Opinião|Mudança da meta expõe falha do arcabouço fiscal: foco só em arrecadação, sem corte efetivo de gastos


Sem agenda efetiva de contenção de despesas, com aval de Lula, novas metas também correm o risco de serem descumpridas

Por Alvaro Gribel
Atualização:

A alteração das metas fiscais dos próximos anos, que serão anunciadas nesta segunda-feira durante a apresentação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, expõe a grande falha do arcabouço fiscal elaborado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em substituição ao teto de gastos, do governo Michel Temer.

O ajuste tem como foco o aumento da arrecadação, sem uma agenda efetiva de cortes de gastos, o que tornou irrealistas as projeções apresentadas pela equipe econômica em abril do ano passado.

Com isso, no lugar de um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem, a proposta agora é de déficit zero – ou seja, o mesmo número já previsto para este ano. Para 2026, o número também foi revisado para baixo, de 1% para 0,25%, e pela primeira vez surgiu a estimativa para 2027, que será de 0,5%, e para 2028, que será de 1%. A grosso modo, apenas em 2027 o governo se compromete a atingir o que estava programado para 2025 – um adiamento de dois anos.

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Os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Foto: Diogo Zacarias

De um lado, o arcabouço fiscal está sendo pressionado por três grandes grupos de despesas: o salário mínimo e os pisos da saúde e da educação. De outro, a Receita Federal e a equipe econômica já estão esgotando as possibilidades de aumento de receitas extraordinárias, que passam a enfrentar não só resistências no Congresso, mas também entre pessoas físicas e jurídicas, que terão de pagar a conta.

O salário mínimo já tem a previsão de um aumento nominal de 6,37% no ano que vem, o que significa um ganho real de 2,9%, pela forma de indexação atrelada à inflação do ano anterior e ao PIB de dois anos antes. Além disso, os pisos da saúde e da educação estão vinculados a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL), no caso da Educação, e de 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI), no caso da Saúde.

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Na prática, esses três grupos crescem de forma mais acelerada do que a regra global do arcabouço fiscal, que permite alta de no máximo 2,5% dos gastos, em relação ao ano anterior, e limitado a 70% do crescimento das receitas.

O economista Marcelo Fonseca, da Reag Investimentos, calcula que as contas públicas do País têm um “déficit primário estrutural” entre R$ 100 bilhões a R$ 150 bihões por ano. O cálculo é feito retirando todas as receitas extraordinárias da conta, ou seja, recursos que entrarão uma única vez nos cofres do Tesouro. Por isso, ele defende que é preciso começar logo uma agenda de cortes de gastos.

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“Qualquer programa de ajuste que queira estabilizar as contas públicas vai precisar de uma agenda importante de contenção de despesas. E isso não é só revisar programas e melhorar a eficiência, mas de fato mudar a direção dos gastos. É matemática elementar”, explicou.

Se até a quinta-feira passada o mercado financeiro já havia assimilado a alteração desses números, agora, a reação tende a ser diferente, com a piora do cenário global. A inflação americana e o mercado de trabalho mais aquecidos do que o esperado vão dificultar o início do corte de juros pelo Fed, o Banco Central dos EUA.

Com isso, a tendência é de aumento do dólar em relação às principais divisas do mundo. Países com problemas nas contas públicas, como o Brasil, tendem a sofrer mais. O reflexo disso já aparece na cotação do dólar sobre o real, que saltou de R$ 5 na última terça-feira para R$ 5,19 na manhã desta segunda. A geopolítica global também ficou mais intrincada, com os ataques do Irã a Israel.

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Com o dólar mais alto, a tendência é de que as expectativas de inflação para o Brasil também piorem. Isso porque os produtos industrializados que o Brasil importa tendem a ficar mais caros. O economista Luis Otávio Leal, da G5 Parters, mostra os números de como isso pode virar um problema para o Banco Central. Se hoje a preocupação com a inflação está nos bens “não comercializáveis”, notadamente o setor de serviços, que sobe 4,72% nos 12 meses encerrados em março, um novo foco de alta pode vir dos bens comercializáveis (produtos industriais), que até então têm alta de apenas 0,97%. Produtos mais caros vindos do exterior podem ter um impacto de até 0,65 ponto no nosso IPCA, o que obrigaria o BC a manter a taxa Selic mais elevada.

Mas qual a relação disso com as contas públicas? Tudo, porque juros mais altos significam um déficit nominal também mais elevado, com impacto sobre o endividamento do governo. Além disso, afetam o crescimento do PIB, com reflexo sobre a arrecadação.

Mesmo com a revisão, os números apresentados hoje estão acima do projetado pelo mercado financeiro no Boletim Focus. Para 2025, a mediana de economistas e investidores aponta para um déficit de 0,6% do PIB, com leve melhora para -0,5%, no ano seguinte, e -0,2%, em 2027.

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De alguma forma, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Do contrário, o presidente poderá naufragar na economia.

A alteração das metas fiscais dos próximos anos, que serão anunciadas nesta segunda-feira durante a apresentação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, expõe a grande falha do arcabouço fiscal elaborado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em substituição ao teto de gastos, do governo Michel Temer.

O ajuste tem como foco o aumento da arrecadação, sem uma agenda efetiva de cortes de gastos, o que tornou irrealistas as projeções apresentadas pela equipe econômica em abril do ano passado.

Com isso, no lugar de um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem, a proposta agora é de déficit zero – ou seja, o mesmo número já previsto para este ano. Para 2026, o número também foi revisado para baixo, de 1% para 0,25%, e pela primeira vez surgiu a estimativa para 2027, que será de 0,5%, e para 2028, que será de 1%. A grosso modo, apenas em 2027 o governo se compromete a atingir o que estava programado para 2025 – um adiamento de dois anos.

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Foto: Diogo Zacarias

De um lado, o arcabouço fiscal está sendo pressionado por três grandes grupos de despesas: o salário mínimo e os pisos da saúde e da educação. De outro, a Receita Federal e a equipe econômica já estão esgotando as possibilidades de aumento de receitas extraordinárias, que passam a enfrentar não só resistências no Congresso, mas também entre pessoas físicas e jurídicas, que terão de pagar a conta.

O salário mínimo já tem a previsão de um aumento nominal de 6,37% no ano que vem, o que significa um ganho real de 2,9%, pela forma de indexação atrelada à inflação do ano anterior e ao PIB de dois anos antes. Além disso, os pisos da saúde e da educação estão vinculados a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL), no caso da Educação, e de 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI), no caso da Saúde.

Na prática, esses três grupos crescem de forma mais acelerada do que a regra global do arcabouço fiscal, que permite alta de no máximo 2,5% dos gastos, em relação ao ano anterior, e limitado a 70% do crescimento das receitas.

O economista Marcelo Fonseca, da Reag Investimentos, calcula que as contas públicas do País têm um “déficit primário estrutural” entre R$ 100 bilhões a R$ 150 bihões por ano. O cálculo é feito retirando todas as receitas extraordinárias da conta, ou seja, recursos que entrarão uma única vez nos cofres do Tesouro. Por isso, ele defende que é preciso começar logo uma agenda de cortes de gastos.

“Qualquer programa de ajuste que queira estabilizar as contas públicas vai precisar de uma agenda importante de contenção de despesas. E isso não é só revisar programas e melhorar a eficiência, mas de fato mudar a direção dos gastos. É matemática elementar”, explicou.

Se até a quinta-feira passada o mercado financeiro já havia assimilado a alteração desses números, agora, a reação tende a ser diferente, com a piora do cenário global. A inflação americana e o mercado de trabalho mais aquecidos do que o esperado vão dificultar o início do corte de juros pelo Fed, o Banco Central dos EUA.

Com isso, a tendência é de aumento do dólar em relação às principais divisas do mundo. Países com problemas nas contas públicas, como o Brasil, tendem a sofrer mais. O reflexo disso já aparece na cotação do dólar sobre o real, que saltou de R$ 5 na última terça-feira para R$ 5,19 na manhã desta segunda. A geopolítica global também ficou mais intrincada, com os ataques do Irã a Israel.

Com o dólar mais alto, a tendência é de que as expectativas de inflação para o Brasil também piorem. Isso porque os produtos industrializados que o Brasil importa tendem a ficar mais caros. O economista Luis Otávio Leal, da G5 Parters, mostra os números de como isso pode virar um problema para o Banco Central. Se hoje a preocupação com a inflação está nos bens “não comercializáveis”, notadamente o setor de serviços, que sobe 4,72% nos 12 meses encerrados em março, um novo foco de alta pode vir dos bens comercializáveis (produtos industriais), que até então têm alta de apenas 0,97%. Produtos mais caros vindos do exterior podem ter um impacto de até 0,65 ponto no nosso IPCA, o que obrigaria o BC a manter a taxa Selic mais elevada.

Mas qual a relação disso com as contas públicas? Tudo, porque juros mais altos significam um déficit nominal também mais elevado, com impacto sobre o endividamento do governo. Além disso, afetam o crescimento do PIB, com reflexo sobre a arrecadação.

Mesmo com a revisão, os números apresentados hoje estão acima do projetado pelo mercado financeiro no Boletim Focus. Para 2025, a mediana de economistas e investidores aponta para um déficit de 0,6% do PIB, com leve melhora para -0,5%, no ano seguinte, e -0,2%, em 2027.

De alguma forma, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Do contrário, o presidente poderá naufragar na economia.

A alteração das metas fiscais dos próximos anos, que serão anunciadas nesta segunda-feira durante a apresentação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, expõe a grande falha do arcabouço fiscal elaborado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em substituição ao teto de gastos, do governo Michel Temer.

O ajuste tem como foco o aumento da arrecadação, sem uma agenda efetiva de cortes de gastos, o que tornou irrealistas as projeções apresentadas pela equipe econômica em abril do ano passado.

Com isso, no lugar de um superávit de 0,5% do PIB no ano que vem, a proposta agora é de déficit zero – ou seja, o mesmo número já previsto para este ano. Para 2026, o número também foi revisado para baixo, de 1% para 0,25%, e pela primeira vez surgiu a estimativa para 2027, que será de 0,5%, e para 2028, que será de 1%. A grosso modo, apenas em 2027 o governo se compromete a atingir o que estava programado para 2025 – um adiamento de dois anos.

Os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Foto: Diogo Zacarias

De um lado, o arcabouço fiscal está sendo pressionado por três grandes grupos de despesas: o salário mínimo e os pisos da saúde e da educação. De outro, a Receita Federal e a equipe econômica já estão esgotando as possibilidades de aumento de receitas extraordinárias, que passam a enfrentar não só resistências no Congresso, mas também entre pessoas físicas e jurídicas, que terão de pagar a conta.

O salário mínimo já tem a previsão de um aumento nominal de 6,37% no ano que vem, o que significa um ganho real de 2,9%, pela forma de indexação atrelada à inflação do ano anterior e ao PIB de dois anos antes. Além disso, os pisos da saúde e da educação estão vinculados a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL), no caso da Educação, e de 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI), no caso da Saúde.

Na prática, esses três grupos crescem de forma mais acelerada do que a regra global do arcabouço fiscal, que permite alta de no máximo 2,5% dos gastos, em relação ao ano anterior, e limitado a 70% do crescimento das receitas.

O economista Marcelo Fonseca, da Reag Investimentos, calcula que as contas públicas do País têm um “déficit primário estrutural” entre R$ 100 bilhões a R$ 150 bihões por ano. O cálculo é feito retirando todas as receitas extraordinárias da conta, ou seja, recursos que entrarão uma única vez nos cofres do Tesouro. Por isso, ele defende que é preciso começar logo uma agenda de cortes de gastos.

“Qualquer programa de ajuste que queira estabilizar as contas públicas vai precisar de uma agenda importante de contenção de despesas. E isso não é só revisar programas e melhorar a eficiência, mas de fato mudar a direção dos gastos. É matemática elementar”, explicou.

Se até a quinta-feira passada o mercado financeiro já havia assimilado a alteração desses números, agora, a reação tende a ser diferente, com a piora do cenário global. A inflação americana e o mercado de trabalho mais aquecidos do que o esperado vão dificultar o início do corte de juros pelo Fed, o Banco Central dos EUA.

Com isso, a tendência é de aumento do dólar em relação às principais divisas do mundo. Países com problemas nas contas públicas, como o Brasil, tendem a sofrer mais. O reflexo disso já aparece na cotação do dólar sobre o real, que saltou de R$ 5 na última terça-feira para R$ 5,19 na manhã desta segunda. A geopolítica global também ficou mais intrincada, com os ataques do Irã a Israel.

Com o dólar mais alto, a tendência é de que as expectativas de inflação para o Brasil também piorem. Isso porque os produtos industrializados que o Brasil importa tendem a ficar mais caros. O economista Luis Otávio Leal, da G5 Parters, mostra os números de como isso pode virar um problema para o Banco Central. Se hoje a preocupação com a inflação está nos bens “não comercializáveis”, notadamente o setor de serviços, que sobe 4,72% nos 12 meses encerrados em março, um novo foco de alta pode vir dos bens comercializáveis (produtos industriais), que até então têm alta de apenas 0,97%. Produtos mais caros vindos do exterior podem ter um impacto de até 0,65 ponto no nosso IPCA, o que obrigaria o BC a manter a taxa Selic mais elevada.

Mas qual a relação disso com as contas públicas? Tudo, porque juros mais altos significam um déficit nominal também mais elevado, com impacto sobre o endividamento do governo. Além disso, afetam o crescimento do PIB, com reflexo sobre a arrecadação.

Mesmo com a revisão, os números apresentados hoje estão acima do projetado pelo mercado financeiro no Boletim Focus. Para 2025, a mediana de economistas e investidores aponta para um déficit de 0,6% do PIB, com leve melhora para -0,5%, no ano seguinte, e -0,2%, em 2027.

De alguma forma, os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) precisarão vencer a queda de braço interna contra integrantes do PT para convencer Lula a bancar uma agenda efetiva de cortes de gastos. Do contrário, o presidente poderá naufragar na economia.

Opinião por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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