Banco Central está perdendo a capacidade de domar a inflação? Entenda


BC subiu a taxa básica de juros em 1 ponto porcentual e indicou novas altas, mas cenário segue turbulento; economistas passaram a discutir o cenário de ‘dominância fiscal’, que ocorre quando a política monetária perde força

Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:

Nas últimas semanas, os economistas começaram a debater se o Brasil enfrenta uma situação bastante delicada, em que o Banco Central perde a capacidade de operar na economia por meio da alta de juros.

O processo em que o BC vê a potência da política monetária não trazer o resultado esperado é chamado de “dominância fiscal”. Nessa situação, a economia vive um ciclo perverso. A alta de juros piora o custo da dívida - já bastante elevada -, a percepção de risco dos investidores com a economia aumenta, o que desvaloriza ainda mais o câmbio e, consequentemente, traz impacto para a inflação.

“Quando o BC sobe a taxa de juros, tende a atrair capital, porque o País fica mais atrativo, oferece mais retorno (para o investidor). O dólar cai, e isso ajuda a trazer a inflação para baixo”, afirma Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank. “Mas não estamos vendo isso acontecer. Dado que a dívida é muito elevada, quando aumenta a taxa de juros, o impacto fiscal que isso tem é significativo, não é desprezível.”

continua após a publicidade

No início deste mês, o Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica de juros em 1 ponto porcentual - para 12,25% ao ano - e adotou um tom considerado duro e surpreendente por parte do mercado: assegurou mais duas altas da mesma magnitude.

Mas, ao contrário de outras ocasiões, o que se observou foi um avanço do dólar em relação ao real. A moeda norte-americana bateu R$ 6,20 na terça-feira, 17. A disparada do dólar tem obrigado o BC a intervir no mercado, como uma tentativa de controlar a cotação da divisa.

continua após a publicidade

“Esse tema (da dominância fiscal) entrou em discussão, porque o BC tem sido agressivo, anunciou uma alta de juros forte, fez intervenção no câmbio e, mesmo assim, nada aconteceu”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

O que os investidores olham e se preocupam - e muito - é com a dificuldade de o Brasil conseguir interromper o endividamento crescente. O País tem uma dívida considerada elevada para uma economia emergente. Em 2024, deve encerrar em 78,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e subir a 81,9% do PIB no próximo ano, de acordo com as projeções coletadas pelo sistema de expectativas do Banco Central, que dá base para o relatório Focus, elaborado semanalmente pela instituição. A dívida só deve deve estabilizar em 2030, quando terá ultrapassado o patamar de 90% do PIB.

continua após a publicidade

Hoje, a desvalorização do câmbio já leva a uma piora das projeções de inflação. No relatório Focus, as previsões para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para os próximos anos estão acima da meta de inflação, que é de 3%.

Mas o País está em dominância fiscal? Por ora, a avaliação é de que não, embora haja sinais de perda de potência da política monetária não só no câmbio, mas também na atividade econômica, que continua aquecida neste fim de ano. Juros mais alto encarem o crédito para famílias e empresas, resultando num desaquecimento da economia.

continua após a publicidade

“Não vemos a possibilidade de estar em dominância fiscal como sim ou não. São vários graus. E como a gente entende a dominância fiscal? É o ponto em que a política monetária para de fazer efeito. Já chegamos nesse ponto? Ainda não. Você sobe o juro e a atividade vai desacelerar um pouco. Bem ou mal, também contém o dólar. Mas esse impacto é mais fraco”, afirma Salles, do C6 Bank.

Na leitura de Vale, da MB Associados, um cenário mais definitivo de dominância fiscal pode ser alcançado num próximo governo se não houver nenhuma medida de acerto das contas públicas. “São dois anos em que essa tensão pode aumentar, infelizmente. E um ajuste mais definitivo, para evitar que entre nesse cenário (de dominância fiscal), só em 2027”, afirma Vale.

Banco Central subiu juros, mas câmbio mudou de patamar Foto: Wilton Junior/Estadão
continua após a publicidade

Incerteza crescente

A incerteza do mercado cresceu depois da apresentação do pacote de contenção de gastos pela equipe econômica. A leitura é de que as medidas anunciadas pelo governo, numa tentativa de recuperar a confiança sobre o rumo da política fiscal e garantir a sobrevivência do arcabouço fiscal, ficaram abaixo do esperado. Houve um ruído grande também com a apresentação da proposta de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

Embora o governo tenha anunciado a taxação para quem ganha mais de R$ 50 mil como forma de compensar essa isenção, há preocupação de que a proposta possa gerar uma perda bilionária de arrecadação em um país que precisa ajustar as contas públicas.

continua após a publicidade

O nó se dá porque a equipe econômica só vai conseguir estancar o crescente endividamento brasileiro se colocar o País numa rota de superávits primários. Ou seja, fazer com que as receitas superem as despesas, sem levar em conta o pagamento de juros.

Em abril, no entanto, o governo anunciou uma mudança nas metas para as contas públicas em 2025 e 2026. Os alvos foram reduzidos de um superávit de 0,5% do PIB para 0% em 2025, a mesma meta deste ano, que foi mantida; e de um superávit de 1% do PIB para 0,25% em 2026. As metas de 2027 e 2028 – já no mandato do próximo presidente –, que ainda não haviam sido fixados, ficaram em saldos positivos de 0,50% e 1% do PIB, respectivamente.

“A questão da dominância fiscal é o grande tema”, disse José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central, no IV Seminário de Análise Conjuntural, promovido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), em parceria com o Estadão.

“Se não houver um sinal muito forte de uma mudança de postura, no sentido de mais austeridade na condução das contas públicas, seja da parte do Executivo, da parte do Congresso - de preferência os dois em conjunto -, eu acho que a coisa pode se deteriorar de forma irreversível. Estamos vivendo um momento extremamente importante da história econômica do País”, disse Senna, que é chefe do Centro de Estudos Monetários da FGV/Ibre.

Nas últimas semanas, os economistas começaram a debater se o Brasil enfrenta uma situação bastante delicada, em que o Banco Central perde a capacidade de operar na economia por meio da alta de juros.

O processo em que o BC vê a potência da política monetária não trazer o resultado esperado é chamado de “dominância fiscal”. Nessa situação, a economia vive um ciclo perverso. A alta de juros piora o custo da dívida - já bastante elevada -, a percepção de risco dos investidores com a economia aumenta, o que desvaloriza ainda mais o câmbio e, consequentemente, traz impacto para a inflação.

“Quando o BC sobe a taxa de juros, tende a atrair capital, porque o País fica mais atrativo, oferece mais retorno (para o investidor). O dólar cai, e isso ajuda a trazer a inflação para baixo”, afirma Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank. “Mas não estamos vendo isso acontecer. Dado que a dívida é muito elevada, quando aumenta a taxa de juros, o impacto fiscal que isso tem é significativo, não é desprezível.”

No início deste mês, o Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica de juros em 1 ponto porcentual - para 12,25% ao ano - e adotou um tom considerado duro e surpreendente por parte do mercado: assegurou mais duas altas da mesma magnitude.

Mas, ao contrário de outras ocasiões, o que se observou foi um avanço do dólar em relação ao real. A moeda norte-americana bateu R$ 6,20 na terça-feira, 17. A disparada do dólar tem obrigado o BC a intervir no mercado, como uma tentativa de controlar a cotação da divisa.

“Esse tema (da dominância fiscal) entrou em discussão, porque o BC tem sido agressivo, anunciou uma alta de juros forte, fez intervenção no câmbio e, mesmo assim, nada aconteceu”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

O que os investidores olham e se preocupam - e muito - é com a dificuldade de o Brasil conseguir interromper o endividamento crescente. O País tem uma dívida considerada elevada para uma economia emergente. Em 2024, deve encerrar em 78,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e subir a 81,9% do PIB no próximo ano, de acordo com as projeções coletadas pelo sistema de expectativas do Banco Central, que dá base para o relatório Focus, elaborado semanalmente pela instituição. A dívida só deve deve estabilizar em 2030, quando terá ultrapassado o patamar de 90% do PIB.

Hoje, a desvalorização do câmbio já leva a uma piora das projeções de inflação. No relatório Focus, as previsões para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para os próximos anos estão acima da meta de inflação, que é de 3%.

Mas o País está em dominância fiscal? Por ora, a avaliação é de que não, embora haja sinais de perda de potência da política monetária não só no câmbio, mas também na atividade econômica, que continua aquecida neste fim de ano. Juros mais alto encarem o crédito para famílias e empresas, resultando num desaquecimento da economia.

“Não vemos a possibilidade de estar em dominância fiscal como sim ou não. São vários graus. E como a gente entende a dominância fiscal? É o ponto em que a política monetária para de fazer efeito. Já chegamos nesse ponto? Ainda não. Você sobe o juro e a atividade vai desacelerar um pouco. Bem ou mal, também contém o dólar. Mas esse impacto é mais fraco”, afirma Salles, do C6 Bank.

Na leitura de Vale, da MB Associados, um cenário mais definitivo de dominância fiscal pode ser alcançado num próximo governo se não houver nenhuma medida de acerto das contas públicas. “São dois anos em que essa tensão pode aumentar, infelizmente. E um ajuste mais definitivo, para evitar que entre nesse cenário (de dominância fiscal), só em 2027”, afirma Vale.

Banco Central subiu juros, mas câmbio mudou de patamar Foto: Wilton Junior/Estadão

Incerteza crescente

A incerteza do mercado cresceu depois da apresentação do pacote de contenção de gastos pela equipe econômica. A leitura é de que as medidas anunciadas pelo governo, numa tentativa de recuperar a confiança sobre o rumo da política fiscal e garantir a sobrevivência do arcabouço fiscal, ficaram abaixo do esperado. Houve um ruído grande também com a apresentação da proposta de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

Embora o governo tenha anunciado a taxação para quem ganha mais de R$ 50 mil como forma de compensar essa isenção, há preocupação de que a proposta possa gerar uma perda bilionária de arrecadação em um país que precisa ajustar as contas públicas.

O nó se dá porque a equipe econômica só vai conseguir estancar o crescente endividamento brasileiro se colocar o País numa rota de superávits primários. Ou seja, fazer com que as receitas superem as despesas, sem levar em conta o pagamento de juros.

Em abril, no entanto, o governo anunciou uma mudança nas metas para as contas públicas em 2025 e 2026. Os alvos foram reduzidos de um superávit de 0,5% do PIB para 0% em 2025, a mesma meta deste ano, que foi mantida; e de um superávit de 1% do PIB para 0,25% em 2026. As metas de 2027 e 2028 – já no mandato do próximo presidente –, que ainda não haviam sido fixados, ficaram em saldos positivos de 0,50% e 1% do PIB, respectivamente.

“A questão da dominância fiscal é o grande tema”, disse José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central, no IV Seminário de Análise Conjuntural, promovido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), em parceria com o Estadão.

“Se não houver um sinal muito forte de uma mudança de postura, no sentido de mais austeridade na condução das contas públicas, seja da parte do Executivo, da parte do Congresso - de preferência os dois em conjunto -, eu acho que a coisa pode se deteriorar de forma irreversível. Estamos vivendo um momento extremamente importante da história econômica do País”, disse Senna, que é chefe do Centro de Estudos Monetários da FGV/Ibre.

Nas últimas semanas, os economistas começaram a debater se o Brasil enfrenta uma situação bastante delicada, em que o Banco Central perde a capacidade de operar na economia por meio da alta de juros.

O processo em que o BC vê a potência da política monetária não trazer o resultado esperado é chamado de “dominância fiscal”. Nessa situação, a economia vive um ciclo perverso. A alta de juros piora o custo da dívida - já bastante elevada -, a percepção de risco dos investidores com a economia aumenta, o que desvaloriza ainda mais o câmbio e, consequentemente, traz impacto para a inflação.

“Quando o BC sobe a taxa de juros, tende a atrair capital, porque o País fica mais atrativo, oferece mais retorno (para o investidor). O dólar cai, e isso ajuda a trazer a inflação para baixo”, afirma Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank. “Mas não estamos vendo isso acontecer. Dado que a dívida é muito elevada, quando aumenta a taxa de juros, o impacto fiscal que isso tem é significativo, não é desprezível.”

No início deste mês, o Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica de juros em 1 ponto porcentual - para 12,25% ao ano - e adotou um tom considerado duro e surpreendente por parte do mercado: assegurou mais duas altas da mesma magnitude.

Mas, ao contrário de outras ocasiões, o que se observou foi um avanço do dólar em relação ao real. A moeda norte-americana bateu R$ 6,20 na terça-feira, 17. A disparada do dólar tem obrigado o BC a intervir no mercado, como uma tentativa de controlar a cotação da divisa.

“Esse tema (da dominância fiscal) entrou em discussão, porque o BC tem sido agressivo, anunciou uma alta de juros forte, fez intervenção no câmbio e, mesmo assim, nada aconteceu”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

O que os investidores olham e se preocupam - e muito - é com a dificuldade de o Brasil conseguir interromper o endividamento crescente. O País tem uma dívida considerada elevada para uma economia emergente. Em 2024, deve encerrar em 78,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e subir a 81,9% do PIB no próximo ano, de acordo com as projeções coletadas pelo sistema de expectativas do Banco Central, que dá base para o relatório Focus, elaborado semanalmente pela instituição. A dívida só deve deve estabilizar em 2030, quando terá ultrapassado o patamar de 90% do PIB.

Hoje, a desvalorização do câmbio já leva a uma piora das projeções de inflação. No relatório Focus, as previsões para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para os próximos anos estão acima da meta de inflação, que é de 3%.

Mas o País está em dominância fiscal? Por ora, a avaliação é de que não, embora haja sinais de perda de potência da política monetária não só no câmbio, mas também na atividade econômica, que continua aquecida neste fim de ano. Juros mais alto encarem o crédito para famílias e empresas, resultando num desaquecimento da economia.

“Não vemos a possibilidade de estar em dominância fiscal como sim ou não. São vários graus. E como a gente entende a dominância fiscal? É o ponto em que a política monetária para de fazer efeito. Já chegamos nesse ponto? Ainda não. Você sobe o juro e a atividade vai desacelerar um pouco. Bem ou mal, também contém o dólar. Mas esse impacto é mais fraco”, afirma Salles, do C6 Bank.

Na leitura de Vale, da MB Associados, um cenário mais definitivo de dominância fiscal pode ser alcançado num próximo governo se não houver nenhuma medida de acerto das contas públicas. “São dois anos em que essa tensão pode aumentar, infelizmente. E um ajuste mais definitivo, para evitar que entre nesse cenário (de dominância fiscal), só em 2027”, afirma Vale.

Banco Central subiu juros, mas câmbio mudou de patamar Foto: Wilton Junior/Estadão

Incerteza crescente

A incerteza do mercado cresceu depois da apresentação do pacote de contenção de gastos pela equipe econômica. A leitura é de que as medidas anunciadas pelo governo, numa tentativa de recuperar a confiança sobre o rumo da política fiscal e garantir a sobrevivência do arcabouço fiscal, ficaram abaixo do esperado. Houve um ruído grande também com a apresentação da proposta de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

Embora o governo tenha anunciado a taxação para quem ganha mais de R$ 50 mil como forma de compensar essa isenção, há preocupação de que a proposta possa gerar uma perda bilionária de arrecadação em um país que precisa ajustar as contas públicas.

O nó se dá porque a equipe econômica só vai conseguir estancar o crescente endividamento brasileiro se colocar o País numa rota de superávits primários. Ou seja, fazer com que as receitas superem as despesas, sem levar em conta o pagamento de juros.

Em abril, no entanto, o governo anunciou uma mudança nas metas para as contas públicas em 2025 e 2026. Os alvos foram reduzidos de um superávit de 0,5% do PIB para 0% em 2025, a mesma meta deste ano, que foi mantida; e de um superávit de 1% do PIB para 0,25% em 2026. As metas de 2027 e 2028 – já no mandato do próximo presidente –, que ainda não haviam sido fixados, ficaram em saldos positivos de 0,50% e 1% do PIB, respectivamente.

“A questão da dominância fiscal é o grande tema”, disse José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central, no IV Seminário de Análise Conjuntural, promovido pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), em parceria com o Estadão.

“Se não houver um sinal muito forte de uma mudança de postura, no sentido de mais austeridade na condução das contas públicas, seja da parte do Executivo, da parte do Congresso - de preferência os dois em conjunto -, eu acho que a coisa pode se deteriorar de forma irreversível. Estamos vivendo um momento extremamente importante da história econômica do País”, disse Senna, que é chefe do Centro de Estudos Monetários da FGV/Ibre.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.