Surpresa para os analistas: em todo o mundo a inflação dispara. Na maioria dos países avançados, a inflação anual saltou para próximo ou acima dos 5% ,mais de 3 pontos porcentuais acima das metas estabelecidas. E, na maioria dos países em desenvolvimento, foi para além dos 7%.
Os bancos centrais vêm sendo cobrados para agir com rigor e isso terá consequências. Alguns analistas já dão como inevitável um período de dura recessão global.
Três são as causas principais desse estouro dos preços. Houve a desorganização dos fluxos de produção e distribuição pela pandemia que puxou pelos custos. A partir do fim de fevereiro, a guerra da Ucrânia lançou para o alto os preços do petróleo e dos alimentos, movimento que não tem prazo para acabar. A esses dois fatores somou-se outro, desta vez de demanda, que foi o forte crescimento do consumo, que o sistema produtivo atende apenas em parte, porque falta muita coisa: peças, chips, fertilizantes, combustíveis...
Em março de 1980, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) , dirigido então pelo economista Paul Volcker, decidiu enfrentar a inflação de custos, produzida pelo choque do petróleo, com juros inéditos até então, de 20% ao ano. A recessão foi implacável, o desemprego deu um salto, mas, aos poucos, a inflação saiu derrotada. A economia do Brasil, então altamente endividada em moeda estrangeira, não suportou a disparada dos juros e quebrou. E foram aquelas crises intermináveis.
Ninguém espera uma pancada nos juros como a de Paul Volcker. Mas ficou inevitável aplicar certa dose desse remédio. Perguntas: quanto a economia global terá de suportar em recessão e quais seriam as consequências políticas?
A principal incógnita dessa equação é o desdobramento da guerra da Ucrânia. A União Europeia decidiu suspender as importações de carvão mineral da Rússia. Mas poderá ir além nas suas sanções. Aumentam as pressões para que pare de importar também petróleo e gás natural, principais exportações da Rússia. A Europa, principalmente Alemanha e Itália, é altamente dependente do suprimento de gás e petróleo da Rússia. Se a decisão for essa, será inevitável forte racionamento de combustíveis e de energia elétrica que, por si só, empurraria a economia mundial para a recessão. Poderia vir acompanhada de mais inflação na medida em que os preços do petróleo e do gás também disparariam.
Enfim, tudo contado, estão à frente mais incertezas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia.
*CELSO MING É COMENTARISTA DE ECONOMIA