BRASÍLIA – Enquanto a incerteza fiscal parece dominar o mercado, que não acredita na possibilidade de o governo zerar o déficit das contas públicas em 2024, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central fez um alerta para a importância de perseguir a meta estabelecida no novo arcabouço fiscal, sob o risco de limitar a queda da Selic.
O recado, que à primeira vista pode parecer um “puxão de orelhas” à equipe econômica, na verdade reforça a mensagem do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que luta para convencer até mesmo o próprio PT da importância de alcançar o equilíbrio das contas públicas já no próximo ano.
A mensagem do BC sobre o compromisso com a meta também atende a um incômodo do mercado financeiro. Por isso, o Copom não poderia deixar de citar o fiscal, como fez no comunicado da decisão de agosto, que inaugurou o ciclo de queda na Selic. Agora, ao reduzir os juros pela segunda vez seguida em 0,50 ponto porcentual, de 13,25% para 12,75% ao ano, o Copom precisou voltar ao tema.
“Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reforça a importância da firme persecução dessas metas”, destacou o comunicado.
Em outras palavras, a busca persistente pela meta de resultado zero em 2024 pode reancorar as expectativas de inflação mais longas, paradas em 3,50% há semanas. Isso - em tese - abriria espaço até mesmo para a aceleração dos cortes na Selic, já que é uma das condições que foram colocadas pelo Copom na ata do encontro passado, além de reduções substanciais no hiato do produto e na inflação de serviços.
Desde a reunião de agosto, os membros do Copom têm explicado que a desconfiança dos agentes em relação ao cumprimento dos compromissos fiscais do governo já estava considerada no cenário base de inflação, uma vez que o modelo incorpora as projeções do mercado no Boletim Focus.
Mas, diante de renovados ruídos sobre uma possível mudança da meta e dos sinais de que as medidas bilionárias de arrecadação extra do Ministério da Fazenda terão dificuldade no Congresso, a preocupação cresceu e se refletiu em preços de ativos.
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No comunicado, o BC também indicou que o receio em relação ao cenário internacional aumentou entre as reuniões do Copom de agosto e setembro. Segundo o texto, o ambiente externo mostrou-se “mais incerto”, introduzindo um advérbio de intensidade à classificação anterior.
A novidade, citada pelo comitê, foi o aumento dos juros longos nos Estados Unidos e a perspectiva mais negativa com o crescimento da China, preocupações que já vinham sendo pontuadas, nos últimos eventos públicos, por diversos diretores do BC, de Roberto Campos Neto a Gabriel Galípolo.
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Outro fator que inspira cautela do Copom é o aumento das projeções oficiais para a inflação. Para 2024, principal horizonte da política monetária, a alta foi de 3,4% para 3,5%, se afastando mais do centro da meta de 3,0%. Já para 2025, com peso minoritário nas decisões, a estimativa, que coincidiu com o alvo central (3,0%) em agosto, subiu agora para 3,1%.
Diante dos novos alertas, o colegiado renovou a promessa unânime de que o ciclo de afrouxamento monetário deve seguir no ritmo de 0,50 ponto porcentual nas próximas reuniões. “Em se confirmando o cenário esperado, os membros do Comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário.”