O Brasil ocupa posição privilegiada no mundo para traçar uma rota de desenvolvimento que combine a busca por crescimento econômico com a preocupação em criar uma infraestrutura verde e resiliente. Se não adotar esse caminho, no entanto, pode ver a pobreza extrema aumentar nos próximos anos, como efeito dos choques climáticos. É o que aponta relatório do Banco Mundial, que sustenta que a opção por uma economia sustentável não custará mais caro ao País.
O estudo estima que as questões climáticas podem levar de 800 mil a 3 milhões de brasileiros à pobreza extrema em 2030. Segundo o relatório, isso se deve ao fato de “reduções do rendimento agrícola relacionadas ao clima, eventos climáticos extremos, alterações nos preços dos alimentos, impactos na saúde e redução da produtividade do trabalho devido ao calor” serem fatores que exacerbam a pobreza.
“Há um forte alinhamento entre o que o Brasil tem que fazer para acelerar sua jornada para um status de país de renda alta e o que precisa ser feito na frente de mudanças climáticas”, afirma Stephane Hallegate, consultor sênior de mudanças climáticas do Banco Mundial e co-autor do Relatório Sobre Clima e Desenvolvimento Para o País a respeito do Brasil. O Banco Mundial já elaborou relatórios desse tipo sobre 26 países, nos quais aponta caminhos para combinar o desenvolvimento econômico com a preocupação climática.
O documento ainda aponta que eventos climáticos extremos causam perdas de R$ 13 bilhões (US$ 2,6 bilhões, ou 0,1% do PIB de 2022) por ano em média e afetam a competitividade econômica do País.
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Segundo o diretor do Banco Mundial para o Brasil, Johannes Zutt, o País deve aproveitar sua vantagem em energia renovável para se tornar potência de energia limpa ao mesmo tempo em que implementa um plano para proteger a floresta amazônica. Com isso, argumentam os pesquisadores, o Brasil poderia atingir a meta de acabar com o desmatamento ilegal em 2028 e alcançar o desmatamento líquido zero em 2050 sem comprometer o desenvolvimento da região.
As necessidades de investimento anual adicional para trilhar o caminho estimulado pelo Banco Mundial são de cerca de 0,8% do PIB entre 2022 e 2030 e de 1,2% entre 2022 e 2050. Isso representa aumento de cerca de 20% na comparação com os investimentos que os pesquisadores entendem que o país terá que fazer de qualquer maneira.
O ponto crítico, segundo o relatório, é o investimento em infraestrutura, que vem caindo no País. “Muitos desses investimentos adicionais seriam pagos por economias, com mais eficiência, menos consumo, menos poluição, então é um bom negócio economicamente, mas claro que ainda é 0,8% do PIB”, afirma Hallegate. Alcançar esse investimento exigirá, segundo eles, empenho do setor público e do setor privado.
O perfil brasileiro de emissões é diferente do resto do mundo. A maior parte (76%) das emissões do País entre 2000 e 2020 deriva de mudanças no uso do solo, o que inclui desmatamento e agricultura. Globalmente, esse índice é de 18%. De outro lado, a energia do País é considerada limpa, pois quase metade da energia produzida no Brasil vem de fontes renováveis, em contraste com a média de 15% a 27% no resto do mundo.
“O Brasil é um grande emissor de gases de efeito estufa não porque usa combustíveis sujos, mas porque ele continua cortando florestas para extrair madeira e expandir a agricultura”, afirma Johannes Zutt.
“Com 21% da floresta amazônica já cortada, o restante está se aproximando rapidamente de um ponto crítico, além do qual seu ciclo vital será irreparavelmente interrompido. Isso terá impactos devastadores em toda a América Latina e particularmente para o Brasil”, diz Zutt. O relatório considera que um possível ponto de inflexão na Amazônia teria impacto sobre o PIB acumulado do Brasil até 2050 de aproximadamente R$ 920 bilhões.
O estudo sustenta que o custo de apostar em energia limpa, no Brasil, é equivalente ao de usar combustíveis fósseis. Os custos de investimento iniciais, no entanto, seriam mais altos para geração, transmissão e armazenamento. Na leitura dos pesquisadores, isso seria “totalmente compensado por economias em termos de combustível e operações”.
“O Brasil é um caso especial no que se refere a mudanças climáticas”, afirma Hallegate. Segundo ele, isso se deve tanto pela proximidade de um ponto de inflexão preocupante na Amazônia como pela oportunidade de conciliar o desenvolvimento econômico com a questão climática. “Todas essas coisas que são importantes para erradicar a pobreza e alcançar o desenvolvimento econômico também ajudariam na questão climática. E esse não é o caso em todos os países. Esse alinhamento é particularmente forte o Brasil”, afirma o co-autor do relatório.
Para fazer isso acontecer, o relatório aponta que o país precisa de reformas estruturais e medidas de aumento da produtividade, políticas econômicas abrangentes para o crescimento resiliente e de baixo carbono, políticas setoriais e pacotes de investimentos, e financiamento dos investimentos necessários. Isso inclui uma reforma no sistema de subsídios para eliminar aqueles ligados a atividades intensivas em emissões e introdução de um imposto sobre o carbono.
Entre os 26 países analisados até o momento, o Brasil possui um dos mais baixos custos de investimento. “Mas o mundo está se movendo muito rápido”, diz o pesquisador.
“O papel do setor privado é crítico. Vou dar exemplos concretos: na agricultura, temos a agricultura que aposta na sustentabilidade, que utiliza menos água, menos fertilizante, que aumenta a produtividade por hectare e é óbvio que se aumentarmos a produtividade nos terrenos agrícolas que já existem hoje, vamos diminuir a pressão sobre o desmatamento na Amazônia”, diz Carlos Leiria Pinto, gerente da International Finance Corporation (IFC), braço financeiro do Banco Mundial, para o Brasil. Ele também cita a área de energia e a de construções verdes como setores onde o setor privado pode ter papel decisivo nos investimentos.