Bastidores do mundo dos negócios

Houve overdose de IPOs que eram pastel de vento, diz Ricardo K, da RK Partners


Por Irany Tereza
Ricardo K, da RK Partners:  ano perdido para grandes operações    Foto: Felipe Rau/Estadão

Sócio e CEO da RK Partners, Ricardo Knoepfelmacher atua especificamente na reestruturação de grandes empresas e tem certa predileção pelos casos mais complexos. Ganhou fama com casos notórios como o do Grupo X, de Eike Batista, e o da Odebrecht (hoje, Novonor). No ano passado, afirmou que a enxurrada de operações de abertura de capital (IPOs, na sigla em inglês) estava sendo motivada, em grande parte, por dificuldades financeiras das empresas e não por planos de crescimento. Também havia previsto em torno de 500 casos de recuperação judicial no pós-pandemia, o que acabou não acontecendo.

Ao programa Olhar de Líder, do Broadcast, Ricardo K, como é mais conhecido, disse que sua consultoria teve de recusar "uns 20" pedidos de assessoramento, tamanha foi a procura no último ano. Disse não acreditar em venda da Braskem ou de qualquer outro grande ativo enquanto os cenários internacional e doméstico continuarem nebulosos e afirmou que quem pagou a conta dos IPOs mal avaliados foi o investidor.

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"Houve uma overdose de empresas superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento", afirmou.

A seguir, o resumo da entrevista de Ricardo K. A íntegra pode ser conferida em vídeo no Broadcast TV.

Broadcast: Acredita que suas projeções se confirmaram?

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Ricardo K: Parcialmente. Vivemos um momento parecido com o de 2015/2016, com taxas de juros muito altas. Imagina o custo da dívida das grandes empresas, que achavam que não estavam alavancadas e agora estão pagando perto de 20% de juros ao ano e não conseguem repassar tudo para o preço final dos produtos. Acho que haverá uma concentração maior dessas reestruturações no primeiro semestre do ano que vem. A enxurrada de recuperações não ocorreu. Na prática, em 2021 tivemos decréscimo substancial: foram 891 recuperações, comparado com 1.179 em 2020. Dessas 891, apenas 90 faturavam mais do que R$ 300 milhões por ano. Esse instrumento de RJ é um remédio usado por empresas grandes. Em geral não é usado pelas pequenas porque é caro.

Broadcast: A que atribui o fato de grandes empresas estarem conseguindo atravessar a crise?

Ricardo K: À rolagem das dívidas. Todos os cinco grandes bancos brasileiros criaram uma área de reestruturação. Eles se anteciparam e, antes que as empresas piorassem sua situação de servir a dívida, negociaram a rolagem. Há um grupo de empresas que ainda está pagando, mas com dificuldade, e que tem alavancagem acima de 3,5 vezes o Ebitda. São empresas que, com uma taxa Selic de 13,75%, estão bem sufocadas. Por isso acho que ano que vem será diferente. Mas, até agora, surpreendentemente, exceto para setores específicos, o impacto foi muito menor do que todos antevíamos.

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Broadcast: Houve aumento de demanda na RK Partners durante a pandemia?

Ricardo K: Tivemos. Mas, fazendo uma analogia, somos como uma alta costura. Não pegamos muitos casos ao mesmo tempo. Tivemos que recusar muitos casos nesse processo. Aceitamos, em média, de seis a oito casos por ano; tivemos uns 20 que não conseguimos pegar. Este foi um mercado que se desenvolveu bastante. Vários concorrentes surgiram do nada. Gente que fazia IPO e M&A (fusões e aquisições) passou a achar que reestruturação era um bom negócio, mesmo sem entender do assunto. Acho que agora vai haver uma depuração do mercado.

Broadcast: Algum caso que possa citar?

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Ricardo K: Tivemos alguns bons casos. A PDG talvez seja o melhor deles, inclusive está saindo da recuperação judicial. A empresa chegou a ter 641 canteiros de obras simultâneos, sendo maior real state do Brasil. Outra que está indo muito bem, apesar da RJ muito complexa, é a Novonor. Lá tivemos que aprovar 22 planos diferentes. As pessoas acham que quando é um grande grupo é mais fácil aprovar um grande plano, mas às vezes temos que aprovar por cada CNPJ. Agora é uma questão de implementar os planos aprovados. A grande questão é como a empresa de engenharia se viabiliza num mercado grande, com alguma demanda reprimida, mas sem grandes projetos estruturantes de infra. No caso da Novonor tem também a questão da Braskem que, na prática, é dos credores, mas que eles ainda não venderam. Mas, do ponto de vista da nossa contratação para a criação de um plano que fosse factível e isso foi um sucesso.

Broadcast: A venda da Braskem foi meio atropelada. Acredita que ainda pode acontecer este ano ou no que vem?

Ricardo K: Acho que este ano não vai acontecer nada. É um ano perdido para grandes operações. Além da turbulência política não se sabe o que vai acontecer com a guerra da Ucrânia, com o preço do petróleo, quanto tempo os juros ficarão tão altos para segurar a inflação. É difícil vender um ativo tão bom por um preço aviltado porque há uma crise. Entendo a postura dos bancos de segurarem um pouco porque é um ativo excelente e que paga bons dividendos. Não está queimando na mão dos bancos. Não só Braskem, mas outros grandes ativos. Fora a "vitória de Pirro" da Eletrobras, não haverá grandes operações acontecendo e há compras de empresas pequenas nesse M&A frenético.

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Broadcast: Mantém a afirmação de que empresas recorreram à abertura de capital para fugir da recuperação judicial?

Ricardo K: A gente teve no ano passado vários casos muito interessantes de empresas que vinham conversar pensando numa recuperação judicial. Duas semanas depois, a gente via que o cara estava indo fazer o IPO. Várias empresas conseguiram. O mercado, às vezes, não olha com a devida atenção. Eram empresas com saúde financeira muito frágil. Em 2021, das 73 empresas que abriram capital, 57 hoje valem menos do que valiam. Houve grande frustração para o acionista, entretanto foi um dinheiro fácil que elas conseguiram captar sem precisar aumentar o endividamento. Quem perdeu foram os investidores, em alguns casos, 95% em um ano. Especialmente nas empresas de tecnologia vários sonhos foram vendidos, mas eram falácias. Este ano, 110 empresas já desistiram do IPO. É um ano seco. O que está tendo é uma volta do mercado de M&A. Talvez o mercado de fusões e aquisições cresça 25% em cima do ano passado.

Broadcast: O IPO para evitar a RJ foi estratégia que deu certo para empresa e errado para o investidor?

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Ricardo K: É exatamente isso. Deu certo para a empresa, mas muitas delas ficaram com um problema de credibilidade. Isso começou a ficar muito claro a partir de agosto do ano passado. Na prática outras empresas não conseguiram ir para a listagem na Bolsa porque o mercado começou a ver que a realidade era: a empresa abre o capital e um mês depois vale a metade. O pessoal faz a conta. Mas, do ponto de vista de resolver o problema de financiamento da companhia sem pegar empréstimo novo, o dinheiro quem perdeu foi o acionista. Vários conhecidos estavam encantados com este momento da economia brasileira, e eu alertei que ao menos metade não ia funcionar. E o que a gente vê é que em 78% dos casos as empresas hoje valem menos do que quando abriram o capital. Isso num ano. Então, quem pagou a conta foi o investidor.

Broadcast: Isso não é ludibriar o investidor?

Ricardo K: Essa é uma palavra meio forte. Na prática, todos contratam bons advogados e têm todas as ressalvas possíveis para dizer por que não deu certo o investimento de risco. Não sei se tem solução, a não ser os próprios investidores se assessorarem melhor para não cair nesse conto do vigário. Isso é uma coisa meio pendular na economia brasileira. Acho que vai demorar um tempo para voltar o IPO. As pessoas falam muito que o problema é da instabilidade política, das eleições etc. Acho que tem dois grandes problemas. O primeiro é que há uma renda fixa rendendo muito e, nos próximos dois anos, o Brasil vai continuar rentista. O segundo é que, de fato, houve uma overdose de empresa superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento.

Broadcast: Como a está a parceria com o Itaú anunciada no ano passado para a criação de um fundo para empresas estressadas, que captaria R$ 500 milhões?

Ricardo K: Anunciamos a parceria no ano passado e começamos a captação há três meses. Está indo superbem. Não posso antecipar, mas as notícias são muito boas, o que nos orgulha muito porque é um ano muito difícil para captação e estamos muito confortáveis e estamos ultimando isso nas próximas semanas. Mas, superou nossas expectativas. Já temos um grupo de potenciais empresas para esse crédito especial, várias negociações bem avançadas, além de um fechamento acredito acima do que havíamos proposto. Vamos conseguir ter casos muito em breve.

Broadcast: Sobre CSN e Samarco...

Ricardo K: Não vou falar porque a CSN é uma empresa aberta. Estamos honrados por termos sido chamados para um caso tão interessante e complexo que pode ajudar muito tanto a Samarco quanto a CSN.

 

Esta entrevista foi publicada no Broadcast+ no dia 01/09/2022, às 17h16

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Ricardo K, da RK Partners:  ano perdido para grandes operações    Foto: Felipe Rau/Estadão

Sócio e CEO da RK Partners, Ricardo Knoepfelmacher atua especificamente na reestruturação de grandes empresas e tem certa predileção pelos casos mais complexos. Ganhou fama com casos notórios como o do Grupo X, de Eike Batista, e o da Odebrecht (hoje, Novonor). No ano passado, afirmou que a enxurrada de operações de abertura de capital (IPOs, na sigla em inglês) estava sendo motivada, em grande parte, por dificuldades financeiras das empresas e não por planos de crescimento. Também havia previsto em torno de 500 casos de recuperação judicial no pós-pandemia, o que acabou não acontecendo.

Ao programa Olhar de Líder, do Broadcast, Ricardo K, como é mais conhecido, disse que sua consultoria teve de recusar "uns 20" pedidos de assessoramento, tamanha foi a procura no último ano. Disse não acreditar em venda da Braskem ou de qualquer outro grande ativo enquanto os cenários internacional e doméstico continuarem nebulosos e afirmou que quem pagou a conta dos IPOs mal avaliados foi o investidor.

"Houve uma overdose de empresas superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento", afirmou.

A seguir, o resumo da entrevista de Ricardo K. A íntegra pode ser conferida em vídeo no Broadcast TV.

Broadcast: Acredita que suas projeções se confirmaram?

Ricardo K: Parcialmente. Vivemos um momento parecido com o de 2015/2016, com taxas de juros muito altas. Imagina o custo da dívida das grandes empresas, que achavam que não estavam alavancadas e agora estão pagando perto de 20% de juros ao ano e não conseguem repassar tudo para o preço final dos produtos. Acho que haverá uma concentração maior dessas reestruturações no primeiro semestre do ano que vem. A enxurrada de recuperações não ocorreu. Na prática, em 2021 tivemos decréscimo substancial: foram 891 recuperações, comparado com 1.179 em 2020. Dessas 891, apenas 90 faturavam mais do que R$ 300 milhões por ano. Esse instrumento de RJ é um remédio usado por empresas grandes. Em geral não é usado pelas pequenas porque é caro.

Broadcast: A que atribui o fato de grandes empresas estarem conseguindo atravessar a crise?

Ricardo K: À rolagem das dívidas. Todos os cinco grandes bancos brasileiros criaram uma área de reestruturação. Eles se anteciparam e, antes que as empresas piorassem sua situação de servir a dívida, negociaram a rolagem. Há um grupo de empresas que ainda está pagando, mas com dificuldade, e que tem alavancagem acima de 3,5 vezes o Ebitda. São empresas que, com uma taxa Selic de 13,75%, estão bem sufocadas. Por isso acho que ano que vem será diferente. Mas, até agora, surpreendentemente, exceto para setores específicos, o impacto foi muito menor do que todos antevíamos.

Broadcast: Houve aumento de demanda na RK Partners durante a pandemia?

Ricardo K: Tivemos. Mas, fazendo uma analogia, somos como uma alta costura. Não pegamos muitos casos ao mesmo tempo. Tivemos que recusar muitos casos nesse processo. Aceitamos, em média, de seis a oito casos por ano; tivemos uns 20 que não conseguimos pegar. Este foi um mercado que se desenvolveu bastante. Vários concorrentes surgiram do nada. Gente que fazia IPO e M&A (fusões e aquisições) passou a achar que reestruturação era um bom negócio, mesmo sem entender do assunto. Acho que agora vai haver uma depuração do mercado.

Broadcast: Algum caso que possa citar?

Ricardo K: Tivemos alguns bons casos. A PDG talvez seja o melhor deles, inclusive está saindo da recuperação judicial. A empresa chegou a ter 641 canteiros de obras simultâneos, sendo maior real state do Brasil. Outra que está indo muito bem, apesar da RJ muito complexa, é a Novonor. Lá tivemos que aprovar 22 planos diferentes. As pessoas acham que quando é um grande grupo é mais fácil aprovar um grande plano, mas às vezes temos que aprovar por cada CNPJ. Agora é uma questão de implementar os planos aprovados. A grande questão é como a empresa de engenharia se viabiliza num mercado grande, com alguma demanda reprimida, mas sem grandes projetos estruturantes de infra. No caso da Novonor tem também a questão da Braskem que, na prática, é dos credores, mas que eles ainda não venderam. Mas, do ponto de vista da nossa contratação para a criação de um plano que fosse factível e isso foi um sucesso.

Broadcast: A venda da Braskem foi meio atropelada. Acredita que ainda pode acontecer este ano ou no que vem?

Ricardo K: Acho que este ano não vai acontecer nada. É um ano perdido para grandes operações. Além da turbulência política não se sabe o que vai acontecer com a guerra da Ucrânia, com o preço do petróleo, quanto tempo os juros ficarão tão altos para segurar a inflação. É difícil vender um ativo tão bom por um preço aviltado porque há uma crise. Entendo a postura dos bancos de segurarem um pouco porque é um ativo excelente e que paga bons dividendos. Não está queimando na mão dos bancos. Não só Braskem, mas outros grandes ativos. Fora a "vitória de Pirro" da Eletrobras, não haverá grandes operações acontecendo e há compras de empresas pequenas nesse M&A frenético.

Broadcast: Mantém a afirmação de que empresas recorreram à abertura de capital para fugir da recuperação judicial?

Ricardo K: A gente teve no ano passado vários casos muito interessantes de empresas que vinham conversar pensando numa recuperação judicial. Duas semanas depois, a gente via que o cara estava indo fazer o IPO. Várias empresas conseguiram. O mercado, às vezes, não olha com a devida atenção. Eram empresas com saúde financeira muito frágil. Em 2021, das 73 empresas que abriram capital, 57 hoje valem menos do que valiam. Houve grande frustração para o acionista, entretanto foi um dinheiro fácil que elas conseguiram captar sem precisar aumentar o endividamento. Quem perdeu foram os investidores, em alguns casos, 95% em um ano. Especialmente nas empresas de tecnologia vários sonhos foram vendidos, mas eram falácias. Este ano, 110 empresas já desistiram do IPO. É um ano seco. O que está tendo é uma volta do mercado de M&A. Talvez o mercado de fusões e aquisições cresça 25% em cima do ano passado.

Broadcast: O IPO para evitar a RJ foi estratégia que deu certo para empresa e errado para o investidor?

Ricardo K: É exatamente isso. Deu certo para a empresa, mas muitas delas ficaram com um problema de credibilidade. Isso começou a ficar muito claro a partir de agosto do ano passado. Na prática outras empresas não conseguiram ir para a listagem na Bolsa porque o mercado começou a ver que a realidade era: a empresa abre o capital e um mês depois vale a metade. O pessoal faz a conta. Mas, do ponto de vista de resolver o problema de financiamento da companhia sem pegar empréstimo novo, o dinheiro quem perdeu foi o acionista. Vários conhecidos estavam encantados com este momento da economia brasileira, e eu alertei que ao menos metade não ia funcionar. E o que a gente vê é que em 78% dos casos as empresas hoje valem menos do que quando abriram o capital. Isso num ano. Então, quem pagou a conta foi o investidor.

Broadcast: Isso não é ludibriar o investidor?

Ricardo K: Essa é uma palavra meio forte. Na prática, todos contratam bons advogados e têm todas as ressalvas possíveis para dizer por que não deu certo o investimento de risco. Não sei se tem solução, a não ser os próprios investidores se assessorarem melhor para não cair nesse conto do vigário. Isso é uma coisa meio pendular na economia brasileira. Acho que vai demorar um tempo para voltar o IPO. As pessoas falam muito que o problema é da instabilidade política, das eleições etc. Acho que tem dois grandes problemas. O primeiro é que há uma renda fixa rendendo muito e, nos próximos dois anos, o Brasil vai continuar rentista. O segundo é que, de fato, houve uma overdose de empresa superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento.

Broadcast: Como a está a parceria com o Itaú anunciada no ano passado para a criação de um fundo para empresas estressadas, que captaria R$ 500 milhões?

Ricardo K: Anunciamos a parceria no ano passado e começamos a captação há três meses. Está indo superbem. Não posso antecipar, mas as notícias são muito boas, o que nos orgulha muito porque é um ano muito difícil para captação e estamos muito confortáveis e estamos ultimando isso nas próximas semanas. Mas, superou nossas expectativas. Já temos um grupo de potenciais empresas para esse crédito especial, várias negociações bem avançadas, além de um fechamento acredito acima do que havíamos proposto. Vamos conseguir ter casos muito em breve.

Broadcast: Sobre CSN e Samarco...

Ricardo K: Não vou falar porque a CSN é uma empresa aberta. Estamos honrados por termos sido chamados para um caso tão interessante e complexo que pode ajudar muito tanto a Samarco quanto a CSN.

 

Esta entrevista foi publicada no Broadcast+ no dia 01/09/2022, às 17h16

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Ricardo K, da RK Partners:  ano perdido para grandes operações    Foto: Felipe Rau/Estadão

Sócio e CEO da RK Partners, Ricardo Knoepfelmacher atua especificamente na reestruturação de grandes empresas e tem certa predileção pelos casos mais complexos. Ganhou fama com casos notórios como o do Grupo X, de Eike Batista, e o da Odebrecht (hoje, Novonor). No ano passado, afirmou que a enxurrada de operações de abertura de capital (IPOs, na sigla em inglês) estava sendo motivada, em grande parte, por dificuldades financeiras das empresas e não por planos de crescimento. Também havia previsto em torno de 500 casos de recuperação judicial no pós-pandemia, o que acabou não acontecendo.

Ao programa Olhar de Líder, do Broadcast, Ricardo K, como é mais conhecido, disse que sua consultoria teve de recusar "uns 20" pedidos de assessoramento, tamanha foi a procura no último ano. Disse não acreditar em venda da Braskem ou de qualquer outro grande ativo enquanto os cenários internacional e doméstico continuarem nebulosos e afirmou que quem pagou a conta dos IPOs mal avaliados foi o investidor.

"Houve uma overdose de empresas superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento", afirmou.

A seguir, o resumo da entrevista de Ricardo K. A íntegra pode ser conferida em vídeo no Broadcast TV.

Broadcast: Acredita que suas projeções se confirmaram?

Ricardo K: Parcialmente. Vivemos um momento parecido com o de 2015/2016, com taxas de juros muito altas. Imagina o custo da dívida das grandes empresas, que achavam que não estavam alavancadas e agora estão pagando perto de 20% de juros ao ano e não conseguem repassar tudo para o preço final dos produtos. Acho que haverá uma concentração maior dessas reestruturações no primeiro semestre do ano que vem. A enxurrada de recuperações não ocorreu. Na prática, em 2021 tivemos decréscimo substancial: foram 891 recuperações, comparado com 1.179 em 2020. Dessas 891, apenas 90 faturavam mais do que R$ 300 milhões por ano. Esse instrumento de RJ é um remédio usado por empresas grandes. Em geral não é usado pelas pequenas porque é caro.

Broadcast: A que atribui o fato de grandes empresas estarem conseguindo atravessar a crise?

Ricardo K: À rolagem das dívidas. Todos os cinco grandes bancos brasileiros criaram uma área de reestruturação. Eles se anteciparam e, antes que as empresas piorassem sua situação de servir a dívida, negociaram a rolagem. Há um grupo de empresas que ainda está pagando, mas com dificuldade, e que tem alavancagem acima de 3,5 vezes o Ebitda. São empresas que, com uma taxa Selic de 13,75%, estão bem sufocadas. Por isso acho que ano que vem será diferente. Mas, até agora, surpreendentemente, exceto para setores específicos, o impacto foi muito menor do que todos antevíamos.

Broadcast: Houve aumento de demanda na RK Partners durante a pandemia?

Ricardo K: Tivemos. Mas, fazendo uma analogia, somos como uma alta costura. Não pegamos muitos casos ao mesmo tempo. Tivemos que recusar muitos casos nesse processo. Aceitamos, em média, de seis a oito casos por ano; tivemos uns 20 que não conseguimos pegar. Este foi um mercado que se desenvolveu bastante. Vários concorrentes surgiram do nada. Gente que fazia IPO e M&A (fusões e aquisições) passou a achar que reestruturação era um bom negócio, mesmo sem entender do assunto. Acho que agora vai haver uma depuração do mercado.

Broadcast: Algum caso que possa citar?

Ricardo K: Tivemos alguns bons casos. A PDG talvez seja o melhor deles, inclusive está saindo da recuperação judicial. A empresa chegou a ter 641 canteiros de obras simultâneos, sendo maior real state do Brasil. Outra que está indo muito bem, apesar da RJ muito complexa, é a Novonor. Lá tivemos que aprovar 22 planos diferentes. As pessoas acham que quando é um grande grupo é mais fácil aprovar um grande plano, mas às vezes temos que aprovar por cada CNPJ. Agora é uma questão de implementar os planos aprovados. A grande questão é como a empresa de engenharia se viabiliza num mercado grande, com alguma demanda reprimida, mas sem grandes projetos estruturantes de infra. No caso da Novonor tem também a questão da Braskem que, na prática, é dos credores, mas que eles ainda não venderam. Mas, do ponto de vista da nossa contratação para a criação de um plano que fosse factível e isso foi um sucesso.

Broadcast: A venda da Braskem foi meio atropelada. Acredita que ainda pode acontecer este ano ou no que vem?

Ricardo K: Acho que este ano não vai acontecer nada. É um ano perdido para grandes operações. Além da turbulência política não se sabe o que vai acontecer com a guerra da Ucrânia, com o preço do petróleo, quanto tempo os juros ficarão tão altos para segurar a inflação. É difícil vender um ativo tão bom por um preço aviltado porque há uma crise. Entendo a postura dos bancos de segurarem um pouco porque é um ativo excelente e que paga bons dividendos. Não está queimando na mão dos bancos. Não só Braskem, mas outros grandes ativos. Fora a "vitória de Pirro" da Eletrobras, não haverá grandes operações acontecendo e há compras de empresas pequenas nesse M&A frenético.

Broadcast: Mantém a afirmação de que empresas recorreram à abertura de capital para fugir da recuperação judicial?

Ricardo K: A gente teve no ano passado vários casos muito interessantes de empresas que vinham conversar pensando numa recuperação judicial. Duas semanas depois, a gente via que o cara estava indo fazer o IPO. Várias empresas conseguiram. O mercado, às vezes, não olha com a devida atenção. Eram empresas com saúde financeira muito frágil. Em 2021, das 73 empresas que abriram capital, 57 hoje valem menos do que valiam. Houve grande frustração para o acionista, entretanto foi um dinheiro fácil que elas conseguiram captar sem precisar aumentar o endividamento. Quem perdeu foram os investidores, em alguns casos, 95% em um ano. Especialmente nas empresas de tecnologia vários sonhos foram vendidos, mas eram falácias. Este ano, 110 empresas já desistiram do IPO. É um ano seco. O que está tendo é uma volta do mercado de M&A. Talvez o mercado de fusões e aquisições cresça 25% em cima do ano passado.

Broadcast: O IPO para evitar a RJ foi estratégia que deu certo para empresa e errado para o investidor?

Ricardo K: É exatamente isso. Deu certo para a empresa, mas muitas delas ficaram com um problema de credibilidade. Isso começou a ficar muito claro a partir de agosto do ano passado. Na prática outras empresas não conseguiram ir para a listagem na Bolsa porque o mercado começou a ver que a realidade era: a empresa abre o capital e um mês depois vale a metade. O pessoal faz a conta. Mas, do ponto de vista de resolver o problema de financiamento da companhia sem pegar empréstimo novo, o dinheiro quem perdeu foi o acionista. Vários conhecidos estavam encantados com este momento da economia brasileira, e eu alertei que ao menos metade não ia funcionar. E o que a gente vê é que em 78% dos casos as empresas hoje valem menos do que quando abriram o capital. Isso num ano. Então, quem pagou a conta foi o investidor.

Broadcast: Isso não é ludibriar o investidor?

Ricardo K: Essa é uma palavra meio forte. Na prática, todos contratam bons advogados e têm todas as ressalvas possíveis para dizer por que não deu certo o investimento de risco. Não sei se tem solução, a não ser os próprios investidores se assessorarem melhor para não cair nesse conto do vigário. Isso é uma coisa meio pendular na economia brasileira. Acho que vai demorar um tempo para voltar o IPO. As pessoas falam muito que o problema é da instabilidade política, das eleições etc. Acho que tem dois grandes problemas. O primeiro é que há uma renda fixa rendendo muito e, nos próximos dois anos, o Brasil vai continuar rentista. O segundo é que, de fato, houve uma overdose de empresa superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento.

Broadcast: Como a está a parceria com o Itaú anunciada no ano passado para a criação de um fundo para empresas estressadas, que captaria R$ 500 milhões?

Ricardo K: Anunciamos a parceria no ano passado e começamos a captação há três meses. Está indo superbem. Não posso antecipar, mas as notícias são muito boas, o que nos orgulha muito porque é um ano muito difícil para captação e estamos muito confortáveis e estamos ultimando isso nas próximas semanas. Mas, superou nossas expectativas. Já temos um grupo de potenciais empresas para esse crédito especial, várias negociações bem avançadas, além de um fechamento acredito acima do que havíamos proposto. Vamos conseguir ter casos muito em breve.

Broadcast: Sobre CSN e Samarco...

Ricardo K: Não vou falar porque a CSN é uma empresa aberta. Estamos honrados por termos sido chamados para um caso tão interessante e complexo que pode ajudar muito tanto a Samarco quanto a CSN.

 

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Sócio e CEO da RK Partners, Ricardo Knoepfelmacher atua especificamente na reestruturação de grandes empresas e tem certa predileção pelos casos mais complexos. Ganhou fama com casos notórios como o do Grupo X, de Eike Batista, e o da Odebrecht (hoje, Novonor). No ano passado, afirmou que a enxurrada de operações de abertura de capital (IPOs, na sigla em inglês) estava sendo motivada, em grande parte, por dificuldades financeiras das empresas e não por planos de crescimento. Também havia previsto em torno de 500 casos de recuperação judicial no pós-pandemia, o que acabou não acontecendo.

Ao programa Olhar de Líder, do Broadcast, Ricardo K, como é mais conhecido, disse que sua consultoria teve de recusar "uns 20" pedidos de assessoramento, tamanha foi a procura no último ano. Disse não acreditar em venda da Braskem ou de qualquer outro grande ativo enquanto os cenários internacional e doméstico continuarem nebulosos e afirmou que quem pagou a conta dos IPOs mal avaliados foi o investidor.

"Houve uma overdose de empresas superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento", afirmou.

A seguir, o resumo da entrevista de Ricardo K. A íntegra pode ser conferida em vídeo no Broadcast TV.

Broadcast: Acredita que suas projeções se confirmaram?

Ricardo K: Parcialmente. Vivemos um momento parecido com o de 2015/2016, com taxas de juros muito altas. Imagina o custo da dívida das grandes empresas, que achavam que não estavam alavancadas e agora estão pagando perto de 20% de juros ao ano e não conseguem repassar tudo para o preço final dos produtos. Acho que haverá uma concentração maior dessas reestruturações no primeiro semestre do ano que vem. A enxurrada de recuperações não ocorreu. Na prática, em 2021 tivemos decréscimo substancial: foram 891 recuperações, comparado com 1.179 em 2020. Dessas 891, apenas 90 faturavam mais do que R$ 300 milhões por ano. Esse instrumento de RJ é um remédio usado por empresas grandes. Em geral não é usado pelas pequenas porque é caro.

Broadcast: A que atribui o fato de grandes empresas estarem conseguindo atravessar a crise?

Ricardo K: À rolagem das dívidas. Todos os cinco grandes bancos brasileiros criaram uma área de reestruturação. Eles se anteciparam e, antes que as empresas piorassem sua situação de servir a dívida, negociaram a rolagem. Há um grupo de empresas que ainda está pagando, mas com dificuldade, e que tem alavancagem acima de 3,5 vezes o Ebitda. São empresas que, com uma taxa Selic de 13,75%, estão bem sufocadas. Por isso acho que ano que vem será diferente. Mas, até agora, surpreendentemente, exceto para setores específicos, o impacto foi muito menor do que todos antevíamos.

Broadcast: Houve aumento de demanda na RK Partners durante a pandemia?

Ricardo K: Tivemos. Mas, fazendo uma analogia, somos como uma alta costura. Não pegamos muitos casos ao mesmo tempo. Tivemos que recusar muitos casos nesse processo. Aceitamos, em média, de seis a oito casos por ano; tivemos uns 20 que não conseguimos pegar. Este foi um mercado que se desenvolveu bastante. Vários concorrentes surgiram do nada. Gente que fazia IPO e M&A (fusões e aquisições) passou a achar que reestruturação era um bom negócio, mesmo sem entender do assunto. Acho que agora vai haver uma depuração do mercado.

Broadcast: Algum caso que possa citar?

Ricardo K: Tivemos alguns bons casos. A PDG talvez seja o melhor deles, inclusive está saindo da recuperação judicial. A empresa chegou a ter 641 canteiros de obras simultâneos, sendo maior real state do Brasil. Outra que está indo muito bem, apesar da RJ muito complexa, é a Novonor. Lá tivemos que aprovar 22 planos diferentes. As pessoas acham que quando é um grande grupo é mais fácil aprovar um grande plano, mas às vezes temos que aprovar por cada CNPJ. Agora é uma questão de implementar os planos aprovados. A grande questão é como a empresa de engenharia se viabiliza num mercado grande, com alguma demanda reprimida, mas sem grandes projetos estruturantes de infra. No caso da Novonor tem também a questão da Braskem que, na prática, é dos credores, mas que eles ainda não venderam. Mas, do ponto de vista da nossa contratação para a criação de um plano que fosse factível e isso foi um sucesso.

Broadcast: A venda da Braskem foi meio atropelada. Acredita que ainda pode acontecer este ano ou no que vem?

Ricardo K: Acho que este ano não vai acontecer nada. É um ano perdido para grandes operações. Além da turbulência política não se sabe o que vai acontecer com a guerra da Ucrânia, com o preço do petróleo, quanto tempo os juros ficarão tão altos para segurar a inflação. É difícil vender um ativo tão bom por um preço aviltado porque há uma crise. Entendo a postura dos bancos de segurarem um pouco porque é um ativo excelente e que paga bons dividendos. Não está queimando na mão dos bancos. Não só Braskem, mas outros grandes ativos. Fora a "vitória de Pirro" da Eletrobras, não haverá grandes operações acontecendo e há compras de empresas pequenas nesse M&A frenético.

Broadcast: Mantém a afirmação de que empresas recorreram à abertura de capital para fugir da recuperação judicial?

Ricardo K: A gente teve no ano passado vários casos muito interessantes de empresas que vinham conversar pensando numa recuperação judicial. Duas semanas depois, a gente via que o cara estava indo fazer o IPO. Várias empresas conseguiram. O mercado, às vezes, não olha com a devida atenção. Eram empresas com saúde financeira muito frágil. Em 2021, das 73 empresas que abriram capital, 57 hoje valem menos do que valiam. Houve grande frustração para o acionista, entretanto foi um dinheiro fácil que elas conseguiram captar sem precisar aumentar o endividamento. Quem perdeu foram os investidores, em alguns casos, 95% em um ano. Especialmente nas empresas de tecnologia vários sonhos foram vendidos, mas eram falácias. Este ano, 110 empresas já desistiram do IPO. É um ano seco. O que está tendo é uma volta do mercado de M&A. Talvez o mercado de fusões e aquisições cresça 25% em cima do ano passado.

Broadcast: O IPO para evitar a RJ foi estratégia que deu certo para empresa e errado para o investidor?

Ricardo K: É exatamente isso. Deu certo para a empresa, mas muitas delas ficaram com um problema de credibilidade. Isso começou a ficar muito claro a partir de agosto do ano passado. Na prática outras empresas não conseguiram ir para a listagem na Bolsa porque o mercado começou a ver que a realidade era: a empresa abre o capital e um mês depois vale a metade. O pessoal faz a conta. Mas, do ponto de vista de resolver o problema de financiamento da companhia sem pegar empréstimo novo, o dinheiro quem perdeu foi o acionista. Vários conhecidos estavam encantados com este momento da economia brasileira, e eu alertei que ao menos metade não ia funcionar. E o que a gente vê é que em 78% dos casos as empresas hoje valem menos do que quando abriram o capital. Isso num ano. Então, quem pagou a conta foi o investidor.

Broadcast: Isso não é ludibriar o investidor?

Ricardo K: Essa é uma palavra meio forte. Na prática, todos contratam bons advogados e têm todas as ressalvas possíveis para dizer por que não deu certo o investimento de risco. Não sei se tem solução, a não ser os próprios investidores se assessorarem melhor para não cair nesse conto do vigário. Isso é uma coisa meio pendular na economia brasileira. Acho que vai demorar um tempo para voltar o IPO. As pessoas falam muito que o problema é da instabilidade política, das eleições etc. Acho que tem dois grandes problemas. O primeiro é que há uma renda fixa rendendo muito e, nos próximos dois anos, o Brasil vai continuar rentista. O segundo é que, de fato, houve uma overdose de empresa superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento.

Broadcast: Como a está a parceria com o Itaú anunciada no ano passado para a criação de um fundo para empresas estressadas, que captaria R$ 500 milhões?

Ricardo K: Anunciamos a parceria no ano passado e começamos a captação há três meses. Está indo superbem. Não posso antecipar, mas as notícias são muito boas, o que nos orgulha muito porque é um ano muito difícil para captação e estamos muito confortáveis e estamos ultimando isso nas próximas semanas. Mas, superou nossas expectativas. Já temos um grupo de potenciais empresas para esse crédito especial, várias negociações bem avançadas, além de um fechamento acredito acima do que havíamos proposto. Vamos conseguir ter casos muito em breve.

Broadcast: Sobre CSN e Samarco...

Ricardo K: Não vou falar porque a CSN é uma empresa aberta. Estamos honrados por termos sido chamados para um caso tão interessante e complexo que pode ajudar muito tanto a Samarco quanto a CSN.

 

Esta entrevista foi publicada no Broadcast+ no dia 01/09/2022, às 17h16

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Ricardo K, da RK Partners:  ano perdido para grandes operações    Foto: Felipe Rau/Estadão

Sócio e CEO da RK Partners, Ricardo Knoepfelmacher atua especificamente na reestruturação de grandes empresas e tem certa predileção pelos casos mais complexos. Ganhou fama com casos notórios como o do Grupo X, de Eike Batista, e o da Odebrecht (hoje, Novonor). No ano passado, afirmou que a enxurrada de operações de abertura de capital (IPOs, na sigla em inglês) estava sendo motivada, em grande parte, por dificuldades financeiras das empresas e não por planos de crescimento. Também havia previsto em torno de 500 casos de recuperação judicial no pós-pandemia, o que acabou não acontecendo.

Ao programa Olhar de Líder, do Broadcast, Ricardo K, como é mais conhecido, disse que sua consultoria teve de recusar "uns 20" pedidos de assessoramento, tamanha foi a procura no último ano. Disse não acreditar em venda da Braskem ou de qualquer outro grande ativo enquanto os cenários internacional e doméstico continuarem nebulosos e afirmou que quem pagou a conta dos IPOs mal avaliados foi o investidor.

"Houve uma overdose de empresas superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento", afirmou.

A seguir, o resumo da entrevista de Ricardo K. A íntegra pode ser conferida em vídeo no Broadcast TV.

Broadcast: Acredita que suas projeções se confirmaram?

Ricardo K: Parcialmente. Vivemos um momento parecido com o de 2015/2016, com taxas de juros muito altas. Imagina o custo da dívida das grandes empresas, que achavam que não estavam alavancadas e agora estão pagando perto de 20% de juros ao ano e não conseguem repassar tudo para o preço final dos produtos. Acho que haverá uma concentração maior dessas reestruturações no primeiro semestre do ano que vem. A enxurrada de recuperações não ocorreu. Na prática, em 2021 tivemos decréscimo substancial: foram 891 recuperações, comparado com 1.179 em 2020. Dessas 891, apenas 90 faturavam mais do que R$ 300 milhões por ano. Esse instrumento de RJ é um remédio usado por empresas grandes. Em geral não é usado pelas pequenas porque é caro.

Broadcast: A que atribui o fato de grandes empresas estarem conseguindo atravessar a crise?

Ricardo K: À rolagem das dívidas. Todos os cinco grandes bancos brasileiros criaram uma área de reestruturação. Eles se anteciparam e, antes que as empresas piorassem sua situação de servir a dívida, negociaram a rolagem. Há um grupo de empresas que ainda está pagando, mas com dificuldade, e que tem alavancagem acima de 3,5 vezes o Ebitda. São empresas que, com uma taxa Selic de 13,75%, estão bem sufocadas. Por isso acho que ano que vem será diferente. Mas, até agora, surpreendentemente, exceto para setores específicos, o impacto foi muito menor do que todos antevíamos.

Broadcast: Houve aumento de demanda na RK Partners durante a pandemia?

Ricardo K: Tivemos. Mas, fazendo uma analogia, somos como uma alta costura. Não pegamos muitos casos ao mesmo tempo. Tivemos que recusar muitos casos nesse processo. Aceitamos, em média, de seis a oito casos por ano; tivemos uns 20 que não conseguimos pegar. Este foi um mercado que se desenvolveu bastante. Vários concorrentes surgiram do nada. Gente que fazia IPO e M&A (fusões e aquisições) passou a achar que reestruturação era um bom negócio, mesmo sem entender do assunto. Acho que agora vai haver uma depuração do mercado.

Broadcast: Algum caso que possa citar?

Ricardo K: Tivemos alguns bons casos. A PDG talvez seja o melhor deles, inclusive está saindo da recuperação judicial. A empresa chegou a ter 641 canteiros de obras simultâneos, sendo maior real state do Brasil. Outra que está indo muito bem, apesar da RJ muito complexa, é a Novonor. Lá tivemos que aprovar 22 planos diferentes. As pessoas acham que quando é um grande grupo é mais fácil aprovar um grande plano, mas às vezes temos que aprovar por cada CNPJ. Agora é uma questão de implementar os planos aprovados. A grande questão é como a empresa de engenharia se viabiliza num mercado grande, com alguma demanda reprimida, mas sem grandes projetos estruturantes de infra. No caso da Novonor tem também a questão da Braskem que, na prática, é dos credores, mas que eles ainda não venderam. Mas, do ponto de vista da nossa contratação para a criação de um plano que fosse factível e isso foi um sucesso.

Broadcast: A venda da Braskem foi meio atropelada. Acredita que ainda pode acontecer este ano ou no que vem?

Ricardo K: Acho que este ano não vai acontecer nada. É um ano perdido para grandes operações. Além da turbulência política não se sabe o que vai acontecer com a guerra da Ucrânia, com o preço do petróleo, quanto tempo os juros ficarão tão altos para segurar a inflação. É difícil vender um ativo tão bom por um preço aviltado porque há uma crise. Entendo a postura dos bancos de segurarem um pouco porque é um ativo excelente e que paga bons dividendos. Não está queimando na mão dos bancos. Não só Braskem, mas outros grandes ativos. Fora a "vitória de Pirro" da Eletrobras, não haverá grandes operações acontecendo e há compras de empresas pequenas nesse M&A frenético.

Broadcast: Mantém a afirmação de que empresas recorreram à abertura de capital para fugir da recuperação judicial?

Ricardo K: A gente teve no ano passado vários casos muito interessantes de empresas que vinham conversar pensando numa recuperação judicial. Duas semanas depois, a gente via que o cara estava indo fazer o IPO. Várias empresas conseguiram. O mercado, às vezes, não olha com a devida atenção. Eram empresas com saúde financeira muito frágil. Em 2021, das 73 empresas que abriram capital, 57 hoje valem menos do que valiam. Houve grande frustração para o acionista, entretanto foi um dinheiro fácil que elas conseguiram captar sem precisar aumentar o endividamento. Quem perdeu foram os investidores, em alguns casos, 95% em um ano. Especialmente nas empresas de tecnologia vários sonhos foram vendidos, mas eram falácias. Este ano, 110 empresas já desistiram do IPO. É um ano seco. O que está tendo é uma volta do mercado de M&A. Talvez o mercado de fusões e aquisições cresça 25% em cima do ano passado.

Broadcast: O IPO para evitar a RJ foi estratégia que deu certo para empresa e errado para o investidor?

Ricardo K: É exatamente isso. Deu certo para a empresa, mas muitas delas ficaram com um problema de credibilidade. Isso começou a ficar muito claro a partir de agosto do ano passado. Na prática outras empresas não conseguiram ir para a listagem na Bolsa porque o mercado começou a ver que a realidade era: a empresa abre o capital e um mês depois vale a metade. O pessoal faz a conta. Mas, do ponto de vista de resolver o problema de financiamento da companhia sem pegar empréstimo novo, o dinheiro quem perdeu foi o acionista. Vários conhecidos estavam encantados com este momento da economia brasileira, e eu alertei que ao menos metade não ia funcionar. E o que a gente vê é que em 78% dos casos as empresas hoje valem menos do que quando abriram o capital. Isso num ano. Então, quem pagou a conta foi o investidor.

Broadcast: Isso não é ludibriar o investidor?

Ricardo K: Essa é uma palavra meio forte. Na prática, todos contratam bons advogados e têm todas as ressalvas possíveis para dizer por que não deu certo o investimento de risco. Não sei se tem solução, a não ser os próprios investidores se assessorarem melhor para não cair nesse conto do vigário. Isso é uma coisa meio pendular na economia brasileira. Acho que vai demorar um tempo para voltar o IPO. As pessoas falam muito que o problema é da instabilidade política, das eleições etc. Acho que tem dois grandes problemas. O primeiro é que há uma renda fixa rendendo muito e, nos próximos dois anos, o Brasil vai continuar rentista. O segundo é que, de fato, houve uma overdose de empresa superavaliadas que, na prática, não entregaram o que o plano de negócios previa. Alguns desses planos eram pastel de vento.

Broadcast: Como a está a parceria com o Itaú anunciada no ano passado para a criação de um fundo para empresas estressadas, que captaria R$ 500 milhões?

Ricardo K: Anunciamos a parceria no ano passado e começamos a captação há três meses. Está indo superbem. Não posso antecipar, mas as notícias são muito boas, o que nos orgulha muito porque é um ano muito difícil para captação e estamos muito confortáveis e estamos ultimando isso nas próximas semanas. Mas, superou nossas expectativas. Já temos um grupo de potenciais empresas para esse crédito especial, várias negociações bem avançadas, além de um fechamento acredito acima do que havíamos proposto. Vamos conseguir ter casos muito em breve.

Broadcast: Sobre CSN e Samarco...

Ricardo K: Não vou falar porque a CSN é uma empresa aberta. Estamos honrados por termos sido chamados para um caso tão interessante e complexo que pode ajudar muito tanto a Samarco quanto a CSN.

 

Esta entrevista foi publicada no Broadcast+ no dia 01/09/2022, às 17h16

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