NOVA YORK - O temor com um esfriamento acima do esperado na economia americana provoca nesta segunda-feira, 5, uma queda generalizada no mercados financeiros internacionais. Na Ásia, a Bolsa de Tóquio despencou 12,4% e registrou a maior queda, em pontos, de sua história - influenciada também por questões domésticas, como a alta dos juros na semana passada. As bolsas de Taiwan e de Seul também apresentaram baixasa expressivas, acima de 8%. Na Europa, as bolsas operavam no início da manhã em quedas de cerca de 2%.
O pano de fundo desse cenário são os dados mais fracos de emprego nos Estados Unidos, divulgados na sexta-feira, 2. O mercado de trabalho esfriou além do esperado em julho, quando o furacão Beryl atingiu o sul do país, e a avaliação é que isso pode forçar o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) a começar a reduzir os juros em uma intensidade maior. Bancos como o Citi passaram a prever um primeiro corte de 0,5 ponto porcentual, e não mais de 0,25, enquanto quem ainda não via setembro como a virada de chave na política monetária americana, caso do Bank of America, foi convencido disso.
Os EUA geraram 114 mil empregos em julho, abaixo do piso das expectativas de analistas consultados pelo Projeções Broadcast, que variavam de 135 mil a 225 mil vagas, com mediana de 180 mil. A taxa de desemprego aumentou, o salário médio por hora cresceu abaixo do previsto e os dados de junho e maio foram revisados para baixo.
Os números desencadearam uma reavaliação imediata nas expectativas de Wall Street quanto ao início do corte juros e azedou ainda mais o humor nas bolsas de Nova York, sob o temor de que o Fed tenha demorado muito para acionar a sua tesoura. As chances de uma primeira queda maior em setembro, de 0,5 ponto, passaram de 80%, conforme a plataforma CME Group. Por sua vez, a probabilidade de um corte de 0,25 ponto, até então majoritária, caiu para cerca de 18%, após o relatório.
“Agora esperamos que o Fed inicie o ciclo com cortes de 50 pontos-base em setembro e novembro, seguidos por reduções de 25 pontos-base em cada reunião subsequente”, disse o Citi, em relatório a clientes.
Por sua vez, o Bank of America antecipou a sua expectativa de corte de juros, de dezembro para setembro, passando a prever duas reduções de taxas neste ano. “O emprego em julho foi fraco o suficiente para garantir um corte em setembro”, diz o time de economistas do banco americano, liderado por Michael Gapen.
Enquanto o mercado se afunilou para setembro, a intensidade do primeiro corte de juros gera discordâncias e promete ser o novo cabo de força entre Wall Street e o BC americano - e também entre os próprios economistas. De um lado, alguns acham prematuro prever um Fed mais agressivo já na largada, e querem ver mais dados da inflação e do mercado de trabalho nos EUA, outros veem riscos mais iminentes de uma possível recessão no país, o que daria combustível a um corte mais severo.
“Estou altamente cético de que o Fed consideraria um corte de juros de 50 pontos-base em setembro”, disse o economista-chefe do Santander para os EUA, Stephen Stanley, lembrando que o próximo foco de atenção serão novos dados da inflação americana, daqui duas semanas.
A rapidez com que o mercado se moveu para a expectativa de um corte de 50 pontos-base em setembro surpreendeu até gurus de Wall Street. “Estou surpreso com a rapidez com que a narrativa do mercado mudou sobre o que o Federal Reserve deveria fazer”, escreveu o conselheiro econômico da Allianz, Mohamed El-Erian, em seu perfil no ‘X’ (antigo Twitter). “Eu até ouvi alguém mencionar um corte entre as reuniões”, acrescentou.
El-Erian, que já previa uma desaceleração dos EUA mais intensa do que outros economistas, considera “improvável” um primeiro corte de juros de 50 pontos-base. Crítico da demora que o Fed levou para reconhecer o problema da inflação nos EUA, alertou que o Fed não pode errar mais após não ter reduzido os juros na reunião dessa semana, como ele próprio defendia.
Antes dos números do mercado de trabalho, o presidente do Fed, Jerome Powell, havia dito que uma redução de 50 pontos-base não estaria na mesa dos dirigentes naquele momento. “Não quero dizer, não quero ser realmente específico sobre o que faremos, mas não é algo em que estamos pensando agora”, afirmou ele, a jornalistas, na semana passada, após sinalizar pela primeira vez de forma mais efetiva que um corte de juros pode estar a caminho na reunião em setembro.
Regra de Sahm
Os números de emprego de julho também acenderam o alerta quanto ao risco de acionamento da chamada regra de ‘Sahm’, um indicador de recessão com base no mercado de trabalho. Cunhado pela economista Claudia Sahm, o modelo indica que uma economia está em recessão se a taxa de desemprego subir 0,5 ponto porcentual ou mais na média de três meses sobre o mínimo registrado nos 12 meses anteriores. A leitura da taxa de desemprego de julho empurrou o indicador da Regra de Sahm para alta de 0,53 ponto porcentual.
Segundo o Wells Fargo, cruzar esse limite pode não ser o sinal infalível de recessão como no passado. Para o Citi, a regra de Sahm será acionada só em agosto. O banco vê a taxa de desemprego em contínua alta nos próximos meses, passando dos 5% até o fim do ano, um dos desafios para quem vencer as eleições presidenciais nos EUA, em novembro.