BRASÍLIA - Mesmo acelerando o ritmo de alta da Selic na semana passada, o Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central avisou nesta quarta-feira, 3, que inclusive cogitou elevar a taxa básica de juros em mais de 1,50 ponto porcentual na última quarta-feira, 27. A ata do encontro reforça a promessa da diretoria da instituição de fazer o que for preciso para levar a inflação para o centro da meta em 2022, ainda que a maior parte do mercado tenha desancorado de vez as expectativas para o próximo ano, em que o centro da meta é de 3,50%.
Após o próprio governo ter bancado a negociação com o Congresso para alterar a fórmula de apuração do teto de gastos (a regra que atrela o crescimento das despesas à inflação), o mercado passou imediatamente a esperar uma ação mais forte do Copom, que até então vinha seguindo o plano de voo de elevações de 1 ponto porcentual na taxa de juros. Na véspera da reunião, os analistas seguiam divididos e o consenso do mercado migrou de 1,25 para 1,5 ponto apenas na terça-feira, 26. Alguns economistas chegaram a apostar em movimentos mais fortes, de 1,75, 2 e até 3 pontos porcentuais de uma só vez.
No documento desta quarta, porém, o Copom revelou que o novo plano de voo da instituição é seguir com aumentos de 1,5 ponto nas próximas reuniões. No comunicado da semana passada, o colegiado já tinha adiantado a intenção de um novo ajuste de magnitude da reunião de dezembro - de 7,75% para 9,25% ao ano -, mas a ata estendeu esse entendimento para as primeiras reuniões do próximo ano.
Com isso, o Copom praticamente confirmou que a Selic deve sim chegar a dois dígitos, um patamar “significativamente mais contracionista” do que o usado no cenário básico que considera as projeções do relatório Focus - em que o juro iria a 9,75% no fim do ciclo.
O aumento do juro básico da economia reflete em taxas bancárias mais elevadas, embora haja uma defasagem entre a decisão do BC e o encarecimento do crédito (entre seis e nove meses). A elevação da taxa de juros também influencia negativamente o consumo da população e os investimentos produtivos.
Na ata, o BC foi mais enfático do que no comunicado ao responsabilizar o fiscal pela guinada mais veloz no aperto monetário. O Copom inclusive reiterou que o desempenho das contas públicas tem sido melhor que o esperado justamente pelo cumprimento à risca do teto de gastos em 2021. Por isso, a ata enfatiza que a probabilidade quase consumada de mudanças no arcabouço fiscal é a principal causa da desancoragem das expectativas do mercado que forçou o colegiado a mirar juros cada vez maiores.
Mas ainda fica a dúvida por parte do mercado financeiro de qual vai ser a reação do BC a depender do desenho final do arcabouço fiscal em caso de aprovação da PEC dos precatórios, que pode ser votada na Câmara nesta quarta. Se somente a discussão já forçou uma aceleração do ritmo a 1,50 ponto porcentual, não está descartada velocidade ainda maior em caso de mudança no teto de gastos conforme descrita na PEC ou de ruptura mais significativa na âncora fiscal.
Em cenário de deterioração ininterrupta das projeções de inflação, o BC ainda deve ficar mais atento à evolução dos preços de commodities em real, já que considerou que agora os choques vão ter efeito direto em 2022.
Ao mesmo tempo em que promete uma política monetária mais contracionista, o Copom destaca preocupação com os dados mais recentes da atividade econômica e já admite uma recuperação menos intensa no segundo semestre deste ano. Ainda assim, o colegiado aposta nos serviços, na agropecuária e na indústria extrativa para evitar uma nova recessão em 2022, mesmo em um cenário sem limites para a Selic.