BRASÍLIA – Depois de prever R$ 250 bilhões ao novo plano industrial do governo, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) prepara dois anúncios direcionados às micro, pequenas e médias empresas. Um deles é a nova versão do cartão BNDES, que passará a contar com garantias do Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), abastecido com recursos públicos. E o segundo é uma linha em parceria com o Sebrae, que terá o potencial de emprestar até R$ 8,4 bilhões.
“Esse cartão (BNDES) precisa ser modernizado. Primeiro, ele vai se tornar um cartão digital, que pode ser aprovado em segundos, e não em dias”, afirmou ao Estadão o diretor financeiro e de crédito digital a micro, pequenas e médias empresas da instituição, Alexandre Abreu. “E, segundo, os bancos tiveram muita inadimplência com ele no passado. Então nós vamos colocar o FGI para garantir.”
Ao atrelar o cartão ao FGI, fundo focado em empresas de menor porte, o banco emissor passará a dividir o risco com o Tesouro Nacional, que honrará até 80% do valor da dívida em caso de inadimplência. Abreu não revela qual a expectativa de concessão com a mudança no formato, mas diz “que vai aumentar muito” e “de forma geométrica”.
Atualmente, há 871,5 mil cartões ativos, que também podem ser solicitados pelos MEIs, os microempreendedores individuais. Em 2023, no total, eles movimentaram R$ 616,2 milhões.
O funcionamento é similar ao de um cartão de crédito, mas com cifras e prazos maiores. O banco parceiro emite o cartão, cujo limite é de até R$ 2 milhões por cliente. Com o dinheiro, é possível comprar máquinas e equipamentos nacionais pré-definidos, que podem ser pagos em até quatro anos. Apesar do limite elevado, o ticket médio, segundo o BNDES, fica abaixo de R$ 100 mil.
Questionado se o valor disponível no FGI atualmente, de cerca de R$ 500 milhões, será suficiente para garantir eventuais calotes com o cartão, Abreu afirma que o banco tentará “sensibilizar” o governo para a necessidade de novos aportes.
“É uma boa estratégia, do ponto de vista do Estado brasileiro, aportar recursos no FGI. Porque se estimula a economia com uma eficiência muito grande, de 1 para 12 (de alavancagem). Se colocar R$ 1 bilhão no fundo, por exemplo, serão R$ 12 bilhões (de potencial de crédito)”, diz o diretor, que presidiu o Banco do Brasil entre 2015 e 2016, durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
O atual cenário fiscal, porém, poderá inviabilizar esses novos aportes do Tesouro. Isso porque a equipe econômica ainda tenta manter de pé a meta de déficit zero em meio a um forte crescimento das despesas obrigatórias, que consomem boa parte do Orçamento.
Além disso, o aumento do crédito via BNDES vem sendo acompanhado com lupa no atual governo Lula devido à deterioração das contas públicas e do temor da retomada de estratégias malsucedidas no âmbito dos bancos públicos.
Linha em parceria com o Sebrae
Enquanto o lançamento do novo cartão BNDES poderá ficar apenas para o segundo semestre, a linha de crédito em parceria com o Sebrae deve começar a operar no curto prazo, daqui a cerca de dois meses. O mecanismo será o mesmo dos financiamentos atrelados ao FGI; mas, em vez de dinheiro do governo, esse fundo específico terá aportes do próprio Sebrae e do BNDES.
“A cada R$ 5 que o Sebrae colocar, o BNDES vai botar R$ 1. E aí vamos criar um fundo, que vai fazer exatamente o que o FGI faz: vai garantir a liberação de empréstimos. Só que o foco será em micro e pequenas empresas, não vai ter média”, explica Abreu.
Segundo ele, o fundo, que deverá chamar FGI Sebrae, terá cerca de R$ 700 milhões, sendo 20% aportado pelo BNDES, e poderá alavancar aproximadamente R$ 8,4 bilhões em crédito. O Sebrae também realizará parcerias com outros bancos, conforme já anunciado pela entidade, o que fará com que a linha de crédito alcance R$ 30 bilhões até 2026.
Crédito com garantia do FGI dobra em 2023
Para driblar a restrição orçamentária, que vem impedindo novos aportes do Tesouro ao FGI e aumentar o potencial do fundo, o BNDES decidiu redistribuir os limites entre as instituições financeiras, dando mais garantia a quem tinha maior demanda por empréstimos. O resultado, segundo Abreu, foi um crescimento de 100% na concessão em 2023 ante 2022, chegando à cifra de R$ 43 bilhões.
“Para isso, usamos menos de R$ 4 bilhões do fundo”, pondera Abreu, relembrando o efeito da alavancagem. Os dados serão divulgados oficialmente no balanço fechado do banco, previsto para março, e foram antecipados ao Estadão.
A Caixa Econômica Federal lidera esse tipo de concessão, com 43% das operações realizadas e 15% do volume total liberado. Na sequência, aparecem Itaú, Santander e Bradesco. Abreu explica que há um mecanismo de teto para a inadimplência, para estimular os bancos a serem criteriosos na concessão desse financiamento. “Se aumentar a inadimplência (acima de determinado patamar), ele (banco) perde o direito de pegar o FGI”, afirma o diretor.