Em uma crise imobiliária que não parece ter fim, o governo da China está entrando em cena como comprador de última instância. Na sexta-feira, as autoridades chinesas deram o passo mais ousado até o momento, revelando um plano nacional para comprar parte do vasto estoque de moradias que está definhando no mercado.
Elas também afrouxaram as regras para hipotecas. O banco central disse que forneceria US$ 41,5 bilhões em empréstimos baratos para ajudar as empresas estatais a comprar moradias construídas, mas não vendidas. As medidas ocorreram poucas horas depois que novos dados econômicos revelaram uma dura verdade: ninguém quer comprar casas no momento.
Os formuladores de políticas tentaram dezenas de medidas para atrair compradores de casas e reverter um declínio acentuado no mercado imobiliário, que mostrou poucos sinais de recuperação no curto prazo.
Na sexta-feira, autoridades de toda a China participaram de uma videoconferência para discutir os desafios enfrentados. O vice-premiê da China, He Lifeng, anunciou uma grande mudança na abordagem do governo para lidar com a crise imobiliária, que levou as famílias a cortar gastos. He disse que os governos locais poderiam comprar casas para começar a lidar com o grande número de apartamentos vazios.
As casas compradas pelo governo seriam então usadas para fornecer moradias econômicas. Ele não deu nenhum detalhe sobre quando esse programa começaria ou como seria financiado.
A abordagem é semelhante ao Troubled Asset Relief Program (Programa de Alívio de Ativos Problemáticos), ou Tarp, que o governo dos EUA criou em 2008 para comprar ativos problemáticos após o colapso do mercado imobiliário americano, disse Larry Hu, economista-chefe para a China do Macquarie Group, uma empresa financeira australiana.
“Trata-se de uma mudança de política no sentido de que agora os governos locais estão entrando no mercado para comprar propriedades diretamente”, disse Hu.
Alguns governos locais já estão testando discretamente a abordagem em cidades como Jinan, Tianjin e Qingdao, ao longo da costa da China, e Chengdu, no sul, mas esta é a primeira vez que uma autoridade sênior chinesa fala sobre isso em um cenário nacional.
Dirigindo-se a autoridades na semana passada, He disse que eles tinham de “travar a dura batalha” de lidar com todas as propriedades inacabadas em todo o país, de acordo com um relato oficial da mídia estatal chinesa Xinhua.
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Os dados oficiais do governo mostram que Pequim tem um longo caminho a percorrer para aumentar a confiança no mercado imobiliário. A quantidade de casas não vendidas está em um nível recorde, e os preços dos imóveis estão caindo em um ritmo recorde.
O estoque de casas não vendidas era equivalente a 748 milhões de metros quadrados (m²), em março, de acordo com o Escritório Nacional de Estatísticas da China. Em abril, os preços das casas novas em 70 cidades caíram 3,5% em relação ao ano anterior, enquanto os preços das casas existentes caíram 6,8%, ambas quedas recordes.
Horas após a divulgação dos números sobre os preços das casas na sexta-feira, o banco central da China tomou medidas para incentivar a compra de casas, reduzindo os requisitos para o pagamento da entrada. Ele também eliminou a taxa de juros de hipotecas em todo o país.
“Os formuladores de políticas estão desesperados para impulsionar as vendas”, disse Rosealea Yao, especialista em imóveis da Gavekal, uma empresa de pesquisa com foco na China. O banco central vem reduzindo as taxas de hipoteca há vários anos e a taxa média antes dessa medida já estava em um nível recorde de baixa.
Os líderes da China estabeleceram uma meta de crescimento econômico de cerca de 5% este ano, um plano que muitos economistas independentes acreditam ser ambicioso e que exigirá gastos governamentais agressivos.
Para isso, a China também informou na sexta-feira que havia levantado US$ 5,5 bilhões (R$ 28 bilhões) com sua primeira venda de títulos de 30 anos, como parte de um esforço para levantar US$ 140 bilhões (R$ 721 bilhões) nos próximos seis meses.
A crise imobiliária da China foi alimentada por anos de empréstimos pesados por parte de incorporadoras imobiliárias e construções excessivas que sustentaram grande parte da notável série de décadas de rápido crescimento econômico do país.
Mas quando o governo finalmente interveio em 2020 para pôr fim às práticas arriscadas das incorporadoras, muitas empresas já estavam à beira do colapso. Uma de suas maiores incorporadoras imobiliárias, a China Evergrande, ficou inadimplente no final de 2021 devido a enormes pilhas de dívidas. Ela deixou para trás centenas de milhares de apartamentos inacabados e contas não pagas no valor de centenas de bilhões de dólares.
A crise imobiliária deixou muitas famílias chinesas, que antes investiam as economias de suas vidas em imóveis, sem alternativas viáveis para construir riqueza. Elas têm poucas outras boas opções, pois o mercado de ações da China, embora tenha se recuperado nos últimos meses, continua volátil.
A Evergrande foi a primeira de uma série de inadimplências de alto nível que agora pontuam o setor. Um tribunal de Hong Kong ordenou que a empresa fosse liquidada em janeiro. Outro gigante imobiliário em dificuldades, a Country Garden, teve sua primeira audiência na semana passada em um tribunal de Hong Kong, em um processo movido por um investidor que busca a liquidação da empresa.
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