Acordo UE/Mercosul ganha mais força com guerra na Ucrânia, diz embaixador da UE no Brasil


Para Ignacio Ybáñez, o Brasil, para recuperar a confiança da União Europeia, deveria destinar mais orçamento aos órgãos que controlam desmatamento

Por Lorenna Rodrigues

BRASÍLIA - “Com a agressão da Rússia à Ucrânia, buscamos parceiros confiáveis e há interesse reforçado no acordo entre a União Europeia e o Mercosul”, afirma o embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybáñez. Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, ele disse que o conflito fez o bloco priorizar o processo e, apesar de admitir ser difícil que isso ocorra, que “seria muito bom” assinar o acordo logo depois das eleições, independentemente de quem ganhar.

Ybáñez adiantou que a Comissão Europeia já tem pronto um esboço do documento adicional que será apresentado por exigência de países europeus como forma de assegurar que o Brasil cumprirá com objetivos ambientais. Entre os pontos que estarão previstos nesse compromisso complementar está a exigência de mais recursos para órgãos ambientais como o Ibama.

“O problema é que os compromissos estão lá, mas os resultados, não. Quando você olha os índices de desmatamento do Brasil antes e depois de Glasgow (COP-26), continuam os mesmos”, afirmou.

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Depois de o ex-presidente e candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva falar em reabrir as negociações, o embaixador disse que uma eventual eleição do petista não é entrave para fechar o entendimento. “O que vamos dizer [à equipe de Lula] é que, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer.”

Ignacio Ybáñez; embaixador da União Europeia no Brasil, Ybáñez diz que 'seria muito bom' assinar o acordo logo depois das eleições, qualquer que seja o governo eleito. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Veja os principais trechos da entrevista.

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O Ministério da Economia disse recentemente que foi procurado por representantes da União Europeia para reabrir as negociações sobre o acordo com o Mercosul. Houve essa aproximação?

Ficamos surpresos porque, para nós, as negociações nunca foram fechadas. Ao contrário, nos últimos tempos tivemos avanços importantes em partes que não são tão visíveis, como sobre indicações geográficas. O acordo para nós sempre foi e continua sendo uma prioridade e, com a agressão da Rússia à Ucrânia, a busca por parceiros confiáveis é ainda mais importante do que era no passado. Podemos dizer que há um interesse reforçado. Seria muito bom neste momento sair um acordo UE/Mercosul, é importante para as duas regiões. Seria muito bom logo após as eleições, seja qual for o governo eleito, sair com um acordo assinado.

Mas o senhor vê chance de assinar o acordo este ano?

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Gostaria que fosse o quanto antes melhor, mas acho que, estando o Brasil em um processo eleitoral, é complicado.

O acordo foi fechado em 2019, mas ainda falta ser assinado, ser ratificado. Por que o processo é tão demorado?

O que aconteceu em 2020 e em 2021 foi que os índices de desmatamento do Brasil não deixaram de crescer, então surgiu uma desconfiança de países da União Europeia de que, com esses números, não seria possível para o Brasil cumprir seus compromissos ambientais. Chegamos a um compromisso de buscar um documento adicional [side letter] onde vamos recuperar a confiança através de compromissos bem estabelecidos em relação ao desmatamento. Finalizamos recentemente nosso trabalho interno dentro da Comissão Europeia e vamos apresentar a proposta para os estados membros.

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E o que podemos esperar desse documento?

O que teremos que buscar são elementos que restabelecem confiança. Por exemplo, o Brasil tem que voltar a colocar orçamento dentro dos órgãos que têm que fazer controle de desmatamento, como Ibama e ICMbio. Ninguém na União Europeia nem nos estados membros discutem a soberania do Brasil sob a Amazônia. Dito isso, o que oferecemos é cooperação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas para a presidência da República neste momento, falou na campanha em reabrir as negociações do acordo Mercosul/UE. Isso é algo que preocupa a UE?

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Temos tido conversas com a equipe dele e acho que, quando a equipe conhecer em mais profundidade o acordo, vai ficar mais confortável. O que vamos dizer é que, tecnicamente, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer. Do lado da UE, não há uma preocupação com o resultado das eleições, não é um acordo entre governos, mas entre sociedades.

Uma eventual eleição do ex-presidente Lula seria um entrave para a conclusão do acordo?

Para nós não. Quando você escuta os discursos do candidato Lula sobre o tema, vão em boa direção, e desse ponto de vista ficamos esperançosos. Quando ele fala das relações entre Brasil e Europa, em geral são mensagens positivas, ele tinha uma ótima relação com muitos dos líderes da União Europeia e nós acreditamos que isso vai se reproduzir olhando para o futuro.

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E a reeleição do presidente Jair Bolsonaro?

Também não. Pensamos que os dois candidatos que têm mais possibilidades [de serem eleitos] há uma boa receptividade à ideia do acordo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, recentemente disse que a França está ficando irrelevante para o Brasil e usou até um palavrão [o ministro disse que é melhor os franceses “nos tratarem bem porque senão vamos ligar o ‘f...-se’ para vocês”]. Isso prejudica as relações e o andamento das negociações?

Sempre qualquer palavra um pouco fora das relações ótimas entre a UE e o Brasil atrapalham um pouco, não podemos evitar. Mas também são ditas por outros políticos europeus. Eu, como embaixador da União Europeia, gostaria que nem um nem outro falasse esse tipo de coisa. Mas quando temos contato com o ministro Guedes, as mensagens são muito diferentes.

A União Europeia vê com alguma preocupação os ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez às urnas em reunião com embaixadores em julho? O senhor não estava?

Eu estava fora, mas foi a encarregada de negócios. Sempre que o presidente da República convida, nós participamos. Pensamos que o TSE fez e continuará a fazer um bom trabalho para assegurar eleições limpas e transparentes. Não temos uma preocupação geral [com o Brasil] baseado na nossa convicção de que as instituições brasileiras são fortes e o momento da posse do novo presidente do TSE foi uma ótima demonstração da fortaleza das instituições.

O conflito Rússia/Ucrânia está se agravando? Como a UE tem visto os últimos movimentos dos russos, como a interrupção no fornecimento de gás para os países do bloco?

A União Europeia vê esse conflito com grandíssima preocupação. Não queremos entrar em guerra com a Rússia, sabemos do efeito que isso poderia ter, mas estamos ajudando a Ucrânia a se defender. Nossas sanções estão muito focadas em penalizar o regime de Putin, nenhuma das sanções se aplica nem a produtos agrícolas nem a fertilizantes, que é uma preocupação do Brasil, e nem vão. Vamos continuar com as sanções e é possível que vamos até aumentar para conseguir mudanças de comportamento por parte da Rússia.

BRASÍLIA - “Com a agressão da Rússia à Ucrânia, buscamos parceiros confiáveis e há interesse reforçado no acordo entre a União Europeia e o Mercosul”, afirma o embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybáñez. Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, ele disse que o conflito fez o bloco priorizar o processo e, apesar de admitir ser difícil que isso ocorra, que “seria muito bom” assinar o acordo logo depois das eleições, independentemente de quem ganhar.

Ybáñez adiantou que a Comissão Europeia já tem pronto um esboço do documento adicional que será apresentado por exigência de países europeus como forma de assegurar que o Brasil cumprirá com objetivos ambientais. Entre os pontos que estarão previstos nesse compromisso complementar está a exigência de mais recursos para órgãos ambientais como o Ibama.

“O problema é que os compromissos estão lá, mas os resultados, não. Quando você olha os índices de desmatamento do Brasil antes e depois de Glasgow (COP-26), continuam os mesmos”, afirmou.

Depois de o ex-presidente e candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva falar em reabrir as negociações, o embaixador disse que uma eventual eleição do petista não é entrave para fechar o entendimento. “O que vamos dizer [à equipe de Lula] é que, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer.”

Ignacio Ybáñez; embaixador da União Europeia no Brasil, Ybáñez diz que 'seria muito bom' assinar o acordo logo depois das eleições, qualquer que seja o governo eleito. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Veja os principais trechos da entrevista.

O Ministério da Economia disse recentemente que foi procurado por representantes da União Europeia para reabrir as negociações sobre o acordo com o Mercosul. Houve essa aproximação?

Ficamos surpresos porque, para nós, as negociações nunca foram fechadas. Ao contrário, nos últimos tempos tivemos avanços importantes em partes que não são tão visíveis, como sobre indicações geográficas. O acordo para nós sempre foi e continua sendo uma prioridade e, com a agressão da Rússia à Ucrânia, a busca por parceiros confiáveis é ainda mais importante do que era no passado. Podemos dizer que há um interesse reforçado. Seria muito bom neste momento sair um acordo UE/Mercosul, é importante para as duas regiões. Seria muito bom logo após as eleições, seja qual for o governo eleito, sair com um acordo assinado.

Mas o senhor vê chance de assinar o acordo este ano?

Gostaria que fosse o quanto antes melhor, mas acho que, estando o Brasil em um processo eleitoral, é complicado.

O acordo foi fechado em 2019, mas ainda falta ser assinado, ser ratificado. Por que o processo é tão demorado?

O que aconteceu em 2020 e em 2021 foi que os índices de desmatamento do Brasil não deixaram de crescer, então surgiu uma desconfiança de países da União Europeia de que, com esses números, não seria possível para o Brasil cumprir seus compromissos ambientais. Chegamos a um compromisso de buscar um documento adicional [side letter] onde vamos recuperar a confiança através de compromissos bem estabelecidos em relação ao desmatamento. Finalizamos recentemente nosso trabalho interno dentro da Comissão Europeia e vamos apresentar a proposta para os estados membros.

E o que podemos esperar desse documento?

O que teremos que buscar são elementos que restabelecem confiança. Por exemplo, o Brasil tem que voltar a colocar orçamento dentro dos órgãos que têm que fazer controle de desmatamento, como Ibama e ICMbio. Ninguém na União Europeia nem nos estados membros discutem a soberania do Brasil sob a Amazônia. Dito isso, o que oferecemos é cooperação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas para a presidência da República neste momento, falou na campanha em reabrir as negociações do acordo Mercosul/UE. Isso é algo que preocupa a UE?

Temos tido conversas com a equipe dele e acho que, quando a equipe conhecer em mais profundidade o acordo, vai ficar mais confortável. O que vamos dizer é que, tecnicamente, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer. Do lado da UE, não há uma preocupação com o resultado das eleições, não é um acordo entre governos, mas entre sociedades.

Uma eventual eleição do ex-presidente Lula seria um entrave para a conclusão do acordo?

Para nós não. Quando você escuta os discursos do candidato Lula sobre o tema, vão em boa direção, e desse ponto de vista ficamos esperançosos. Quando ele fala das relações entre Brasil e Europa, em geral são mensagens positivas, ele tinha uma ótima relação com muitos dos líderes da União Europeia e nós acreditamos que isso vai se reproduzir olhando para o futuro.

E a reeleição do presidente Jair Bolsonaro?

Também não. Pensamos que os dois candidatos que têm mais possibilidades [de serem eleitos] há uma boa receptividade à ideia do acordo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, recentemente disse que a França está ficando irrelevante para o Brasil e usou até um palavrão [o ministro disse que é melhor os franceses “nos tratarem bem porque senão vamos ligar o ‘f...-se’ para vocês”]. Isso prejudica as relações e o andamento das negociações?

Sempre qualquer palavra um pouco fora das relações ótimas entre a UE e o Brasil atrapalham um pouco, não podemos evitar. Mas também são ditas por outros políticos europeus. Eu, como embaixador da União Europeia, gostaria que nem um nem outro falasse esse tipo de coisa. Mas quando temos contato com o ministro Guedes, as mensagens são muito diferentes.

A União Europeia vê com alguma preocupação os ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez às urnas em reunião com embaixadores em julho? O senhor não estava?

Eu estava fora, mas foi a encarregada de negócios. Sempre que o presidente da República convida, nós participamos. Pensamos que o TSE fez e continuará a fazer um bom trabalho para assegurar eleições limpas e transparentes. Não temos uma preocupação geral [com o Brasil] baseado na nossa convicção de que as instituições brasileiras são fortes e o momento da posse do novo presidente do TSE foi uma ótima demonstração da fortaleza das instituições.

O conflito Rússia/Ucrânia está se agravando? Como a UE tem visto os últimos movimentos dos russos, como a interrupção no fornecimento de gás para os países do bloco?

A União Europeia vê esse conflito com grandíssima preocupação. Não queremos entrar em guerra com a Rússia, sabemos do efeito que isso poderia ter, mas estamos ajudando a Ucrânia a se defender. Nossas sanções estão muito focadas em penalizar o regime de Putin, nenhuma das sanções se aplica nem a produtos agrícolas nem a fertilizantes, que é uma preocupação do Brasil, e nem vão. Vamos continuar com as sanções e é possível que vamos até aumentar para conseguir mudanças de comportamento por parte da Rússia.

BRASÍLIA - “Com a agressão da Rússia à Ucrânia, buscamos parceiros confiáveis e há interesse reforçado no acordo entre a União Europeia e o Mercosul”, afirma o embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybáñez. Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, ele disse que o conflito fez o bloco priorizar o processo e, apesar de admitir ser difícil que isso ocorra, que “seria muito bom” assinar o acordo logo depois das eleições, independentemente de quem ganhar.

Ybáñez adiantou que a Comissão Europeia já tem pronto um esboço do documento adicional que será apresentado por exigência de países europeus como forma de assegurar que o Brasil cumprirá com objetivos ambientais. Entre os pontos que estarão previstos nesse compromisso complementar está a exigência de mais recursos para órgãos ambientais como o Ibama.

“O problema é que os compromissos estão lá, mas os resultados, não. Quando você olha os índices de desmatamento do Brasil antes e depois de Glasgow (COP-26), continuam os mesmos”, afirmou.

Depois de o ex-presidente e candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva falar em reabrir as negociações, o embaixador disse que uma eventual eleição do petista não é entrave para fechar o entendimento. “O que vamos dizer [à equipe de Lula] é que, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer.”

Ignacio Ybáñez; embaixador da União Europeia no Brasil, Ybáñez diz que 'seria muito bom' assinar o acordo logo depois das eleições, qualquer que seja o governo eleito. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Veja os principais trechos da entrevista.

O Ministério da Economia disse recentemente que foi procurado por representantes da União Europeia para reabrir as negociações sobre o acordo com o Mercosul. Houve essa aproximação?

Ficamos surpresos porque, para nós, as negociações nunca foram fechadas. Ao contrário, nos últimos tempos tivemos avanços importantes em partes que não são tão visíveis, como sobre indicações geográficas. O acordo para nós sempre foi e continua sendo uma prioridade e, com a agressão da Rússia à Ucrânia, a busca por parceiros confiáveis é ainda mais importante do que era no passado. Podemos dizer que há um interesse reforçado. Seria muito bom neste momento sair um acordo UE/Mercosul, é importante para as duas regiões. Seria muito bom logo após as eleições, seja qual for o governo eleito, sair com um acordo assinado.

Mas o senhor vê chance de assinar o acordo este ano?

Gostaria que fosse o quanto antes melhor, mas acho que, estando o Brasil em um processo eleitoral, é complicado.

O acordo foi fechado em 2019, mas ainda falta ser assinado, ser ratificado. Por que o processo é tão demorado?

O que aconteceu em 2020 e em 2021 foi que os índices de desmatamento do Brasil não deixaram de crescer, então surgiu uma desconfiança de países da União Europeia de que, com esses números, não seria possível para o Brasil cumprir seus compromissos ambientais. Chegamos a um compromisso de buscar um documento adicional [side letter] onde vamos recuperar a confiança através de compromissos bem estabelecidos em relação ao desmatamento. Finalizamos recentemente nosso trabalho interno dentro da Comissão Europeia e vamos apresentar a proposta para os estados membros.

E o que podemos esperar desse documento?

O que teremos que buscar são elementos que restabelecem confiança. Por exemplo, o Brasil tem que voltar a colocar orçamento dentro dos órgãos que têm que fazer controle de desmatamento, como Ibama e ICMbio. Ninguém na União Europeia nem nos estados membros discutem a soberania do Brasil sob a Amazônia. Dito isso, o que oferecemos é cooperação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas para a presidência da República neste momento, falou na campanha em reabrir as negociações do acordo Mercosul/UE. Isso é algo que preocupa a UE?

Temos tido conversas com a equipe dele e acho que, quando a equipe conhecer em mais profundidade o acordo, vai ficar mais confortável. O que vamos dizer é que, tecnicamente, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer. Do lado da UE, não há uma preocupação com o resultado das eleições, não é um acordo entre governos, mas entre sociedades.

Uma eventual eleição do ex-presidente Lula seria um entrave para a conclusão do acordo?

Para nós não. Quando você escuta os discursos do candidato Lula sobre o tema, vão em boa direção, e desse ponto de vista ficamos esperançosos. Quando ele fala das relações entre Brasil e Europa, em geral são mensagens positivas, ele tinha uma ótima relação com muitos dos líderes da União Europeia e nós acreditamos que isso vai se reproduzir olhando para o futuro.

E a reeleição do presidente Jair Bolsonaro?

Também não. Pensamos que os dois candidatos que têm mais possibilidades [de serem eleitos] há uma boa receptividade à ideia do acordo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, recentemente disse que a França está ficando irrelevante para o Brasil e usou até um palavrão [o ministro disse que é melhor os franceses “nos tratarem bem porque senão vamos ligar o ‘f...-se’ para vocês”]. Isso prejudica as relações e o andamento das negociações?

Sempre qualquer palavra um pouco fora das relações ótimas entre a UE e o Brasil atrapalham um pouco, não podemos evitar. Mas também são ditas por outros políticos europeus. Eu, como embaixador da União Europeia, gostaria que nem um nem outro falasse esse tipo de coisa. Mas quando temos contato com o ministro Guedes, as mensagens são muito diferentes.

A União Europeia vê com alguma preocupação os ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez às urnas em reunião com embaixadores em julho? O senhor não estava?

Eu estava fora, mas foi a encarregada de negócios. Sempre que o presidente da República convida, nós participamos. Pensamos que o TSE fez e continuará a fazer um bom trabalho para assegurar eleições limpas e transparentes. Não temos uma preocupação geral [com o Brasil] baseado na nossa convicção de que as instituições brasileiras são fortes e o momento da posse do novo presidente do TSE foi uma ótima demonstração da fortaleza das instituições.

O conflito Rússia/Ucrânia está se agravando? Como a UE tem visto os últimos movimentos dos russos, como a interrupção no fornecimento de gás para os países do bloco?

A União Europeia vê esse conflito com grandíssima preocupação. Não queremos entrar em guerra com a Rússia, sabemos do efeito que isso poderia ter, mas estamos ajudando a Ucrânia a se defender. Nossas sanções estão muito focadas em penalizar o regime de Putin, nenhuma das sanções se aplica nem a produtos agrícolas nem a fertilizantes, que é uma preocupação do Brasil, e nem vão. Vamos continuar com as sanções e é possível que vamos até aumentar para conseguir mudanças de comportamento por parte da Rússia.

BRASÍLIA - “Com a agressão da Rússia à Ucrânia, buscamos parceiros confiáveis e há interesse reforçado no acordo entre a União Europeia e o Mercosul”, afirma o embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybáñez. Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, ele disse que o conflito fez o bloco priorizar o processo e, apesar de admitir ser difícil que isso ocorra, que “seria muito bom” assinar o acordo logo depois das eleições, independentemente de quem ganhar.

Ybáñez adiantou que a Comissão Europeia já tem pronto um esboço do documento adicional que será apresentado por exigência de países europeus como forma de assegurar que o Brasil cumprirá com objetivos ambientais. Entre os pontos que estarão previstos nesse compromisso complementar está a exigência de mais recursos para órgãos ambientais como o Ibama.

“O problema é que os compromissos estão lá, mas os resultados, não. Quando você olha os índices de desmatamento do Brasil antes e depois de Glasgow (COP-26), continuam os mesmos”, afirmou.

Depois de o ex-presidente e candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva falar em reabrir as negociações, o embaixador disse que uma eventual eleição do petista não é entrave para fechar o entendimento. “O que vamos dizer [à equipe de Lula] é que, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer.”

Ignacio Ybáñez; embaixador da União Europeia no Brasil, Ybáñez diz que 'seria muito bom' assinar o acordo logo depois das eleições, qualquer que seja o governo eleito. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Veja os principais trechos da entrevista.

O Ministério da Economia disse recentemente que foi procurado por representantes da União Europeia para reabrir as negociações sobre o acordo com o Mercosul. Houve essa aproximação?

Ficamos surpresos porque, para nós, as negociações nunca foram fechadas. Ao contrário, nos últimos tempos tivemos avanços importantes em partes que não são tão visíveis, como sobre indicações geográficas. O acordo para nós sempre foi e continua sendo uma prioridade e, com a agressão da Rússia à Ucrânia, a busca por parceiros confiáveis é ainda mais importante do que era no passado. Podemos dizer que há um interesse reforçado. Seria muito bom neste momento sair um acordo UE/Mercosul, é importante para as duas regiões. Seria muito bom logo após as eleições, seja qual for o governo eleito, sair com um acordo assinado.

Mas o senhor vê chance de assinar o acordo este ano?

Gostaria que fosse o quanto antes melhor, mas acho que, estando o Brasil em um processo eleitoral, é complicado.

O acordo foi fechado em 2019, mas ainda falta ser assinado, ser ratificado. Por que o processo é tão demorado?

O que aconteceu em 2020 e em 2021 foi que os índices de desmatamento do Brasil não deixaram de crescer, então surgiu uma desconfiança de países da União Europeia de que, com esses números, não seria possível para o Brasil cumprir seus compromissos ambientais. Chegamos a um compromisso de buscar um documento adicional [side letter] onde vamos recuperar a confiança através de compromissos bem estabelecidos em relação ao desmatamento. Finalizamos recentemente nosso trabalho interno dentro da Comissão Europeia e vamos apresentar a proposta para os estados membros.

E o que podemos esperar desse documento?

O que teremos que buscar são elementos que restabelecem confiança. Por exemplo, o Brasil tem que voltar a colocar orçamento dentro dos órgãos que têm que fazer controle de desmatamento, como Ibama e ICMbio. Ninguém na União Europeia nem nos estados membros discutem a soberania do Brasil sob a Amazônia. Dito isso, o que oferecemos é cooperação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas para a presidência da República neste momento, falou na campanha em reabrir as negociações do acordo Mercosul/UE. Isso é algo que preocupa a UE?

Temos tido conversas com a equipe dele e acho que, quando a equipe conhecer em mais profundidade o acordo, vai ficar mais confortável. O que vamos dizer é que, tecnicamente, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer. Do lado da UE, não há uma preocupação com o resultado das eleições, não é um acordo entre governos, mas entre sociedades.

Uma eventual eleição do ex-presidente Lula seria um entrave para a conclusão do acordo?

Para nós não. Quando você escuta os discursos do candidato Lula sobre o tema, vão em boa direção, e desse ponto de vista ficamos esperançosos. Quando ele fala das relações entre Brasil e Europa, em geral são mensagens positivas, ele tinha uma ótima relação com muitos dos líderes da União Europeia e nós acreditamos que isso vai se reproduzir olhando para o futuro.

E a reeleição do presidente Jair Bolsonaro?

Também não. Pensamos que os dois candidatos que têm mais possibilidades [de serem eleitos] há uma boa receptividade à ideia do acordo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, recentemente disse que a França está ficando irrelevante para o Brasil e usou até um palavrão [o ministro disse que é melhor os franceses “nos tratarem bem porque senão vamos ligar o ‘f...-se’ para vocês”]. Isso prejudica as relações e o andamento das negociações?

Sempre qualquer palavra um pouco fora das relações ótimas entre a UE e o Brasil atrapalham um pouco, não podemos evitar. Mas também são ditas por outros políticos europeus. Eu, como embaixador da União Europeia, gostaria que nem um nem outro falasse esse tipo de coisa. Mas quando temos contato com o ministro Guedes, as mensagens são muito diferentes.

A União Europeia vê com alguma preocupação os ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez às urnas em reunião com embaixadores em julho? O senhor não estava?

Eu estava fora, mas foi a encarregada de negócios. Sempre que o presidente da República convida, nós participamos. Pensamos que o TSE fez e continuará a fazer um bom trabalho para assegurar eleições limpas e transparentes. Não temos uma preocupação geral [com o Brasil] baseado na nossa convicção de que as instituições brasileiras são fortes e o momento da posse do novo presidente do TSE foi uma ótima demonstração da fortaleza das instituições.

O conflito Rússia/Ucrânia está se agravando? Como a UE tem visto os últimos movimentos dos russos, como a interrupção no fornecimento de gás para os países do bloco?

A União Europeia vê esse conflito com grandíssima preocupação. Não queremos entrar em guerra com a Rússia, sabemos do efeito que isso poderia ter, mas estamos ajudando a Ucrânia a se defender. Nossas sanções estão muito focadas em penalizar o regime de Putin, nenhuma das sanções se aplica nem a produtos agrícolas nem a fertilizantes, que é uma preocupação do Brasil, e nem vão. Vamos continuar com as sanções e é possível que vamos até aumentar para conseguir mudanças de comportamento por parte da Rússia.

BRASÍLIA - “Com a agressão da Rússia à Ucrânia, buscamos parceiros confiáveis e há interesse reforçado no acordo entre a União Europeia e o Mercosul”, afirma o embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybáñez. Em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, ele disse que o conflito fez o bloco priorizar o processo e, apesar de admitir ser difícil que isso ocorra, que “seria muito bom” assinar o acordo logo depois das eleições, independentemente de quem ganhar.

Ybáñez adiantou que a Comissão Europeia já tem pronto um esboço do documento adicional que será apresentado por exigência de países europeus como forma de assegurar que o Brasil cumprirá com objetivos ambientais. Entre os pontos que estarão previstos nesse compromisso complementar está a exigência de mais recursos para órgãos ambientais como o Ibama.

“O problema é que os compromissos estão lá, mas os resultados, não. Quando você olha os índices de desmatamento do Brasil antes e depois de Glasgow (COP-26), continuam os mesmos”, afirmou.

Depois de o ex-presidente e candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva falar em reabrir as negociações, o embaixador disse que uma eventual eleição do petista não é entrave para fechar o entendimento. “O que vamos dizer [à equipe de Lula] é que, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer.”

Ignacio Ybáñez; embaixador da União Europeia no Brasil, Ybáñez diz que 'seria muito bom' assinar o acordo logo depois das eleições, qualquer que seja o governo eleito. Foto: Gabriela Biló/Estadão

Veja os principais trechos da entrevista.

O Ministério da Economia disse recentemente que foi procurado por representantes da União Europeia para reabrir as negociações sobre o acordo com o Mercosul. Houve essa aproximação?

Ficamos surpresos porque, para nós, as negociações nunca foram fechadas. Ao contrário, nos últimos tempos tivemos avanços importantes em partes que não são tão visíveis, como sobre indicações geográficas. O acordo para nós sempre foi e continua sendo uma prioridade e, com a agressão da Rússia à Ucrânia, a busca por parceiros confiáveis é ainda mais importante do que era no passado. Podemos dizer que há um interesse reforçado. Seria muito bom neste momento sair um acordo UE/Mercosul, é importante para as duas regiões. Seria muito bom logo após as eleições, seja qual for o governo eleito, sair com um acordo assinado.

Mas o senhor vê chance de assinar o acordo este ano?

Gostaria que fosse o quanto antes melhor, mas acho que, estando o Brasil em um processo eleitoral, é complicado.

O acordo foi fechado em 2019, mas ainda falta ser assinado, ser ratificado. Por que o processo é tão demorado?

O que aconteceu em 2020 e em 2021 foi que os índices de desmatamento do Brasil não deixaram de crescer, então surgiu uma desconfiança de países da União Europeia de que, com esses números, não seria possível para o Brasil cumprir seus compromissos ambientais. Chegamos a um compromisso de buscar um documento adicional [side letter] onde vamos recuperar a confiança através de compromissos bem estabelecidos em relação ao desmatamento. Finalizamos recentemente nosso trabalho interno dentro da Comissão Europeia e vamos apresentar a proposta para os estados membros.

E o que podemos esperar desse documento?

O que teremos que buscar são elementos que restabelecem confiança. Por exemplo, o Brasil tem que voltar a colocar orçamento dentro dos órgãos que têm que fazer controle de desmatamento, como Ibama e ICMbio. Ninguém na União Europeia nem nos estados membros discutem a soberania do Brasil sob a Amazônia. Dito isso, o que oferecemos é cooperação.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas para a presidência da República neste momento, falou na campanha em reabrir as negociações do acordo Mercosul/UE. Isso é algo que preocupa a UE?

Temos tido conversas com a equipe dele e acho que, quando a equipe conhecer em mais profundidade o acordo, vai ficar mais confortável. O que vamos dizer é que, tecnicamente, quando você chega a um acordo, é o resultado de um equilíbrio de forças. Se você reabre as negociações, esse equilíbrio pode desaparecer. Do lado da UE, não há uma preocupação com o resultado das eleições, não é um acordo entre governos, mas entre sociedades.

Uma eventual eleição do ex-presidente Lula seria um entrave para a conclusão do acordo?

Para nós não. Quando você escuta os discursos do candidato Lula sobre o tema, vão em boa direção, e desse ponto de vista ficamos esperançosos. Quando ele fala das relações entre Brasil e Europa, em geral são mensagens positivas, ele tinha uma ótima relação com muitos dos líderes da União Europeia e nós acreditamos que isso vai se reproduzir olhando para o futuro.

E a reeleição do presidente Jair Bolsonaro?

Também não. Pensamos que os dois candidatos que têm mais possibilidades [de serem eleitos] há uma boa receptividade à ideia do acordo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, recentemente disse que a França está ficando irrelevante para o Brasil e usou até um palavrão [o ministro disse que é melhor os franceses “nos tratarem bem porque senão vamos ligar o ‘f...-se’ para vocês”]. Isso prejudica as relações e o andamento das negociações?

Sempre qualquer palavra um pouco fora das relações ótimas entre a UE e o Brasil atrapalham um pouco, não podemos evitar. Mas também são ditas por outros políticos europeus. Eu, como embaixador da União Europeia, gostaria que nem um nem outro falasse esse tipo de coisa. Mas quando temos contato com o ministro Guedes, as mensagens são muito diferentes.

A União Europeia vê com alguma preocupação os ataques que o presidente Jair Bolsonaro fez às urnas em reunião com embaixadores em julho? O senhor não estava?

Eu estava fora, mas foi a encarregada de negócios. Sempre que o presidente da República convida, nós participamos. Pensamos que o TSE fez e continuará a fazer um bom trabalho para assegurar eleições limpas e transparentes. Não temos uma preocupação geral [com o Brasil] baseado na nossa convicção de que as instituições brasileiras são fortes e o momento da posse do novo presidente do TSE foi uma ótima demonstração da fortaleza das instituições.

O conflito Rússia/Ucrânia está se agravando? Como a UE tem visto os últimos movimentos dos russos, como a interrupção no fornecimento de gás para os países do bloco?

A União Europeia vê esse conflito com grandíssima preocupação. Não queremos entrar em guerra com a Rússia, sabemos do efeito que isso poderia ter, mas estamos ajudando a Ucrânia a se defender. Nossas sanções estão muito focadas em penalizar o regime de Putin, nenhuma das sanções se aplica nem a produtos agrícolas nem a fertilizantes, que é uma preocupação do Brasil, e nem vão. Vamos continuar com as sanções e é possível que vamos até aumentar para conseguir mudanças de comportamento por parte da Rússia.

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