Bancos de médio porte e fintechs apresentaram à registradora Nuclea uma proposta de ajuste na portabilidade de conta salário, e esperam ter o apoio dos grandes bancos para que as mudanças sejam implementadas. As instituições querem ganhar competitividade junto aos clientes que entram nos bancos via folhas de pagamento, instrumento que ainda é chave para garantir a fidelidade do público.
Neste mês, a Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que representa instituições de médio e pequenos portes e algumas fintechs, enviou à Nuclea um documento com sugestões que poderiam ser implementadas sem a necessidade de aprovação pelo Banco Central.
Uma das sugestões do documento, ao qual à Coluna teve acesso, é que as solicitações deixem de exigir do cliente o CNPJ do empregador. Segundo a ABBC, de cada dez recusas de portabilidade, seis estão relacionadas a divergências no número do CNPJ. Como alternativa, a ABBC sugere que os bancos validem o pedido apenas com os oito primeiros dígitos do CNPJ.
A ABBC pede ainda que se analise as recusas relacionadas ao motivo “CPF não encontrado”. De acordo com a entidade, como o banco original e o que busca “ganhar” a conta têm acesso aos dados do cliente, este fator não deveria ter o peso que tem hoje no total de recusas de portabilidade.
As instituições também sugerem que os motivos de recusa de portabilidade sejam padronizados, com a criação de um manual pela Nuclea. Além disso, propõem que o prazo para que os pedidos sejam analisados caia de dez dias úteis para cinco, sob o argumento de que o atual prazo não é compatível com as possibilidades de transferência instantânea de recursos existentes no País.
A Nuclea, uma sociedade entre dezenas de bancos, é a responsável por registrar e processar os pedidos de portabilidade de crédito. Os bancos de menor porte consideram que o processo atual é burocrático e que a falta de um padrão não apenas impede que mais pedidos de mudança de banco sejam aceitos como também dificulta a solução de problemas.
Um dos pedidos que as instituições fazem à empresa é que os relatórios e apresentações sobre a portabilidade sejam disponibilizados no site da Nuclea. Hoje, estes dados ficam restritos às instituições financeiras.
Por meio de nota, a Nuclea disse que “a portabilidade de conta-salário é autorregulada e depende da aprovação do mercado para a implementação de melhorias ou ajustes sistêmicos. “A fim de evoluir constantemente e prover a melhor experiência para o solicitante da portabilidade de conta-salário, a Núclea promove conversas regulares com o mercado e todos os entes do setor financeiro, incluindo a ABBC e a Febraban.”
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou, por meio de nota, que entende que “toda evolução sistêmica e operacional que traga maior benefício e transparência ao cliente é importante”, mas ressaltou que é necessário ter cuidado para não expor os clientes a fraudes ou golpes. “A proposta da ABBC à Nuclea visa reduzir as recusas por erros de preenchimento, simplificando o preenchimento dos dados da fonte pagadora, exigindo apenas o CNPJ raiz da fonte pagadora ao invés do CNPJ completo”, disse a entidade.
Demanda das fintechs por nova portabilidade é antiga
A demanda das fintechs por mudanças na portabilidade de salário é antiga. Em paralelo ao pedido feito pela ABBC, entidades como a Zetta, que representa o Nubank, buscam junto ao BC mudanças como a portabilidade através das transferências inteligentes via Pix, já em implementação dentro do Open Finance desde meados de abril. Um dos avanços já obtidos foi a inclusão dos dados dos empregadores, que permitiu o preenchimento automático das informações, o que eliminou inconsistências que antes levavam à rejeição de pedidos.
A portabilidade de salário é vista por essas instituições como uma forma de contornar uma das vantagens dos bancos tradicionais, que é a gestão das folhas de pagamento das empresas. Ao deterem as contas pelas quais as empresas pagam seus funcionários, os bancos conseguem capturar receitas com as transações que estes clientes fazem. E têm acesso a depósitos de custo zero através das contas correntes, o que cria um financiamento barato à concessão de crédito.
Segundo a Zetta, as transferências inteligentes - que funcionam como uma automação de movimentações via Pix - viabilizaram a portabilidade na prática, já que seria possível programar transferências da conta onde se recebe o salário para uma conta em outra instituição.
O problema é que, hoje, contas-salário não podem ser movimentadas por Pix e, portanto, ficariam fora das transações inteligentes. Para avançar nesse tema, é necessário fazer mudanças na resolução número 5.058, do Conselho Monetário Nacional (CMN), que disciplina o funcionamento desse tipo de conta.
“A primeira etapa seria as transferências inteligentes estarem funcionando super bem e o segundo ponto, mais importante, é um pequeno ajuste regulatório. Aí, conseguiríamos fazer a portabilidade de salários na prática”, diz o presidente da Zetta, Eduardo Lopes. “Do ponto de vista técnico, o ajuste de permitir que a conta-salário seja movimentada via Pix tem um desenvolvimento baixo”, completa Letícia Novaes, advogada da entidade.
Procurados, o Banco Central e a ABBC não responderam até o fechamento desta reportagem.
Este texto foi publicado no Broadcast no dia 30/07/24, às 16h55.
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