A 123milhas e a Art Viagens entregaram nesta quarta-feira, 30 a lista de credores à Justiça de Minas Gerais, com mais de 5 mil páginas. A maioria deles são pessoas físicas, com valores na casa dos milhares de reais a receber.
No total, a 123milhas e a Art Viagens (nome oficial da Hotmilhas, uma das principais fornecedoras da 123milhas, que figura como garantidora em uma série de contratos/obrigações, ocupando até a posição de devedora solidária) têm dívidas de R$ 2,1 bilhões com credores sem garantias, de acordo com documentos aos quais o Estadão/Broadcast teve acesso. Os próprios sócios da empresa, Ramiro Julio Soares Madureira e Augusto Júlio Soares Madureira, constam da relação de credores.
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Entre as empresas sujeitas ao processo de recuperação judicial há uma série de redes hoteleiras, como a espanhola Restels, a AG Hotéis e Turismo e o Transamérica. Também estão na lista a Azul Linhas Aéreas, com R$ 505 mil em débitos a receber; o Google, com R$ 24,3 milhões; a Méliuz, com R$ 244 mil; e a Caixa, com R$ 4,9 milhões.
A empresa também fez dívidas com o Facebook, a Eletromidia, o banco digital BMP e pousadas e agências de turismo.
Já dentre os credores extraconcursais, ou seja, que não estão sujeitos à recuperação judicial, aparecem o Banco do Brasil e o Santander, com R$ 74 milhões e R$ 8 milhões, respectivamente, em dívidas a receber da companhia.
Esses créditos não serão submetidos ao plano de recuperação judicial que será apresentado pelas empresas e nem sofrerão descontos.
Prejuízo
O balanço da companhia protocolado na Justiça de Minais Gerais com o pedido de recuperação judicial mostra que, nos primeiros seis meses deste ano, a 123milhas teve prejuízo líquido de R$ 1,671 bilhão. No mesmo período de 2022, as perdas haviam sido de R$ 13,134 milhões.
Na peça, obtida pelo Estadão/Broadcast, a companhia informa ter tido receita líquida de R$ 148,494 milhões. Foi um crescimento de 30% em relação ao mesmo período de 2022, mas os custos subiram mais de 15 vezes em um ano, para R$ 825,594 milhões.
A 123milhas também teve perda de R$ 818,582 milhões no primeiro semestre deste ano por desvalorização de ativos, como o item contas a receber de clientes. Combinados, os fatores levaram à perda registrada nos primeiros seis meses do ano.
A companhia afirma que os problemas do produto Promo, que teve as viagens programadas para o período entre setembro e dezembro suspensas há algumas semanas, impactaram o valor dos ativos. Segundo a 123milhas, até o fechamento do balanço, não foi possível mensurar com precisão os passivos contingentes (aqueles relativos a eventos futuros) relacionados ao pacote Promo.
O balanço aponta ainda que, entre dezembro do ano passado e junho deste ano, o patrimônio líquido da 123milhas saiu de R$ 5,8 milhões negativos para R$ 1,676 bilhão negativo. A maior variação foi na conta de contratos a embarcar, referentes a passagens compradas pelos clientes e que ainda precisavam ser honradas.
O montante nessa linha que a empresa tinha de honrar em até um ano somava R$ 774,269 milhões em junho, alta de mais de seis vezes em um semestre. O volume a honrar mais de 12 meses à frente era de R$ 260,056 milhões, alta de mais de três vezes no mesmo período.
O número retrata o problema que levou à crise da companhia: a 123milhas vendia aos clientes um produto que permitia que comprassem uma espécie de “promessa de viagem”, a um preço mais barato, em que a emissão dos bilhetes aconteceria em um momento posterior, quando a empresa encontrasse no mercado passagens aéreas que tivessem preço equivalente ao pago pelo consumidor.
A companhia estruturou o programa sob duas premissas: a de que o preço das passagens cairia após o período de restrições provocadas pela covid-19 e de que os clientes comprariam mais produtos e serviços. Nenhuma das duas se provou certa.
Processos
O documento a que a reportagem teve acesso lista ainda cerca de 16,6 mil processos movidos por pessoas físicas contra a empresa, de valores variados. Estes processos somam R$ 231,8 milhões, sendo que o maior deles tem valor de R$ 1,2 milhão. Não há detalhamento sobre os motivos de cada processo.
Ao todo, a 123milhas declarou ter R$ 2,3 bilhões em dívidas ao pedir recuperação judicial. A companhia ainda deve entregar parte dos documentos referentes ao processo, como a lista de credores completa./Talita Nascimento, Marcela Villar, Matheus Piovesana e Cynthia Decloedt