Mas tal mudança não se deve ao ressurgimento do crescimento econômico na América Latina, cujo desempenho continua sendo muito inferior ao asiático. Dentre os países emergentes, China, Índia e Turquia são as forças motrizes do crescimento mundial, e embora a Argentina esteja crescendo, com o governo Macri tendo recebido nas últimas eleições um apoio que entusiasma os investidores, o crescimento brasileiro é medíocre e o governo não tem o suporte político para as reformas necessárias para garantir a sua aceleração.
Os dados do Banco Central sobre ingressos de capitais mostram que o entusiasmo dos investidores nada tem a ver com o Brasil. Os investimentos estrangeiros diretos no Brasil estão abaixo dos US$ 90 bilhões de 2010, e continuam flutuando sem nenhum crescimento em torno dos mesmos US$ 80 bilhões de 2013. Porém, nos últimos 12 meses, os investimentos em carteira (renda fixa, ações e fundos) mostram fluxos em torno de zero, contrastando com o ocorrido em 2010, quando os ingressos em carteira – predominantemente em ações – foram de US$ 80 bilhões, e também contrastam com os ingressos em carteira em 2013 (antes de o Brasil perder o “grau de investimento”), quando chegaram a US$ 40 bilhões.
Em 2010, o governo colheu os frutos das ações “contracíclicas”, um rótulo que escondia a realidade, que era uma nova fase de populismo econômico, que se prolongou do segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva até a queda de Dilma Rousseff. Esquecendo-se da Carta aos Brasileiros, Lula passou a acreditar que bastaria expandir o crédito, e em 2010 festejou o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 7,5%.
O Cristo Redentor decolando na capa da revista The Economist, ao fim de 2009, prenunciava o “milagre de 2010” e, meses antes, Barack Obama mostrou o quanto havia sido seduzido pelo líder populista, classificando “o cara” como o grande líder da América Latina. Embora em 2013 a insistência no populismo já tivesse elevado os riscos (as cotações do CDS brasileiro se descolaram das do México, igualando às da Turquia), ainda tivemos algum crescimento. Porém, a tempestade recessiva já se armava, e, embora a Economist se arrependesse, publicando uma capa com o Cristo Redentor em queda, a ilusão dos investidores ainda estimulou o ingresso de capitais.
Os investidores têm razões para observar atentamente o Brasil. Afinal, com uma política monetária de excelente qualidade, a taxa real de juros de mercado já está próxima de 3%, começando a ampliar o consumo, que por um bom tempo será a força motriz da recuperação. Mas não há otimismo quanto à formação bruta de capital fixo.
A grande maioria das empresas herdou da recessão um nível extremamente baixo de utilização de capacidade, e a fotografia mostrada pelo Banco Central no último Relatório de Estabilidade Financeira prova que as empresas continuam endividadas, e que os empréstimos têm baixa capacidade de serem liquidados.
Embora o governo tenha um diagnóstico fiscal correto, a falta de apoio político impede que as medidas necessárias sejam aprovadas e, sem tal aprovação, a política monetária – a tábua de salvação à qual se agarram as perspectivas de crescimento – perderá eficácia. Sem que se complete o ciclo de reformas fiscais, começando pela da Previdência, nem mesmo um banqueiro central competente consegue fazer milagres.
Esse é o quadro vislumbrado pelos investidores internacionais. Eles já se machucaram com as decisões tomadas em 2010 e 2013, desenvolvendo anticorpos contra governos populistas que habilmente dominam a retórica dos milagres e das soluções fáceis. Infelizmente, o desgaste político do atual governo e a desesperança da sociedade abrem um campo enorme no qual o populismo econômico pode progredir, e esse risco é uma razão mais do que suficiente para que, embora se detenham na análise das oportunidades potenciais, os investidores internacionais prefiram colocar seus recursos na Argentina, mais do que no Brasil.
EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA A.C. PASTORE & ASSOCIADOS. ESCREVE NO PRIMEIRO DOMINGO DO MÊS