BRASÍLIA – A Câmara dos Deputados aprovou na noite de terça-feira, 23, com ampla folga, o texto-base do arcabouço fiscal, nova regra para controlar as contas públicas do governo. Foram 372 votos favoráveis, 108 contrários e uma abstenção. Por ser um projeto de lei complementar, o arcabouço precisava de 257 votos favoráveis (maioria absoluta) para ser aprovado.
A Câmara rejeitou um destaque (pedido de alteração ao texto) da federação PSOL/Rede e deixou outros quatro para serem votados nesta quarta-feira, 24. Na votação, apenas a federação PSOL/Rede – que integra a base do governo –, o PL e o Novo orientaram seus integrantes a votar “não”, ou seja, contra o texto.
Após reunião com líderes partidários e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA), anunciou uma mudança no texto que condiciona o crescimento de gastos em 2024 ao aumento de receitas. Isso para minimizar uma brecha que permitia ao governo ampliar de forma expressiva os gastos já na largada da nova regra.
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Cajado, que durante a elaboração do seu relatório, adotou como critério desconsiderar estimativas e projeções para dar prioridade aos resultados efetivos de receita e despesa, disse que a alteração de última hora foi resultado da negociação política que tomou toda a tarde desta terça.
“Foi o acordo possível. Como eu disse desde o início, este relatório não reflete apenas a minha opinião, mas da coletividade”, afirmou.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atuou fortemente nos bastidores para impedir que a nova versão do substitutivo do projeto do novo arcabouço fiscal limitasse a ampliação dos gastos do governo em 2024, primeiro ano de vigência da regra fiscal.
Após o Estadão revelar que a primeira versão do relatório ampliava o espaço para despesas em R$ 80 bilhões, os deputados pressionaram Cajado para mudar o texto.
A oposição e mesmo os partidos aliados do governo Lula reagiram para as brechas serem fechadas. Durante a reunião de líderes, antes do início da votação, foi discutida a possibilidade de retirar do texto essa exceção para o ano que vem, chamada de “regra de transição” pelos parlamentares.
Segundo apurou o Estadão, Haddad foi contra e costurou ao telefone uma alternativa intermediária com Arthur Lira. A solução encontrada foi uma fórmula de cálculo do espaço para aumento das despesas no primeiro ano da regra, em 2024, ainda mais complicada.
Como ficou a regra
Pela nova versão do texto, o governo poderá encaminhar ao Congresso o projeto de lei orçamentária de 2024, em agosto, fixando o crescimento das despesas a 70% da variação da receita no acumulado de 12 meses até junho deste ano, dentro do intervalo de 0,6% e 2,5% acima da inflação.
Em maio de 2024, porém, o governo poderá aumentar o espaço para novas despesas com base numa projeção de aumento de receita até o fim do ano que vem em relação à arrecadação efetiva deste ano. A diferença, se positiva, poderá garantir espaço adicional para novas despesas por meio de crédito suplementar do Orçamento.
Caso essa projeção não se realize, o governo terá que “devolver” o excedente no Orçamento de 2025. Isso significa, na prática, uma redução do limite do teto em 2025, dando mais tempo para o governo viabilizar medidas para aumentar a arrecadação.
O esforço de articulação de Haddad é atribuído ao fato de que 2024 será um ano mais apertado por conta de despesas maiores já contratadas. Entre elas, a política de valorização do salário mínimo e a volta dos pisos constitucionais de saúde e educação atrelados à arrecadação.
Apesar da negociação, a mudança não foi totalmente assimilada pelos partidos da base. O líder do União Brasil, deputado Elmar Nascimento (BA), disse ser contra a proposta alternativa de Haddad, o que jogaria o ajuste só para 2025. Numa análise preliminar, especialistas consultados pelo Estadão apontam que a mudança tornou a regra ainda mais complexa.