Este texto contém alguns spoilers da terceira temporada de 3%
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Lançada em 2016, a série brasileira 3% fez manchetes ao conquistar a audiência estrangeira – à época, um comunicado oficial da Netflix informou que a distopia se tornou a produção original de língua não-inglesa mais assistida nos Estados Unidos. Três anos depois, já consolidada, a série chega à terceira temporada com o desafio de retratar o amadurecimento pessoal e político dos seus personagens. Os novos episódios estrearam nesta sexta-feira, 7.
Na história, o Brasil pós-apocalíptico concentra uma população miserável que reside no Continente. Todos os anos, centenas de jovens fazem uma série de provas coletivas e individuais. Os 3% aprovados ganham o direito a uma vida no Maralto, única parte do país que ainda conserva recursos naturais.
A trama teve boa recepção entre o público estrangeiro. Quatro meses após o lançamento da primeira temporada, a Netflix divulgou ao Estado um levantamento que mostrava que mais de 50% de todas as horas assistidas da série eram provenientes de mercados internacionais. 3% angariou grande número de espectadores em países como Austrália, Canadá, França, Itália, Coréia do Sul e Turquia.
“A série foi amplamente vista fora do Brasil em diversos países, o que nos mostra que há sempre um público para uma grande narrativa, seja com conteúdo produzido nos Estados Unidos, Brasil, Singapura, Austrália, Índia ou no Oriente Médio”, disse à época Erik Barmack, vice-presidente de Originais Internacionais da Netflix.
A produção também foi bem recebida pela crítica estrangeira especializada. "O que falta em orçamento é compensado pelas altas taxas de público", disse o jornal britânico The Guardian. "Há traição, engano, perigo: todas as coisas boas". No estadunidense The New York Times, a série foi apresentada como uma “alternativa mais visualmente realizada à Jogos Vorazes”. Para o IndieWire, “3% traz consigo elementos únicos e personagens convincentes”.
Novos episódios. “Na primeira temporada de 3%, acompanhamos jovens entrando em contato com o Processo que define o mundo”, explica o criador e roteirista Pedro Aguilera. “Na segunda, eles precisam decidir de que lado estão”. A nova temporada traz a discussão de uma terceira via, representada pela Concha, um oásis situado entre os dois mundos que tenta sobreviver à revelia deles.
Interpretada por Bianca Comparato, Michele personifica a jornada de amadurecimento dos protagonistas de 3%. Ex-guerrilheira da Causa, organização que tenta destruir o Maralto, passa de loba solitária à líder da Concha. “Antes, Michele se guiava por vingança pessoal. Agora, ela tem o desafio de fazer uma comunidade vingar”, afirma Bianca. Frente a uma crise de desabastecimento, a personagem precisa criar um novo Processo, que expulsará 90% dos moradores da Concha, entregando-os à própria sorte.
Por mais que Michele se esforce para não reproduzir o modelo que tanto despreza, o novo Processo foge do controle. Em um caso específico, resulta em suicídio. “O que a Michele vai perceber é que nenhum processo de seleção é justo”, afirma Bianca. “Não há justiça em uma escolha como essa”.
Protagonistas desde a primeira temporada, Joana (Vaneza Oliveira), Rafael (Rodolfo Valente) e Marco (Rafael Lozano) estão abrigados na Concha e também vivem novos arcos narrativos. Joana se divide entre a solidão e a vontade de pertencer; Rafael vive um triângulo amoroso e dá apoio ao irmão mais novo; e Marco cuida sozinho de um filho. “Na verdade, os personagens, na época do Processo, são jovens em transição, e agora estão no começo da vida adulta”, explica Bianca. Para ela, o amadurecimento se mostra mesmo nas relações entre eles. “A Joana e a Michele vão se enfrentar muito, mas de maneira muito mais madura”.
Para Aguilera, a Concha representa coisas diferentes para cada personagem. “É uma quebra do paradigma de dois lados, mas pode ser o paraíso ou se tornar uma reprodução dos mesmos jogos de poder”, afirma.
Barreiras. Questionado sobre a expectativa em relação à terceira temporada, Aguilera responde que pretende agradar os fãs. “Precisamos pensar neles o tempo todo. Existem muitas opções no mercado, e nosso maior pesadelo seria o público achar que já viu tudo em duas temporadas e não se engajar na terceira”.
Bianca acredita que 3% quebrou barreiras de língua e gênero. “Fico muito feliz em chegar à terceira temporada, mas ainda mais por termos aberto as portas para outras produções”, afirma. “Vemos agora muito investimento em conteúdos nacionais que apostam em gênero, apesar da impressão de que brasileiro não faz esse tipo de produção”. /Com informações de Pedro Rocha.