São Paulo - O comunicado mais duro do que o esperado do Comitê de Política Monetária (Copom) em junho não retirou da mesa a possibilidade de redução da taxa Selic em agosto, segundo economistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast. A percepção dos analistas é de que a resposta das expectativas de inflação após a decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) sobre as metas de inflação, na reunião que será realizada no dia 29, devem determinar quando será iniciado o ciclo de cortes.
Essa senha foi apresentada pelo próprio Banco Central, que manteve a taxa Selic em 13,75% ao ano na decisão desta quarta-feira, 21, e evitou sinalizar explicitamente uma redução dos juros já na próxima reunião, em 2 de agosto. A autoridade monetária preferiu indicar que os seus próximos passos dependerão da evolução das expectativas de inflação, da inflação corrente e da atividade econômica.
“Os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”, afirmaram os membros do Copom no penúltimo parágrafo do comunicado.
Para analistas, a decisão do CMN sobre as metas será o principal determinante do comportamento das expectativas. O Conselho (que reúne os ministros da Fazenda e do Planejamento, mais o presidente do Banco Central) define, todo ano, as metas de inflação para três anos. Atualmente, as metas são de 3,25% este ano e 3% para 2024 e 2025, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto, para mais ou para menos.
No início do ano, por conta dos juros altos, muitos membros do governo discutiram a possibilidade de mudar a meta, para um patamar mais alto, para facilitar a queda da Selic. Mas especialistas sempre defenderam que essa saída poderia ter um efeito contrário: metas de inflação mais altas poderiam trazer a percepção de um BC mais ‘frouxo’, piorando as expectativas em relação aos preços futuros e até dificultando a queda das taxas de juros.
Essa discussão sobre a mudança das metas acabou perdendo força, e a mudança que pode acontecer na reunião do CMN da próxima semana é a mudança de como a meta é perseguida. Hoje, o BC precisa cumprir a meta dentro do ano-calendário - ou seja, precisa chegar a dezembro com a inflação dentro da meta, mesmo que durante todo o ano tenha ficado fora dos parâmetros. A ideia em discussão é adotar uma meta continua, válida durante todo o tempo. Ou seja, o BC precisaria se preocupar com o alvo da meta no acumulado em 12 meses, o tempo todo.
Expectativas de longo prazo
O mercado já considerava que a manutenção do centro da meta em 3% teria o potencial de derrubar as medianas dentro do Boletim Focus para o IPCA de longo prazo a até 3,5% - e mesmo as recentes quedas de 0,2 ponto porcentual nessas expectativas foram vistas como uma antecipação desse movimento à véspera do Copom.
“Parece que o Focus ainda tem uma probabilidade minoritária de que a meta seja elevada, de forma que, se ficar em 3%, vejo espaço para uma melhora das projeções, de talvez algo como 0,2 a 0,3 ponto porcentual”, afirma o economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso. “Com as expectativas no Focus reduzindo de 0,2 a 0,3 ponto, o modelo do BC dá uma boa melhora, e todo o resto deveria levá-lo a ter uma inflação menor.”
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Nas contas do analista, uma redução desta magnitude nas expectativas para o IPCA de 2025 e 2026 - de 3,8% para entre 3,6% e 3,5% em ambos os casos - poderia levar a projeção do Copom para o IPCA de 2024 de 3,3% a 3,2%. Este é o intervalo, segundo o economista, no qual o comitê poderia passar a ver a inflação “ao redor” do centro da meta de 3%, o que pode abrir espaço para o corte de juros.
A avaliação parte do próprio comunicado, no qual o Copom reiterou que a decisão de manter a Selic em 13,75% é “compatível com a estratégia de convergência da inflação para ao redor da meta ao longo do horizonte relevante”. “Digamos que o intervalo ‘ao redor’ da meta é 3%, com 0,2 ponto porcentual para cima ou para baixo”, afirma Caruso, que manteve a projeção de início do ciclo de cortes em agosto, embora reconhecendo redução da probabilidade.
Na mesma linha, o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira, afirma que a eventual manutenção das metas de inflação em 3% contribuiria com a queda das expectativas de inflação do mercado a um nível de até 3,3%. Este nível é percebido pelo analista como suficiente para que o BC veja as projeções do mercado “em torno” das metas - um dos pontos observados com atenção pelo Copom.
A combinação desse vetor, dos esperados dados de inflação mais baixa e de atividade mais fracos e de uma prevista valorização do real nos 45 dias que separam o comitê da sua próxima decisão deve atender aos pontos apontados pelo BC como necessários para determinar os próximos passos da política monetária e, com isso, permitir um corte da taxa Selic em agosto, afirma Oliveira.
“O tom mais hawkish do Copom também atua na curva de juros e ajuda a convencer os agentes de que o BC está de fato perseguindo o centro da meta”, acrescenta o economista. “A gente vislumbra um cenário em que as expectativas continuam desacelerando, a inflação corrente vai desacelerando e isso aumenta o juro real”, diz Oliveira, que também reconhece uma barra mais alta para redução da Selic em agosto.
Em relatório publicado nesta quarta-feira, 21, o economista para Brasil do Barclays, Roberto Secemski, reiterou a expectativa de início do ciclo de cortes da taxa Selic apenas em setembro, mas reconheceu que há chance de uma redução de 0,25 ponto porcentual dos juros já em agosto. A velocidade da resposta das expectativas à decisão do CMN determinará esse timing, segundo o analista.
“Na nossa visão, uma eventual confirmação do centro da meta de inflação em 3% - mesmo que acompanhada de uma mudança do sistema de anos-calendário para um horizonte móvel e um menos desejável, mas possível, aumento da banda de tolerância de 1,5 para 2 pontos porcentuais - pode levar a uma melhora relevante das expectativas de inflação de 2024 a 2027 nas semanas seguintes”, afirma Secemski.