Embora haja convergência sobre o objetivo de combater a pobreza, vergonhosamente grande no Brasil, no debate sobre as perspectivas do governo Lula há duas correntes distintas. Concordam que no curto prazo a única forma de mitigar o problema é pela transferência de renda, mas divergem quanto ao caminho para retomar o crescimento, que é a solução final.
Os que se alinham com a orientação de Lula acreditam que o motor do crescimento depende dos gastos do governo, do uso das empresas estatais e dos bancos públicos. O populismo garante votos e aliados, mas não garante o desenvolvimento. Embora se declarem a favor da responsabilidade fiscal, não reconhecem que o tamanho de nossa dívida pública é grande demais. Como nossa taxa de juros excede a do crescimento econômico, o financiamento dos gastos com dívida eleva os prêmios de risco e a taxa de juros, penalizando os investimentos em capital fixo e reduzindo o crescimento econômico.
Do outro lado estão os que respeitam a história dos países nos quais os investimentos (e as inovações) privados desempenham papel crucial. Estes reconhecem que cabe ao governo usar eficientemente os recursos arrecadados através dos impostos, investindo nos setores cujos retornos sociais excedem os retornos privados, e criando uma âncora fiscal que dê ao Banco Central o respaldo para controlar a inflação com taxas de juros baixas. A maior falha, contudo, consiste em ignorar que diante das “capturas” ao nosso orçamento, das quais o governo se beneficia politicamente, a única forma de exercer a responsabilidade fiscal é através do controle dos gastos e da geração de superávits primários.
Não basta prometer que será fiscalmente responsável. É preciso construir um arcabouço que garanta tal resultado. Porém, a primeira ação do governo consistiu em expandir os gastos, excedendo em muito o necessário para cumprir as promessas de campanha. Seria um caminho aceitável se vivêssemos uma recessão, o que justificaria o uso de políticas contracíclicas. No entanto, a taxa de desemprego no Brasil está hoje próxima de 8%, com os salários reais crescendo. Esta é a menor taxa de desemprego desde que existem dados da PNAD Contínua, igualando-se apenas à de 2012, quando o hiato positivo do PIB obrigou o abandono da estratégia do “gasto é vida” e a vigorosa elevação da taxa de juros. Não é possível afirmar que estamos em pleno emprego, mas estamos próximos.
Cabe ao governo definir uma âncora fiscal baseada no controle dos gastos públicos e na geração de superávits primários, permitindo que o BC inicie mais cedo a redução da taxa de juros.