BRASÍLIA - Maior ponto de resistência do Congresso em relação ao pacote de ajuste fiscal do governo Lula, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) bateu novo recorde de gastos nos últimos 12 meses até outubro. Foram R$ 110 bilhões em despesas, segundo dados do Tesouro Nacional, o que significa um crescimento de 16,8% em relação ao mesmo período de 2023, quando essa rubrica somou R$ 94 bilhões, já corrigidos pela inflação.
Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) explicou que há tanto aumento no número de beneficiários do programa quanto crescimento do valor pago, em função da política de reajustes do salário mínimo.
“Quanto ao aumento do valor anual do BPC, cumpre apontar que o reajuste do salário mínimo é um fator preponderante que afeta o crescimento dos recursos investidos no BPC”, disse a pasta, que também citou aumento de pedidos ainda em função da pandemia de Covid-19, o programa de redução das filas, além de decisões judiciais.
Analistas apontam três fatores que fizeram disparar esse esse benefício, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda: a indexação do salário mínimo (que corrige o BPC) ao crescimento do PIB pelo governo Lula em 2023; uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2021 que afrouxou parâmetros de renda para dar direito ao benefício; e as decisões judiciais de tribunais federais regionais, que não seguem regras de perícias internacionais para definir o que são pessoas com deficiências graves, que as tornam inaptas para trabalhar por um período prolongado.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo precisa combater o que chamou de “indústria de liminares”. Uma das questões é que a Justiça dá a uma pessoa o direito de receber o pagamento quando o governo não possui o registro da deficiência ou não concorda com os critérios para aferir essa deficiência. Conforme mostrou o Estadão, quase um terço dos do BPC para pessoas com deficiência foi concedido por decisões judiciais, que triplicaram em três anos.
O pacote de corte de gastos prevê uma economia de R$ 2 bilhões por ano com as medidas, totalizando 12 bilhões até 2030. Não se trata de reduzir em relação ao valor de hoje, mas conter o crescimento no futuro.
O que é o BPC?
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) dá direito a um salário mínimo para pessoas de baixa renda e é dividido em duas categorias: o BPC Idoso, para quem tem pelo menos 65 anos, e o BPC pessoas com deficiência (PcD), de qualquer idade, mas que sejam diagnosticadas como inaptas para trabalhar.
O benefício tem um agravante para as contas públicas porque, diferentemente das aposentadorias e pensões, não é necessário ter tempo de contribuição ao INSS para receber o benefício, uma vez que o objetivo da Constituição de 1988 foi proteger os mais vulneráveis.
Segundo Tiago Sbardelotto, especialista em contas públicas da XP Investimentos, as concessões para o BPC começaram a crescer em 2022, depois de um represamento da fila de pedidos, como resultado da pandemia de covid-19. Depois disso, houve certa estabilidade no BPC pago a idosos e um forte aumento no número de pessoas com deficiência.
“Houve uma aceleração forte em 2022 por conta da fila que se formou durante a pandemia. Esse movimento se manteve até 2023. A partir de 2024, temos duas dinâmicas diferentes. No caso do BPC idoso, vemos uma acomodação, com a taxa de crescimento desacelerando a uma média histórica. Por outro lado, o BPC PcD (pessoas com deficiência) se mantém crescendo a um ritmo muito elevado, em torno de 15% a 16% nos últimos meses”, diz
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“Houve aumento depois da reforma de 2021, que ampliou e também tornou mais subjetivos os critérios para elegibilidade do BPC para pessoas com deficiência, além do crescimento da judicialização, e, possivelmente, fraudes”, diz o economista.
Dessa forma, afirma Sbardelotto, o gasto com BPC foi impulsionado dos dois lados: aumento das concessões e também dos valores, pela política de valorização do salário mínimo.
O que o governo quer mudar?
Atualmente, para ter acesso ao BPC, a renda por pessoa de uma família não pode ser maior do que um quarto do salário mínimo. Os rendimentos que entram no cálculo da renda familiar mensal incluem salários, pensões, seguro-desemprego e rendimentos no mercado informal.
Passarão a integrar a conta a renda de cônjuge que não mora na mesma casa e o salário de irmãos, filhos e enteados. O valor de outros benefícios também vai contar. Na prática, a inclusão aumenta a renda considerada e pode fazer com que alguns beneficiários percam o direito ao beneficio.
Além disso, a equipe econômica anunciou que vai chamar todos os beneficiários do BPC para um recadastramento. A biometria será obrigatória para novas concessões e atualizações no cadastro.