A reforma tributária continua aprisionada à guerra fria que se instalou entre o Senado e a Câmara pela disputa da agenda econômica. Se não fosse esse embate, que ainda persiste, e a indecisão do governo Bolsonaro sobre o caminho de tramitação das propostas, muito provavelmente o projeto de reforma do sistema tributário já estaria mais adiantada no Congresso.
A verdade é que falta foco. Não se sabe até agora qual é a prioridade de fato. Ninguém é capaz de responder com segurança a seguinte pergunta: depois da aprovação da reforma da Previdência, qual é a nova reforma prioritária? Isso vale para a equipe econômica e também para as lideranças congressistas. As prioridades mudam todos os dias.
Na terça-feira passada, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse, no evento Empresas Mais do Grupo Estado, que a reforma administrativa pode andar mais rápido do que a tributária. Lideranças empresariais e da Câmara não gostaram.
Poucos dias depois, na sexta-feira, Maia voltou atrás e disse que a reforma tributária continua como prioridade da Câmara. “Não adianta reduzir gastos públicos se não trabalharmos para melhorar a produtividade das empresas”, escreveu no Twitter ao reproduzir reportagem do Estado que mostrava que o governo pode deixar para um segundo momento o envio da proposta de reforma tributária e focar na administrativa e nas medidas de ajuste fiscal para a redução dos gastos obrigatórios.
Empresários procuraram Maia para alertá-lo que não há reforma mais importante para a retomada do que a tributária. O líder do MDB, Baleia Rossi (SP), autor da PEC 45 de reforma tributária na Câmara, também reagiu no Twitter: “A reforma não vai parar”, postou. Ele e o relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), já estão com as negociações avançadas com setores.
No Senado, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), tem sido pressionado a puxar as propostas mais importantes para lá. A pressão parte, sobretudo, do líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), e o seu grupo político. A ameaça à área econômica é que vão parar as votações das propostas, se não houver o ingresso dos textos também por lá. Não há acordo para a divisão das propostas mesmo depois de sucessivas tentativas e reuniões para um acerto na “partilha” dos textos. Lideranças do Congresso ouvidas pela coluna afirmam que não vão esperar mais os projetos do governo. O fato é que o ministro da Economia, Paulo Guedes, não está com a sua proposta de reforma tributária pronta. Ele decidiu fatiá-la depois que os rumos foram alterados com a saída do secretário da Receita Federal Marcos Cintra. Nomeada assessora especial, a economista Vanessa Canado foi empoderada para dar nova roupagem ao texto.
Na próxima semana, se não houver desvios no roteiro devido à crise do PSL com o presidente Bolsonaro, o ministro anuncia a reforma administrativa e as medidas que ele tem chamado de “fura teto”. São aquelas que visam a abrir o espaço do teto de gastos (que está em perigo e comprime os investimentos) e diminuem as despesas obrigatórias.
O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, foi o primeiro a mostrar as prioridades. Ele deixou claro, em palestra nesta semana, que a equipe econômica trata com precedência a reforma administrativa em relação à tributária.
Responsável pelo ajuste, ele bem sabe que tem tanta coisa para ser resolvida na área fiscal até o fim do ano, inclusive a nova política para o salário mínimo – um dos pontos mais difíceis de serem tratados no Congresso – que o tema vai tomar o pouco que falta do ano.
Mas a reforma tributária é muito urgente e precisa ser feita. Ela não andou ainda tão rapidamente, como se esperava, porque é uma reforma com muitos detalhes e com impactos setoriais diferentes, o que muitas vezes leva a discussões intermináveis. É preciso criar logo a viabilidade política o mais rápido possível para aprová-la.
Velho modelo
Não deu outra. Antes mesmo de enviar a sua proposta de reforma tributária, o governo baixou a MP do Contribuinte Legal que dá até 70% de desconto no total das dívidas que pessoas físicas e empresas têm com a União.
Sai governo entra governo e a reforma tributária é ultrapassada pelo velho modelo tributário de renegociação de débitos. Esse tipo de MP, quando chega ao Congresso, se torna uma verdadeira porta aberta para a inclusão de mudanças que acabam beneficiando os devedores contumazes.*É JORNALISTA