Ao entrar na chamada de vídeo para conversar com a reportagem do Estadão, Fátima Bernardes se mostrou aberta para a conversa sobre seu novo programa, o semanal Assim Como a Gente, que estreia nesta sexta-feira, 13, às 21h30, no GNT e na plataforma Globoplay.
É empática com o que ela mais gosta de fazer, desde os tempos de repórter e que fez questão de conservar mesmo quando ocupava a bancada do Jornal Nacional: conversar, ouvir o outro. E esse é o mote central de seu novo programa.
A ideia de Assim Como a Gente é do jornalista Carlos Jardim, um dos chefes de redação da Globo News. Ele e Fátima trabalharam juntos no Jornal Nacional e no Encontro. Fátima leu o projeto assim que saiu do matinal que comandou na TV Globo até julho de 2022. A autorização para produzi-lo veio neste ano.
Ao lado de Jardim, que atua como diretor geral e roteirista final, Fátima definiu a lista de convidados - sempre dois por programa e com alguma conexão entre si. São nomes como Lulu Santos, Ivete Sangalo, Serginho Groisman, Ludmilla, Taís Araújo, Cauã Reymond, Maria Rita, Fábio Assunção, Felipe Camargo, Vera Fischer, entre outros.
Entre os temas debatidos por Fátima e seus convidados estão a homossexualidade, debate do programa que junta Ludmilla e Lulu Santos, e o ativismo social, compartilhado por Dira Paes e Taís Araújo.
Apesar do programa ser muito sobre escuta, a apresentadora poderá dar continuidade ao que julga essencial, desde que se libertou de amarradas impostas pelo jornalismo em nome da isenção: se posicionar. “Percebi que um apresentador precisa ter um posicionamento, mostrar quem ele é. Dei esse passo e tudo mudou”, diz.
A princípio, serão 10 programas. Fátima não fala em temporada. Não é certo que Assim Como a Gente terá uma continuação ou se há espaço para ele na grade da TV Globo, assim como ocorre com programas como Lady Night e Vai Que Cola, programas também produzidos originalmente para a TV fechada.
A seguir, o papo com Fátima Bernardes:
Sabemos que o programa vai receber dois convidados a cada edição. E que eles terão relatos sobre um tema em comum. O que mais você pode contar sobre o Assim Como a Gente?
A minha maior preocupação é que o programa não seja divulgado como ‘A Fátima vai entrevistar a Ludmilla e o Lulu Santos’. Se for assim, pode frustrar muita gente. Não vamos esmiuçar a carreira dos entrevistados. O recorte do programa é o de que as duas pessoas escolhidas para estarem juntas tenham, na trajetória de vida ou de carreira, uma conexão. E isso é muito interessante. No caso da Ludmilla e do Lulu, é a homossexualidade deles divulgada em momentos diferentes de carreira, Quais foram os receios e preocupações? Se o Lulu não pudesse gravar no dia que a gente o convidou, não poderíamos encaixá-lo em outro programa, por exemplo. Não faria sentido. Quando juntamos a Dira Paes e a Taís Araújo é para falarmos sobre o ativismo que elas exercem. São duas mulheres que descobriram que as pessoas querem ouvi-las.
No Encontro você também conversava com atores, atrizes, cantores, cantoras...Nesse sentido, no que o Assim Como a Gente se difere?
Primeiro, a possibilidade de uma entrevista de 50 minutos, o que é bem diferente do Encontro. Lulu e Ludmilla nunca haviam conversado, por exemplo. Quando gravamos o programa, eles iam fazer o The Town, cantar juntos, e ainda não haviam tido uma única conversa. Teremos também a plateia que poderá fazer perguntas a qualquer momento. Nem eu e nem os convidados sabemos quais serão elas. No Encontro, eu tinha uma produtora de plateia que conversava previamente com quem estava no estúdio. Então, quando eu chamava alguém, eu já sabia qual era o assunto.
Você, por muitos anos, apresentou telejornais, no estúdio, falando para a câmera. O que ter a presença da plateia, a partir do Encontro, te trouxe?
Quando eu apresentava telejornais, sempre fazia questão de fazer reportagens de rua. Não queria me desconectar, ficar presa a uma tela. Quando eu fui para o Encontro, essa também era a minha preocupação. A plateia, se ela é viva, representa o mundo real. Ter a plateia (no estúdio) me deu uma capacidade maior de lidar com o improviso. Gosto de ter gente por perto.
Vivemos na era das celebridades. A TV precisa de bons papos, mas que deem audiência. Os entrevistados têm interesse em expor determinados temas. O Carlos Jardim (diretor) soube dosar isso muito bem no documentário Maria - Ninguém Sabe Quem Sou Eu (sobre a cantora Maria Bethânia). Como vocês também ajustaram essa questão no Assim Como a Gente?
Temos um roteiro afinado. Converso com o Jardim quais caminhos podemos seguir, com uma primeira pergunta pré-estabelecida. A partir dela, não sabemos o que cada entrevistado vai responder.
Pergunto isso porque você também é uma pessoa pública, famosa. Qualquer foto que você poste ou qualquer declaração pode gerar comentários, matérias...
Até o que eu não posto e não falo também repercute (risos).
Como vocês dosaram isso, então?
Não penso nisso. Deixo os convidados muito à vontade. Sempre estou muito disposta a ouvi-los. Isso gera uma confiança neles. Antes da gravação, sempre passo no camarim de cada um para dizer que se eles sentissem que era o momento de dizer algo, sem ter uma pergunta prévia, que eles poderiam fazê-lo. Eles podem se abraçar, gargalhar, chorar. Foi muito gostoso ser uma observadora. O final de cada programa é muito bonito. É o momento em que um entrevistado fala sobre o outro.
No Encontro, ao vivo, diariamente em uma TV Aberta, você tinha que lidar com a audiência o tempo todo, era informada sobre os números com o programa no ar...
Não, não era.
Por um pedido seu?
Sim, sim. Era um combinado. A pessoa que trabalha comigo no ponto, em geral, fala bem pouco. Gosto de ouvir o que o entrevistado está dizendo. Mergulho no universo do estúdio. Se uma pessoa ficar falando o tempo todo comigo, me atrapalha. Tínhamos apenas alguns códigos, como passagem de bloco, hora do merchandising, encerramento etc.
Você sai da TV aberta e vai para um canal fechado e uma plataforma de streaming. Embora muita gente esteja conectado, o País é muito grande, com realidades muito diversas. Acredita que, agora, passa a falar com um público diferente do que está acostumada?
O meu público está dentro do GNT. É menor, mas está lá. Não devemos subestimar o público da TV aberta. Ele aprendeu a avaliar a televisão de uma maneira muito interessante. Na época que eu fazia o Jornal Nacional havia muitas pesquisas e era possível perceber que os telespectadores sabiam identificar muito bem as matérias, os quadros. Penso que temos que sempre oferecer o melhor. Fazer algo interessante.
Há chances de o Assim Como A Gente passar na TV Globo?
Não me falaram nada sobre isso. Se ocorrer, o público será brindado com um programa muito legal.
Já estão pensando ou gravando a segunda temporada?
Você está me dizendo que terão outras? (brinca Fátima). Não sei se terão. Oferecemos esses dez programas. Se eles acharem que podem ter outras temporadas...
É do seu desejo que tenham outras?
Por mim, sim.
Você vai começar a gravar a última temporada do The Voice. Como foi a experiência no programa?
Adorei fazer. Nunca havia apresentado um reality show. Ele é um programa totalmente de entretenimento. Lamento ter feito apenas três edições. Queria ter feito mais. Foi interessante sair de um programa (o Encontro) que tinha entretenimento, em que eu podia cair, dançar, cantar, mas também dar uma notícia trágica, e ir para o outro em que eu tinha o relaxamento de saber que eu só teria que lidar com a beleza e o sonho das pessoas. Espero que essa última temporada seja bem festiva!
Quando você saiu do Jornal Nacional, você já tinha mais de 40 anos. Você recomeçou após os 40, idade em que o mercado de trabalho começa a ficar desfavorável para muitas pessoas. Como foi isso para você?
Nunca penso em idade. Isso não me define em nada. Me enxergo a partir das minhas vontades. Se eu me tolher, como as pessoas vão me olhar? Eu sei o tipo de energia, de disposição e da vontade que eu tenho. O público merece o meu melhor, sempre. Quando eu percebi que estava desacelerando, entrando no automático, decidi sair (do Jornal Nacional). Não era infelicidade. Era uma percepção. Aí, sim, pensei: como eu estarei daqui a cinco anos? Infeliz? O mesmo ocorreu com o Encontro, que era jornalismo e entretenimento. Eu queria fazer só entretenimento. Queria me testar. O Assim Como a Gente é entretenimento com informação, que é o futuro. Não precisa ter jornalismo, apenas estar conectado com a realidade.
A mudança maior, nesses anos todos, foi profissional ou pessoal?
Tudo junto. Passei por transformações pessoais muito fortes. Me divorciei, comecei um novo relacionamento. Isso tudo, claro, estava relacionado ao que eu estava fazendo. E, profissionalmente, me expus muito mais na escolha dos temas do Encontro e, agora, com a escolha dos convidados do Assim Como a Gente. Tive muito mais oportunidade de fazer isso do que quando eu estava no jornalismo. Percebi que um apresentador precisa se posicionar, mostrar quem ele é. Dei esse passo e tudo mudou.
Expor seus posicionamentos implica em ser alvo de críticas e ataques, tão comuns atualmente, sobretudo em redes sociais. Como aprendeu a lidar com isso?
Hoje, com a idade que estou (Fátima tem 61 anos)... Eu me preocupo muito com as pessoas jovens, que sofrem, que são destruídas por ataques em redes sociais ou que vivem em função disso. O ataque diz mais sobre a pessoa que faz o comentário do que quem ela está criticando. Raramente respondo. Não entro em briga. Não tenho nada com isso. Eu tive a felicidade de ter um retorno forte de público na minha carreira. Não tenho 15 minutos de fama. Tenho 37 anos de história na TV Globo. E foi tudo construído aos poucos, desde o primeiro autógrafo em um papelzinho, as primeiras fotografias, os primeiros comentários nas redes sociais. A idade e uma carreira bem construída me possibilitam lidar bem com isso.