BRASÍLIA – A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) afirmou que transferir a Amazonas Energia para a Âmbar, empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista, conforme decisão judicial, causaria um prejuízo “irreparável” de R$ 16 bilhões, que seria bancado por todos os consumidores de conta de luz do Brasil.
A Justiça Federal do Amazonas obrigou a Aneel a transferir a Amazonas Energia, distribuidora do Estado, para a Âmbar, empresa do Grupo J&F, que pertence aos Batista, nos termos da proposta apresentada pela companhia. O órgão recorreu da decisão nesta quinta-feira, 26, e calcula que o plano tem um custo de R$ 15,8 bilhões em 15 anos para os consumidores brasileiros – quando poderia ser menor, de R$ 8 bilhões, se seguisse as recomendações da agência.
O cálculo, apresentado à Justiça, está relacionado com os prejuízos da operação que são bancados por consumidores brasileiros, independentemente do Estado. A maior parte envolve o índice de furto de energia no Amazonas (o chamado “gato”) e o valor necessário para manter a empresa de pé e pagar as contas em dia. A agência exigiu compromissos maiores da Âmbar para diminuir os problemas de forma mais acelerada ao longo dos anos, o que reduziria o custo total na conta de luz.
Na segunda-feira, 23, a Âmbar defendeu o plano apresentado e afirmou que a proposta demonstra “sua capacidade técnica e econômica para adequar o serviço de distribuição” no Amazonas.
Executivos do grupo J&F dizem, nos bastidores, que a empresa não participou da elaboração da ação e continuam defendendo a análise do plano pela diretoria da Aneel. Procurada novamente para comentar o processo, nesta quinta, 26, a Âmbar não se manifestou. O Ministério de Minas e Energia disse que não cabe a ele comentar. A Amazonas Energia também não se pronunciou.
Os executivos da Âmbar se reuniram com diretores da Aneel na tarde nesta quinta-feira, 26, em meio ao impasse. A empresa defendeu o plano apresentado. Uma das maiores divergências entre a companhia e a agência reguladora é o endividamento da Amazonas Energia, calculado em R$ 10 bilhões. A Âmbar sugeriu resolver a dívida em 15 anos, ancorada nas flexibilizações que serão bancadas pela conta de luz. A área técnica da Aneel classificou a proposta como ilegal e recomendou à diretoria exigir que a empresa equacione a dívida até o fim deste ano, caso a transferência seja realizada. Autoridades do Ministério de Minas e Energia também se reuniriam com a Aneel para discutir o processo, mas cancelaram a agenda.
A Aneel tem até esta sexta-feira, 27, para cumprir a decisão. A agência espera uma reversão do cenário nesse período. Conforme o Estadão revelou, o órgão preparava um processo de intervenção na Amazonas Energia antes da determinação judicial. A área técnica recomendou a rejeição do plano.
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O governo Lula beneficiou a empresa dos irmãos Batista com uma medida provisória (MP) que socorre o caixa da Amazonas Energia e transfere o custo para os consumidores brasileiros. A decisão foi assinada 72 horas depois de a Âmbar ter comprado usinas termelétricas da Eletrobras que têm dívidas a receber da Amazonas Energia.
No recurso apresentado ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a Aneel argumenta que é a responsável legal por avaliar o plano de transferência de controle e determinar as condições do negócio. O órgão classificou a decisão judicial como “teratológica” e disse que a ordem foi dada sem examinar os aspectos técnicos do plano da Âmbar.
Cumprir o despacho judicial, nas palavras da Aneel, levaria a “todos os consumidores do País, por meio da CCC (Conta de Consumo de Combustível), um custo de R$ 16 bilhões em suas contas de energia” por meio de um processo judicial “de urgência, precário e raso”.
A distribuidora do Amazonas é deficitária e enfrenta uma série de problemas. O nível de perdas em função dos furtos, por exemplo, é calculado em 119,8%, ou seja, maior do que o faturamento. O nível considerado adequado pela Aneel é de 68%. Pelo plano da Âmbar, o índice aceitável só seria atingido em 2038. A área técnica sugeriu uma mudança para 2033.
Outro problema que será bancado pelos consumidores são os custos operacionais, que é o dinheiro necessário para a empresa se manter funcionando com todas as despesas que tem. A companhia dos irmãos Batista não apresentou metas de redução desses custos em 15 anos alegando que a concessão envolve a distribuição de energia em uma das regiões mais complexas do País, com vastas áreas remotas, dificuldade de logística e toda a complexidade ambiental do Estado amazônico. Para os técnicos da agência, porém, é necessário e possível adotar uma trajetória de redução para diminuir o encargo sobre aos consumidores.
Se a decisão não for revertida, a Aneel deverá realizar uma reunião extraordinária para aprovar o plano da Âmbar nesta sexta-feira, 27, contrariando a área técnica e ignorando os argumentos dos consultores da agência contra a transferência. De acordo com a agência, o cumprimento da decisão causaria “danos graves e de reparação difícil/impossível” ao consumidor e “inequívocos danos às ordens pública e econômica, de complexa – e quiçá impossível – reversão, com enormes prejuízos às atividades de regulação e fiscalização do setor elétrico.”
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Um dos pontos destacados é que, cumprindo a decisão e transferindo o controle da companhia amazonense para os irmãos Batista, o processo seria praticamente irreversível, mesmo que a decisão judicial caia depois, pois a empresa já estaria nas mãos do grupo empresarial. Nesse caso, nasceria um impasse jurídico e um acordo seria forçado.