Embora o presidente insista que “a única coisa desajustada que há no País” seja o comportamento do Banco Central, a realidade discorda veementemente. Pelo contrário, o comportamento do BC, que tanto desagrada a Lula, reflete principalmente os muitos desajustes produzidos por seu governo.
A começar pelo descontrole do gasto público, mesmo rebatizado como “investimento” pelo Oráculo de Garanhuns. A chamada “PEC da Transição” não só permitiu um aumento de gastos muito acima do necessário para acomodar o Bolsa Família “vitaminado”, como também – por intenção ou incompetência – revogou a regra que vinculava gastos com saúde e educação à inflação, indexando-os à evolução da receita e tornando o orçamento federal ainda mais rígido.
Já a política de elevação do salário mínimo acima da inflação e o desenho ruim do Bolsa Família, dentre outras medidas, levaram à maior expansão da história das despesas recorrentes do governo federal.
O corolário desta política é o crescimento do gasto obrigatório superando o ritmo fixado pelo “novo arcabouço” para o gasto total, levando, portanto, à compressão do investimento federal a níveis politicamente insustentáveis.
Assim, cedo ou tarde, o arcabouço há de abrir o bico. Sob ele já era virtualmente impossível impedir a escalada da dívida; com regras ainda mais frouxas, o governo se endividará cada vez mais.
Num mundo de juro baixo, ainda dava para fingir que o problema não existia. Quando, porém, se percebe que o juro mais alto veio para ficar, não dá para disfarçar o entulho debaixo do tapete.
Como também não se disfarça a falta de apetite para lidar com o problema. As medidas mencionadas pela equipe econômica a respeito são risíveis, exatamente porque não tratam dos desequilíbrios acima.
Já a pantomima do presidente em simular surpresa com o volume de renúncias fiscais poderia enganar quem não tenha notado que em 2023 seu governo criou 32 novos benefícios fiscais no valor de R$ 68 bilhões, afora o Mover para a indústria automobilística, recentemente aprovado.
As inconsistências da política econômica elevam tanto o dólar quanto as expectativas de inflação, além do estímulo ao consumo numa economia já próxima do pleno-emprego.
Foram elas que liquidaram com o espaço para redução de juros. Ao BC coube apenas a tarefa da dar a má notícia. Obviamente, sempre é mais fácil atirar no mensageiro do que resolver os problemas, mas esta postura não fará com que desapareçam, apenas que se aprofundem, independentemente de quem estiver ao leme do BC.