Nova York - A despeito de prever um cenário, no qual os mercados emergentes correm mais risco de piora - ainda que leve - no ritmo de crescimento na próxima década em um ambiente global mais desafiador, a BlackRock, maior gestora do mundo, com US$ 9 trilhões em ativos, está otimista com o Brasil. A visão é de que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu os desafios do País e está trabalhando para colocá-lo nos trilhos, isso significa, endereçar os problemas fiscais e regulatórios como o complexo sistema tributário.
“Não há razão para que o Brasil não possa voltar e crescer de forma muito agressiva novamente. Mas a realidade é que o cenário hoje é mais desafiador. E como resultado disso, mais esforço é necessário”, avaliou o líder de renda fixa para mercados emergentes da BlackRock, Amer Bisat, ao comentar estudo da gestora sobre mercados emergentes, publicado nesta quarta-feira, 31.
Para Bisat, não só no Brasil, mas nos governos da região, a adoção de medidas para turbinar a economia no curto prazo soa como uma “resposta fácil”, mas pode ser um “vento contrário” para o crescimento no longo prazo. Nos últimos anos, a região foi palco do aumento do populismo e da polarização em meio a anos recorrentes de baixa atividade e aspirações frustradas, em especial, da classe média, de acordo com a publicação da BlackRock.
No Brasil, a polarização política vista nos últimos anos ultrapassou níveis de países como Estados Unidos e México, mostra o documento. “É fácil ver o populismo como uma resposta fácil. Emprestar mais, gastar mais. E esse é um desafio que os governos em mercados emergentes necessitam enfrentar e lidar porque não há resposta fácil. Pode ser fácil, mas não é sustentável”, alertou.
O desafio dos mercados emergentes é justamente fazer o contrário, priorizando medidas qualitativas e que ambicionem um crescimento sustentável no longo prazo, segundo Bisat. É justamente para onde a BlackRock olha quando toma as suas decisões de investimento. “Eu não invisto olhando para o curto prazo, mas para o longo prazo. Então, vou procurar ações de empresas e títulos soberanos que estejam pensando no longo prazo”, explicou.
Neste contexto, a BlackRock vê os mercados emergentes com mais riscos de piora - ainda que leve - do que de melhora no ritmo de crescimento nos próximos dez anos. O seu cenário prevê que a expansão de capital continue estacionada em 2,2% em 2030, mesmo nível de 2019. Para a produtividade desse conjunto de países, a projeção é de alta de 1,4%. Em termos de potencial de crescimento de empregos, porém, prevê uma desaceleração. Por sua vez, a maior gestora de recursos do mundo não vislumbra uma aceleração de reformas estruturais que leve à uma maior eficiência nos mercados emergentes.
Potencial e problemas
Mas, nem todos os países da região estão predestinados a entregar um baixo crescimento à frente. O Brasil é um deles, com “enorme potencial”, mas com dois problemas centrais, na visão de Bisat. O primeiro é o fiscal e sua elevada dívida, pautando a agenda do País. Em segundo lugar, o marco regulatório que afugenta o setor privado, em especial, o criticado arcabouço tributário brasileiro.
Apesar de se dizer “empolgado” e repetir que está “otimista” com o Brasil, Bisat também adiciona a palavra “realista” em sua análise. O mundo mudou. Há mais desafios hoje para os mercados emergentes do que no passado. Portanto, é difícil prever forte ingresso de capital na região, considerando pressões contínuas de desglobalização, níveis crescentes de endividamento e taxas de juros mais altas ao redor do mundo.
A ótica de investimento para mercados emergentes é foco do estudo capitaneado por ele ao lado da especialista Karen Leiton, no qual defendem a necessidade de uma nova mentalidade de investimento para a região. É o que chamam de “Mercados Emergentes 2.0″. A teoria tem como pilares a diferenciação, diversificação, retorno, qualidade, gestão de risco disciplinada e uma pesquisa rigorosa.
Leia Também:
Por que a BlackRock está aumentando a participação em empresas brasileiras?
As ondas de recuperação judicial de empresas vão ficar mais frequentes, diz especialista
Proposta de moeda comum para América do Sul parte de diagnóstico errado, diz economista
Por que o mundo está nas mãos da China quando se fala de baterias para carros elétricos
Nas últimas quatro décadas, os mercados emergentes foram uma história de altos e baixos, segundo a BlackRock. De “terra prometida”, os ativos da região perderam força após a crise financeira internacional e a covid. No cenário atual, continuam atraentes, mas as regras do jogo mudaram - e radicalmente, alerta a Blackrock. O Brasil é o exemplo perfeito, diz Bisat. Há muitas oportunidades de investimentos 2.0 no País, segundo ele.
“Está na hora de começarmos a pensar em comprar títulos de dívida de empresas no Brasil. Há muitos nomes interessantes, rentáveis, eficientes e com baixo nível de dívida”, disse o diretor da Blackrock, sem mencionar nomes. “Estamos olhando para oportunidades no Brasil”, afirmou, acrescentando que tem visto oportunidades também na Turquia.
Para Bisat, a inflação no Brasil parece ter atingido o pico, depois do grande problema que foi nos últimos três anos, e as taxas de juros continuam muito altas - ainda que avalie que o Banco Central (BC) brasileiro tenha feito a coisa certa. Quanto ao início dos cortes, o especialista reforça o coro para que a autoridade monetária aja com “muito cuidado” e com os olhos voltados ao comportamento do custo de vida dos brasileiros.
“A América Latina é a região mais avançada, com os juros mais altos, no Brasil, na Colômbia, no México, no Chile. Todos têm níveis de juros muito altos. Então, eu diria que a América Latina provavelmente será a primeira região a fazer cortes nas taxas de juros”, projetou o diretor da BlackRock. Por outro lado, as elevadas taxas de juros do Brasil parecem uma fonte “muito atraente” de recursos, desde que o governo faça as coisas certas.