‘Bancos já assimilaram que haverá limite nos juros do rotativo’, diz relator do Desenrola na Câmara


Alencar Santana diz não ver vontade política no Congresso para mexer nas compras parceladas sem juros, criticadas pelas instituições financeiras; relator quer teto de 100% ao ano para rotativo, que hoje beira 450%

Por Mariana Carneiro e Bianca Lima
Atualização:
Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
Entrevista comAlencar Santanarelator do Desenrola na Câmara

BRASÍLIA - O deputado Alencar Santana (PT-SP) afirma que a proposta de limitar a taxa de juros cobrada no rotativo do cartão de crédito tem apoio de líderes partidários na Câmara, assim como a manutenção do parcelamento sem juros. A modalidade de compra, bastante difundida no varejo, é criticada pelas instituições financeiras, que defendem a limitação do instrumento.

Sem acordo entre os operadores que atuam neste mercado - como bancos, empresas de maquininhas e o comércio -, o impasse está sendo tratado no Congresso, no projeto de lei que cria as garantias para a segunda fase do programa Desenrola, cuja previsão de votação na Câmara é ainda nesta semana.

No seu relatório, Santana dá prazo para que o setor financeiro proponha uma autorregulação em até 90 dias. Caso não ocorra, a cobrança de juros não poderá superar o principal da dívida - o que, na prática, equivale a um juro máximo de 100% ao ano. Hoje, a taxa cobrada supera os 445%.

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Alencar Santana (PT-SP) Foto: Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

“Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado”, disse, em entrevista concedida ao Estadão nesta segunda-feira, 4. “Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo”, acrescentou.

Sobre o parcelamento sem juros, Santana disse não ver vontade política no Congresso de mexer nesse ponto. “Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País”, disse.

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Segundo o relator, o argumento dos bancos “não comoveu ninguém”. “Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles”, afirmou. A seguir, veja os principais trechos da entrevista ao Estadão.

Seu relatório estipula um prazo de 90 dias para os bancos baixarem os juros do rotativo. Caso contrário, as dívidas serão limitadas ao dobro do principal. Qual seu intuito com isso?

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O objetivo é não intervir diretamente, estabelecendo um porcentual. Até porque você pode ter uma variação da taxa Selic. Se você tiver uma Selic alta, 8% (ao mês) é algo bom. Se tiver uma Selic baixa, 8% é um juro alto. Então, não queria intervir dizendo ‘vai ser de 10%, 5%’ (o juro do rotativo). Para evitar uma intervenção direta, a gente dá um prazo para que algo seja feito. O quê? Uma proposta do setor homologada pelo Conselho Monetário Nacional, com a participação do Banco Central, desse limite aos juros. Em nada sendo feito até 90 dias, automaticamente os juros estariam limitados em, no máximo, o valor do principal da dívida. Se eu tenho R$ 500 (de dívida), o máximo, ao longo do tempo, será chegar a R$ 500 (o valor dos juros).

Por que optou por essa redação, em vez de fixar o porcentual de 100% para os juros do rotativo?

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Na prática, é a mesma coisa. Esse modelo, a gente estudou, é o mesmo adotado na Inglaterra, por exemplo. A aplicação dos juros a partir do inadimplemento (quando a pessoa se torna inadimplente) será justamente o motivo da regulamentação. Eu só não quis estipular um limitador monetário.

O prazo de 90 dias começa a contar quando?

No momento em que a lei entrar em vigor.

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Desde que o sr. falou desse limitador, algo mudou na negociação com os bancos sobre os juros do rotativo?

Os grandes bancos não queriam isso e não queriam que houvesse consequências. No início, diziam “a gente topa que haja um prazo para que façamos algo, mas não tem que ter consequência”. Aí eu disse: “me desculpa, a lei perde o sentido”. Se você não fizer e não tiver consequência fica ad eternum a possibilidade de fazer. Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo. Qual foi a tentativa deles aí na reta final? Já que haverá um limite, que a gente mexesse no parcelado sem juros. Que acabasse com o parcelado sem juros, diminuísse o número de parcelas, ou se cobrasse juros no parcelamento. Mas não tem acordo, não permitimos isso.


Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

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Não tem acordo por que o sr. é contra ou por que expressa a opinião dos líderes da Câmara?

Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País. Quando você cobra juros no parcelado, você cria uma sensação de aumento gradual (de preços), você mexe com o cenário econômico.

Mas e o argumento dos bancos de que os juros estão embutidos nos preços quando se compra parcelado sem juros?

Não comoveu ninguém.

Nas últimas conversas que o sr. teve com bancos, varejo e empresas de maquininhas, houve algum tipo de avanço?

Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles, né? Pelo menos ninguém defendeu isso para mim.

O setor financeiro tem influência no Congresso. Acredita que possa haver alterações na tramitação?

Mas qual vai ser o parlamentar que vai apresentar a tese de que agora o parcelado vai ter juros? As pessoas podem até gostar dos bancos, mas nessa hora gostam das pessoas.

Nem na questão do limite para o rotativo?

Muito difícil, não estou sentindo nenhum movimento nesse sentido. Mas Parlamento é Parlamento, vamos aguardar. Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

Essa proposta passou pelo BC?

Dialogamos com o Ministério da Fazenda, não com o BC.

Por quê?

Falei com o governo, mas o Roberto Campos (Neto) também já falou contra os juros do rotativo, né? Falou que é muito alto. Sobre o parcelado sem juros, na regulamentação, se ele estiver de acordo, que proponha ao Conselho Monetário.

O sr. acredita que pode mudar o entendimento sobre o teto do rotativo na regulamentação via CMN?

Não acredito. Ele (Roberto Campos Neto) tem voz, mas não tem maioria. E a Fazenda está de acordo (com o relatório apresentado).

No relatório, o sr. também tratou de um incentivo à portabilidade da dívida. Como funcionaria?

As pessoas têm uma dívida no cartão de crédito e parcelam essa dívida, por exemplo. Ela pode achar alguém (uma instituição financeira) que ofereça para ela juros menores. É a possibilidade de ela entregar a sua dívida para outro.

Mas hoje não é possível? Falta regulamentação?

Hoje, há a portabilidade do consignado, do crédito imobiliário… Mas, nesse tipo de questão, apesar de poder, não é feito. Nós colocamos no texto para que justamente as pessoas saibam que é um direito delas. Tem que saber que é um direito.

Mas não é feito por que o consumidor não sabe?

Porque ninguém oferece.

Por que não tem garantia?

Não tem garantia, mas pode interessar para um banco menor. Pode servir para atrair o cliente justamente quando ele portar essa dívida.

Na semana passada, o Estadão/Broadcast noticiou que o sr. estudava reduzir os juros do Desenrola (hoje limitados a 1,99% ao mês). Como isso evoluiu?

O deputado Elmar Nascimento (União-BA) trouxe para nós essa sugestão. O problema é que o programa está todo preparado para começar com base nisso (1,99% ao mês). Se você coloca um juros ainda menor, segundo a Fazenda… O Ministério quer que o banco tenha um estímulo para cobrar o eventual devedor do Desenrola. Porque senão o banco vai pensar: se a dívida está garantida, para que eu vou me esforçar, fazer um dispêndio para cobrar o devedor, se eu tenho garantia real (bancada pela União)? Esse juro, de certa maneira, é um certo estímulo, porque o banco vê um ganho nessa operação.

O sr. fará algum ajuste no parecer que já apresentou?

Estou esperando para ver se os líderes farão sugestões ou não. Elmar pediu essa e uma outra questão, que é uma espécie de revisão anual por parte do Conselho Monetário dos juros do rotativo. Para reavaliar o limite do rotativo.

O sr. está inclinado a acatar a sugestão?

Estou avaliando ainda, não tenho posição. Mas me parece interessante, por ora.

BRASÍLIA - O deputado Alencar Santana (PT-SP) afirma que a proposta de limitar a taxa de juros cobrada no rotativo do cartão de crédito tem apoio de líderes partidários na Câmara, assim como a manutenção do parcelamento sem juros. A modalidade de compra, bastante difundida no varejo, é criticada pelas instituições financeiras, que defendem a limitação do instrumento.

Sem acordo entre os operadores que atuam neste mercado - como bancos, empresas de maquininhas e o comércio -, o impasse está sendo tratado no Congresso, no projeto de lei que cria as garantias para a segunda fase do programa Desenrola, cuja previsão de votação na Câmara é ainda nesta semana.

No seu relatório, Santana dá prazo para que o setor financeiro proponha uma autorregulação em até 90 dias. Caso não ocorra, a cobrança de juros não poderá superar o principal da dívida - o que, na prática, equivale a um juro máximo de 100% ao ano. Hoje, a taxa cobrada supera os 445%.

Alencar Santana (PT-SP) Foto: Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

“Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado”, disse, em entrevista concedida ao Estadão nesta segunda-feira, 4. “Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo”, acrescentou.

Sobre o parcelamento sem juros, Santana disse não ver vontade política no Congresso de mexer nesse ponto. “Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País”, disse.

Segundo o relator, o argumento dos bancos “não comoveu ninguém”. “Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles”, afirmou. A seguir, veja os principais trechos da entrevista ao Estadão.

Seu relatório estipula um prazo de 90 dias para os bancos baixarem os juros do rotativo. Caso contrário, as dívidas serão limitadas ao dobro do principal. Qual seu intuito com isso?

O objetivo é não intervir diretamente, estabelecendo um porcentual. Até porque você pode ter uma variação da taxa Selic. Se você tiver uma Selic alta, 8% (ao mês) é algo bom. Se tiver uma Selic baixa, 8% é um juro alto. Então, não queria intervir dizendo ‘vai ser de 10%, 5%’ (o juro do rotativo). Para evitar uma intervenção direta, a gente dá um prazo para que algo seja feito. O quê? Uma proposta do setor homologada pelo Conselho Monetário Nacional, com a participação do Banco Central, desse limite aos juros. Em nada sendo feito até 90 dias, automaticamente os juros estariam limitados em, no máximo, o valor do principal da dívida. Se eu tenho R$ 500 (de dívida), o máximo, ao longo do tempo, será chegar a R$ 500 (o valor dos juros).

Por que optou por essa redação, em vez de fixar o porcentual de 100% para os juros do rotativo?

Na prática, é a mesma coisa. Esse modelo, a gente estudou, é o mesmo adotado na Inglaterra, por exemplo. A aplicação dos juros a partir do inadimplemento (quando a pessoa se torna inadimplente) será justamente o motivo da regulamentação. Eu só não quis estipular um limitador monetário.

O prazo de 90 dias começa a contar quando?

No momento em que a lei entrar em vigor.

Desde que o sr. falou desse limitador, algo mudou na negociação com os bancos sobre os juros do rotativo?

Os grandes bancos não queriam isso e não queriam que houvesse consequências. No início, diziam “a gente topa que haja um prazo para que façamos algo, mas não tem que ter consequência”. Aí eu disse: “me desculpa, a lei perde o sentido”. Se você não fizer e não tiver consequência fica ad eternum a possibilidade de fazer. Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo. Qual foi a tentativa deles aí na reta final? Já que haverá um limite, que a gente mexesse no parcelado sem juros. Que acabasse com o parcelado sem juros, diminuísse o número de parcelas, ou se cobrasse juros no parcelamento. Mas não tem acordo, não permitimos isso.


Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

Não tem acordo por que o sr. é contra ou por que expressa a opinião dos líderes da Câmara?

Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País. Quando você cobra juros no parcelado, você cria uma sensação de aumento gradual (de preços), você mexe com o cenário econômico.

Mas e o argumento dos bancos de que os juros estão embutidos nos preços quando se compra parcelado sem juros?

Não comoveu ninguém.

Nas últimas conversas que o sr. teve com bancos, varejo e empresas de maquininhas, houve algum tipo de avanço?

Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles, né? Pelo menos ninguém defendeu isso para mim.

O setor financeiro tem influência no Congresso. Acredita que possa haver alterações na tramitação?

Mas qual vai ser o parlamentar que vai apresentar a tese de que agora o parcelado vai ter juros? As pessoas podem até gostar dos bancos, mas nessa hora gostam das pessoas.

Nem na questão do limite para o rotativo?

Muito difícil, não estou sentindo nenhum movimento nesse sentido. Mas Parlamento é Parlamento, vamos aguardar. Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

Essa proposta passou pelo BC?

Dialogamos com o Ministério da Fazenda, não com o BC.

Por quê?

Falei com o governo, mas o Roberto Campos (Neto) também já falou contra os juros do rotativo, né? Falou que é muito alto. Sobre o parcelado sem juros, na regulamentação, se ele estiver de acordo, que proponha ao Conselho Monetário.

O sr. acredita que pode mudar o entendimento sobre o teto do rotativo na regulamentação via CMN?

Não acredito. Ele (Roberto Campos Neto) tem voz, mas não tem maioria. E a Fazenda está de acordo (com o relatório apresentado).

No relatório, o sr. também tratou de um incentivo à portabilidade da dívida. Como funcionaria?

As pessoas têm uma dívida no cartão de crédito e parcelam essa dívida, por exemplo. Ela pode achar alguém (uma instituição financeira) que ofereça para ela juros menores. É a possibilidade de ela entregar a sua dívida para outro.

Mas hoje não é possível? Falta regulamentação?

Hoje, há a portabilidade do consignado, do crédito imobiliário… Mas, nesse tipo de questão, apesar de poder, não é feito. Nós colocamos no texto para que justamente as pessoas saibam que é um direito delas. Tem que saber que é um direito.

Mas não é feito por que o consumidor não sabe?

Porque ninguém oferece.

Por que não tem garantia?

Não tem garantia, mas pode interessar para um banco menor. Pode servir para atrair o cliente justamente quando ele portar essa dívida.

Na semana passada, o Estadão/Broadcast noticiou que o sr. estudava reduzir os juros do Desenrola (hoje limitados a 1,99% ao mês). Como isso evoluiu?

O deputado Elmar Nascimento (União-BA) trouxe para nós essa sugestão. O problema é que o programa está todo preparado para começar com base nisso (1,99% ao mês). Se você coloca um juros ainda menor, segundo a Fazenda… O Ministério quer que o banco tenha um estímulo para cobrar o eventual devedor do Desenrola. Porque senão o banco vai pensar: se a dívida está garantida, para que eu vou me esforçar, fazer um dispêndio para cobrar o devedor, se eu tenho garantia real (bancada pela União)? Esse juro, de certa maneira, é um certo estímulo, porque o banco vê um ganho nessa operação.

O sr. fará algum ajuste no parecer que já apresentou?

Estou esperando para ver se os líderes farão sugestões ou não. Elmar pediu essa e uma outra questão, que é uma espécie de revisão anual por parte do Conselho Monetário dos juros do rotativo. Para reavaliar o limite do rotativo.

O sr. está inclinado a acatar a sugestão?

Estou avaliando ainda, não tenho posição. Mas me parece interessante, por ora.

BRASÍLIA - O deputado Alencar Santana (PT-SP) afirma que a proposta de limitar a taxa de juros cobrada no rotativo do cartão de crédito tem apoio de líderes partidários na Câmara, assim como a manutenção do parcelamento sem juros. A modalidade de compra, bastante difundida no varejo, é criticada pelas instituições financeiras, que defendem a limitação do instrumento.

Sem acordo entre os operadores que atuam neste mercado - como bancos, empresas de maquininhas e o comércio -, o impasse está sendo tratado no Congresso, no projeto de lei que cria as garantias para a segunda fase do programa Desenrola, cuja previsão de votação na Câmara é ainda nesta semana.

No seu relatório, Santana dá prazo para que o setor financeiro proponha uma autorregulação em até 90 dias. Caso não ocorra, a cobrança de juros não poderá superar o principal da dívida - o que, na prática, equivale a um juro máximo de 100% ao ano. Hoje, a taxa cobrada supera os 445%.

Alencar Santana (PT-SP) Foto: Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

“Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado”, disse, em entrevista concedida ao Estadão nesta segunda-feira, 4. “Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo”, acrescentou.

Sobre o parcelamento sem juros, Santana disse não ver vontade política no Congresso de mexer nesse ponto. “Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País”, disse.

Segundo o relator, o argumento dos bancos “não comoveu ninguém”. “Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles”, afirmou. A seguir, veja os principais trechos da entrevista ao Estadão.

Seu relatório estipula um prazo de 90 dias para os bancos baixarem os juros do rotativo. Caso contrário, as dívidas serão limitadas ao dobro do principal. Qual seu intuito com isso?

O objetivo é não intervir diretamente, estabelecendo um porcentual. Até porque você pode ter uma variação da taxa Selic. Se você tiver uma Selic alta, 8% (ao mês) é algo bom. Se tiver uma Selic baixa, 8% é um juro alto. Então, não queria intervir dizendo ‘vai ser de 10%, 5%’ (o juro do rotativo). Para evitar uma intervenção direta, a gente dá um prazo para que algo seja feito. O quê? Uma proposta do setor homologada pelo Conselho Monetário Nacional, com a participação do Banco Central, desse limite aos juros. Em nada sendo feito até 90 dias, automaticamente os juros estariam limitados em, no máximo, o valor do principal da dívida. Se eu tenho R$ 500 (de dívida), o máximo, ao longo do tempo, será chegar a R$ 500 (o valor dos juros).

Por que optou por essa redação, em vez de fixar o porcentual de 100% para os juros do rotativo?

Na prática, é a mesma coisa. Esse modelo, a gente estudou, é o mesmo adotado na Inglaterra, por exemplo. A aplicação dos juros a partir do inadimplemento (quando a pessoa se torna inadimplente) será justamente o motivo da regulamentação. Eu só não quis estipular um limitador monetário.

O prazo de 90 dias começa a contar quando?

No momento em que a lei entrar em vigor.

Desde que o sr. falou desse limitador, algo mudou na negociação com os bancos sobre os juros do rotativo?

Os grandes bancos não queriam isso e não queriam que houvesse consequências. No início, diziam “a gente topa que haja um prazo para que façamos algo, mas não tem que ter consequência”. Aí eu disse: “me desculpa, a lei perde o sentido”. Se você não fizer e não tiver consequência fica ad eternum a possibilidade de fazer. Eu acho que os bancos já assimilaram que haverá um limite nos juros do rotativo. Qual foi a tentativa deles aí na reta final? Já que haverá um limite, que a gente mexesse no parcelado sem juros. Que acabasse com o parcelado sem juros, diminuísse o número de parcelas, ou se cobrasse juros no parcelamento. Mas não tem acordo, não permitimos isso.


Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

Não tem acordo por que o sr. é contra ou por que expressa a opinião dos líderes da Câmara?

Eu sou contra e os líderes em geral são contra. Vamos estipular juros sobre o parcelado? Por que razão? Isso é uma conquista da sociedade, do processo de estabilização do País. Quando você cobra juros no parcelado, você cria uma sensação de aumento gradual (de preços), você mexe com o cenário econômico.

Mas e o argumento dos bancos de que os juros estão embutidos nos preços quando se compra parcelado sem juros?

Não comoveu ninguém.

Nas últimas conversas que o sr. teve com bancos, varejo e empresas de maquininhas, houve algum tipo de avanço?

Os bancos continuam batendo na tecla do parcelado sem juros, mas ninguém comprou a tese deles, né? Pelo menos ninguém defendeu isso para mim.

O setor financeiro tem influência no Congresso. Acredita que possa haver alterações na tramitação?

Mas qual vai ser o parlamentar que vai apresentar a tese de que agora o parcelado vai ter juros? As pessoas podem até gostar dos bancos, mas nessa hora gostam das pessoas.

Nem na questão do limite para o rotativo?

Muito difícil, não estou sentindo nenhum movimento nesse sentido. Mas Parlamento é Parlamento, vamos aguardar. Nós só estamos dizendo: não queremos intervenção; sejam bonzinhos e apresentem uma proposta razoável ou está dado.

Essa proposta passou pelo BC?

Dialogamos com o Ministério da Fazenda, não com o BC.

Por quê?

Falei com o governo, mas o Roberto Campos (Neto) também já falou contra os juros do rotativo, né? Falou que é muito alto. Sobre o parcelado sem juros, na regulamentação, se ele estiver de acordo, que proponha ao Conselho Monetário.

O sr. acredita que pode mudar o entendimento sobre o teto do rotativo na regulamentação via CMN?

Não acredito. Ele (Roberto Campos Neto) tem voz, mas não tem maioria. E a Fazenda está de acordo (com o relatório apresentado).

No relatório, o sr. também tratou de um incentivo à portabilidade da dívida. Como funcionaria?

As pessoas têm uma dívida no cartão de crédito e parcelam essa dívida, por exemplo. Ela pode achar alguém (uma instituição financeira) que ofereça para ela juros menores. É a possibilidade de ela entregar a sua dívida para outro.

Mas hoje não é possível? Falta regulamentação?

Hoje, há a portabilidade do consignado, do crédito imobiliário… Mas, nesse tipo de questão, apesar de poder, não é feito. Nós colocamos no texto para que justamente as pessoas saibam que é um direito delas. Tem que saber que é um direito.

Mas não é feito por que o consumidor não sabe?

Porque ninguém oferece.

Por que não tem garantia?

Não tem garantia, mas pode interessar para um banco menor. Pode servir para atrair o cliente justamente quando ele portar essa dívida.

Na semana passada, o Estadão/Broadcast noticiou que o sr. estudava reduzir os juros do Desenrola (hoje limitados a 1,99% ao mês). Como isso evoluiu?

O deputado Elmar Nascimento (União-BA) trouxe para nós essa sugestão. O problema é que o programa está todo preparado para começar com base nisso (1,99% ao mês). Se você coloca um juros ainda menor, segundo a Fazenda… O Ministério quer que o banco tenha um estímulo para cobrar o eventual devedor do Desenrola. Porque senão o banco vai pensar: se a dívida está garantida, para que eu vou me esforçar, fazer um dispêndio para cobrar o devedor, se eu tenho garantia real (bancada pela União)? Esse juro, de certa maneira, é um certo estímulo, porque o banco vê um ganho nessa operação.

O sr. fará algum ajuste no parecer que já apresentou?

Estou esperando para ver se os líderes farão sugestões ou não. Elmar pediu essa e uma outra questão, que é uma espécie de revisão anual por parte do Conselho Monetário dos juros do rotativo. Para reavaliar o limite do rotativo.

O sr. está inclinado a acatar a sugestão?

Estou avaliando ainda, não tenho posição. Mas me parece interessante, por ora.

Entrevista por Mariana Carneiro

Repórter especial de Economia em Brasília. Foi editora da Coluna do Estadão. Graduada em comunicação social pela PUC-Rio, com MBA em mercado financeiro pela B3 e especialização em análise de conjuntura econômica pela UFRJ. Foi correspondente na Argentina (2015) pela Folha de S.Paulo e também trabalhou em O Globo, TV Globo, JB e Jornal do Commercio.

Bianca Lima

Repórter especial do Estadão em Brasília, com experiência em macroeconomia, contas públicas e tributação. Foi repórter da GloboNews e do g1 e bolsista do International Center for Journalists (ICFJ), com sede em Washington. Tem MBA em economia e mercado financeiro pela B3. Vencedora dos prêmios CNH, Abecip, FNP e Estadão.

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