Na contagem regressiva para a assembleia geral de credores (AGC), marcada para 25 de abril, os detentores de debêntures e “bonds” da Light e representantes da companhia entraram em novo impasse, após avanços nas negociações em torno de um novo plano de recuperação, com condições melhores para os credores, apurou o Broadcast.
O principal ponto de discórdia passou agora a ser a correção de debêntures da distribuidora Light Sesa ao longo do período da recuperação judicial. A cifra supera R$ 1 bilhão, valor que credores consideram importante para mitigar as perdas, conforme avaliação de um negociador representante de credores que aceitou falar sem ter o nome revelado.
Para um interlocutor próximo à empresa, porém, esse item, associado a outros ajustes demandados pelos credores e inicialmente aceitos pela companhia, tornaria a recuperação insustentável em médio prazo, após o período de carência.
Outros pontos estão bem encaminhados
Detentores de “bonds” também apontam para a correção dos papéis como o principal ponto de divergência com a Light neste momento, disse uma pessoa próxima dos “bondholders”. Outros pontos - como a cifra total da capitalização e os valores de conversão das dívidas em ações - foram apontados na objeção que o grupo protocolou na Justiça no dia 18, mas estão bem encaminhados e têm perspectiva de consenso, afirmou outro negociador, que espera uma nova proposta da Light depois da Páscoa.
Diferentes negociadores admitem que as conversas entre as partes vinham progredindo de forma promissora, com a companhia melhorando os termos da proposta mais recente, que se tornou pública em 24 de fevereiro. Diante disso, a expectativa era de um acordo que levaria a empresa a protocolar uma nova proposta de plano, já alinhavada.
A frustração veio, porém, quando a discussão chegou ao item sobre a correção das dívidas da distribuidora Light Sesa durante o período da recuperação judicial, e o que se observa agora é uma guerra de versões.
Sesa concentra R$ 9 bilhões dos R$ 11 bilhões de dívida
Segundo fonte próxima dos debenturistas, em meio aos avanços em outros temas, a Light teria recuado na correção dos débitos da Sesa, que concentra cerca de R$ 9 bilhões dos R$ 11 bilhões de dívida do grupo, e da geradora Light Energia. Esse negociador diz que os debenturistas da Sesa não abrem mão do ajuste e frisa que o item já tinha sido aceito pela Light, citando o documento de “blow out” (encerramento de período de confidencialidade) das negociações com “bondholders”, em 21 de fevereiro.
Outro interlocutor próximo às negociações diz que este tema, embora proposto pelos credores, nunca teve o aceite por parte da Light no caso das dívidas da Light Sesa. O tema estaria endereçado apenas junto a credores da Light Energia, empresa de geração do grupo que concentra menor volume de dívidas e tem situação econômico-financeira mais equilibrada.
O documento de “blow out” divulgado ao mercado em 21 de fevereiro informa que, no caso das dívidas da Light Sesa, o grupo de credores requer “juros acumulados (e não pagos)”, mas proposta e contraproposta da Light não citam o tema. Já no caso da Light Energia, o documento indica, em todas as etapas de negociação, que seriam mantidos “termos e condições originais” da dívida. No entanto, enquanto a Light defendeu, em sua última versão divulgada, que “os cupons vencidos devem ser capitalizados até que a data de reestruturação entre em vigor”, os credores demandaram que os juros acumulados e não pagos fossem “pagos em dinheiro na primeira data de pagamento de juros após a reestruturação”.
Caso tem guerra de versões
De acordo com outra fonte próxima à negociação, a empresa teria chegado a sinalizar aos debenturistas da Sesa que, no caso deles, não seria possível pagar tais juros acumulados, mas teria admitido aceitar outras demandas, incluindo ajustes nas taxas, e teria recebido uma “aprovação comercial” da nova proposta. Na formalização desses avanços, porém, os credores teriam incluído os juros acumulados, travando o andamento do processo.
De maneira geral, não há incidência de juros sobre as dívidas abrangidas em recuperações judiciais. Contudo, o processo da Light é “anômalo”, diz um interlocutor. Pela Lei 12.767/12, concessionárias de energia não podem entrar em recuperação judicial. Mas, no processo de recuperação judicial da Light, a holding obteve a suspensão do pagamento de obrigações financeiras de suas controladas, a concessionária de distribuição Light Sesa e a geradora Light Energia, ao argumentar que é garantidora das dívidas das empresas. Por isso, a própria companhia diz que a Sesa não está em recuperação judicial, mas “na” recuperação.
A distribuidora concentra a maior parte das dívidas do grupo, e a reestruturação do passivo dessa empresa é considerada peça fundamental na recuperação de todo o grupo e também para a perenidade da companhia. Responsável pela maior parte das receitas, a empresa tem contrato de concessão que vence em 2026 e precisa demonstrar à União e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que possui equilíbrio econômico financeiro para se habilitar a uma renovação contratual.
Plano é reduzir endividamento para até R$ 7 bilhões
A Light Sesa encerrou setembro de 2023 com dívida consolidada de R$ 9,3 bilhões. Segundo fonte, a intenção da companhia é ter, após o plano, um endividamento de R$ 6,5 bilhões a R$ 7 bilhões. Para isso, o plano proposto envolve o pagamento integral, em até 90 dias, de dívidas junto a credores menores, de até R$ 30 mil, o que equivale a 60% do total de 28 mil credores. Além disso, espera contar com a conversão de R$ 2,2 bilhões de dívidas maiores em ações.
A proposta prevê também o aporte de até R$ 1,5 bilhão na Light SA, sendo que os acionistas de referência - Nelson Tanure, Beto Sicupira e Ronaldo Cezar Coelho - garantiriam a injeção de R$ 1 bilhão. Parte dos recursos pagaria a amortização dos pequenos credores, estimada em R$ 300 milhões, e o restante iria para o caixa da companhia, para fazer frente a diversas necessidades, inclusive investimentos na área de concessão da distribuidora.
Para um interlocutor próximo à empresa, a inclusão dos juros acumulados na Sesa faria com que o saldo devedor permanecesse muito alto, mesmo após a conversão de parte da dívida em ações. Com isso, após o período de carência, a companhia voltaria a ter dificuldades para cumprir seus compromissos e poderia ter de buscar nova reestruturação das dívidas, já que não há perspectiva de mudança tão significativa nas entradas de caixa, mesmo após uma esperada renovação da concessão, posto que se trata de um serviço regulado.
Este texto foi publicado no Broadcast no dia 25/03/24, às 10h35
O Broadcast+ é uma plataforma líder no mercado financeiro com notícias e cotações em tempo real, além de análises e outras funcionalidades para auxiliar na tomada de decisão.
Para saber mais sobre o Broadcast+ e solicitar uma demonstração, acesse.