Câmara aprova PEC do pacote de corte de gastos com mudanças em abono, Fundeb e supersalários


Texto agora segue ao Senado; proposta, que foi desidratada, integra o conjunto de medidas de ajuste fiscal enviada pela Fazenda ao Congresso

Por Alvaro Gribel, Daniel Weterman e Mariana Carneiro
Atualização:

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira, 19, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que integra o pacote de corte de gastos do governo Lula. O texto traz mudanças no abono salarial e no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), além de abrir caminho para votação do projeto que limita os supersalários do funcionalismo público. As propostas, porém, foram desidratadas em relação ao texto enviado pela equipe econômica.

Foram 344 votos a favor (eram necessários 308), 154 contrários e duas abstenções no primeiro turno. Já no segundo turno, foram 348 votos a favor e 146 contrários. Concluída a votação, o texto seguirá para o Senado Federal.

Câmara vota pacote fiscal do governo Lula. Foto: BRUNO SPADA AGENCIA CAMARA
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Na quarta-feira, 18, a votação foi adiada após o governo não conseguir os votos necessários. O governo, portanto, se mobilizou nesta quinta-feira para conquistar votos do Centrão, uma vez que não podia contar com votos do PSOL, por exemplo.

Nas conversas da manhã, segundo relatos ouvidos pelo Estadão, foram oferecidos pelo governo valores em emendas parlamentares em 2025 de R$ 5 milhões por parlamentar na área de saúde.

No plenário, as equipes de técnicos do governo acionaram parlamentares que já viajaram para seus Estados para que votassem. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia autorizado, na véspera, a votação remota diante da dificuldade de se obter os votos necessários para a aprovação.

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Este é o segundo projeto do pacote analisado pela Câmara, que aprovou anteriormente um projeto de lei complementar com novos gatilhos para reforçar o arcabouço fiscal. A expectativa é de que o terceiro projeto de lei, que limita o crescimento do salário mínimo e promove mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), seja analisado ainda nesta quinta.

A PEC também continha um dispositivo relativo ao BPC, mas que foi excluído pela Câmara. Os deputados retiraram uma proposta do governo que proibia deduções de renda para concessão do benefício. A medida era uma amarra a mais na Constituição ao pagamento do recurso, pois impedia que rendimentos não previstos em lei fossem desconsiderados na hora de calcular se a pessoa tem direito ou não à verba do governo.

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Os deputados fecharam um acordo de manter mudanças no BPC apenas no projeto de lei ordinária, que será votado na sequência e também faz parte no pacote.

O líder do governo, deputado José Guimaraes (PT-CE), orientou voto favorável da base governista, dizendo que o pacote não penaliza os pobres, mas que o ajuste é necessário neste momento para a economia.

“O País precisa desse ajuste, é um ajuste que não penaliza os mais pobres, que preserva direitos, mas é um ajuste necessário em função desse momento que o País está vivendo e o nosso governo”, afirmou. “Temos que pensar o que é melhor para a economia brasileira. Nem sempre pode ser o formato de oposição e governo. O que está em jogo é o compromisso que esse Congresso tem com o País, como fez na PEC da Transição, na reforma tributária.”

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A Fazenda estima que os três projetos juntos vão gerar uma economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos, mas especialistas em contas públicas contestam o cálculo e preveem uma economia menor, da ordem de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões. As contas ainda terão de ser refeitas após as modificações feitas no Congresso.

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), líder da maioria, que chegou a elaborar uma PEC alterativa de corte de gastos, com medidas muito mais duras, alertou que o pacote em votação no Congresso não será suficiente para resolver a crise de confiança na política fiscal.

“Sou vice-líder do governo nesta Casa, vejo os enormes avanços do governo do presidente Lula em diversas áreas, mas tenho obviamente as minhas críticas e o registro que devo fazer sobre o debate fiscal que vive hoje o Brasil. Acredito que foi feito um esforço por parte dos relatores, mas quero dizer que tudo que vai ser aprovado não será suficiente para nós possamos atingir o equilíbrio fiscal”.

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Câmara flexibiliza limite aos supersalários

A PEC manteve o comando constitucional para tentar combater os supersalários do funcionalismo público, mas definindo que uma lei ordinária (e não uma lei complementar, como propôs a Fazenda) vai dizer quais tipos de “penduricalhos” poderão ser excluídos do teto remuneratório.

Na prática, a medida foi flexibilizada, pois uma lei ordinária exige menos votos para ser aprovada, o que pode abrir mais espaço para penduricalhos - ou seja, para pagamentos de benefícios fora do teto, calculado hoje em R$ 44 mil mensais, equivalente à remuneração de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

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Para o professor da Fundação Dom Cabral e autor do livro “O País dos privilégios”, Bruno Carazza, a mudança permitirá que resoluções do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) continuam a criar os “penduricalhos”.

“Há um entendimento bastante questionável do Judiciário de que resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) têm força de lei. Corre-se o sério risco de que eles continuarão criando penduricalhos administrativamente”, explicou Carazza.

Além disso, o texto anterior era mais rígido, pois dizia que “somente” poderiam sair do teto remunerações expressamente autorizadas em lei – a proposta aprovada retirou o termo “somente”, deixando uma regra mais flexível.

Como mostrou o Estadão, o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Frederico Mendes Jr., fez lobby dentro do plenário da Câmara dos Deputados em defesa da categoria nesta quarta-feira (veja vídeo).

Fundeb

A principal mudança no texto, relatado pelo deputado Moses Rodrigues (União-CE), foi a alteração da proposta do governo em relação ao Fundeb. A Fazenda queria que até 20% dos recursos que a União coloca no fundo fossem destinados ao ensino em tempo integral, o que poderia abrir um espaço fiscal de R$ 11,6 bilhões no ano que vem.

A Câmara reduziu o porcentual para 10% e estabeleceu que o dinheiro da complementação da União no Fundeb será usado para ensino em tempo integral apenas em 2025, diminuindo o impacto para R$ 5,8 bilhões. O valor, no entanto, ainda é maior que a economia anunciada pelo governo ao apresentar o pacote fiscal (R$ 4,8 bilhões).

A partir de 2026, os Estados e municípios terão de destinar 4% de recursos próprios que colocam no Fundeb para esse programa. Na prática, a União transfere a responsabilidade para os governos locais e espera economizar recursos com isso.

De acordo com o economista Camillo Bassi, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os Estados e municípios precisarão investir R$ 12 bilhões em ensino em tempo integral em 2026 para cumprir a regra da proposta aprovada. “O valor bate com a proposta anterior, mas a origem do recurso é diferente. A partir de 2026, o recurso será calculado em cima dos fundos de todos os Estados, e a União estará alheia.”

A economia efetiva de gastos para a União, no entanto, vai exigir que o governo federal diminua recursos do orçamento da Educação no mesmo montante. Ao cortar recursos, o governo federal deverá assumir o ônus político e ainda respeitar o piso constitucional da Educação exigido pela Constituição, que consome despesas não obrigatórias.

O espaço da economia gerada pelo Fundeb poderá ser ocupado por outros gastos, como o programa Pé-de-Meia, que paga uma bolsa para estudantes do ensino médio. Dessa forma, não haveria corte no total de despesas, mas traria o Pé-de-Meia para dentro do Orçamento, evitando manobras fiscais.

A PEC aprovada também define que terá direito ao abono salarial quem ganha até 1,5 salário mínimo, mas com uma regra de transição até 2035. Hoje, tem direito ao abono quem ganha até dois salários mínimos. O teto para o recebimento do benefício, hoje indexado à valorização do mínimo, passará a ser corrigido pela inflação a partir de 2026.

Também foi prorrogada a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2032, que permite ao governo usar recursos carimbados para outras finalidades, permitindo uma flexibilidade maior no Orçamento.

O Congresso rejeitou um dispositivo proposto pelo governo que tirava a obrigação de o Poder Executivo executar o Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A medida, incluída na Constituição em 2019, impede o governo de cancelar, por exemplo, emendas parlamentares, que são recursos direcionados por deputados e senadores para seus redutos eleitorais.

Entenda os outros dois projetos do pacote fiscal

Projeto de lei 4614-2024 | Pendente de votação na Câmara

  • Salário mínimo: Limita o crescimento do salário mínimo a 2,5% ao ano acima da inflação, com piso de Previsão de economia de R$ 109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Proagro: Gastos com Proagro, espécie de seguro rural voltado a pequenos e médios agricultores, ficarão limitados ao que está previsto no Orçamento de cada ano. Sem previsão de economia.
  • Biometria: Estabelece biometria para todos os benefícios da seguridade social, medida considerada como “pente-fino” por especialistas. Previsão de economia de R$ 15 bilhões até 2030.
  • Bolsa Família: Permite ao governo modificar parâmetros relativos ao Bolsa Família e coloca limites de unipessoais em municípios. Previsão de economia de R$ 17 bilhões até 2030.
  • Renovação de cadastro: Quem está no CadÚnico terá de renovar cadastro a cada 24 meses para receber programa de transferência de renda. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.
  • Dados: Concessionárias de serviços públicos terão que oferecer dados para a União. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.

Projeto de lei complementar | Aprovado na Câmara

  • Seguridade social: Criação ou prorrogação de novos gastos da seguridade social têm que respeitar os limites do arcabouço. Mantido no texto, mas sem previsão de economia divulgada pelo Ministério da Fazenda.
  • Gatilho com déficit primário: Proíbe a renovação de incentivos tributários e limita o crescimento de gastos com pessoal a 0,6%, se o governo registrar déficit primário.
  • Gatilho em caso de queda nominal dos gastos discricionários: Proíbe, até que as despesas discricionárias voltem a subir em termos nominais, a concessão, ampliação ou prorrogação de benefício tributário, de 2027 até 2030, e limita o crescimento anual real de despesas com pessoal e encargos acima de 0,6%.
  • Superávit primário de fundos: Só poderá ser usado para o pagamento de dívidas, mas três dos oito fundos da proposta original saíram do texto.
  • Emendas: A Câmara rejeitou o corte em emendas impositivas (individuais e de bancada) para cumprir o arcabouço fiscal, limitando o bloqueio às emendas não impositivas (como as emendas de comissão) até 15% dos recursos.

Caiu no projeto:

  • Créditos tributários: Foi retirado do texto pelo relator Átila Lira, sob argumentação de que o governo já havia tentando essa proposta, em uma medida provisória, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira, 19, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que integra o pacote de corte de gastos do governo Lula. O texto traz mudanças no abono salarial e no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), além de abrir caminho para votação do projeto que limita os supersalários do funcionalismo público. As propostas, porém, foram desidratadas em relação ao texto enviado pela equipe econômica.

Foram 344 votos a favor (eram necessários 308), 154 contrários e duas abstenções no primeiro turno. Já no segundo turno, foram 348 votos a favor e 146 contrários. Concluída a votação, o texto seguirá para o Senado Federal.

Câmara vota pacote fiscal do governo Lula. Foto: BRUNO SPADA AGENCIA CAMARA

Na quarta-feira, 18, a votação foi adiada após o governo não conseguir os votos necessários. O governo, portanto, se mobilizou nesta quinta-feira para conquistar votos do Centrão, uma vez que não podia contar com votos do PSOL, por exemplo.

Nas conversas da manhã, segundo relatos ouvidos pelo Estadão, foram oferecidos pelo governo valores em emendas parlamentares em 2025 de R$ 5 milhões por parlamentar na área de saúde.

No plenário, as equipes de técnicos do governo acionaram parlamentares que já viajaram para seus Estados para que votassem. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia autorizado, na véspera, a votação remota diante da dificuldade de se obter os votos necessários para a aprovação.

Este é o segundo projeto do pacote analisado pela Câmara, que aprovou anteriormente um projeto de lei complementar com novos gatilhos para reforçar o arcabouço fiscal. A expectativa é de que o terceiro projeto de lei, que limita o crescimento do salário mínimo e promove mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), seja analisado ainda nesta quinta.

A PEC também continha um dispositivo relativo ao BPC, mas que foi excluído pela Câmara. Os deputados retiraram uma proposta do governo que proibia deduções de renda para concessão do benefício. A medida era uma amarra a mais na Constituição ao pagamento do recurso, pois impedia que rendimentos não previstos em lei fossem desconsiderados na hora de calcular se a pessoa tem direito ou não à verba do governo.

Os deputados fecharam um acordo de manter mudanças no BPC apenas no projeto de lei ordinária, que será votado na sequência e também faz parte no pacote.

O líder do governo, deputado José Guimaraes (PT-CE), orientou voto favorável da base governista, dizendo que o pacote não penaliza os pobres, mas que o ajuste é necessário neste momento para a economia.

“O País precisa desse ajuste, é um ajuste que não penaliza os mais pobres, que preserva direitos, mas é um ajuste necessário em função desse momento que o País está vivendo e o nosso governo”, afirmou. “Temos que pensar o que é melhor para a economia brasileira. Nem sempre pode ser o formato de oposição e governo. O que está em jogo é o compromisso que esse Congresso tem com o País, como fez na PEC da Transição, na reforma tributária.”

A Fazenda estima que os três projetos juntos vão gerar uma economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos, mas especialistas em contas públicas contestam o cálculo e preveem uma economia menor, da ordem de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões. As contas ainda terão de ser refeitas após as modificações feitas no Congresso.

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), líder da maioria, que chegou a elaborar uma PEC alterativa de corte de gastos, com medidas muito mais duras, alertou que o pacote em votação no Congresso não será suficiente para resolver a crise de confiança na política fiscal.

“Sou vice-líder do governo nesta Casa, vejo os enormes avanços do governo do presidente Lula em diversas áreas, mas tenho obviamente as minhas críticas e o registro que devo fazer sobre o debate fiscal que vive hoje o Brasil. Acredito que foi feito um esforço por parte dos relatores, mas quero dizer que tudo que vai ser aprovado não será suficiente para nós possamos atingir o equilíbrio fiscal”.

Câmara flexibiliza limite aos supersalários

A PEC manteve o comando constitucional para tentar combater os supersalários do funcionalismo público, mas definindo que uma lei ordinária (e não uma lei complementar, como propôs a Fazenda) vai dizer quais tipos de “penduricalhos” poderão ser excluídos do teto remuneratório.

Na prática, a medida foi flexibilizada, pois uma lei ordinária exige menos votos para ser aprovada, o que pode abrir mais espaço para penduricalhos - ou seja, para pagamentos de benefícios fora do teto, calculado hoje em R$ 44 mil mensais, equivalente à remuneração de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Para o professor da Fundação Dom Cabral e autor do livro “O País dos privilégios”, Bruno Carazza, a mudança permitirá que resoluções do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) continuam a criar os “penduricalhos”.

“Há um entendimento bastante questionável do Judiciário de que resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) têm força de lei. Corre-se o sério risco de que eles continuarão criando penduricalhos administrativamente”, explicou Carazza.

Além disso, o texto anterior era mais rígido, pois dizia que “somente” poderiam sair do teto remunerações expressamente autorizadas em lei – a proposta aprovada retirou o termo “somente”, deixando uma regra mais flexível.

Como mostrou o Estadão, o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Frederico Mendes Jr., fez lobby dentro do plenário da Câmara dos Deputados em defesa da categoria nesta quarta-feira (veja vídeo).

Fundeb

A principal mudança no texto, relatado pelo deputado Moses Rodrigues (União-CE), foi a alteração da proposta do governo em relação ao Fundeb. A Fazenda queria que até 20% dos recursos que a União coloca no fundo fossem destinados ao ensino em tempo integral, o que poderia abrir um espaço fiscal de R$ 11,6 bilhões no ano que vem.

A Câmara reduziu o porcentual para 10% e estabeleceu que o dinheiro da complementação da União no Fundeb será usado para ensino em tempo integral apenas em 2025, diminuindo o impacto para R$ 5,8 bilhões. O valor, no entanto, ainda é maior que a economia anunciada pelo governo ao apresentar o pacote fiscal (R$ 4,8 bilhões).

A partir de 2026, os Estados e municípios terão de destinar 4% de recursos próprios que colocam no Fundeb para esse programa. Na prática, a União transfere a responsabilidade para os governos locais e espera economizar recursos com isso.

De acordo com o economista Camillo Bassi, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os Estados e municípios precisarão investir R$ 12 bilhões em ensino em tempo integral em 2026 para cumprir a regra da proposta aprovada. “O valor bate com a proposta anterior, mas a origem do recurso é diferente. A partir de 2026, o recurso será calculado em cima dos fundos de todos os Estados, e a União estará alheia.”

A economia efetiva de gastos para a União, no entanto, vai exigir que o governo federal diminua recursos do orçamento da Educação no mesmo montante. Ao cortar recursos, o governo federal deverá assumir o ônus político e ainda respeitar o piso constitucional da Educação exigido pela Constituição, que consome despesas não obrigatórias.

O espaço da economia gerada pelo Fundeb poderá ser ocupado por outros gastos, como o programa Pé-de-Meia, que paga uma bolsa para estudantes do ensino médio. Dessa forma, não haveria corte no total de despesas, mas traria o Pé-de-Meia para dentro do Orçamento, evitando manobras fiscais.

A PEC aprovada também define que terá direito ao abono salarial quem ganha até 1,5 salário mínimo, mas com uma regra de transição até 2035. Hoje, tem direito ao abono quem ganha até dois salários mínimos. O teto para o recebimento do benefício, hoje indexado à valorização do mínimo, passará a ser corrigido pela inflação a partir de 2026.

Também foi prorrogada a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2032, que permite ao governo usar recursos carimbados para outras finalidades, permitindo uma flexibilidade maior no Orçamento.

O Congresso rejeitou um dispositivo proposto pelo governo que tirava a obrigação de o Poder Executivo executar o Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A medida, incluída na Constituição em 2019, impede o governo de cancelar, por exemplo, emendas parlamentares, que são recursos direcionados por deputados e senadores para seus redutos eleitorais.

Entenda os outros dois projetos do pacote fiscal

Projeto de lei 4614-2024 | Pendente de votação na Câmara

  • Salário mínimo: Limita o crescimento do salário mínimo a 2,5% ao ano acima da inflação, com piso de Previsão de economia de R$ 109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Proagro: Gastos com Proagro, espécie de seguro rural voltado a pequenos e médios agricultores, ficarão limitados ao que está previsto no Orçamento de cada ano. Sem previsão de economia.
  • Biometria: Estabelece biometria para todos os benefícios da seguridade social, medida considerada como “pente-fino” por especialistas. Previsão de economia de R$ 15 bilhões até 2030.
  • Bolsa Família: Permite ao governo modificar parâmetros relativos ao Bolsa Família e coloca limites de unipessoais em municípios. Previsão de economia de R$ 17 bilhões até 2030.
  • Renovação de cadastro: Quem está no CadÚnico terá de renovar cadastro a cada 24 meses para receber programa de transferência de renda. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.
  • Dados: Concessionárias de serviços públicos terão que oferecer dados para a União. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.

Projeto de lei complementar | Aprovado na Câmara

  • Seguridade social: Criação ou prorrogação de novos gastos da seguridade social têm que respeitar os limites do arcabouço. Mantido no texto, mas sem previsão de economia divulgada pelo Ministério da Fazenda.
  • Gatilho com déficit primário: Proíbe a renovação de incentivos tributários e limita o crescimento de gastos com pessoal a 0,6%, se o governo registrar déficit primário.
  • Gatilho em caso de queda nominal dos gastos discricionários: Proíbe, até que as despesas discricionárias voltem a subir em termos nominais, a concessão, ampliação ou prorrogação de benefício tributário, de 2027 até 2030, e limita o crescimento anual real de despesas com pessoal e encargos acima de 0,6%.
  • Superávit primário de fundos: Só poderá ser usado para o pagamento de dívidas, mas três dos oito fundos da proposta original saíram do texto.
  • Emendas: A Câmara rejeitou o corte em emendas impositivas (individuais e de bancada) para cumprir o arcabouço fiscal, limitando o bloqueio às emendas não impositivas (como as emendas de comissão) até 15% dos recursos.

Caiu no projeto:

  • Créditos tributários: Foi retirado do texto pelo relator Átila Lira, sob argumentação de que o governo já havia tentando essa proposta, em uma medida provisória, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.

BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira, 19, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que integra o pacote de corte de gastos do governo Lula. O texto traz mudanças no abono salarial e no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), além de abrir caminho para votação do projeto que limita os supersalários do funcionalismo público. As propostas, porém, foram desidratadas em relação ao texto enviado pela equipe econômica.

Foram 344 votos a favor (eram necessários 308), 154 contrários e duas abstenções no primeiro turno. Já no segundo turno, foram 348 votos a favor e 146 contrários. Concluída a votação, o texto seguirá para o Senado Federal.

Câmara vota pacote fiscal do governo Lula. Foto: BRUNO SPADA AGENCIA CAMARA

Na quarta-feira, 18, a votação foi adiada após o governo não conseguir os votos necessários. O governo, portanto, se mobilizou nesta quinta-feira para conquistar votos do Centrão, uma vez que não podia contar com votos do PSOL, por exemplo.

Nas conversas da manhã, segundo relatos ouvidos pelo Estadão, foram oferecidos pelo governo valores em emendas parlamentares em 2025 de R$ 5 milhões por parlamentar na área de saúde.

No plenário, as equipes de técnicos do governo acionaram parlamentares que já viajaram para seus Estados para que votassem. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia autorizado, na véspera, a votação remota diante da dificuldade de se obter os votos necessários para a aprovação.

Este é o segundo projeto do pacote analisado pela Câmara, que aprovou anteriormente um projeto de lei complementar com novos gatilhos para reforçar o arcabouço fiscal. A expectativa é de que o terceiro projeto de lei, que limita o crescimento do salário mínimo e promove mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), seja analisado ainda nesta quinta.

A PEC também continha um dispositivo relativo ao BPC, mas que foi excluído pela Câmara. Os deputados retiraram uma proposta do governo que proibia deduções de renda para concessão do benefício. A medida era uma amarra a mais na Constituição ao pagamento do recurso, pois impedia que rendimentos não previstos em lei fossem desconsiderados na hora de calcular se a pessoa tem direito ou não à verba do governo.

Os deputados fecharam um acordo de manter mudanças no BPC apenas no projeto de lei ordinária, que será votado na sequência e também faz parte no pacote.

O líder do governo, deputado José Guimaraes (PT-CE), orientou voto favorável da base governista, dizendo que o pacote não penaliza os pobres, mas que o ajuste é necessário neste momento para a economia.

“O País precisa desse ajuste, é um ajuste que não penaliza os mais pobres, que preserva direitos, mas é um ajuste necessário em função desse momento que o País está vivendo e o nosso governo”, afirmou. “Temos que pensar o que é melhor para a economia brasileira. Nem sempre pode ser o formato de oposição e governo. O que está em jogo é o compromisso que esse Congresso tem com o País, como fez na PEC da Transição, na reforma tributária.”

A Fazenda estima que os três projetos juntos vão gerar uma economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos, mas especialistas em contas públicas contestam o cálculo e preveem uma economia menor, da ordem de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões. As contas ainda terão de ser refeitas após as modificações feitas no Congresso.

O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), líder da maioria, que chegou a elaborar uma PEC alterativa de corte de gastos, com medidas muito mais duras, alertou que o pacote em votação no Congresso não será suficiente para resolver a crise de confiança na política fiscal.

“Sou vice-líder do governo nesta Casa, vejo os enormes avanços do governo do presidente Lula em diversas áreas, mas tenho obviamente as minhas críticas e o registro que devo fazer sobre o debate fiscal que vive hoje o Brasil. Acredito que foi feito um esforço por parte dos relatores, mas quero dizer que tudo que vai ser aprovado não será suficiente para nós possamos atingir o equilíbrio fiscal”.

Câmara flexibiliza limite aos supersalários

A PEC manteve o comando constitucional para tentar combater os supersalários do funcionalismo público, mas definindo que uma lei ordinária (e não uma lei complementar, como propôs a Fazenda) vai dizer quais tipos de “penduricalhos” poderão ser excluídos do teto remuneratório.

Na prática, a medida foi flexibilizada, pois uma lei ordinária exige menos votos para ser aprovada, o que pode abrir mais espaço para penduricalhos - ou seja, para pagamentos de benefícios fora do teto, calculado hoje em R$ 44 mil mensais, equivalente à remuneração de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Para o professor da Fundação Dom Cabral e autor do livro “O País dos privilégios”, Bruno Carazza, a mudança permitirá que resoluções do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) continuam a criar os “penduricalhos”.

“Há um entendimento bastante questionável do Judiciário de que resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) têm força de lei. Corre-se o sério risco de que eles continuarão criando penduricalhos administrativamente”, explicou Carazza.

Além disso, o texto anterior era mais rígido, pois dizia que “somente” poderiam sair do teto remunerações expressamente autorizadas em lei – a proposta aprovada retirou o termo “somente”, deixando uma regra mais flexível.

Como mostrou o Estadão, o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Frederico Mendes Jr., fez lobby dentro do plenário da Câmara dos Deputados em defesa da categoria nesta quarta-feira (veja vídeo).

Fundeb

A principal mudança no texto, relatado pelo deputado Moses Rodrigues (União-CE), foi a alteração da proposta do governo em relação ao Fundeb. A Fazenda queria que até 20% dos recursos que a União coloca no fundo fossem destinados ao ensino em tempo integral, o que poderia abrir um espaço fiscal de R$ 11,6 bilhões no ano que vem.

A Câmara reduziu o porcentual para 10% e estabeleceu que o dinheiro da complementação da União no Fundeb será usado para ensino em tempo integral apenas em 2025, diminuindo o impacto para R$ 5,8 bilhões. O valor, no entanto, ainda é maior que a economia anunciada pelo governo ao apresentar o pacote fiscal (R$ 4,8 bilhões).

A partir de 2026, os Estados e municípios terão de destinar 4% de recursos próprios que colocam no Fundeb para esse programa. Na prática, a União transfere a responsabilidade para os governos locais e espera economizar recursos com isso.

De acordo com o economista Camillo Bassi, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os Estados e municípios precisarão investir R$ 12 bilhões em ensino em tempo integral em 2026 para cumprir a regra da proposta aprovada. “O valor bate com a proposta anterior, mas a origem do recurso é diferente. A partir de 2026, o recurso será calculado em cima dos fundos de todos os Estados, e a União estará alheia.”

A economia efetiva de gastos para a União, no entanto, vai exigir que o governo federal diminua recursos do orçamento da Educação no mesmo montante. Ao cortar recursos, o governo federal deverá assumir o ônus político e ainda respeitar o piso constitucional da Educação exigido pela Constituição, que consome despesas não obrigatórias.

O espaço da economia gerada pelo Fundeb poderá ser ocupado por outros gastos, como o programa Pé-de-Meia, que paga uma bolsa para estudantes do ensino médio. Dessa forma, não haveria corte no total de despesas, mas traria o Pé-de-Meia para dentro do Orçamento, evitando manobras fiscais.

A PEC aprovada também define que terá direito ao abono salarial quem ganha até 1,5 salário mínimo, mas com uma regra de transição até 2035. Hoje, tem direito ao abono quem ganha até dois salários mínimos. O teto para o recebimento do benefício, hoje indexado à valorização do mínimo, passará a ser corrigido pela inflação a partir de 2026.

Também foi prorrogada a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2032, que permite ao governo usar recursos carimbados para outras finalidades, permitindo uma flexibilidade maior no Orçamento.

O Congresso rejeitou um dispositivo proposto pelo governo que tirava a obrigação de o Poder Executivo executar o Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A medida, incluída na Constituição em 2019, impede o governo de cancelar, por exemplo, emendas parlamentares, que são recursos direcionados por deputados e senadores para seus redutos eleitorais.

Entenda os outros dois projetos do pacote fiscal

Projeto de lei 4614-2024 | Pendente de votação na Câmara

  • Salário mínimo: Limita o crescimento do salário mínimo a 2,5% ao ano acima da inflação, com piso de Previsão de economia de R$ 109,8 bilhões entre 2025 e 2030.
  • Proagro: Gastos com Proagro, espécie de seguro rural voltado a pequenos e médios agricultores, ficarão limitados ao que está previsto no Orçamento de cada ano. Sem previsão de economia.
  • Biometria: Estabelece biometria para todos os benefícios da seguridade social, medida considerada como “pente-fino” por especialistas. Previsão de economia de R$ 15 bilhões até 2030.
  • Bolsa Família: Permite ao governo modificar parâmetros relativos ao Bolsa Família e coloca limites de unipessoais em municípios. Previsão de economia de R$ 17 bilhões até 2030.
  • Renovação de cadastro: Quem está no CadÚnico terá de renovar cadastro a cada 24 meses para receber programa de transferência de renda. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.
  • Dados: Concessionárias de serviços públicos terão que oferecer dados para a União. Medida considerada pente-fino, sem projeção de economia.

Projeto de lei complementar | Aprovado na Câmara

  • Seguridade social: Criação ou prorrogação de novos gastos da seguridade social têm que respeitar os limites do arcabouço. Mantido no texto, mas sem previsão de economia divulgada pelo Ministério da Fazenda.
  • Gatilho com déficit primário: Proíbe a renovação de incentivos tributários e limita o crescimento de gastos com pessoal a 0,6%, se o governo registrar déficit primário.
  • Gatilho em caso de queda nominal dos gastos discricionários: Proíbe, até que as despesas discricionárias voltem a subir em termos nominais, a concessão, ampliação ou prorrogação de benefício tributário, de 2027 até 2030, e limita o crescimento anual real de despesas com pessoal e encargos acima de 0,6%.
  • Superávit primário de fundos: Só poderá ser usado para o pagamento de dívidas, mas três dos oito fundos da proposta original saíram do texto.
  • Emendas: A Câmara rejeitou o corte em emendas impositivas (individuais e de bancada) para cumprir o arcabouço fiscal, limitando o bloqueio às emendas não impositivas (como as emendas de comissão) até 15% dos recursos.

Caiu no projeto:

  • Créditos tributários: Foi retirado do texto pelo relator Átila Lira, sob argumentação de que o governo já havia tentando essa proposta, em uma medida provisória, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.

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