BRASÍLIA E SÃO PAULO – Os bancos brasileiros só poderão conceder crédito para frigoríficos e matadouros que comprovarem que não compram gado de abate proveniente de áreas de desmatamento ilegal da Amazônia e do Maranhão.
A decisão vale para fornecedores diretos e indiretos e faz parte de um protocolo comum de autorregulação para a cadeia de carne bovina, aprovado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) para combater o desmatamento na região.
A norma de sustentabilidade será lançada nesta terça-feira, 30, segundo antecipou ao Estadão o presidente da Febraban, Isaac Sidney. É a primeira vez que há um protocolo detalhado para um setor específico da economia, como frigoríficos e matadouros.
Até agora, 21 bancos assinaram o protocolo, entre eles os maiores do País: Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e Caixa Econômica Federal (veja a lista abaixo).
As instituições financeiras que já aderiram à autorregulação terão de exigir dos seus clientes a implementação de um sistema de rastreabilidade e monitoramento até dezembro de 2025. Ou seja, só terá empréstimos desses 21 bancos quem cumprir a exigência.
A pecuária é hoje a principal atividade rural associada ao desmatamento, e o Brasil, o maior exportador mundial de carne. Esse quadro levou o setor a ser um dos maiores alvos da pressão internacional para forçar que a cadeia de produção de carne não seja sustentada economicamente por fazendeiros que atuam fora da lei.
“Como um setor estratégico, os bancos não poderiam ficar inertes e apenas acompanhar a distância, um tema crucial para esta e as próximas gerações”, diz o presidente da Febraban.
Segundo ele, as instituições financeiras não ficaram de braços cruzados e nem serão omissas. “Nos sentimos, inclusive, com legitimidade para criticar e reivindicar medidas concretas para o Brasil ser protagonista da agenda verde”, afirma Sidney.
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A autorregulação ocorre quando as empresas se unem para definir normas aprovadas e aplicadas por elas mesmas, que funcionam de forma complementar à regulação exigida pelo governo.
“Financiar atividades que possam estar relacionadas ao desmatamento gera risco reputacional, regulatório com o Banco Central, e operacional”, diz o diretor de sustentabilidade da Febraban, Amaury Oliva. “Um dos grandes desafios do País é o desmatamento, a área mais sensível é o bioma da Amazônia. Por isso, o nosso foco”, diz o diretor.
Oliva destaca que o sistema de rastreamento deverá ter informações como embargos, sobreposições com áreas protegidas, identificação de polígonos de desmatamento e autorizações de supressão de vegetação, além do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades de origem dos animais.
A verificação do cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo também foi considerada. Haverá um monitoramento da eficácia da norma com indicadores de desempenho que serão divulgados periodicamente pelos frigoríficos.
Desmatamento
O desmatamento e a degradação dos solos representam aproximadamente 45% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, tornando a mudança no uso do solo a principal fonte de emissões do país.
A maior parte deste desmatamento ocorre de forma ilegal — mais de 95%, segundo dados do Mapbiomas, para o ano de 2021. E a Amazônia é o bioma que apresenta a maior área desmatada (cerca de 60% do total em 2021).
Em 2022, 12,5 mil km² foram desmatados, segundo os dados de monitoramento da alteração da cobertura florestal da Amazônia do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe).
Na COP-26, em Glasgow, o Brasil assinou a declaração de líderes sobre florestas e uso do solo, se comprometendo a eliminar o desmatamento até 2030. Governo e empresas do setor estão sendo cobrados a dar respostas ao problema sob pena de perderem mercado.
A cobrança parte do pressuposto de que não é mais aceitável dissociar o financiamento econômico da responsabilidade efetiva de combate a práticas empresariais que não são sustentáveis.
Os bancos poderão sofrer punição em caso de descumprimento do protocolo. Entre as punições, poderão responder a procedimentos administrativos, que podem incluir a assinatura de um plano de ajuste de conduta, o pagamento de multa e até exclusão de sua participação no Sistema de Autorregulação Bancária.
A Febraban possui o canal “Conte Aqui” para receber denúncias de descumprimento da norma pelo banco.
Carne
Para a pecuarista e ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira, Tereza Vendramini, a adesão dos bancos ao protocolo é positiva porque as grandes potências mundiais estão exigindo esse posicionamento do Brasil.
As regras valem para propriedades acima de 100 hectares. Na sua avaliação, a trava é positiva porque os pequenos produtores terão “fôlego” para se adequarem.
De acordo com dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), o Brasil exporta cerca de 25% da carne bovina produzida no País, negociada com países em todo o mundo.
Veja a lista dos bancos signatários:
- Banco ABC Brasil S.A.
- Banco Bradesco S.A.
- Banco BTG Pactual S.A.
- Banco Citibank S.A.
- Banco Cooperativo Sicredi S.A.
- Banco Daycoval S.A.
- Banco do Brasil S.A.
- Banco do Estado do Pará S.A.
- Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A.
- Banco do Nordeste do Brasil S.A.
- Banco Fibra S. A.
- Banco Mercantil do Brasil S.A.
- Banco Original S.A.
- Banco PAN S.A.
- Banco Safra S.A.
- Banco Santander Brasil S.A.
- Banco Toyota do Brasil S.A.
- Banco Votorantim S.A.
- Caixa Econômica Federal
- China Construction Bank Banco Múltiplo S.A.
- Itaú Unibanco S.A.