Diretor do Centro de Cidadania Fiscal, Bernard Appy escreve quinzenalmente

Governo pode eliminar as distorções no ambiente de negócios ou optar pelo populismo


Medidas como a redução do Imposto de Renda das pessoas físicas têm forte apelo político, mas podem ter impacto negativo sobre o crescimento de longo prazo

Por Bernard Appy
Atualização:

A crise da covid vai deixar muitas consequências. A pior, e mais triste, são os mais de 500 mil mortos – número que poderia ser bem menor se o governo federal tivesse orientado sua atuação pela ciência, sido mais ágil na aquisição de vacinas e se não tivesse estimulado as aglomerações e desestimulado o uso de máscaras. Infelizmente, o número de mortos deve crescer ainda mais, até que a vacinação alcance uma parcela relevante da população, reduzindo o ritmo de contágio.

Mas a crise gerou outros problemas extremamente sérios. Por um lado, a recuperação econômica vem se dando de forma desequilibrada, caracterizada pela manutenção de um nível de desemprego muito elevado, especialmente para os trabalhadores menos qualificados. Por outro lado, os preços subiram muito – por razões externas, mas também domésticas –, reduzindo o poder de compra sobretudo das famílias de menor renda. Como agravante, a crise da covid sobreveio em um momento em que o Brasil não havia sequer se recuperado dos efeitos da recessão de 2015-16.

Momento é de decisão entre medidas de apelo popular ou de medidas voltadas à melhora estrutural da economia. Foto: Adriano Machado/Reuters - 18/5/2021
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Se os efeitos da crise são claros, há menos clareza sobre o que deve ser feito para que o Brasil volte a crescer. Há dois caminhos possíveis: uma saída é focar apenas em medidas politicamente fáceis, como a ampliação de programas de transferência de renda e a redução de tributos, que podem estimular a demanda no curto prazo; outra saída, mais trabalhosa, é contemplar também medidas que eliminem distorções prejudiciais ao ambiente de negócios e à produtividade e melhorem estruturalmente a distribuição de renda.

No momento atual, o governo conta com alguns graus de liberdade para o avanço dessa agenda. De um lado, a forma de fixação do teto de gastos resultará em alguma margem para a expansão de despesas discricionárias no Orçamento de 2022. De outro, o governo conseguiu constituir uma razoável base de apoio no Congresso Nacional (ainda que a um custo elevado), o que deveria facilitar a aprovação de projetos mais complexos, ao menos até meados do segundo semestre deste ano.

A dicotomia entre soluções mais simples – de caráter populista – ou soluções estruturais, mais complexas, se coloca para todas as áreas de atuação do poder público, inclusive a área tributária. Medidas como a redução do Imposto de Renda das pessoas físicas têm forte apelo político, mas, dependendo de como forem financiadas, podem ter um impacto negativo sobre o crescimento de longo prazo. Isso ocorreria, por exemplo, se a base do financiamento fossem mudanças mal desenhadas na tributação do lucro.

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É verdade que há falhas no modelo brasileiro de tributação da renda empresarial – inclusive por conta da não tributação na distribuição de lucros. Mas também é verdade que há diversas formas de resolver o problema: algumas que corrigem distorções distributivas sem prejudicar a eficiência econômica e outras que prejudicam o ambiente de negócios e o crescimento de longo prazo, sem necessariamente corrigir as distorções distributivas atuais. A discussão sobre os prós e contras das diversas alternativas deveria preceder a mudança na legislação – especialmente se a matéria for levada a votação sem ter sido devidamente analisada, risco apontado em matéria de Adriana Fernandes, publicada neste jornal em 12 de junho.

Há muitas outras situações em que medidas tributárias mal concebidas têm impactos negativos de longo prazo – ainda que vinculadas a outras mudanças que, tomadas isoladamente, seriam justificáveis. Esse é o caso, por exemplo, da concessão de tratamentos diferenciados na reforma da tributação do consumo, para “não prejudicar nenhum setor”. É o caso, também, de compensar a redução de alguns tributos com a recriação da CPMF.

O momento é de decisão entre medidas de apelo popular, que até podem ajudar na saída da crise, mas têm efeitos negativos no longo prazo, ou medidas voltadas à melhora estrutural da economia, que têm impactos positivos no curto e, também, no longo prazo.

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*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

A crise da covid vai deixar muitas consequências. A pior, e mais triste, são os mais de 500 mil mortos – número que poderia ser bem menor se o governo federal tivesse orientado sua atuação pela ciência, sido mais ágil na aquisição de vacinas e se não tivesse estimulado as aglomerações e desestimulado o uso de máscaras. Infelizmente, o número de mortos deve crescer ainda mais, até que a vacinação alcance uma parcela relevante da população, reduzindo o ritmo de contágio.

Mas a crise gerou outros problemas extremamente sérios. Por um lado, a recuperação econômica vem se dando de forma desequilibrada, caracterizada pela manutenção de um nível de desemprego muito elevado, especialmente para os trabalhadores menos qualificados. Por outro lado, os preços subiram muito – por razões externas, mas também domésticas –, reduzindo o poder de compra sobretudo das famílias de menor renda. Como agravante, a crise da covid sobreveio em um momento em que o Brasil não havia sequer se recuperado dos efeitos da recessão de 2015-16.

Momento é de decisão entre medidas de apelo popular ou de medidas voltadas à melhora estrutural da economia. Foto: Adriano Machado/Reuters - 18/5/2021

Se os efeitos da crise são claros, há menos clareza sobre o que deve ser feito para que o Brasil volte a crescer. Há dois caminhos possíveis: uma saída é focar apenas em medidas politicamente fáceis, como a ampliação de programas de transferência de renda e a redução de tributos, que podem estimular a demanda no curto prazo; outra saída, mais trabalhosa, é contemplar também medidas que eliminem distorções prejudiciais ao ambiente de negócios e à produtividade e melhorem estruturalmente a distribuição de renda.

No momento atual, o governo conta com alguns graus de liberdade para o avanço dessa agenda. De um lado, a forma de fixação do teto de gastos resultará em alguma margem para a expansão de despesas discricionárias no Orçamento de 2022. De outro, o governo conseguiu constituir uma razoável base de apoio no Congresso Nacional (ainda que a um custo elevado), o que deveria facilitar a aprovação de projetos mais complexos, ao menos até meados do segundo semestre deste ano.

A dicotomia entre soluções mais simples – de caráter populista – ou soluções estruturais, mais complexas, se coloca para todas as áreas de atuação do poder público, inclusive a área tributária. Medidas como a redução do Imposto de Renda das pessoas físicas têm forte apelo político, mas, dependendo de como forem financiadas, podem ter um impacto negativo sobre o crescimento de longo prazo. Isso ocorreria, por exemplo, se a base do financiamento fossem mudanças mal desenhadas na tributação do lucro.

É verdade que há falhas no modelo brasileiro de tributação da renda empresarial – inclusive por conta da não tributação na distribuição de lucros. Mas também é verdade que há diversas formas de resolver o problema: algumas que corrigem distorções distributivas sem prejudicar a eficiência econômica e outras que prejudicam o ambiente de negócios e o crescimento de longo prazo, sem necessariamente corrigir as distorções distributivas atuais. A discussão sobre os prós e contras das diversas alternativas deveria preceder a mudança na legislação – especialmente se a matéria for levada a votação sem ter sido devidamente analisada, risco apontado em matéria de Adriana Fernandes, publicada neste jornal em 12 de junho.

Há muitas outras situações em que medidas tributárias mal concebidas têm impactos negativos de longo prazo – ainda que vinculadas a outras mudanças que, tomadas isoladamente, seriam justificáveis. Esse é o caso, por exemplo, da concessão de tratamentos diferenciados na reforma da tributação do consumo, para “não prejudicar nenhum setor”. É o caso, também, de compensar a redução de alguns tributos com a recriação da CPMF.

O momento é de decisão entre medidas de apelo popular, que até podem ajudar na saída da crise, mas têm efeitos negativos no longo prazo, ou medidas voltadas à melhora estrutural da economia, que têm impactos positivos no curto e, também, no longo prazo.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

A crise da covid vai deixar muitas consequências. A pior, e mais triste, são os mais de 500 mil mortos – número que poderia ser bem menor se o governo federal tivesse orientado sua atuação pela ciência, sido mais ágil na aquisição de vacinas e se não tivesse estimulado as aglomerações e desestimulado o uso de máscaras. Infelizmente, o número de mortos deve crescer ainda mais, até que a vacinação alcance uma parcela relevante da população, reduzindo o ritmo de contágio.

Mas a crise gerou outros problemas extremamente sérios. Por um lado, a recuperação econômica vem se dando de forma desequilibrada, caracterizada pela manutenção de um nível de desemprego muito elevado, especialmente para os trabalhadores menos qualificados. Por outro lado, os preços subiram muito – por razões externas, mas também domésticas –, reduzindo o poder de compra sobretudo das famílias de menor renda. Como agravante, a crise da covid sobreveio em um momento em que o Brasil não havia sequer se recuperado dos efeitos da recessão de 2015-16.

Momento é de decisão entre medidas de apelo popular ou de medidas voltadas à melhora estrutural da economia. Foto: Adriano Machado/Reuters - 18/5/2021

Se os efeitos da crise são claros, há menos clareza sobre o que deve ser feito para que o Brasil volte a crescer. Há dois caminhos possíveis: uma saída é focar apenas em medidas politicamente fáceis, como a ampliação de programas de transferência de renda e a redução de tributos, que podem estimular a demanda no curto prazo; outra saída, mais trabalhosa, é contemplar também medidas que eliminem distorções prejudiciais ao ambiente de negócios e à produtividade e melhorem estruturalmente a distribuição de renda.

No momento atual, o governo conta com alguns graus de liberdade para o avanço dessa agenda. De um lado, a forma de fixação do teto de gastos resultará em alguma margem para a expansão de despesas discricionárias no Orçamento de 2022. De outro, o governo conseguiu constituir uma razoável base de apoio no Congresso Nacional (ainda que a um custo elevado), o que deveria facilitar a aprovação de projetos mais complexos, ao menos até meados do segundo semestre deste ano.

A dicotomia entre soluções mais simples – de caráter populista – ou soluções estruturais, mais complexas, se coloca para todas as áreas de atuação do poder público, inclusive a área tributária. Medidas como a redução do Imposto de Renda das pessoas físicas têm forte apelo político, mas, dependendo de como forem financiadas, podem ter um impacto negativo sobre o crescimento de longo prazo. Isso ocorreria, por exemplo, se a base do financiamento fossem mudanças mal desenhadas na tributação do lucro.

É verdade que há falhas no modelo brasileiro de tributação da renda empresarial – inclusive por conta da não tributação na distribuição de lucros. Mas também é verdade que há diversas formas de resolver o problema: algumas que corrigem distorções distributivas sem prejudicar a eficiência econômica e outras que prejudicam o ambiente de negócios e o crescimento de longo prazo, sem necessariamente corrigir as distorções distributivas atuais. A discussão sobre os prós e contras das diversas alternativas deveria preceder a mudança na legislação – especialmente se a matéria for levada a votação sem ter sido devidamente analisada, risco apontado em matéria de Adriana Fernandes, publicada neste jornal em 12 de junho.

Há muitas outras situações em que medidas tributárias mal concebidas têm impactos negativos de longo prazo – ainda que vinculadas a outras mudanças que, tomadas isoladamente, seriam justificáveis. Esse é o caso, por exemplo, da concessão de tratamentos diferenciados na reforma da tributação do consumo, para “não prejudicar nenhum setor”. É o caso, também, de compensar a redução de alguns tributos com a recriação da CPMF.

O momento é de decisão entre medidas de apelo popular, que até podem ajudar na saída da crise, mas têm efeitos negativos no longo prazo, ou medidas voltadas à melhora estrutural da economia, que têm impactos positivos no curto e, também, no longo prazo.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

A crise da covid vai deixar muitas consequências. A pior, e mais triste, são os mais de 500 mil mortos – número que poderia ser bem menor se o governo federal tivesse orientado sua atuação pela ciência, sido mais ágil na aquisição de vacinas e se não tivesse estimulado as aglomerações e desestimulado o uso de máscaras. Infelizmente, o número de mortos deve crescer ainda mais, até que a vacinação alcance uma parcela relevante da população, reduzindo o ritmo de contágio.

Mas a crise gerou outros problemas extremamente sérios. Por um lado, a recuperação econômica vem se dando de forma desequilibrada, caracterizada pela manutenção de um nível de desemprego muito elevado, especialmente para os trabalhadores menos qualificados. Por outro lado, os preços subiram muito – por razões externas, mas também domésticas –, reduzindo o poder de compra sobretudo das famílias de menor renda. Como agravante, a crise da covid sobreveio em um momento em que o Brasil não havia sequer se recuperado dos efeitos da recessão de 2015-16.

Momento é de decisão entre medidas de apelo popular ou de medidas voltadas à melhora estrutural da economia. Foto: Adriano Machado/Reuters - 18/5/2021

Se os efeitos da crise são claros, há menos clareza sobre o que deve ser feito para que o Brasil volte a crescer. Há dois caminhos possíveis: uma saída é focar apenas em medidas politicamente fáceis, como a ampliação de programas de transferência de renda e a redução de tributos, que podem estimular a demanda no curto prazo; outra saída, mais trabalhosa, é contemplar também medidas que eliminem distorções prejudiciais ao ambiente de negócios e à produtividade e melhorem estruturalmente a distribuição de renda.

No momento atual, o governo conta com alguns graus de liberdade para o avanço dessa agenda. De um lado, a forma de fixação do teto de gastos resultará em alguma margem para a expansão de despesas discricionárias no Orçamento de 2022. De outro, o governo conseguiu constituir uma razoável base de apoio no Congresso Nacional (ainda que a um custo elevado), o que deveria facilitar a aprovação de projetos mais complexos, ao menos até meados do segundo semestre deste ano.

A dicotomia entre soluções mais simples – de caráter populista – ou soluções estruturais, mais complexas, se coloca para todas as áreas de atuação do poder público, inclusive a área tributária. Medidas como a redução do Imposto de Renda das pessoas físicas têm forte apelo político, mas, dependendo de como forem financiadas, podem ter um impacto negativo sobre o crescimento de longo prazo. Isso ocorreria, por exemplo, se a base do financiamento fossem mudanças mal desenhadas na tributação do lucro.

É verdade que há falhas no modelo brasileiro de tributação da renda empresarial – inclusive por conta da não tributação na distribuição de lucros. Mas também é verdade que há diversas formas de resolver o problema: algumas que corrigem distorções distributivas sem prejudicar a eficiência econômica e outras que prejudicam o ambiente de negócios e o crescimento de longo prazo, sem necessariamente corrigir as distorções distributivas atuais. A discussão sobre os prós e contras das diversas alternativas deveria preceder a mudança na legislação – especialmente se a matéria for levada a votação sem ter sido devidamente analisada, risco apontado em matéria de Adriana Fernandes, publicada neste jornal em 12 de junho.

Há muitas outras situações em que medidas tributárias mal concebidas têm impactos negativos de longo prazo – ainda que vinculadas a outras mudanças que, tomadas isoladamente, seriam justificáveis. Esse é o caso, por exemplo, da concessão de tratamentos diferenciados na reforma da tributação do consumo, para “não prejudicar nenhum setor”. É o caso, também, de compensar a redução de alguns tributos com a recriação da CPMF.

O momento é de decisão entre medidas de apelo popular, que até podem ajudar na saída da crise, mas têm efeitos negativos no longo prazo, ou medidas voltadas à melhora estrutural da economia, que têm impactos positivos no curto e, também, no longo prazo.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

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