Bancos chineses podem estar carregados de empréstimos inadimplentes ocultos


A ressaca da era covid no setor poderia estar prestes a se intensificar

Por The Economist

Quando o Banco de Jinzhou, no nordeste da China, mostrou sinais de apuros no início do ano, os meios de comunicação estatais sugeriram que um bilionário chamado Li Hejun poderia ser o culpado. Magnata da indústria de painéis solares, Li já foi o homem mais rico da China. Sua empresa era conhecida por manter fortes vínculos com o banco. E pouco depois que a notícia de sua prisão se espalhou, o Banco de Jinzhou suspendeu a negociação de suas ações e disse aos investidores que reestruturaria suas operações.

Estranhamente, as finanças do banco pareciam em bom estado. O nível geral de dívidas com pagamento atrasado do banco era baixo na primeira metade de 2022, o último período para o qual existe informação detalhada disponível. Apesar de um número preocupante se sobressair — mais de 50% de seus empréstimos a empresas privadas tiveram pagamentos atrasados — esse tipo de empréstimo correspondeu a apenas 1% do total. Empréstimos para pequenas e microempresas, que correspondem a cerca de metade do portfólio de empréstimos do banco, pareciam normais, com apenas 3% azedando.

Mas era esta a história completa? Em teoria, não há distinção significativa entre empréstimos para empresas privadas pessoais e empréstimos para pequenas e microempresas, afirma Jason Bedford, um analista veterano do setor financeiro. Ambos são usados de maneiras similares e deveriam oferecer riscos similares. Na prática, porém, há uma diferença crucial: empréstimos para pequenas e microempresas continuam cobertos por uma moratória da era covid que permite aos bancos evitar reconhecer inadimplências em empréstimos. Portanto é possível que uma grande porção dos empréstimos ativos do Banco de Jinzhou seja de dívidas não pagas e não reconhecidas. O banco não informou quase nada a respeito de sua condição este ano.

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Se dívidas não pagas e ocultas, como essas, assolam o Banco de Jinzhou, podem muito bem assolar também outras instituições. O que é preocupante, pois as finanças chinesas já são uma bagunça. Governos locais estão com dificuldades para pagar empréstimos de ao menos 65 trilhões de yuans (US$ 9 trilhões) em dívidas que não entram em balanços contábeis. Muitos dos grandes empreendedores imobiliários do país já deram calotes em obrigações offshore e devem trilhões de yuans em moradias não construídas para habitantes locais. As maiores administradoras de fundos chinesas começaram a dar calote em pagamentos para investidores. Dado que o tipo de dívidas ocultas do balanço contábil do Banco de Jinzhou recebeu até aqui pouca atenção, as dificuldades da instituição devem servir de alerta.

China tem enfrentado problemas no mercado imobiliário, que podem se estender aos bancos Foto: Thomas Peter/REUTERS

Os problemas com os empréstimos para empresas menores começaram com a covid-19. Conforme a China fechou, o Banco Central colocou em moratória os pagamentos de empréstimos das pequenas e microempresas até junho de 2020, para conter uma onda de calotes. Após menos de três meses, as autoridades estimaram que 700 bilhões de yuan em pagamentos de prestações de dívidas tinham sido adiados. A moratória foi estendida várias vezes desde então, com autoridades citando o impacto continuado da covid. Não existe nenhuma estimativa do montante dos empréstimos não pagos, e os bancos só serão obrigados a revelar esses dados publicamente no próximo ano.

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A moratória também coincidiu com outra iniciativa do Estado. Para estimular a economia, o governo central pressionou os bancos a estender os prazos de pagamento dos empréstimos para as empresas menores e sob os juros mais baixos possíveis. Apesar de políticas desse tipo terem sido tentadas por anos, os bancos vinham resistindo, preferindo emprestar para as empresas maiores, com frequência estatais, com as quais já mantinham relação. Mas desta vez a política funcionou. Uma operação de vigilância sobre o setor financeiro que culminou na prisão do presidente de um dos maiores bancos comerciais da China, no ano passado, tornou os diretores das instituições financeiras mais dispostos a seguir determinações oficiais.

Como resultado, no começo do ano cerca de 28% de todos os empréstimos na China foram concedidos para pequenas e microempresas, em comparação a 24% no fim de 2019. Muitos desses empréstimos representam simplesmente a renovação de dívidas mais antigas não pagas. É bem conhecido que empresas pequenas passaram por dificuldades durante a pandemia. Apesar disso, quase não houve aumento nos empréstimos com pagamentos atrasados, nota Alicia Garcia Herrero, do banco Natixis.

Outro resultado foi o que alguns percebem como uma avaliação catastroficamente equivocada de ativos. Julga-se normalmente que empresas pequenas apresentam riscos maiores, mas empréstimos para pequenas e microempresas têm sido oferecidos, não obstante, sob juros baixíssimos. Bancos oferecem crédito a uma média de 4% de juro anual, contra 6% em 2019. Para piorar as coisas, um recente aumento em depósitos de longo prazo, que são remunerados a índices mais elevados, significa que as margens dos bancos foram espremidas ainda mais.

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Poucos bancos deram pistas a respeito da quantidade de pagamentos de empréstimos atrasados em seus balanços contábeis. O Banco Minsheng, um dos maiores da China, afirmou em seu relatório de meio de ano em 2022 que concedeu 212 bilhões de yuan em empréstimos renovados e pagamentos renegociados nos seis meses anteriores, o equivalente a cerca de 9% de sua contabilidade total de crédito. Desde então, o banco se negou a fazer revelações similares. O Banco Central está fornecendo fundos para os bancos que podem ser usados para dar apoio a setores específicos da economia. Em um relatório recente, a instituição afirmou que forneceu 2,7 trilhões de yuans para empréstimos a pequenas empresas na primeira metade deste ano.

Qualquer moratória em pagamentos de empréstimos vem com uma aposta: de que um período de perdão permita que empresas em dificuldades se recuperem após um choque. A decisão inicial pode ter salvado dezenas de milhares de empresas e até alguns bancos da falência. Mas agora, o efeito das dívidas acumuladas — por maior que possa ser — depende da sorte econômica da China nos próximos meses. Apesar dos índices dos gerentes de compras para manufaturas mostrarem que o panorama para as empresas grandes melhorou levemente, para as empresas pequenas e médias a contração continuou. A ressaca econômica da era covid persiste. E agora pode estar prestes a se intensificar. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando o Banco de Jinzhou, no nordeste da China, mostrou sinais de apuros no início do ano, os meios de comunicação estatais sugeriram que um bilionário chamado Li Hejun poderia ser o culpado. Magnata da indústria de painéis solares, Li já foi o homem mais rico da China. Sua empresa era conhecida por manter fortes vínculos com o banco. E pouco depois que a notícia de sua prisão se espalhou, o Banco de Jinzhou suspendeu a negociação de suas ações e disse aos investidores que reestruturaria suas operações.

Estranhamente, as finanças do banco pareciam em bom estado. O nível geral de dívidas com pagamento atrasado do banco era baixo na primeira metade de 2022, o último período para o qual existe informação detalhada disponível. Apesar de um número preocupante se sobressair — mais de 50% de seus empréstimos a empresas privadas tiveram pagamentos atrasados — esse tipo de empréstimo correspondeu a apenas 1% do total. Empréstimos para pequenas e microempresas, que correspondem a cerca de metade do portfólio de empréstimos do banco, pareciam normais, com apenas 3% azedando.

Mas era esta a história completa? Em teoria, não há distinção significativa entre empréstimos para empresas privadas pessoais e empréstimos para pequenas e microempresas, afirma Jason Bedford, um analista veterano do setor financeiro. Ambos são usados de maneiras similares e deveriam oferecer riscos similares. Na prática, porém, há uma diferença crucial: empréstimos para pequenas e microempresas continuam cobertos por uma moratória da era covid que permite aos bancos evitar reconhecer inadimplências em empréstimos. Portanto é possível que uma grande porção dos empréstimos ativos do Banco de Jinzhou seja de dívidas não pagas e não reconhecidas. O banco não informou quase nada a respeito de sua condição este ano.

Se dívidas não pagas e ocultas, como essas, assolam o Banco de Jinzhou, podem muito bem assolar também outras instituições. O que é preocupante, pois as finanças chinesas já são uma bagunça. Governos locais estão com dificuldades para pagar empréstimos de ao menos 65 trilhões de yuans (US$ 9 trilhões) em dívidas que não entram em balanços contábeis. Muitos dos grandes empreendedores imobiliários do país já deram calotes em obrigações offshore e devem trilhões de yuans em moradias não construídas para habitantes locais. As maiores administradoras de fundos chinesas começaram a dar calote em pagamentos para investidores. Dado que o tipo de dívidas ocultas do balanço contábil do Banco de Jinzhou recebeu até aqui pouca atenção, as dificuldades da instituição devem servir de alerta.

China tem enfrentado problemas no mercado imobiliário, que podem se estender aos bancos Foto: Thomas Peter/REUTERS

Os problemas com os empréstimos para empresas menores começaram com a covid-19. Conforme a China fechou, o Banco Central colocou em moratória os pagamentos de empréstimos das pequenas e microempresas até junho de 2020, para conter uma onda de calotes. Após menos de três meses, as autoridades estimaram que 700 bilhões de yuan em pagamentos de prestações de dívidas tinham sido adiados. A moratória foi estendida várias vezes desde então, com autoridades citando o impacto continuado da covid. Não existe nenhuma estimativa do montante dos empréstimos não pagos, e os bancos só serão obrigados a revelar esses dados publicamente no próximo ano.

A moratória também coincidiu com outra iniciativa do Estado. Para estimular a economia, o governo central pressionou os bancos a estender os prazos de pagamento dos empréstimos para as empresas menores e sob os juros mais baixos possíveis. Apesar de políticas desse tipo terem sido tentadas por anos, os bancos vinham resistindo, preferindo emprestar para as empresas maiores, com frequência estatais, com as quais já mantinham relação. Mas desta vez a política funcionou. Uma operação de vigilância sobre o setor financeiro que culminou na prisão do presidente de um dos maiores bancos comerciais da China, no ano passado, tornou os diretores das instituições financeiras mais dispostos a seguir determinações oficiais.

Como resultado, no começo do ano cerca de 28% de todos os empréstimos na China foram concedidos para pequenas e microempresas, em comparação a 24% no fim de 2019. Muitos desses empréstimos representam simplesmente a renovação de dívidas mais antigas não pagas. É bem conhecido que empresas pequenas passaram por dificuldades durante a pandemia. Apesar disso, quase não houve aumento nos empréstimos com pagamentos atrasados, nota Alicia Garcia Herrero, do banco Natixis.

Outro resultado foi o que alguns percebem como uma avaliação catastroficamente equivocada de ativos. Julga-se normalmente que empresas pequenas apresentam riscos maiores, mas empréstimos para pequenas e microempresas têm sido oferecidos, não obstante, sob juros baixíssimos. Bancos oferecem crédito a uma média de 4% de juro anual, contra 6% em 2019. Para piorar as coisas, um recente aumento em depósitos de longo prazo, que são remunerados a índices mais elevados, significa que as margens dos bancos foram espremidas ainda mais.

Poucos bancos deram pistas a respeito da quantidade de pagamentos de empréstimos atrasados em seus balanços contábeis. O Banco Minsheng, um dos maiores da China, afirmou em seu relatório de meio de ano em 2022 que concedeu 212 bilhões de yuan em empréstimos renovados e pagamentos renegociados nos seis meses anteriores, o equivalente a cerca de 9% de sua contabilidade total de crédito. Desde então, o banco se negou a fazer revelações similares. O Banco Central está fornecendo fundos para os bancos que podem ser usados para dar apoio a setores específicos da economia. Em um relatório recente, a instituição afirmou que forneceu 2,7 trilhões de yuans para empréstimos a pequenas empresas na primeira metade deste ano.

Qualquer moratória em pagamentos de empréstimos vem com uma aposta: de que um período de perdão permita que empresas em dificuldades se recuperem após um choque. A decisão inicial pode ter salvado dezenas de milhares de empresas e até alguns bancos da falência. Mas agora, o efeito das dívidas acumuladas — por maior que possa ser — depende da sorte econômica da China nos próximos meses. Apesar dos índices dos gerentes de compras para manufaturas mostrarem que o panorama para as empresas grandes melhorou levemente, para as empresas pequenas e médias a contração continuou. A ressaca econômica da era covid persiste. E agora pode estar prestes a se intensificar. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando o Banco de Jinzhou, no nordeste da China, mostrou sinais de apuros no início do ano, os meios de comunicação estatais sugeriram que um bilionário chamado Li Hejun poderia ser o culpado. Magnata da indústria de painéis solares, Li já foi o homem mais rico da China. Sua empresa era conhecida por manter fortes vínculos com o banco. E pouco depois que a notícia de sua prisão se espalhou, o Banco de Jinzhou suspendeu a negociação de suas ações e disse aos investidores que reestruturaria suas operações.

Estranhamente, as finanças do banco pareciam em bom estado. O nível geral de dívidas com pagamento atrasado do banco era baixo na primeira metade de 2022, o último período para o qual existe informação detalhada disponível. Apesar de um número preocupante se sobressair — mais de 50% de seus empréstimos a empresas privadas tiveram pagamentos atrasados — esse tipo de empréstimo correspondeu a apenas 1% do total. Empréstimos para pequenas e microempresas, que correspondem a cerca de metade do portfólio de empréstimos do banco, pareciam normais, com apenas 3% azedando.

Mas era esta a história completa? Em teoria, não há distinção significativa entre empréstimos para empresas privadas pessoais e empréstimos para pequenas e microempresas, afirma Jason Bedford, um analista veterano do setor financeiro. Ambos são usados de maneiras similares e deveriam oferecer riscos similares. Na prática, porém, há uma diferença crucial: empréstimos para pequenas e microempresas continuam cobertos por uma moratória da era covid que permite aos bancos evitar reconhecer inadimplências em empréstimos. Portanto é possível que uma grande porção dos empréstimos ativos do Banco de Jinzhou seja de dívidas não pagas e não reconhecidas. O banco não informou quase nada a respeito de sua condição este ano.

Se dívidas não pagas e ocultas, como essas, assolam o Banco de Jinzhou, podem muito bem assolar também outras instituições. O que é preocupante, pois as finanças chinesas já são uma bagunça. Governos locais estão com dificuldades para pagar empréstimos de ao menos 65 trilhões de yuans (US$ 9 trilhões) em dívidas que não entram em balanços contábeis. Muitos dos grandes empreendedores imobiliários do país já deram calotes em obrigações offshore e devem trilhões de yuans em moradias não construídas para habitantes locais. As maiores administradoras de fundos chinesas começaram a dar calote em pagamentos para investidores. Dado que o tipo de dívidas ocultas do balanço contábil do Banco de Jinzhou recebeu até aqui pouca atenção, as dificuldades da instituição devem servir de alerta.

China tem enfrentado problemas no mercado imobiliário, que podem se estender aos bancos Foto: Thomas Peter/REUTERS

Os problemas com os empréstimos para empresas menores começaram com a covid-19. Conforme a China fechou, o Banco Central colocou em moratória os pagamentos de empréstimos das pequenas e microempresas até junho de 2020, para conter uma onda de calotes. Após menos de três meses, as autoridades estimaram que 700 bilhões de yuan em pagamentos de prestações de dívidas tinham sido adiados. A moratória foi estendida várias vezes desde então, com autoridades citando o impacto continuado da covid. Não existe nenhuma estimativa do montante dos empréstimos não pagos, e os bancos só serão obrigados a revelar esses dados publicamente no próximo ano.

A moratória também coincidiu com outra iniciativa do Estado. Para estimular a economia, o governo central pressionou os bancos a estender os prazos de pagamento dos empréstimos para as empresas menores e sob os juros mais baixos possíveis. Apesar de políticas desse tipo terem sido tentadas por anos, os bancos vinham resistindo, preferindo emprestar para as empresas maiores, com frequência estatais, com as quais já mantinham relação. Mas desta vez a política funcionou. Uma operação de vigilância sobre o setor financeiro que culminou na prisão do presidente de um dos maiores bancos comerciais da China, no ano passado, tornou os diretores das instituições financeiras mais dispostos a seguir determinações oficiais.

Como resultado, no começo do ano cerca de 28% de todos os empréstimos na China foram concedidos para pequenas e microempresas, em comparação a 24% no fim de 2019. Muitos desses empréstimos representam simplesmente a renovação de dívidas mais antigas não pagas. É bem conhecido que empresas pequenas passaram por dificuldades durante a pandemia. Apesar disso, quase não houve aumento nos empréstimos com pagamentos atrasados, nota Alicia Garcia Herrero, do banco Natixis.

Outro resultado foi o que alguns percebem como uma avaliação catastroficamente equivocada de ativos. Julga-se normalmente que empresas pequenas apresentam riscos maiores, mas empréstimos para pequenas e microempresas têm sido oferecidos, não obstante, sob juros baixíssimos. Bancos oferecem crédito a uma média de 4% de juro anual, contra 6% em 2019. Para piorar as coisas, um recente aumento em depósitos de longo prazo, que são remunerados a índices mais elevados, significa que as margens dos bancos foram espremidas ainda mais.

Poucos bancos deram pistas a respeito da quantidade de pagamentos de empréstimos atrasados em seus balanços contábeis. O Banco Minsheng, um dos maiores da China, afirmou em seu relatório de meio de ano em 2022 que concedeu 212 bilhões de yuan em empréstimos renovados e pagamentos renegociados nos seis meses anteriores, o equivalente a cerca de 9% de sua contabilidade total de crédito. Desde então, o banco se negou a fazer revelações similares. O Banco Central está fornecendo fundos para os bancos que podem ser usados para dar apoio a setores específicos da economia. Em um relatório recente, a instituição afirmou que forneceu 2,7 trilhões de yuans para empréstimos a pequenas empresas na primeira metade deste ano.

Qualquer moratória em pagamentos de empréstimos vem com uma aposta: de que um período de perdão permita que empresas em dificuldades se recuperem após um choque. A decisão inicial pode ter salvado dezenas de milhares de empresas e até alguns bancos da falência. Mas agora, o efeito das dívidas acumuladas — por maior que possa ser — depende da sorte econômica da China nos próximos meses. Apesar dos índices dos gerentes de compras para manufaturas mostrarem que o panorama para as empresas grandes melhorou levemente, para as empresas pequenas e médias a contração continuou. A ressaca econômica da era covid persiste. E agora pode estar prestes a se intensificar. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Quando o Banco de Jinzhou, no nordeste da China, mostrou sinais de apuros no início do ano, os meios de comunicação estatais sugeriram que um bilionário chamado Li Hejun poderia ser o culpado. Magnata da indústria de painéis solares, Li já foi o homem mais rico da China. Sua empresa era conhecida por manter fortes vínculos com o banco. E pouco depois que a notícia de sua prisão se espalhou, o Banco de Jinzhou suspendeu a negociação de suas ações e disse aos investidores que reestruturaria suas operações.

Estranhamente, as finanças do banco pareciam em bom estado. O nível geral de dívidas com pagamento atrasado do banco era baixo na primeira metade de 2022, o último período para o qual existe informação detalhada disponível. Apesar de um número preocupante se sobressair — mais de 50% de seus empréstimos a empresas privadas tiveram pagamentos atrasados — esse tipo de empréstimo correspondeu a apenas 1% do total. Empréstimos para pequenas e microempresas, que correspondem a cerca de metade do portfólio de empréstimos do banco, pareciam normais, com apenas 3% azedando.

Mas era esta a história completa? Em teoria, não há distinção significativa entre empréstimos para empresas privadas pessoais e empréstimos para pequenas e microempresas, afirma Jason Bedford, um analista veterano do setor financeiro. Ambos são usados de maneiras similares e deveriam oferecer riscos similares. Na prática, porém, há uma diferença crucial: empréstimos para pequenas e microempresas continuam cobertos por uma moratória da era covid que permite aos bancos evitar reconhecer inadimplências em empréstimos. Portanto é possível que uma grande porção dos empréstimos ativos do Banco de Jinzhou seja de dívidas não pagas e não reconhecidas. O banco não informou quase nada a respeito de sua condição este ano.

Se dívidas não pagas e ocultas, como essas, assolam o Banco de Jinzhou, podem muito bem assolar também outras instituições. O que é preocupante, pois as finanças chinesas já são uma bagunça. Governos locais estão com dificuldades para pagar empréstimos de ao menos 65 trilhões de yuans (US$ 9 trilhões) em dívidas que não entram em balanços contábeis. Muitos dos grandes empreendedores imobiliários do país já deram calotes em obrigações offshore e devem trilhões de yuans em moradias não construídas para habitantes locais. As maiores administradoras de fundos chinesas começaram a dar calote em pagamentos para investidores. Dado que o tipo de dívidas ocultas do balanço contábil do Banco de Jinzhou recebeu até aqui pouca atenção, as dificuldades da instituição devem servir de alerta.

China tem enfrentado problemas no mercado imobiliário, que podem se estender aos bancos Foto: Thomas Peter/REUTERS

Os problemas com os empréstimos para empresas menores começaram com a covid-19. Conforme a China fechou, o Banco Central colocou em moratória os pagamentos de empréstimos das pequenas e microempresas até junho de 2020, para conter uma onda de calotes. Após menos de três meses, as autoridades estimaram que 700 bilhões de yuan em pagamentos de prestações de dívidas tinham sido adiados. A moratória foi estendida várias vezes desde então, com autoridades citando o impacto continuado da covid. Não existe nenhuma estimativa do montante dos empréstimos não pagos, e os bancos só serão obrigados a revelar esses dados publicamente no próximo ano.

A moratória também coincidiu com outra iniciativa do Estado. Para estimular a economia, o governo central pressionou os bancos a estender os prazos de pagamento dos empréstimos para as empresas menores e sob os juros mais baixos possíveis. Apesar de políticas desse tipo terem sido tentadas por anos, os bancos vinham resistindo, preferindo emprestar para as empresas maiores, com frequência estatais, com as quais já mantinham relação. Mas desta vez a política funcionou. Uma operação de vigilância sobre o setor financeiro que culminou na prisão do presidente de um dos maiores bancos comerciais da China, no ano passado, tornou os diretores das instituições financeiras mais dispostos a seguir determinações oficiais.

Como resultado, no começo do ano cerca de 28% de todos os empréstimos na China foram concedidos para pequenas e microempresas, em comparação a 24% no fim de 2019. Muitos desses empréstimos representam simplesmente a renovação de dívidas mais antigas não pagas. É bem conhecido que empresas pequenas passaram por dificuldades durante a pandemia. Apesar disso, quase não houve aumento nos empréstimos com pagamentos atrasados, nota Alicia Garcia Herrero, do banco Natixis.

Outro resultado foi o que alguns percebem como uma avaliação catastroficamente equivocada de ativos. Julga-se normalmente que empresas pequenas apresentam riscos maiores, mas empréstimos para pequenas e microempresas têm sido oferecidos, não obstante, sob juros baixíssimos. Bancos oferecem crédito a uma média de 4% de juro anual, contra 6% em 2019. Para piorar as coisas, um recente aumento em depósitos de longo prazo, que são remunerados a índices mais elevados, significa que as margens dos bancos foram espremidas ainda mais.

Poucos bancos deram pistas a respeito da quantidade de pagamentos de empréstimos atrasados em seus balanços contábeis. O Banco Minsheng, um dos maiores da China, afirmou em seu relatório de meio de ano em 2022 que concedeu 212 bilhões de yuan em empréstimos renovados e pagamentos renegociados nos seis meses anteriores, o equivalente a cerca de 9% de sua contabilidade total de crédito. Desde então, o banco se negou a fazer revelações similares. O Banco Central está fornecendo fundos para os bancos que podem ser usados para dar apoio a setores específicos da economia. Em um relatório recente, a instituição afirmou que forneceu 2,7 trilhões de yuans para empréstimos a pequenas empresas na primeira metade deste ano.

Qualquer moratória em pagamentos de empréstimos vem com uma aposta: de que um período de perdão permita que empresas em dificuldades se recuperem após um choque. A decisão inicial pode ter salvado dezenas de milhares de empresas e até alguns bancos da falência. Mas agora, o efeito das dívidas acumuladas — por maior que possa ser — depende da sorte econômica da China nos próximos meses. Apesar dos índices dos gerentes de compras para manufaturas mostrarem que o panorama para as empresas grandes melhorou levemente, para as empresas pequenas e médias a contração continuou. A ressaca econômica da era covid persiste. E agora pode estar prestes a se intensificar. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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