailes da saudade) como o “elixir do casamento”. “Nós íamos duas ou três vezes dançar. A gente frequentava mesmo, a gente se entrosou com outras pessoas, fez amizades. Infelizmente, agora, a coisa esfriou, sabemos de gente que morreu de covid... Mas espero que um dia os bailes possam voltar em segurança, sem risco”, falou Ademir. No dia 28 de fevereiro, o noticiário mostrou o fechamento de um baile da terceira idade que funcionava clandestinamente na zona leste de São Paulo – desobedecendo assim às restrições impostas pelo governo estadual para combater o avanço da pandemia. Embora nada justifique a realização de um baile em um momento como este, é possível, ao menos, entender de onde vem tanta saudade e a importância desse tipo de evento para um público com mais de 60 anos.  Luiz da Silva Filho, diretor-presidente da União Fraterna, um dos principais salões de baile da cidade, contou que, só no período da manhã, recebe pelo menos cinco ligações de idosos perguntando sobre a volta dos eventos. “A falta que o baile faz é palpável. Além dos frequentadores, temos toda uma cadeia de fornecedores, bandas de música, cantores, garçons. Estamos todos na expectativa de, quem sabe, em um segundo semestre ou mais adiante voltar com as atividades”, disse Silva. Os bailes da saudade estão no centro da vida de Ivone Rodrigues Ciocci, 70 anos. Há 4 anos, ela ficou viúva. Em seu tempo de casada, nunca havia pisado em um salão de baile ou mesmo dançado em qualquer circunstância. Dona de casa e cada vez mais deprimida, ouviu de uma amiga que precisava sair para se divertir um pouco. Foi então que Ivone se permitiu.

“Eu peguei gosto pelo baile, pela dança livre e de salão. Eu ia para dois, três bailes na mesma noite. Andava com minhas roupas de baile em uma mochila. Quando chegava em casa, tinha que ficar com as pernas para cima de tanto que tinha dançado”, brincou. Ela confessa a falta que os encontros dançantes estão fazendo. “A gente faz tantos amigos, coisa que eu não tinha antes. Sou uma dona de casa que não sabia que a vida poderia ser tão boa. Agora, com a covid, me sinto uma criança de castigo. O tempo está correndo para mim. Quero logo a vacina para que eu ainda tenha tempo para dançar”, disse.  Até quem não é muito de frequentar salões tem uma lembrança divertida. “Acho muito ‘mela-mela’ para o meu gosto. Mas teve um dia que eu, sem querer, arranquei a peruca de um velho durante uma dança. Saí com a peruca dele nas mãos”, lembrou Margarida Arouche, 69 anos. Irmã de Margarida, Martha Arouche, 73 anos, também costuma trocar a dança por atividades como capoeira e pilates. “A idade é o que você faz. Não é aquela que você tem. Muita saudade de sentar em um boteco com minha irmã e amigas”, falou. Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas, aponta os sinais de ansiedade e depressão em pacientes em uma faixa etária mais avançada. “O combate biológico da pandemia é importantíssimo, mas não podemos descuidar da saúde mental dos idosos”, disse. “Uma das soluções é abusar dos recursos tecnológicos, das chamadas de vídeo, dos telefonemas, das redes sociais. Conversar, trocar impressões subjetivas ajuda no equilíbrio pessoal, impacta na memória e na linguagem”, completou Gomes. A professora de dança Valda Souza, 63 anos, tenta aplacar a saudade de um bom baile ministrando aulas de dança online para o público da terceira idade. “Eu dou aulas que começam com as pessoas ainda sentadas, fazendo alongamentos. Depois, temos danças coreografadas, passo a passo. É um público que gosta muito de se movimentar. As aulas são muito divertidas. Na maioria das vezes, são mulheres. Os homens são mais tímidos online”, contou a professora.  Roberto Caroano, 65 anos, é uma exceção entre os homens – e grande frequentador das aulas de dança na internet. “Antes da pandemia, eu fazia muita atividade, frequentava muitos salões. Sempre faltam valetes (homens). Então, quando eu entrava no salão, dançava o tempo todinho”, disse.  Agora, precisando ficar em casa, ele se sente como uma criança que ficou sem o doce. “Era uma válvula de escape. Para não entrar em depressão e superar essa fase, faço aulas de dança online. Me ajuda a não desanimar”, afirmou Roberto. “Não é a mesma coisa. Não tem os trajes, os perfumes, mas ajuda muito.” A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo informou que, por conta do isolamento social, foram criados mecanismos para a manutenção de um vínculo com o público da terceira idade que, por exemplo, frequentava os polos culturais na cidade. Uma dessas iniciativas foi a criação do grupo WhatsApp Solidário, que inclui mais de 200 pessoas do Polo Cultural da Terceira Idade, do Grande Conselho Municipal do Idoso e do programa Espaço Longevidade. No WhatsApp Solidário, a população idosa tem acesso diário a orientações sobre prevenção à covid-19, dicas de bem-estar e qualidade de vida mediante vídeos temáticos, além de jogos online, filmes, aulas de ioga, teatro e de dança. Além disso, desenvolveu em parceria com a startup Isgame o aplicativo Cérebro Ativo, um programa de aulas online. A ferramenta incentiva raciocínio lógico, criatividade, planejamento, concentração e socialização de pessoas idosas. Cerca de 40% dos usuários do Polo participam das atividades.

“Eu me apaixonei pelos pés dele”, disse Denise Nocentini Silveira, 72 anos. Ela conheceu o amor de uma vida inteira em um baile – ao ser flagrada admirando os passos de um charmoso “valete” que flutuava pelo salão. “Lembro até hoje de quando ele olhou para mim pela primeira vez”, completou. 

Ademir Gomes da Silveira e Denise Nocentini Silveira, ambos de 72 anos, dançam no apartamento em que moram Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Há mais de 40 anos, Denise e Ademir Gomes da Silveira, 72 anos, tratam os bailes da terceira idade (também conhecidos como bailes da saudade) como o “elixir do casamento”. “Nós íamos duas ou três vezes dançar. A gente frequentava mesmo, a gente se entrosou com outras pessoas, fez amizades. Infelizmente, agora, a coisa esfriou, sabemos de gente que morreu de covid... Mas espero que um dia os bailes possam voltar em segurança, sem risco”, falou Ademir. No dia 28 de fevereiro, o noticiário mostrou o fechamento de um baile da terceira idade que funcionava clandestinamente na zona leste de São Paulo – desobedecendo assim às restrições impostas pelo governo estadual para combater o avanço da pandemia. Embora nada justifique a realização de um baile em um momento como este, é possível, ao menos, entender de onde vem tanta saudade e a importância desse tipo de evento para um público com mais de 60 anos.  Luiz da Silva Filho, diretor-presidente da União Fraterna, um dos principais salões de baile da cidade, contou que, só no período da manhã, recebe pelo menos cinco ligações de idosos perguntando sobre a volta dos eventos. “A falta que o baile faz é palpável. Além dos frequentadores, temos toda uma cadeia de fornecedores, bandas de música, cantores, garçons. Estamos todos na expectativa de, quem sabe, em um segundo semestre ou mais adiante voltar com as atividades”, disse Silva. Os bailes da saudade estão no centro da vida de Ivone Rodrigues Ciocci, 70 anos. Há 4 anos, ela ficou viúva. Em seu tempo de casada, nunca havia pisado em um salão de baile ou mesmo dançado em qualquer circunstância. Dona de casa e cada vez mais deprimida, ouviu de uma amiga que precisava sair para se divertir um pouco. Foi então que Ivone se permitiu.

“Eu peguei gosto pelo baile, pela dança livre e de salão. Eu ia para dois, três bailes na mesma noite. Andava com minhas roupas de baile em uma mochila. Quando chegava em casa, tinha que ficar com as pernas para cima de tanto que tinha dançado”, brincou. Ela confessa a falta que os encontros dançantes estão fazendo. “A gente faz tantos amigos, coisa que eu não tinha antes. Sou uma dona de casa que não sabia que a vida poderia ser tão boa. Agora, com a covid, me sinto uma criança de castigo. O tempo está correndo para mim. Quero logo a vacina para que eu ainda tenha tempo para dançar”, disse.  Até quem não é muito de frequentar salões tem uma lembrança divertida. “Acho muito ‘mela-mela’ para o meu gosto. Mas teve um dia que eu, sem querer, arranquei a peruca de um velho durante uma dança. Saí com a peruca dele nas mãos”, lembrou Margarida Arouche, 69 anos. Irmã de Margarida, Martha Arouche, 73 anos, também costuma trocar a dança por atividades como capoeira e pilates. “A idade é o que você faz. Não é aquela que você tem. Muita saudade de sentar em um boteco com minha irmã e amigas”, falou. Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas, aponta os sinais de ansiedade e depressão em pacientes em uma faixa etária mais avançada. “O combate biológico da pandemia é importantíssimo, mas não podemos descuidar da saúde mental dos idosos”, disse. “Uma das soluções é abusar dos recursos tecnológicos, das chamadas de vídeo, dos telefonemas, das redes sociais. Conversar, trocar impressões subjetivas ajuda no equilíbrio pessoal, impacta na memória e na linguagem”, completou Gomes. A professora de dança Valda Souza, 63 anos, tenta aplacar a saudade de um bom baile ministrando aulas de dança online para o público da terceira idade. “Eu dou aulas que começam com as pessoas ainda sentadas, fazendo alongamentos. Depois, temos danças coreografadas, passo a passo. É um público que gosta muito de se movimentar. As aulas são muito divertidas. Na maioria das vezes, são mulheres. Os homens são mais tímidos online”, contou a professora.  Roberto Caroano, 65 anos, é uma exceção entre os homens – e grande frequentador das aulas de dança na internet. “Antes da pandemia, eu fazia muita atividade, frequentava muitos salões. Sempre faltam valetes (homens). Então, quando eu entrava no salão, dançava o tempo todinho”, disse.  Agora, precisando ficar em casa, ele se sente como uma criança que ficou sem o doce. “Era uma válvula de escape. Para não entrar em depressão e superar essa fase, faço aulas de dança online. Me ajuda a não desanimar”, afirmou Roberto. “Não é a mesma coisa. Não tem os trajes, os perfumes, mas ajuda muito.” A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo informou que, por conta do isolamento social, foram criados mecanismos para a manutenção de um vínculo com o público da terceira idade que, por exemplo, frequentava os polos culturais na cidade. Uma dessas iniciativas foi a criação do grupo WhatsApp Solidário, que inclui mais de 200 pessoas do Polo Cultural da Terceira Idade, do Grande Conselho Municipal do Idoso e do programa Espaço Longevidade. No WhatsApp Solidário, a população idosa tem acesso diário a orientações sobre prevenção à covid-19, dicas de bem-estar e qualidade de vida mediante vídeos temáticos, além de jogos online, filmes, aulas de ioga, teatro e de dança. Além disso, desenvolveu em parceria com a startup Isgame o aplicativo Cérebro Ativo, um programa de aulas online. A ferramenta incentiva raciocínio lógico, criatividade, planejamento, concentração e socialização de pessoas idosas. Cerca de 40% dos usuários do Polo participam das atividades.

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