Luta pessoal se torna pública para âncora da CNN que revelou câncer ao vivo: ‘Quero ser útil’


Sara Sidner, um dos rostos mais conhecidos da televisão americana, apresentou o telejornal com um balde ao lado, ao longo de meses, para o caso de precisar vomitar e só faltou ao trabalho uma vez. Depois de começar a escrever cartas de despedida, ela entendeu que não tinha permissão para desistir: ‘Lutar por si mesma é uma coisa boa’

Por Timothy Bella
Atualização:

NOVA YORK - Nos dias em que os efeitos da quimioterapia ficavam muito ruins, Sara Sidner deixava um balde ao lado de sua bancada de âncora na CNN. Nunca se sabe quando será preciso vomitar em rede nacional enquanto se dá uma notícia.

A dor causada pelo câncer de mama em estágio 3, os meses de quimioterapia e a mastectomia dupla em maio – “Ah, eu me sinto muito mais leve”, brincou ela depois da cirurgia – nem sempre são medidas em palavras. Mas suas palavras também podem ser bonitas, como quando ela anunciou seu diagnóstico ao vivo na televisão: “Só o fato de estar viva já me faz sentir muito diferente.”

Outras vezes, porém, Sidner expressa sua luta diária e seus sentimentos – tristeza, ansiedade, exaustão – com outra coisa: emojis de cocô.

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Depois da 16ª e última rodada de quimioterapia em abril, quando ela disse que não iria trabalhar porque estava fraca demais para ser âncora do CNN News Central, o programa matinal de notícias que Sidner apresenta com John Berman e Kate Bolduan, ela mandou sete desses emojis, algo que Berman descreveu como “um pouco demais”. Foi o único dia em que Sidner pediu licença médica durante a quimioterapia.

“Só eles conseguiriam me fazer rir sobre cocô e câncer ao mesmo tempo”, disse Sidner, 52 anos, sobre seus colegas.

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Esses breves momentos de humor grosseiro entre amigos são uma distração passageira no que tem sido um ano aterrorizante. Ela deixou de pensar que sua vida tinha acabado e de escrever cartas de despedida para seus entes queridos e passou a lutar contra a doença com todas as forças. Sidner, jornalista veterana que foi aclamada na CNN quando era correspondente internacional e cresceu na carreira com a cobertura do assassinato de George Floyd e do aumento das mortes por coronavírus no auge da pandemia, está enfrentando um inferno.

Sidner vem fazendo o que tem feito durante todo o diagnóstico e o tratamento: está trabalhando. Ela acabou de ganhar seu primeiro prêmio News Emmy como âncora pela cobertura do descarrilamento do trem tóxico em East Palestine, Ohio. A quem pergunta como ela está, Sidner responde: Ela não está morta. Longe disso.

Sara Sidner ao vivo na CNN, quando anunciou que tratava um câncer de mama. Foto: CNN/Youtube
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“Eu sei que houve dias em que ela não estava se sentindo bem, especialmente durante a quimioterapia, quando ela ficava com o balde de vômito perto dela e dizia: ‘Pessoal, vamos trabalhar e, se for preciso, vou vomitar no ar, e vamos seguir em frente’. A Sara é assim”, disse Harry Enten, amigo e repórter de dados políticos da CNN.

Nesse processo, ela não apenas continuou cobrindo as maiores histórias do mundo, mas também usou sua plataforma para divulgar a conscientização sobre o câncer de mama entre as mulheres negras.

As mulheres negras têm um risco menor de serem diagnosticadas com câncer de mama em comparação com as mulheres brancas, mas têm 40% mais chances de morrer da doença, geralmente porque são diagnosticadas em estágios mais avançados, quando é mais difícil tratar, de acordo com a Sociedade Americana de Câncer.

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“O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define”, disse Alexandra Heerdt, médica de Sidner no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York.

O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define

Alexandra Heerdt, médica de Sidner

Monique James, psiquiatra do centro que trabalha com pacientes com câncer de mama, acrescentou: “Ela está chegando a muitas mulheres negras por ser quem é e por ser muito aberta ao falar sobre o assunto. É uma coisa impressionante”. Sidner vem convocado as mulheres a fazer autoexames e mamografias.

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Agora, enquanto aguarda a cirurgia de reconstrução da mama daqui a seis meses, Sidner reflete sobre o que a impede de deixar essa parte de sua vida escapar.

“Quero ser útil”, disse ela. “Não tenho permissão para desistir. Lutar por si mesma é uma coisa boa”.

O dia mais difícil

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Quando Sidner desligou o telefone com a enfermeira em outubro passado, ela pensou que a enfermeira não a tivesse ouvido. Quem agradece a alguém por lhe dizer que tem câncer? Sidner havia se preparado para o pior depois que descobriu um nódulo, e os médicos ordenaram que ela fizesse uma biópsia após uma mamografia. Mas a realidade do momento a deixou calada quando recebeu a ligação em sua casa em Nova York. Ela não compartilhou imediatamente a notícia nem com seu marido, que mora na Califórnia.

Quando o médico deu ao casal a notícia de que o câncer estava no estágio 3 e que a taxa estimada de sobrevivência em cinco anos estaria entre 60% e 70%, o gemido gutural dele é algo que ela consegue ouvir ainda hoje.

“Foi o dia mais difícil de tudo isso, porque consigo controlar como vou reagir, mas não posso controlar como as outras pessoas se sentem”, disse ela.

A princípio, Sidner estava resignada com a morte e tinha uma ideia de como escreveria as cartas a seus entes queridos: “Não quero que vocês fiquem de luto nem por um segundo”. Mas, na carta para sua mãe, ela não conseguiu passar de “Querida mãe”. Foi quando ela sentiu uma mudança, quando decidiu que iria canalizar sua resposta emocional para atacar a doença.

“De repente, pensei: esta é sua batalha pessoal e, se você não lutar agora, não poderá fazer mais nada”, disse ela.

A jornalista Sara Sidner, âncora da CNN americana, que vem tratando um câncer de mama. Foto: Danielle Amy/The Washington Post  Foto: Danielle Amy/for The Washington Post

Quando ela contou aos colegas da CNN, eles ficaram chocados ao saber que ela tinha acabado de estar em Israel cobrindo o ataque mortal do Hamas que deu início à guerra. Bolduan se lembra de Sidner entrando em seu escritório para dar a notícia.

“Ela disse algo como: ‘Não se preocupe, eu cuido disso. Não gosto de dar muita importância a essas coisas”, disse Bolduan durante uma ligação pelo Zoom. “Eu fiquei realmente chocado e triste, mas ela estava sorrindo para mim, e eu me lembro de ter pensado: ‘Ela está sorrindo, então você tem de sorrir também. Ela vai ficar bem.”

Seus chefes sugeriram que ela ligasse para Jeff Zucker, ex-presidente da CNN, que havia sido tratado de câncer de cólon décadas antes e mantinha contato com Sidner.

“Imediatamente fiz a ela o mesmo discurso que faço a qualquer pessoa na mesma posição”, disse Zucker em entrevista por telefone. “Vamos enfrentar isso agora mesmo, fazer com que seja nossa tarefa mais urgente e vamos vencer.”

Dias depois, os médicos do Memorial Sloan Kettering Cancer Center traçaram o plano de quimioterapia com uma possível mastectomia dupla. A decisão de anunciar publicamente seu diagnóstico veio mais cedo do que ela esperava, depois de ter tido dificuldades com uma peruca que usava no ar para cobrir seu cabelo ralo.

Em 8 de janeiro, Sidner compartilhou com os telespectadores como, apesar de nunca ter fumado, raramente ter ingerido álcool e não ter histórico familiar da doença (todos fatores de risco), ela estava com câncer de mama.

“Eu agradeci ao câncer por ter me escolhido”, disse ela, segurando as lágrimas. “Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida”. O diagnóstico, segundo ela, teve o efeito surpreendente de torná-la grata por poder respirar todos os dias. O momento logo viralizou nas redes sociais.

Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida

Sara Sidner

“Ela se apoderou dessa coisa, assumiu o controle e foi honesta o tempo todo”, disse Berman no Zoom. “Ela queria entregar aquele momento direto para a câmera, por conta própria, e acho que foi uma coisa muito poderosa.”

Sentada na cadeira de quimioterapia, Sidner se aprofundava nos sentimentos, buscando o zen. Nos dias de recuperação, ela lia livros, assistia a desenhos animados e a dramas de época britânicos, ou até mesmo trabalhava na sua declaração de imposto de renda (sim, ela realmente fez isso). Ela também caminhava ou corria o máximo que podia, ou documentava seu treino de peso no Instagram. Em um vídeo após sua mastectomia, em maio, ela disse que sua agonia era comparável a uma luta de boxe com Mike Tyson.

“Ele venceu”, escreveu ela. “Mas eu também, porque sobrevivi”. Em uma manhã sombria de quarta-feira em Manhattan, Sidner, agora na pós-menopausa, está aproveitando a adrenalina alta que vem depois que o jornal termina.

Ela sabe que o cansaço voltará em breve. Sidner está no meio de uma radioterapia, atravessando a cidade cinco dias por semana para fazer tratamentos de 20 minutos. Em seis meses, passará por uma dolorosa cirurgia de reconstrução da mama, que ela imagina que será um dia de dez emojis de cocô: “Eu nunca cheguei a dez antes”.

Até lá, ela está contando com uma força que não sabia que tinha. Quão forte ela é? Sidner levantou 90 quilos em um dia sem quimioterapia, quando deveria se sentir ainda mais fraca. O feito é um de seus dias favoritos desde o diagnóstico.

Não importa como sua história de câncer termine, Sidner quer manter os pés no chão e parar de fingir que está bem nos dias em que não está.

“Mas quer saber de uma coisa?”, ela me perguntou. “Ainda é melhor estar viva do que a alternativa.”

Sim, muito melhor. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

NOVA YORK - Nos dias em que os efeitos da quimioterapia ficavam muito ruins, Sara Sidner deixava um balde ao lado de sua bancada de âncora na CNN. Nunca se sabe quando será preciso vomitar em rede nacional enquanto se dá uma notícia.

A dor causada pelo câncer de mama em estágio 3, os meses de quimioterapia e a mastectomia dupla em maio – “Ah, eu me sinto muito mais leve”, brincou ela depois da cirurgia – nem sempre são medidas em palavras. Mas suas palavras também podem ser bonitas, como quando ela anunciou seu diagnóstico ao vivo na televisão: “Só o fato de estar viva já me faz sentir muito diferente.”

Outras vezes, porém, Sidner expressa sua luta diária e seus sentimentos – tristeza, ansiedade, exaustão – com outra coisa: emojis de cocô.

Depois da 16ª e última rodada de quimioterapia em abril, quando ela disse que não iria trabalhar porque estava fraca demais para ser âncora do CNN News Central, o programa matinal de notícias que Sidner apresenta com John Berman e Kate Bolduan, ela mandou sete desses emojis, algo que Berman descreveu como “um pouco demais”. Foi o único dia em que Sidner pediu licença médica durante a quimioterapia.

“Só eles conseguiriam me fazer rir sobre cocô e câncer ao mesmo tempo”, disse Sidner, 52 anos, sobre seus colegas.

Esses breves momentos de humor grosseiro entre amigos são uma distração passageira no que tem sido um ano aterrorizante. Ela deixou de pensar que sua vida tinha acabado e de escrever cartas de despedida para seus entes queridos e passou a lutar contra a doença com todas as forças. Sidner, jornalista veterana que foi aclamada na CNN quando era correspondente internacional e cresceu na carreira com a cobertura do assassinato de George Floyd e do aumento das mortes por coronavírus no auge da pandemia, está enfrentando um inferno.

Sidner vem fazendo o que tem feito durante todo o diagnóstico e o tratamento: está trabalhando. Ela acabou de ganhar seu primeiro prêmio News Emmy como âncora pela cobertura do descarrilamento do trem tóxico em East Palestine, Ohio. A quem pergunta como ela está, Sidner responde: Ela não está morta. Longe disso.

Sara Sidner ao vivo na CNN, quando anunciou que tratava um câncer de mama. Foto: CNN/Youtube

“Eu sei que houve dias em que ela não estava se sentindo bem, especialmente durante a quimioterapia, quando ela ficava com o balde de vômito perto dela e dizia: ‘Pessoal, vamos trabalhar e, se for preciso, vou vomitar no ar, e vamos seguir em frente’. A Sara é assim”, disse Harry Enten, amigo e repórter de dados políticos da CNN.

Nesse processo, ela não apenas continuou cobrindo as maiores histórias do mundo, mas também usou sua plataforma para divulgar a conscientização sobre o câncer de mama entre as mulheres negras.

As mulheres negras têm um risco menor de serem diagnosticadas com câncer de mama em comparação com as mulheres brancas, mas têm 40% mais chances de morrer da doença, geralmente porque são diagnosticadas em estágios mais avançados, quando é mais difícil tratar, de acordo com a Sociedade Americana de Câncer.

“O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define”, disse Alexandra Heerdt, médica de Sidner no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York.

O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define

Alexandra Heerdt, médica de Sidner

Monique James, psiquiatra do centro que trabalha com pacientes com câncer de mama, acrescentou: “Ela está chegando a muitas mulheres negras por ser quem é e por ser muito aberta ao falar sobre o assunto. É uma coisa impressionante”. Sidner vem convocado as mulheres a fazer autoexames e mamografias.

Agora, enquanto aguarda a cirurgia de reconstrução da mama daqui a seis meses, Sidner reflete sobre o que a impede de deixar essa parte de sua vida escapar.

“Quero ser útil”, disse ela. “Não tenho permissão para desistir. Lutar por si mesma é uma coisa boa”.

O dia mais difícil

Quando Sidner desligou o telefone com a enfermeira em outubro passado, ela pensou que a enfermeira não a tivesse ouvido. Quem agradece a alguém por lhe dizer que tem câncer? Sidner havia se preparado para o pior depois que descobriu um nódulo, e os médicos ordenaram que ela fizesse uma biópsia após uma mamografia. Mas a realidade do momento a deixou calada quando recebeu a ligação em sua casa em Nova York. Ela não compartilhou imediatamente a notícia nem com seu marido, que mora na Califórnia.

Quando o médico deu ao casal a notícia de que o câncer estava no estágio 3 e que a taxa estimada de sobrevivência em cinco anos estaria entre 60% e 70%, o gemido gutural dele é algo que ela consegue ouvir ainda hoje.

“Foi o dia mais difícil de tudo isso, porque consigo controlar como vou reagir, mas não posso controlar como as outras pessoas se sentem”, disse ela.

A princípio, Sidner estava resignada com a morte e tinha uma ideia de como escreveria as cartas a seus entes queridos: “Não quero que vocês fiquem de luto nem por um segundo”. Mas, na carta para sua mãe, ela não conseguiu passar de “Querida mãe”. Foi quando ela sentiu uma mudança, quando decidiu que iria canalizar sua resposta emocional para atacar a doença.

“De repente, pensei: esta é sua batalha pessoal e, se você não lutar agora, não poderá fazer mais nada”, disse ela.

A jornalista Sara Sidner, âncora da CNN americana, que vem tratando um câncer de mama. Foto: Danielle Amy/The Washington Post  Foto: Danielle Amy/for The Washington Post

Quando ela contou aos colegas da CNN, eles ficaram chocados ao saber que ela tinha acabado de estar em Israel cobrindo o ataque mortal do Hamas que deu início à guerra. Bolduan se lembra de Sidner entrando em seu escritório para dar a notícia.

“Ela disse algo como: ‘Não se preocupe, eu cuido disso. Não gosto de dar muita importância a essas coisas”, disse Bolduan durante uma ligação pelo Zoom. “Eu fiquei realmente chocado e triste, mas ela estava sorrindo para mim, e eu me lembro de ter pensado: ‘Ela está sorrindo, então você tem de sorrir também. Ela vai ficar bem.”

Seus chefes sugeriram que ela ligasse para Jeff Zucker, ex-presidente da CNN, que havia sido tratado de câncer de cólon décadas antes e mantinha contato com Sidner.

“Imediatamente fiz a ela o mesmo discurso que faço a qualquer pessoa na mesma posição”, disse Zucker em entrevista por telefone. “Vamos enfrentar isso agora mesmo, fazer com que seja nossa tarefa mais urgente e vamos vencer.”

Dias depois, os médicos do Memorial Sloan Kettering Cancer Center traçaram o plano de quimioterapia com uma possível mastectomia dupla. A decisão de anunciar publicamente seu diagnóstico veio mais cedo do que ela esperava, depois de ter tido dificuldades com uma peruca que usava no ar para cobrir seu cabelo ralo.

Em 8 de janeiro, Sidner compartilhou com os telespectadores como, apesar de nunca ter fumado, raramente ter ingerido álcool e não ter histórico familiar da doença (todos fatores de risco), ela estava com câncer de mama.

“Eu agradeci ao câncer por ter me escolhido”, disse ela, segurando as lágrimas. “Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida”. O diagnóstico, segundo ela, teve o efeito surpreendente de torná-la grata por poder respirar todos os dias. O momento logo viralizou nas redes sociais.

Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida

Sara Sidner

“Ela se apoderou dessa coisa, assumiu o controle e foi honesta o tempo todo”, disse Berman no Zoom. “Ela queria entregar aquele momento direto para a câmera, por conta própria, e acho que foi uma coisa muito poderosa.”

Sentada na cadeira de quimioterapia, Sidner se aprofundava nos sentimentos, buscando o zen. Nos dias de recuperação, ela lia livros, assistia a desenhos animados e a dramas de época britânicos, ou até mesmo trabalhava na sua declaração de imposto de renda (sim, ela realmente fez isso). Ela também caminhava ou corria o máximo que podia, ou documentava seu treino de peso no Instagram. Em um vídeo após sua mastectomia, em maio, ela disse que sua agonia era comparável a uma luta de boxe com Mike Tyson.

“Ele venceu”, escreveu ela. “Mas eu também, porque sobrevivi”. Em uma manhã sombria de quarta-feira em Manhattan, Sidner, agora na pós-menopausa, está aproveitando a adrenalina alta que vem depois que o jornal termina.

Ela sabe que o cansaço voltará em breve. Sidner está no meio de uma radioterapia, atravessando a cidade cinco dias por semana para fazer tratamentos de 20 minutos. Em seis meses, passará por uma dolorosa cirurgia de reconstrução da mama, que ela imagina que será um dia de dez emojis de cocô: “Eu nunca cheguei a dez antes”.

Até lá, ela está contando com uma força que não sabia que tinha. Quão forte ela é? Sidner levantou 90 quilos em um dia sem quimioterapia, quando deveria se sentir ainda mais fraca. O feito é um de seus dias favoritos desde o diagnóstico.

Não importa como sua história de câncer termine, Sidner quer manter os pés no chão e parar de fingir que está bem nos dias em que não está.

“Mas quer saber de uma coisa?”, ela me perguntou. “Ainda é melhor estar viva do que a alternativa.”

Sim, muito melhor. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

NOVA YORK - Nos dias em que os efeitos da quimioterapia ficavam muito ruins, Sara Sidner deixava um balde ao lado de sua bancada de âncora na CNN. Nunca se sabe quando será preciso vomitar em rede nacional enquanto se dá uma notícia.

A dor causada pelo câncer de mama em estágio 3, os meses de quimioterapia e a mastectomia dupla em maio – “Ah, eu me sinto muito mais leve”, brincou ela depois da cirurgia – nem sempre são medidas em palavras. Mas suas palavras também podem ser bonitas, como quando ela anunciou seu diagnóstico ao vivo na televisão: “Só o fato de estar viva já me faz sentir muito diferente.”

Outras vezes, porém, Sidner expressa sua luta diária e seus sentimentos – tristeza, ansiedade, exaustão – com outra coisa: emojis de cocô.

Depois da 16ª e última rodada de quimioterapia em abril, quando ela disse que não iria trabalhar porque estava fraca demais para ser âncora do CNN News Central, o programa matinal de notícias que Sidner apresenta com John Berman e Kate Bolduan, ela mandou sete desses emojis, algo que Berman descreveu como “um pouco demais”. Foi o único dia em que Sidner pediu licença médica durante a quimioterapia.

“Só eles conseguiriam me fazer rir sobre cocô e câncer ao mesmo tempo”, disse Sidner, 52 anos, sobre seus colegas.

Esses breves momentos de humor grosseiro entre amigos são uma distração passageira no que tem sido um ano aterrorizante. Ela deixou de pensar que sua vida tinha acabado e de escrever cartas de despedida para seus entes queridos e passou a lutar contra a doença com todas as forças. Sidner, jornalista veterana que foi aclamada na CNN quando era correspondente internacional e cresceu na carreira com a cobertura do assassinato de George Floyd e do aumento das mortes por coronavírus no auge da pandemia, está enfrentando um inferno.

Sidner vem fazendo o que tem feito durante todo o diagnóstico e o tratamento: está trabalhando. Ela acabou de ganhar seu primeiro prêmio News Emmy como âncora pela cobertura do descarrilamento do trem tóxico em East Palestine, Ohio. A quem pergunta como ela está, Sidner responde: Ela não está morta. Longe disso.

Sara Sidner ao vivo na CNN, quando anunciou que tratava um câncer de mama. Foto: CNN/Youtube

“Eu sei que houve dias em que ela não estava se sentindo bem, especialmente durante a quimioterapia, quando ela ficava com o balde de vômito perto dela e dizia: ‘Pessoal, vamos trabalhar e, se for preciso, vou vomitar no ar, e vamos seguir em frente’. A Sara é assim”, disse Harry Enten, amigo e repórter de dados políticos da CNN.

Nesse processo, ela não apenas continuou cobrindo as maiores histórias do mundo, mas também usou sua plataforma para divulgar a conscientização sobre o câncer de mama entre as mulheres negras.

As mulheres negras têm um risco menor de serem diagnosticadas com câncer de mama em comparação com as mulheres brancas, mas têm 40% mais chances de morrer da doença, geralmente porque são diagnosticadas em estágios mais avançados, quando é mais difícil tratar, de acordo com a Sociedade Americana de Câncer.

“O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define”, disse Alexandra Heerdt, médica de Sidner no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York.

O fato de ela ter decidido ir ao ar e falar sobre o que estava passando e colocar isso no contexto, não porque quisesse falar sobre si mesma, mas para ajudar outras pessoas – isso a define

Alexandra Heerdt, médica de Sidner

Monique James, psiquiatra do centro que trabalha com pacientes com câncer de mama, acrescentou: “Ela está chegando a muitas mulheres negras por ser quem é e por ser muito aberta ao falar sobre o assunto. É uma coisa impressionante”. Sidner vem convocado as mulheres a fazer autoexames e mamografias.

Agora, enquanto aguarda a cirurgia de reconstrução da mama daqui a seis meses, Sidner reflete sobre o que a impede de deixar essa parte de sua vida escapar.

“Quero ser útil”, disse ela. “Não tenho permissão para desistir. Lutar por si mesma é uma coisa boa”.

O dia mais difícil

Quando Sidner desligou o telefone com a enfermeira em outubro passado, ela pensou que a enfermeira não a tivesse ouvido. Quem agradece a alguém por lhe dizer que tem câncer? Sidner havia se preparado para o pior depois que descobriu um nódulo, e os médicos ordenaram que ela fizesse uma biópsia após uma mamografia. Mas a realidade do momento a deixou calada quando recebeu a ligação em sua casa em Nova York. Ela não compartilhou imediatamente a notícia nem com seu marido, que mora na Califórnia.

Quando o médico deu ao casal a notícia de que o câncer estava no estágio 3 e que a taxa estimada de sobrevivência em cinco anos estaria entre 60% e 70%, o gemido gutural dele é algo que ela consegue ouvir ainda hoje.

“Foi o dia mais difícil de tudo isso, porque consigo controlar como vou reagir, mas não posso controlar como as outras pessoas se sentem”, disse ela.

A princípio, Sidner estava resignada com a morte e tinha uma ideia de como escreveria as cartas a seus entes queridos: “Não quero que vocês fiquem de luto nem por um segundo”. Mas, na carta para sua mãe, ela não conseguiu passar de “Querida mãe”. Foi quando ela sentiu uma mudança, quando decidiu que iria canalizar sua resposta emocional para atacar a doença.

“De repente, pensei: esta é sua batalha pessoal e, se você não lutar agora, não poderá fazer mais nada”, disse ela.

A jornalista Sara Sidner, âncora da CNN americana, que vem tratando um câncer de mama. Foto: Danielle Amy/The Washington Post  Foto: Danielle Amy/for The Washington Post

Quando ela contou aos colegas da CNN, eles ficaram chocados ao saber que ela tinha acabado de estar em Israel cobrindo o ataque mortal do Hamas que deu início à guerra. Bolduan se lembra de Sidner entrando em seu escritório para dar a notícia.

“Ela disse algo como: ‘Não se preocupe, eu cuido disso. Não gosto de dar muita importância a essas coisas”, disse Bolduan durante uma ligação pelo Zoom. “Eu fiquei realmente chocado e triste, mas ela estava sorrindo para mim, e eu me lembro de ter pensado: ‘Ela está sorrindo, então você tem de sorrir também. Ela vai ficar bem.”

Seus chefes sugeriram que ela ligasse para Jeff Zucker, ex-presidente da CNN, que havia sido tratado de câncer de cólon décadas antes e mantinha contato com Sidner.

“Imediatamente fiz a ela o mesmo discurso que faço a qualquer pessoa na mesma posição”, disse Zucker em entrevista por telefone. “Vamos enfrentar isso agora mesmo, fazer com que seja nossa tarefa mais urgente e vamos vencer.”

Dias depois, os médicos do Memorial Sloan Kettering Cancer Center traçaram o plano de quimioterapia com uma possível mastectomia dupla. A decisão de anunciar publicamente seu diagnóstico veio mais cedo do que ela esperava, depois de ter tido dificuldades com uma peruca que usava no ar para cobrir seu cabelo ralo.

Em 8 de janeiro, Sidner compartilhou com os telespectadores como, apesar de nunca ter fumado, raramente ter ingerido álcool e não ter histórico familiar da doença (todos fatores de risco), ela estava com câncer de mama.

“Eu agradeci ao câncer por ter me escolhido”, disse ela, segurando as lágrimas. “Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida”. O diagnóstico, segundo ela, teve o efeito surpreendente de torná-la grata por poder respirar todos os dias. O momento logo viralizou nas redes sociais.

Estou aprendendo que, não importa o inferno que enfrentamos na vida, eu ainda sou loucamente apaixonada por esta vida

Sara Sidner

“Ela se apoderou dessa coisa, assumiu o controle e foi honesta o tempo todo”, disse Berman no Zoom. “Ela queria entregar aquele momento direto para a câmera, por conta própria, e acho que foi uma coisa muito poderosa.”

Sentada na cadeira de quimioterapia, Sidner se aprofundava nos sentimentos, buscando o zen. Nos dias de recuperação, ela lia livros, assistia a desenhos animados e a dramas de época britânicos, ou até mesmo trabalhava na sua declaração de imposto de renda (sim, ela realmente fez isso). Ela também caminhava ou corria o máximo que podia, ou documentava seu treino de peso no Instagram. Em um vídeo após sua mastectomia, em maio, ela disse que sua agonia era comparável a uma luta de boxe com Mike Tyson.

“Ele venceu”, escreveu ela. “Mas eu também, porque sobrevivi”. Em uma manhã sombria de quarta-feira em Manhattan, Sidner, agora na pós-menopausa, está aproveitando a adrenalina alta que vem depois que o jornal termina.

Ela sabe que o cansaço voltará em breve. Sidner está no meio de uma radioterapia, atravessando a cidade cinco dias por semana para fazer tratamentos de 20 minutos. Em seis meses, passará por uma dolorosa cirurgia de reconstrução da mama, que ela imagina que será um dia de dez emojis de cocô: “Eu nunca cheguei a dez antes”.

Até lá, ela está contando com uma força que não sabia que tinha. Quão forte ela é? Sidner levantou 90 quilos em um dia sem quimioterapia, quando deveria se sentir ainda mais fraca. O feito é um de seus dias favoritos desde o diagnóstico.

Não importa como sua história de câncer termine, Sidner quer manter os pés no chão e parar de fingir que está bem nos dias em que não está.

“Mas quer saber de uma coisa?”, ela me perguntou. “Ainda é melhor estar viva do que a alternativa.”

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