O Brasil se consolida, cada vez mais, como o maior exportador agrícola do mundo. O País, que já era líder nas vendas de café verde, carne bovina, frango in natura, celulose, soja em grão e açúcar, agora também é o maior exportador de milho, superando os Estados Unidos.
No ano que vem, o País deve ultrapassar os americanos também na produção de algodão, ocupando a terceira posição no ranking mundial, atrás de China e Índia. Com a colheita maior, o Brasil tem condições de se tornar o maior exportador da fibra no mundo, desbancando os Estados Unidos.
A liderança é decorrente de uma série de fatores. No mercado interno, o País tem batido recordes consecutivos na safra de grãos, resultado também do aumento da produtividade nacional. A tecnologia do plantio direto, a irrigação e o melhoramento genético dos cultivares já permitem que os agricultores brasileiros de forma geral consigam colher até três safras agrícolas por ano numa mesma área.
No exterior, a quebra de safra nos Estados Unidos e da Argentina por causa do clima e a guerra na Ucrânia também explicam os números. A redução da oferta dos principais produtores abriu a perspectiva de aumento das exportações para a grande safra brasileira.
O’ protagonismo brasileiro no ranking mundial do agronegócio foi estampado no último relatório do departamento de agricultura dos Estados Unidos (USDA), de 12 de setembro. Pelo documento, o País exportou 57 milhões de toneladas de milho ante 42,29 milhões de toneladas dos produtores americanos na safra 2022/2023, que vai de agosto a julho. Na safra atual, o USDA projeta exportações de milho de 55 milhões de toneladas para o Brasil e de 52,07 milhões para os Estados Unidos.
No algodão, a perspectiva é que as vendas externas no ano safra 2023/24 dos Estados Unidos somem 2,67 milhões de toneladas, apenas 100 mil toneladas acima dos volumes exportados pelo Brasil (2,57 milhões de toneladas). No mesmo período, a expectativa é que o Brasil produza 3 milhões de toneladas de algodão, à frente dos Estados Unidos (2,859 milhões ).
No caso do milho, na safra 2022/23, a produção total de grão atingiu quase 132 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Com a recuperação da produtividade nos Estados do Sul e do Mato Grosso, a safra foi 17% maior do que a do ano anterior, que já tinha sido recorde.
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“Esse aumento da produção fomentou as exportações brasileiras”, afirma Tiago Pereira, assessor técnico da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da CNA.
Efeito China
Pereira acrescenta que, em novembro do ano passado, o Brasil assinou um acordo fitossanitário que pela primeira vez permitiu a exportação de milho para China. “Neste ano, China já é o maior comprador do milho brasileiro e isso fez com que a exportação tivesse mais sustentação também”, argumenta.
Mas o Brasil pode perder a liderança na próxima safra, segundo Glauber Silveira, diretor executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho). Ele afirma que, por causa da grande safra atual, o preço do grão está em baixa. E isso desestimula o plantio dos produtores brasileiros.
Além disso, ele destaca o risco da praga da cigarrinha, que é “bastante preocupante”. Outro fator é a falta de armazéns para estocagem. “Não adianta crescer demais a produção e não ter onde armazenar: o preço cai demais e o produtor é obrigado a vender a qualquer preço.”
Apesar disso, ele acredita que esse retrocesso seja transitório. Nos próximos anos, Silveira diz que o País vai se consolidar na liderança mundial das exportações de milho. “No médio prazo não tem para ninguém, só nós, mesmo.”
Pelos seus cálculos, até 2050, o Brasil poderá produzir 400 milhões de toneladas de milho por ano, impulsionado pelo aumento de área e ganhos de produtividade. Os EUA podem ganhar em produtividade no curto prazo, mas o aumento de área será mais restrito. Isso porque, se ampliarem a área com milho, terão de reduzir a de soja. “Área e produtividade no Brasil não têm limites e se o preço melhorar, muitos produtores que não estão plantando milho na segunda safra vão começar a plantar.”
De importador a exportador de algodão
No caso do algodão, as boas perspectivas para a produção e exportação brasileira são resultado de grandes transformações que ocorrem no setor. Até os anos 1980, por exemplo, o Brasil era exportador de algodão. A fibra era produzida em São Paulo e Paraná em pequenas propriedades e colhida manualmente.
Na época, a praga do bicudo acabou com a produção e o País passou a ser importador de algodão nos anos 1990, conta Miguel Faus, presidente da Associação Nacional de exportadores de Algodão (Anea). A volta às exportações ocorreu com o cultivo do algodão no Centro-Oeste, em grandes propriedades, com colheita mecanizada.
A partir dos anos 2000, os agricultores do Centro-Oeste começaram a plantar algodão como segunda safra, em rotação com o milho. “No Mato Grosso, que é o maior produtor, 80% do algodão hoje é plantado em segunda safra”, diz o presidente da Anea.
Na produção, o Brasil vai passar os EUA no ano safra 2023/2024, segundo o USDA. A produtividade do algodão brasileiro é hoje de 1.900 quilos por hectare, mais que o dobro da dos Estados Unidos (900 quilos por hectare). “Na próxima safra, deveremos ter incremento de área de algodão, pois os preços estão bons, a produtividade é excelente e o milho está hoje com margem negativa”, observa Faus.
No entanto, ultrapassar os Estados Unidos nas exportações e se tornar líder nas vendas externas, é uma possibilidade, se, de fato, a quebra da safra no Estado americano do Texas for maior do que o esperado, diz o presidente da Anea. Um obstáculo para romper essa barreira é que consumo interno de algodão no Brasil é grande (cerca de 700 mil toneladas) e supera o dos EUA, que é de 468 mil toneladas. “O excedente exportável lá é maior do que aqui”, frisa.
De toda forma, além dos ganhos de produtividade, o setor tem investido em qualidade e na sustentabilidade da fibra, uma das exigências dos compradores internacionais.
Faz três anos, por exemplo, que a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) junto com a Anea iniciaram um programa chamado Cotton Brazil para promover o produto brasileiro no exterior. O programa tem um escritório em Cingapura e foram realizadas sete missões internacionais, que trouxeram representantes de 150 indústrias para conhecer como o algodão brasileiro é produzido, isto é, seguindo os critérios de sustentabilidade e qualidade.
Faus diz que o algodão brasileiro está trabalhando em silêncio. Na sua opinião, a commodity já está repetindo o efeito que a soja provocou no agronegócio brasileiro. “Passar os EUA é um detalhe para nós.”